Resumo:O presente artigo visa demonstrar a possibilidade de aceitação de provas extemporâneas e injustificadas, essenciais à demonstração da verdade material, apresentadas pelo Sujeito Passivo, em sede de Processo Administrativo Fiscal e enquanto este perdurar, por parte da autoridade julgadora, com fulcro no Princípio da Oficialidade. O estudo utiliza um método de abordagem dedutivo e baseia-se principalmente em artigos, tendo em vista a especificidade do tema, complementada pela doutrina clássica para definição dos elementos, bem como de jurisprudência que corrobora a proposta. Tem como foco a abordagem no Processo Administrativo Fiscal no âmbito federal, não impedindo que haja uma interpretação extensiva para sua aplicação nos âmbitos estaduais e municipais. Tal medida confere à Administração Pública a oportunidade de adequar o seu ato à verdade material e evita, muitas vezes, que a questão seja levada novamente à apreciação do Judiciário.
Palavras-chave: Provas extemporâneas; Princípio da Oficialidade; Provas injustificadas; Verdade material; Processo Administrativo Fiscal – PAF.
SUMÁRIO:1.INTRODUÇÃO. 2.OS PRINCÍPIOS DA VERDADE MATERIAL E O DA OFICIALIDADE NO PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL. 3.TRÂNSITO EM JULGADO ADMINISTRATIVO. 4.FLEXIBILIZAÇÃO DA REGRA AO SUJEITO PASSIVO. 5.PROVAS EXTEMPORÂNEAS E INJUSTIFICADAS NO PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL. 6.CONCLUSÃO. 7.REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
INTRODUÇÃO
O estudo em tela defende a aceitação de provas extemporâneas e injustificadas (uma vez que as justificações previstas legalmente, não demandam maiores debates, bastando o fato se amoldar às hipóteses justificantes), desde que essenciais à demonstração da verdade material, por parte da autoridade julgadora administrativa, que pode recepcioná-las valendo-se das prerrogativas inerentes ao exercício do Princípio da Oficialidade, que lhe outorga poderes instrutórios amplos à produção de provas, com a finalidade de alcançar a verdade material. Tal prerrogativa aplica-se em sede de Processo Administrativo Fiscal, sendo que o presente estudo focará no âmbito Federal, não obstando a extensão do entendimento para os âmbitos Estaduais e Municipais. Fato importante é que a defesa para que o julgador aceite tal prova fora do prazo cabe tão somente quando esta for apresentada pelo Sujeito Passivo e não pelo Fisco, em quaisquer de suas órbitas.
A principal problemática para a aplicação de tal flexibilização está no fato de não possuir previsão legal expressa, tal como ocorre quando a apresentação da prova fora do prazo encontra justificativa prevista em qualquer das alíneas do artigo 16, parágrafo quarto do Decreto n. 70.235/72. Deve haver uma interpretação sistemática do ordenamento para compreender a aceitação, pois se o contrário ocorrer e o julgador observar tão somente o conteúdo da norma acima descrita, não poderá tomar outra decisão senão a de rechaçar a apreciação da prova por ser esta extemporânea e injustificada.
Tal prática não tem como objetivo banalizar as regras do processo administrativo fiscal, muito pelo contrário, visa flexibilizar regras que impeçam o julgador de chegar o mais próximo da verdade material. Dessa forma, tratando o procedimento como garantidor de seu objetivo final que é a decisão coadunada com a verdade real e não como mero formalismo capaz de tolher o direito do contribuinte, que terá que se valer do Judiciário para ver sua prova apreciada. Ressalta-se que seu uso deverá ocorrer enquanto perdurar o processo administrativo, ou seja, antes da ocorrência do trânsito em julgado administrativo.
Para a compreensão do exposto definiremos os principais institutos, baseando-se na melhor doutrina, sendo que a partir daí traremos ao estudo o contido em outros artigos que trazem consigo uma maior especificidade para embasar o defendido neste estudo, juntamente com posições jurisprudenciais e a própria legislação aplicável. Portanto, será utilizado um método de abordagem dedutivo, com a utilização de documentações indiretas.
Portanto, haverá uma abordagem dos principais institutos inerentes a uma devida compreensão, tais como o do Princípio da Oficialidade, a verdade material e o trânsito em julgado administrativo, passando após a uma abordagem mais específica do tema proposto, com suas problemáticas, demonstrando soluções e as decorrentes conseqüências.
OS PRINCÍPIOS DA VERDADE MATERIAL E O DA OFICIALIDADE NO PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL
A verdade material é o objetivo que o julgador tributário administrativo deve ter quando da consecução do Processo Administrativo Fiscal. Mas para entendermos no que consiste a verdade material, também conhecida como verdade real, necessário se faz recorrer a melhor doutrina.
Celso Antonio Bandeira de Mello[1] utiliza em sua obra definição de Hector Jorge Escola acerca da verdade material, qual seja:
"Consiste em que a Administração, ao invés de ficar restrita ao que as partes demonstrarem no procedimento, deve buscar aquilo que é realmente a verdade, com prescindência do que os interessados hajam alegado e provado como bem o diz Héctor Jorge Escola. Nada importa, pois, que a parte aceite como verdadeiro algo que não o é u que negue a veracidade do que é, pois no procedimento administrativo, independentemente do que haja sido aportado aos autos pela parte ou pelas partes, a Administração deve sempre buscar a verdade substancial. O autor citado escora esta assertiva no dever administrativo de realizar o interesse público."
Já Hely Lopes Meirelles[2] conceitua o princípio da verdade material da seguinte forma:
"O princípio da verdade material, também denominado de liberdade na prova, autoriza a Administração a valer-se de qualquer prova que a autoridade processante ou julgadora tenha conhecimento, desde que a faça trasladar para o processo. É a busca da verdade material em contraste com a verdade formal. Enquanto nos processos judiciais o Juiz deve-se cingir ás provas indicadas no devido tempo pelas partes, no processo administrativo a autoridade processante ou julgadora pode, até final julgamento, conhecer de novas provas, ainda que produzidas em outro processo ou decorrentes de fatos supervenientes que comprovem as alegações em tela. Este princípio é que autoriza a reformatio in pejus, ou a nova prova conduz o julgador de segunda instância a uma verdade material desfavorável ao próprio recorrente."
Com essas conceituações extraídas das obras dos eminentes doutrinadores, podemos traçar algumas características da verdade material em contraposição às inerentes a verdade formal, presente nos processos judiciais.
O julgador administrativo deve buscar sempre a verdade material, valendo-se de todos os meios lícitos para angariar provas, podendo produzi-las juntamente com as partes, pois a lei lhe outorga essa prerrogativa de ofício. Já no âmbito judicial, com exceção do Direito Penal, prevalece a verdade formal, que é a aquela produzida com as provas lícitas levadas aos autos no prazo e forma estabelecidos legalmente, sendo que a lei não outorga poderes ao juiz para produzir provas de ofício com tanta amplitude, pois quem possui essa prerrogativa no processo judicial são as partes, sendo o juiz inerte.
Maria Sylvia Zanella Di Pietro[3] conceitua com primazia o que vem a ser o princípio da Oficialidade:
"O princípio da oficialidade autoriza a Administração a requerer diligências, investigar fatos de que toma conhecimento no curso do processo, solicitar pareceres, laudos, informações, rever os próprios atos e praticar tudo o que for necessário à consecução do interesse público."
O Princípio da Oficialidade, portanto, possibilita a consecução do objetivo almejado pela autoridade julgadora, que é a busca da verdade material, não ficando adstrito somente às provas que as partes produziram, podendo buscá-las de ofício.
Como o foco do trabalho é o processo administrativo fiscal, conclui-se que o julgador tributário tem o poder para angariar provas de ofício com o objetivo de alcançar a verdade material, não podendo negar provas necessárias ao seu objetivo, desde que apresentadas durante o processo administrativo (conforme se verá adiante), sob pena de proferir uma decisão em desconformidade com o interesse público.
TRÂNSITO EM JULGADO ADMINISTRATIVO
Outro instituto que se faz necessário conceituar, porém, de nomenclatura criticada, é o chamado trânsito em julgado administrativo, que opera como limitador à flexibilização da apresentação da prova de maneira extemporânea. Isto porque o fato de ser apresentada fora do prazo legal, não quer dizer que possa ser apresentada a qualquer tempo e para isso se faz necessário compreender no que consiste a coisa julgada administrativa.
Primeiramente, sabemos que a Administração Pública tem o poder de revogar ou invalidar seus atos.
Celso Antônio Bandeira de Mello[4] assim define a revogação:
"(...) revogação é a extinção de um ato administrativo ou seus efeitos por outro ato administrativo, efetuada por razões de conveniência e oportunidade, respeitando-se os efeitos precedentes."
Já com relação à invalidação, segue breve definição do mesmo autor acima citado[5]:
"Invalidação é a supressão de um ato administrativo ou da relação jurídica dele nascida, por haverem sido produzidos em desconformidade com a ordem jurídica."
Pois bem, com ambas as definições acima, podemos entender no que consiste a coisa julgada administrativa.
Ao explanar sobre a coisa julgada administrativa, Celso Antônio Bandeira de Mello (2009, p. 452) explica que ela abrange a irrevogabilidade do ato, mas seu significado é mais extenso, pois compreende também a irretratabilidade, que consiste no impedimento de a Administração Pública questionar o ato judicialmente, impedimento este não aplicável à mera irrevogabilidade.
Referido autor ainda explica (2009, p. 452) que a amplitude da coisa julgada administrativa é menor do que a coisa julgada obtida judicialmente, uma vez que a definitividade do ato restringe-se à própria Administração Pública, não impedindo terceiros de buscar a correção do ato judicialmente.
Observando apenas que o controle judicial restringe-se aos atos inválidos e não meramente revogáveis, pois somente à Administração cabe decidir sobre a revogação de seus atos, isto porque a ela cabe a prerrogativa de definir o que vem a ser oportuno e conveniente, prerrogativa esta que o Judiciário não detém quando no exercício de sua função típica julgadora, sob pena de usurpar competência da função Executiva.
Ainda na linha de pensamento do mesmo autor (2009, p. 453), a coisa julgada administrativa origina-se de decisões administrativas dadas em última instância, de modo contencioso, com observância do contraditório, tal qual como ocorre no Processo Administrativo Fiscal.
Tal instituto confere segurança jurídica com a estabilidade da decisão administrativa, observando-se a lealdade e a boa-fé na esfera administrativa.
Sérgio Ferraz e Adílson Dallari (2003), citados por Celso Antônio Bandeira de Mello (2009, p. 453 e 454), sustentam que só seria possível desconstituir a coisa julgada administrativa em um processo administrativo revisional fundado na infração à lei, com a participação de todos os interessados antes envolvidos, concluindo-se que não poderá anular de ofício seu ato (tal como o faz normalmente) sem a observância do devido processo legal no âmbito administrativo.
Quanto à exceção trazida de propor que se instaure um processo administrativo revisional, com o intuito de desconstituir a coisa julgada administrativa, deve ter este revisional como fundamento uma prova nova ou não trazida anteriormente por motivo de força maior, não podendo fundar-se em prova, mesmo que essencial, mas que poderia ter sido apresentada antes da ocorrência da coisa julgada administrativa.
Entendendo a definitividade da decisão administrativa obtida no Processo Administrativo Fiscal, gerando a coisa julgada administrativa, conclui-se que a flexibilização para a apresentação da prova fora do prazo, não possibilita a apresentação a qualquer tempo, mas somente até o término do procedimento, pois ainda oportuno à Administração adequar seu ato antes de tornar-se definitivo. Portanto, não pode a prova extemporânea e injustificada, mesmo que essencial, servir de fundamento para a instauração de procedimento revisional tendente a desconstituir a coisa julgada administrativa o que certamente feriria a segurança jurídica do ato administrativo.
FLEXIBILIZAÇÃO DA REGRA AO SUJEITO PASSIVO
O estudo em tela defende a flexibilização da regra, possibilitando a apresentação da prova fora do prazo e de maneira injustificada, tão somente ao Sujeito Passivo, conforme será demonstrado a seguir.
Esta limitação encontra guarida no preceito de que o Fisco, quando do momento do lançamento, já deve ter reunido todo o conjunto probatório relativo à ocorrência do fato gerador (artigo 9°, caput do Decreto n. 70.235/72), não podendo fundamentar o lançamento com provas posteriores. O julgador tributário detém a liberdade de produzir provas, porém, as provas produzidas no decorrer do processo administrativo servem tão somente para corroborar o conjunto probatório trazido pelo Fisco para fundamentar o lançamento.
Permitir a apresentação de provas fundamentais pelo Fisco após o lançamento, salvo aquelas produzidas no decorrer do processo administrativo pelo julgador tributário, com vistas a confirmação dos elementos probatórios trazidos pelo Fisco, seria prejudicial ao contribuinte. O contribuinte se defende das provas que serviram de fundamento ao lançamento, sendo que, se essas provas não forem suficientes, não pode o Fisco surpreender o contribuinte com novas provas, obedecendo a segurança jurídica na relação tributária.
Reforçando a não possibilidade de juntada de provas posteriores por parte do Fisco, Fabiana Del Padre Tomé “(2011, p. 225) expressa que: “Nada justifica, portanto, a juntada posterior de provas imprescindíveis à motivação do ato de lançamento ou de aplicação de penalidade.”.
A presunção de legitimidade do ato administrativo pode levar o intérprete à falsa conclusão de que o ônus probatório de que não há relação jurídica tributária, cabe ao contribuinte, sendo que à Administração, em decorrência do seu poder de império estatal, restaria tão somente ilidir as alegações do contribuinte, sem necessidade de comprovar previamente a motivação do lançamento.
Um lançamento sem comprovação prévia contém vício de motivação (TOMÉ, 2011, p. 334). A presunção de legitimidade exige a prévia fundamentação do ato de lançamento, pois sua presunção juris tantum conta com a devida observância dos elementos do ato administrativo, em especial a motivação, com provas cabais da ocorrência do fato que ensejou o ato administrativo (TOMÉ, 2011, p. 337).
Tal prerrogativa não permite que não haja a devida comprovação prévia dos elementos fundadores do lançamento, que permitiram ao Fisco concluir acerca da ocorrência do fato gerador do tributo. No mesmo sentido, Paulo de Barros Carvalho[6] (1998), citado por Fabiana Del Padre Tomé (2011, p. 271):
"Na própria configuração oficial do lançamento, a lei institui a necessidade de que o ato jurídico administrativo seja devidamente fundamentado, o que significa dizer que o fisco tem que oferecer prova concludente de que o evento ocorreu na estrita conformidade da previsão genérica da hipótese normativa."
O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais já decidiu no mesmo sentido:
"Processo n° :10283.002174/97-74
Recurso n°: 124.737
Matéria: IRPJ E OUTROS - Ex(s): 1994
Recorrente: DNN - COMÉRCIO DE JÓIAS LTDA
Recorrida: DRJ em MANUAS - AM
Sessão de: 22 de maio de 2001
Acórdão n°: 103-20.594
IRPJ - FALTA DE CARACTERIZAÇÃO DA INFRAÇÃO - Em respeito à legalidade, verdade material e segurança jurídica não pode subsistir lançamento de crédito tributário quando não estiver devidamente demonstrada e provada a efetiva subsunção da realidade factual à hipótese descrita na lei como infração à legislação tributária.
ÔNUS DA PROVA - Na relação jurídico-tributária o onus probandi incumbit ei qui dicit. Compete ao Fisco, ab initio, investigar, diligenciar, demonstrar e provar a ocorrência, ou não, do fato jurídico tributário ou da prática de infração praticada no sentido de realizar a legalidade, o devido processo legal, a verdade material, o contraditório e a ampla defesa. O sujeito passivo somente poderá ser compelido a produzir provas em contrário quando puder ter pleno conhecimento da infração com vista a elidir a respectiva imputação."
A prova extemporânea em favor do Fisco implicaria em um novo lançamento, pois este deve reunir todas as provas previamente, originando o crédito tributário. Com isso, haveria continuação na contagem do prazo decadencial, pois o primeiro lançamento que desconsiderou a prova que deveria ter sido produzida anteriormente e não conseguiu provar a existência do fato gerador com as demais provas, não produz efeitos, contando-se o prazo decadencial até o novo lançamento, pois o primeiro não conseguiu interromper o prazo decadencial, que originaria a posterior contagem do prazo prescricional, não prejudicando assim a segurança jurídica do contribuinte, que deve respeito ao ato de império vinculado com produção de provas prévias ao lançamento, delimitando assim a defesa do sujeito passivo desde o início.
PROVAS EXTEMPORÂNEAS E INJUSTIFICADAS NO PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL
Compreendido os institutos tratados anteriormente, passemos à discussão acerca da possibilidade de aceitação das provas extemporâneas e injustificadas apresentadas pelo Sujeito Passivo, com foco no Processo Fiscal Administrativo em âmbito Federal.
Vejamos o conteúdo do Decreto n. 70.235/72 que rege o Processo Administrativo Fiscal em âmbito Federal, mais especificamente em seu artigo 16, parágrafo quarto e suas alíneas:
"Art. 16. A impugnação mencionará:
(...)
§ 4º A prova documental será apresentada na impugnação, precluindo o direito de o impugnante fazê-lo em outro momento processual, a menos que:
a) fique demonstrada a impossibilidade de sua apresentação oportuna, por motivo de força maior;
b) refira-se a fato ou a direito superveniente;
c) destine-se a contrapor fatos ou razões posteriormente trazidas aos autos."
A autoridade julgadora, em uma análise isolada desse dispositivo e baseando-se no príncipio da estrita legalidade, pode refutar a prova extemporânea e injustificada, pois o Decreto n. 70.235/72 em seu artigo 16, parágrafo quarto e suas alíneas assim autorizam, porém, a estrita legalidade não compreende a análise isolada dos dispositivos, devendo considerar o sistema normativo aplicável como um todo, bem como os demais princípios, podendo ser limitado na exata medida em que se coadune ao ordenamento jurídico.
No mesmo diploma legal, em seu artigo 18, “caput”, denota-se a presença do Princípio da Oficialidade, corroborado pelo disposto no artigo 2, inciso XII da Lei n. 9.784/99, que aplica-se subsidiariamente aos procedimentos específicos traçados por outros diplomas legais em âmbito Federal (como é o caso do Decreto n. 70.235/72).
Observemos o que dispõe cada um deles, começando pelo artigo 18, “caput” do Decreto n. 70.235/72:
"Art. 18. A autoridade julgadora de primeira instância determinará, de ofício ou a requerimento do impugnante, a realização de diligências ou perícias, quando entendê-las necessárias, indeferindo as que considerar prescindíveis ou impraticáveis, observando o disposto no art. 28, in fine."
No mesmo sentido, o artigo 2, inciso XII da Lei 9.784/99, que serve de maneira subsidiária ao Processo Administrativo Fiscal:
"Art. 2o A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.
Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de:
(...)
XII - impulsão, de ofício, do processo administrativo, sem prejuízo da atuação dos interessados;"
Nada obsta que a autoridade julgadora no âmbito administrativo receba a prova extemporânea e injustificada como prova essencial ao deslinde da questão com base no princípio da oficialidade, pois se a lei faculta à autoridade a produção de provas de ofício, não há sentido em refutar prova essencial que demonstre a verdade material em face das demais juntadas aos autos anteriormente no prazo legal, mas que não alcançaram o objetivo de provar a verdade material, tal qual como fez a prova extemporânea e injustificada.
Para que não se diga que seria um incentivo ao sujeito passivo apresentar as provas no momento em que bem entender, sem nenhuma conseqüência que ocasione desvantagem quanto à apresentação no prazo legal, podemos visualizar que ao sujeito passivo não mais lhe é seguro que sua prova seja aceita, pois deverá demonstrar de maneira inequívoca a importância da prova à autoridade julgadora, pois esta só a recepcionará se for essencial ao deslinde da questão, juízo este que não pode ser feito pelo julgador administrativo quando o sujeito passivo a apresenta no prazo legal.
Para tanto, não pode simplesmente a autoridade julgadora refutar a apreciação da prova com base tão somente na extemporaneidade. Para negar a colação da prova aos autos do processo administrativo, a motivação do ato denegatório deve conter também a justificação de não essencialidade da prova, o que acaba por preencher o pretendido que era a manifestação valorativa quanto ao conteúdo probatório, mesmo que de maneira insatisfatória ao sujeito passivo.
Oportuna a menção de decisões proferidas pelo CARF – Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, no sentido de se aceitar as provas extemporâneas:
"Processo nº 10680.013336/200769
Recurso nº 169.934 Voluntário
Acórdão nº 210201.043
– 1ª Câmara / 2ª Turma Ordinária
Sessão de 09 de fevereiro de 2011
Matéria IRPF DEPÓSITO
BANCÁRIO E ATIVIDADE RURAL
Recorrente ROMEU FERREIRA DE QUEIROZ
Recorrida FAZENDA NACIONAL
(...)
PROVA EXTEMPORÂNEA. ÓBICE DO ART. 16, § 4º E ALÍNEAS DO DECRETO Nº 70.235/72. HIGIDEZ. Nada impede que a autoridade julgadora de primeira instância se ancore na estrita dicção do art. 16, § 4º e alíneas, do Decreto nº 70.235/72, rejeitando a juntada de prova extemporânea à impugnação. Caso o recorrente resolva se insurgir sobre tal procedimento, deve minudentemente debater novamente a questão, apontando a prova que deveria ser apreciada, quando a instância julgadora de segunda instância, à luz do princípio da verdade material, poderá apreciar a prova, como seguidamente se vê nesta Turma de Julgamento, ou devolver os autos para a instância a quo, cassando a decisão recorrida. No caso aqui em discussão, não ficou claro qual prova não foi apreciada pela instância a quo, mais ainda, onde isso teria vulnerado o direito do contribuinte, razão que leva a rejeição da presente defesa.
(...)
Processo nº 10283.004758/200726
Recurso nº 255.615 Voluntário
Acórdão nº 230201.028
– 3ª Câmara / 2ª Turma Ordinária
Sessão de 11 de maio de 2011
Matéria Cessão de Mão de Obra: Retenção. Orgãos Públicos
Recorrente ESTADO DO AMAZONAS SECRETARIA DE ESTADO DA SAÚDE
Recorrida FAZENDA NACIONAL
(...)
VERDADE MATERIAL. A busca da verdade material permite o reconhecimento de provas extemporâneas relativas a recolhimento efetuado, pois não pode ser admitida a cobrança de um débito já pago.
(...)
Processo nº 13708.000341/200311
Recurso nº Voluntário
Acórdão nº 180300.765
– 3ª Turma Especial
Sessão de 26 de janeiro de 2011
Matéria IRPJ e CSLL
Recorrente M AGOSTINI S.A
Recorrida DELEGACIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL DE JULGAMENTO
NO RIO DE JANEIRO RJ
VERDADE MATERIAL - COMPROVAÇÃO DO CRÉDITO
Ainda que não sejam provadas nos autos as hipóteses previstas no § 4º do art. 16 do Decreto 70.235/72 que justificariam a juntada tardia de documentos, é possível admitir referida juntada tardia em vista da necessidade de busca da verdade material. Por outro lado, é crucial que seja demonstrada e comprovada a certeza e liquidez do crédito pleiteado para que o mesmo seja reconhecido pela autoridade julgadora.
(...)"
Quando o julgador de primeira instância negar a juntada da prova extemporânea e injustificada aos autos, o sujeito passivo pode valer-se da via recursal, que no âmbito federal é representada pelo CARF – Conselho Administrativo de Recursos Fiscais e já possui julgados no sentido de aceitar a apresentação de tais provas que não se coadunam com os ditames trazidos pelo Decreto n. 70.235/72. Referido Conselho oferece duas soluções: a apreciação da prova extemporânea e injustificada pela própria autoridade julgadora de Segunda Instância, com base no princípio da verdade material (que é alcançado graças ao princípio da oficialidade, que confere ao julgador, juntamente às partes, o poder de produzir e acolher provas essenciais à resolução da questão em tela), ou a cassação da decisão recorrida, devolvendo à Instância Inferior para novo julgamento, só que agora com a apreciação da prova refutada.
A autoridade administrativa, no caso o julgador no âmbito administrativo, deve ter a visão da amplitude da atuação Estatal quando do enfrentamento da questão, que não se adstringe ao âmbito administrativo, pois a própria Constituição Federal confere a possibilidade de levar a questão à apreciação do Judiciário (art. 5°, inciso XXXV da Constituição Federal), que analisará a legalidade do que foi decidido administrativamente. Ora, se o julgador visualiza na prova extemporânea e injustificada, fundamento que sirva de escopo para o alcance da verdade material, nada mais lógico e eficiente do que avocar a prova com fulcro no Princípio da Oficialidade e desconstituir o ato administrativo que não se coaduna com o objetivo da Administração Pública que visa o bem comum, que certamente não é alcançado quando se julga contrário à verdade, com a escusa de obediência ao formalismo burocrático do Estado, que tolhe o direito do contribuinte, que por fim, se vê obrigado a socorrer-se do Judiciário para tentar anular o ato administrativo ilegal.
Importante salientar a necessidade de não ter ocorrido o trânsito em julgado administrativo, pois mesmo que extemporânea e injustificada, a prova deve ser apresentada dentro do lapso temporal em que o processo administrativo tributário encontra-se em andamento. O importante é que a apresentação ocorra dentro processo administrativo tributário, seja na primeira ou segunda instância, pois ainda há tempo hábil para a autoridade rever o posicionamento dentro do próprio processo.
Defender a aceitação após o trânsito em julgado administrativo, seria desrespeitar completamente o devido processo legal administrativo, tornando-o sem sentido, pois não garantiria segurança jurídica ao apreciar uma prova extemporânea e sem a devida justificação após a ocorrência de todo o procedimento. A flexibilização para a aceitação da modalidade de prova em estudo, dentro do processo administrativo, é uma oportunidade da Administração rever seu ato com observância do devido processo legal.
Assim como o contribuinte não pode ver a tributação como um ônus, pura e simplesmente, uma vez que cabe ao Estado redistribuir o produto da arrecadação em prol da sociedade, não pode também o Estado tributar quem demonstra, mesmo que de maneira extemporânea e injustificada, porém, ainda dentro do Processo Administrativo Tributário que ainda não gerou o chamado trânsito em julgado administrativo, não ser devedor de uma obrigação tributária.