6-Sugestão de Alteração do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro
É tema reservado ao Regimento Interno do Tribunal a disposição sobre a composição e estrutura do Poder Judiciário Estadual, no exercício do autogoverno inerente à magistratura, sendo o local apropriado para normas que disponham sobre a escolha dos membros da Administração.
Considerando que o Regimento Interno do Tribunal é a sua Constituição, nele devem estar previstas a estrutura do Poder e a forma de escolha dos membros integrantes daquela estrutura, guardando simetria com as normas da Constituição da República, da Constituição do Estado e das Leis que disponham sobre os cargos de direção (CRFB/88, artigo 96, inciso I, a e inciso II, a e b).
O artigo 2o do RITJRJ dispõe sobre a competência do Tribunal Pleno para a eleição da Administração do Tribunal e Diretor da EMERJ (incisos I e II). O artigo 3o, inciso V do RITJRJ dispõe sobre a competência do Órgão Especial para elaborar o Regimento Interno e emendá-lo. O artigo 233 dispõe que o Regimento poderá ser alterado por iniciativa de qualquer Desembargador, ou Órgão do Tribunal, seguindo o procedimento traçado nos seus parágrafos. Assim, a proposta de alteração do Regimento Interno, para conferir nova redação ao artigo 2o, pode ser apresentada por qualquer Desembargador, com o desmembramento dos artigos, técnica legislativa utilizada pelo Congresso Nacional. É proposta a seguinte redação:
Art.2º.A - Ao Tribunal Pleno, integrado por 180 (cento e oitenta) Desembargadores, e aos Magistrados da primeira instância compete:
I - eleger o Presidente, o Corregedor-Geral de Justiça, os 03 (três) Vice-Presidentes;
II - eleger o Diretor da Escola da Magistratura do Estado do Rio de janeiro;
Art.2º.B - Ao Tribunal Pleno, integrado por 180 (cento e oitenta) Desembargadores, compete:
I - escolher os candidatos ao Quinto Constitucional do Ministério Público e da Advocacia que integrarão a lista tríplice;
II - eleger 2 (dois) Desembargadores e 2 (dois) Juízes de Direito para integrarem o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) e seus respectivos suplentes;
III - elaborar a lista tríplice de advogados para nomeação pelo Presidente da República para comporem o Tribunal Regional Eleitoral.
Parágrafo único - Sendo ímpar o numero de vagas destinadas ao quinto constitucional, uma delas será, alternada e sucessivamente, preenchida por Advogado e por membro do Ministério Publico, de tal forma que, também sucessiva e alternadamente, os representantes de uma dessas classes superem os de outra em uma unidade.
Nada impede, ainda, que o Tribunal de Justiça discipline a possibilidade de reeleição e outros aspectos do procedimento eleitoral, diante da autonomia e do autogoverno extraídos da Constituição de 1988.
7-Conclusão
A Constituição de 1988 instituiu a República Federativa do Brasil como Estado Democrático de Direito, decorrendo do princípio da democracia os princípios da maioria, da igualdade e da liberdade. O direito de sufrágio compatível com o princípio democrático é marcado pela universalidade e pela igualdade. Todos os entes públicos e privados estão vinculados à Constituição[29] por força da sua supremacia, razão pela qual o Poder Judiciário de um Estado Democrático de Direito deve agir, também no plano interno, com observância do princípio democrático. O reconhecimento do direito de sufrágio universal e igualitário aos membros do Poder Judiciário representa inegável valorização da magistratura de primeira instância e possibilita a participação responsável do juiz nas tomadas de decisão do Tribunal, diretamente, ou através dos representantes eleitos. O Regimento Interno dos Tribunais podem reconhecer o direito de sufrágio aos membros de primeira instância dos Tribunais, no exercício do autogoverno decorrente da norma do artigo 96, I, a da CRFB/88.
A Constituição democrática de 1988 conferiu aos Tribunais a competência para a sua organização, como corolário da autonomia dos entes da federação e do princípio da separação dos Poderes no contexto do autogoverno da magistratura. A Constituição de 1988 não repetiu a norma da Constituição de 1969 (EC 01/1969) sobre delegação ao legislador federal complementar da disciplina da organização dos Tribunais e assegurou expressamente e sem ressalvas a autonomia dos Tribunais Estaduais para eleger seus órgãos diretivos, existindo regra expressa sem sentido contrário com relação ao Poder Judiciário da União, como a Justiça do Trabalho (CRFB/88, artigo 113), a Justiça Eleitoral (CRFB/88, artigo 121) e a Justiça Militar federal (CRFB/88, artigo 124, parágrafo único). A autonomia dos Tribunais Estaduais para eleger seus órgãos diretivos é aquela autonomia típica do federalismo, pela adoção da forma federativa de Estado (CRFB/88, artigo 60, parágrafo 4o, I), que não se confunde com a simples autonomia administrativa do Poder Judiciário (CRFB/88, artigo 99). Assim, a previsão de norma sobre eleições dos Tribunais Estaduais no futuro Estatuto da Magistratura aprovado pelo Poder legislativo da União e sem delegação constitucional, ou na LOMAN é inconstitucional, retirando do Tribunal Estadual autonomia federativa para disciplina da matéria no seu Regimento Interno, verdadeira Constituição dos Tribunais estaduais, no que tange à organização do Poder Judiciário dos Estados autônomos no federalismo brasileiro. Assim, o artigo102 da LOMAN em vigor não foi recepcionado no que se refere aos Tribunais Estaduais. A Constituição de 1988 não delegou ao legislador infraconstitucional a disciplina da matéria relativa à organização dos Tribunais Estaduais, cabendo a cada Tribunal a sua normatização no Regimento Interno, inclusive com a possibilidade de reeleição, nos moldes da recondução das Mesas Diretoras dos Parlamentos estaduais e municipais e da chefia do Ministério Público Estadual.
7-Referências Bibliográficas.
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______________________. Interpretação e Aplicação da Constituição. 5a ed. São Paulo: Saraiva, 2003.
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DWORKIN, Ronald. Levando os Direitos a Sério. Trad. Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
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HÄBERLE, Peter. Sociedade Aberta dos Intérpretes da Constituição: Contribuição Para a Interpretação Pluralista e ‘Procedimental’da Constituição. Trad. de Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Fabris, 1997.
HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia. Entre Facticidade e Validade. Volume I. Tradução Flavio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997.
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SLAIBI FILHO, Nagib. Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Forense, 2004.
Notas
[1]BARROSO considera o Estado Democrático de Direito como a síntese dos conceitos de constitucionalismo e democracia, traduzida na soberania popular e no governo da maioria. Ainda segundo o Professor, a Constituição de um Estado democrático tem duas funções principais: veicular consensos mínimos e essenciais para a dignidade das pessoas e funcionamento do regime democrático, além de garantir o pluralismo político com o funcionamento adequado dos mecanismos democráticos, existindo “um claro equilíbrio entre constitucionalismo e democracia, que não pode nem deve ser rompido pelo intérprete constitucional”. (Cf. BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo. Os Conceitos Fundamentais e a Construção do Novo Modelo. Rio de Janeiro: Saraiva, 2009, pp.87/93).
[2]HÄBERLE, Peter. Sociedade Aberta dos Intérpretes da Constituição: Contribuição Para a Interpretação Pluralista e ‘Procedimental’da Constituição. Trad. de Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Fabris, 1997, p.13.
[3]HESSE, Konrad. Derecho Constitucional y Derecho Privado. Traducción e introducción de Ignacio Gutiérrez Gutiérrez. Madrid: Civitas, 2001, p.73.
[4]SLAIBI FILHO, Nagib. Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p.382.
[5]cf.HESSE, Konrad. Derecho…, cit., pp.31 e ss.
[6]Como afirma DWORKIN, “O governo deve não somente tratar as pessoas com consideração e respeito, mas com igual consideração e igual respeito. (...)O governo não deve restringir a liberdade, partindo do pressuposto de que a concepção de um cidadão sobre a forma de vida mais adequada para um grupo é mais nobre ou superior do que a de outro cidadão.” Prossegue o Professor, sobre a possibilidade de restrição a liberdade em casos restritos e excepcionais: “Um governo que respeita a concepção liberal de igualdade somente pode restringir a liberdade, de maneira adequada, com base em certos tipos muito limitados de justificação” (DWORKIN, Ronald. Levando os Direitos a Sério. Trad. Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p.419 e p. 421).
[7]cf. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 27a ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p.125.
[8]cf. SILVA, José Afonso da. Curso..., cit. p.126.
[9]cf. SILVA, José Afonso da. Curso..., cit. p.129.
[10]cf. SILVA, José Afonso da. Curso..., cit. pp.126-127.
[11]cf. SILVA, José Afonso da. Curso..., cit. p.127.
[12]cf. SILVA, José Afonso da. Curso..., cit. pp.350 e ss.
[13]cf. SILVA, José Afonso da. Curso..., cit. pp.349-350.
[14]cf. SILVA, José Afonso da. Curso..., cit. p.351.
[15]HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia. Entre Facticidade e Validade. Volume I. Tradução Flavio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997, p.146.
[16]cf. HABERMAS, Jürgen. Direito..., cit., p.146.
[17]cf. SILVA, José Afonso da. Curso..., cit. p.354.
[18]DALLARI, Dalmo de Abreu. O Poder dos Juízes. 2a ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p.150.
[19]DALLARI, Dalmo de Abreu. O Poder..., cit., p.151.
[20]DALLARI, Dalmo de Abreu. O Poder..., cit., p.151.
[21]Como destaca NAGIB SLAIBI FILHO, “a democracia, assim, exige três momentos tão diversos como necessários: a consciência, a participação e a responsabilidade – consciência do que está sendo decidido e executado, participação na decisão e execução e responsabilidade pela decisão ou o fim visado por ela.” (SLAIBI FIILHO, Nagib. Direito...cit., p.617).
[22]Cf. http://www.amaerj.org.br/noticias/ministro-barbosa-ressalta-importancia-do-1o-grau-e-da-repercussao-geral-para-celeridade-da-justica.
[23]Cf. http://www.amaerj.org.br/noticias/autonomia-independencia-valorizacao-e-fortalecimento-da-magistratura-marcam-discurso-de-posse-do-novo-presidente-da-amaerj.
[24]AFONSO DA SILVA, José. Aplicabilidade das Normas Constitucionais. 3a ed. São Paulo: Malheiros, 1999, p.101.
[25]“Em verdade, juridicamente, a iniciativa é o ato por que se propõe a adoção de um direito novo. Tal ato é uma declaração de vontade, que deve ser formulada por escrito e articulada. Ato que se manifesta pelo depósito do instrumento, do projeto, em mãos da autoridade competente.” (FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Do Processo Legislativo. São Paulo: Saraiva, 1995, p.202).
[26]BARROSO, Luís Roberto. O Direito Constitucional e a Efetividade de Suas Normas. Limites e Possibilidades da Constituição Brasileira. 6a ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p.322.
[27]BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e Aplicação da Constituição. 5a ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p.71.
[28]BARBOSA MOREIRA, José Carlos. O Poder Judiciário e a Efetividade da Nova Constituição. RF, 304:151, 1988, p.152. Apud: BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e Aplicação da Constituição. 5a ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p.71.
[29]Cf.HÄBERLE, Peter. Sociedade..., cit. p.13.