A inconstitucionalidade da Lei Maria da Penha

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28/11/2014 às 14:46
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6. PONTOS POSITIVOS E NEGATIVOS DA NOVA LEI

Outro assim de todo estudo feito no que diz respeito a Lei Maria da Penha dela podemos extrair alguns pontos positivos os quais trataremos a seguir.

No art. 27 da lei mencionada, haverá a previsão expressa de que a mulher deva estar acompanhada de um patrono em todos os atos processuais. Não havendo condições financeiras será representada por defensor público. Ressaltando a segurança e proteção da mulher, tomando assim conhecimento de quais são seus direitos, e não se sente acuada, sente-se protegida e segura de si, retomando sua dignidade.

A grande inovação introduzida pela Lei em seu art. 5º, parágrafo único, no que diz respeito à proteção a mulher, contra a violência, independente de sua orientação sexual. Diante do exposto, a mulher homossexual, quando vítima de ataque perpetrado pela parceira, no âmbito da família, encontra-se sob a proteção do diploma legal em estudo. A inovação é merecedora de elogios visto que existia uma da timidez normativa que reinava sobre o tema em nosso país. A autoridade policial tem de volta o poder em suas mãos, pois agora pode investigar, fazer inquirições ao agressor e à vítima culminando com um inquérito policial que deverá ser apreciado pelo Juiz em até 48 horas (em caso de medidas de urgência). O que a Lei traz de positivo:

Programas formação de recuperação e reeducação do agressor. Segundo o art. 93 da LEP, essa espécie de pena de limitação de fim de semana, assim como a pena privativa de liberdade em regime aberto, deve ser cumprida em casa de Albergado. A realidade em nosso país, contudo demonstra que essas casas, salvo raríssimas exceções, simplesmente não existem na imensa maioria das cidades brasileiras. Na prática, esse tipo de pena acaba tendo pouca aplibilidade na iniciativa. Mesmo assim não deixa de ser louvável a iniciativa do legislador. A fiscalização quanto à freqüência do condenando é realizada, pelo próprio estabelecimento responsável pelo curso ou programa de recuperação. Também ao patronato se incumbe a tarefa de fiscalizar, além de orientar o albergado, propiciando-lhe condições de recuperação.

Criação de casas de refúgio ou “casa – abrigo”, disposto no art. 35 da Lei 11.340/06, para mulheres agredidas, que tem seu conceito bem apanhado pela autora portuguesa Susana Ramos, dizendo que essa casa “deverá ser um local onde as mulheres vitimam de violência, em situações-limite, se sintam protegidas, possibilitando ás crianças uma nova noção de família, dando-lhes a conhecer outras relações que não passem pela violência”.[14]

A implantação de reforço as Delegacias de Atendimento à Mulher no que diz respeito a capacitação, também, para a Polícia Militar, Corpo de Bombeiros e a Guarda Municipal.Viabilidade da inclusão da vítima em programas assistenciais do governo, programas de proteção à vítima e à testemunha, acesso à transferência de local de trabalho (quando servidora pública). Porém nem tudo é perfeito, a Lei Maria da Penha traz também em seu corolário alguns pontos negativos que veremos a seguir.

Alguns delegados que não receberam treinamento podem não ser capazes de prestar os serviços solicitados, e alguns deles, segundo se informa, continuam a responder às vítimas de maneira a fazer com que se sintam envergonhadas e humilhadas. Para certos delitos, como a violação sexual, as vítimas devem apresentar-se ao Instituto Médico Legal, que tem a competência exclusiva para realizar os exames médicos requeridos pela lei para o processamento da denúncia. Algumas mulheres não têm conhecimento desse requisito, ou não têm acesso à referida instituição da maneira justa e necessária para obter as provas exigidas. Esses institutos tendem a estar localizados em áreas urbanas e, quando existem, com freqüência não dispõem de pessoal suficiente.

Há uma previsão legal no art. 33 parágrafo único da lei Maria da penha, onde encaminhamento, para as varas criminais, das questões tanto criminais quanto cíveis, além de determinar o direito de preferência sobre as ações de violência doméstica em relação às demais. Mas tal medida vem causando muitos transtornos, pois isto significa dar brechas para a prescrição dos demais processos, o que agrava mais ainda a morosidade da justiça no tocante aos demais casos.

Não se compreende o porquê da designação de "Juizados" para o órgão judiciário que irá processar e julgar as causas decorrentes de violência doméstica e familiar contra a mulher. Com efeito, essa nomenclatura é consagrada pelo artigo 98, inciso I da Constituição Federal "para julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo". Ora, a Lei n. 11.340/06 proibiu expressamente a aplicação da Lei dos Juizados Especiais (Lei n. 9.099/95) em seu artigo 41, logo, não há razão, ao menos técnica, para manter a denominação "Juizados".

Outra palavra utilizada largamente no texto de lei e que merece nossa crítica é o termo "agressor", utilizado para designar o sujeito submetido à investigação policial e posterior processo judicial pela pratica de violência doméstica e familiar contra a mulher. Segundo o léxico, agressor é "aquele que agride ou ataca" (Houaiss), portanto, o legislador valeu-se de uma palavra com clara conotação negativa para designar aquele que será submetido à investigação e processo estatal e ainda não foi condenado dando assim uma idéia totalmente condenatória um individuo ainda não sequer julgado.O termo (agressor), ofende o princípio da presunção de inocência, consagrado na constituição (art. 5º, LVII). Esse princípio, que também se aplica ao legislador, estabelece que a pessoa submetida ao procedimento investigatório e ao processo criminal deve ter tratamento de inocente até que se prove ao contrário.

Em conformidade com a lei, para ser considerado "agressor" basta que a "ofendida" indique alguém como tal, prescindível qualquer investigação ou análise judicial. Assim, o marido, o companheiro, ou o convivente será considerado, ab initio, "agressor", ou seja, parte-se do pressuposto de que "agrediu, atacou", todavia, após o devido processo legal, poderá ser considerado inocente, "não-agressor", visto que existe o principio da ampla defesa que deverá ser aplicado em todos os casos do nosso ordenamento jurídico, pois todos tem o direito a defende-se.


7. CRITICAS A LEI 11.340/06 CONCERNENTE À COMPETÊNCIA

Segundo o disposto no art. 33 da Lei 11.340/06, enquanto em todas as cidades não forem instalados os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, as varas criminais acumularão as competências cível e criminal. Assim estas, por enquanto, têm o dever de conhecer e julgar as causas decorrentes desse tipo prática de violência doméstica.

Estabeleceu-se, que esses processos tem preferência, no que diz respeito ao seu andamento e julgamento em relação aos demais protocolados na vara criminal. Um tanto polêmica é a questão tratada neste dispositivo.

A crítica que se faz é quanto à sua constitucionalidade. Com efeito, a teor do art. 96, I, a, da Constituição Federal, compete privativamente aos Tribunais, “eleger seus órgãos diretivos e elaborar seus regimentos internos, com observância das normas de processo e das garantias processuais das partes, dispondo sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos.”

Ao determinar a acumulação, por uma vara criminal, de competências cível e criminal, o legislador infraconstitucional invadiu matéria de competência exclusiva dos respectivos tribunais, rompendo com a regra que garante a independência dentre os poderes.

Criando assim um tumulto no campo processual visto que gerou-se um conflito de competência claro e latente no que consiste em julgar o feito.

A alteração de competência, assim como a criação de novas varas (art. 96, I, d, da CF), é matéria, portanto, que não admite ingerência de outro poder (no caso, o Poder Legislativo), pelo que a Lei, nesse tópico, contém vício de inconstitucionalidade.

Embora não tenha passado desapercebido pelo Deputado Antonio Carlos Biscaia que, ao tempo da tramitação do Projeto de Lei que deu origem à Lei 11.340/2006 e na qualidade de membro da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, apresentou voto em separado apontado tal inconstitucionalidade, mas que não foi apreciado.

Houve um encontro de Magistrados dos Juizados Especiais Criminais e de Turmas Recursais do Estado do Rio de Janeiro, concluíram nesse sentido, valendo que se confira o teor do enunciado 86: “É inconstitucional o art. 33 da Lei 11.340/06 por versar matéria de organização judiciária, cuja competência legislativa é estadual (art. 125, parágrafo 1º, da Constituição Federal)”.

Mantida no texto final a inconstitucionalidade e enquanto não declarada como tal, a lei está posta para cumprimento, cabendo, por ora, ao juiz criminal, sua aplicação. Soa, efetivamente, estranho á nossa tradição que um juiz criminal vá determinar, por exemplo, a separação de corpos do casal, proibir a celebração de contrato de locação ou fixar os alimentos provisórios causando assim um conflito de competência claro. . Inconstitucionalidade por inconstitucionalidade, talvez fosse, mais adequado se atribuir a um juiz de família a competência transitória para aplicação da lei, embora também não fique bem aos “olhos” este decretar a prisão preventiva do agressor. Mas, de qualquer forma, o juiz de família é, via de regra, alguém, mas afeito a essa espécie de discussão, com maior tato para promoção de conciliação, secundado por um curador que demonstre as mesmas aptidões.

O tema, no entanto, deve ensejar apenas discussões temporárias, que serão superadas assim que instalados, em todo país, os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher.

O encontro foi formalizado em setembro de 2006, em Búzios. Os enunciados foram publicados no DOE do Rio de Janeiro, em 11.09.2006, e podem ser consultados, ainda, no Informativo n. 37/2006, da Adv/Coad, o que não saiu do papel em muitos estados em nossos Pais.

Prevê-se demora em tais iniciativas, a exemplo do que se verificou com os Juizados Especiais Cíveis e Criminais. De fato, esboçada pela Constituição de 1988, só se efetivaram com a edição da Lei 9.099/95, sendo que, em muitos estados da federação, como São Paulo, apenas recentemente foram instaladas varas específicas para apreciação das causas cíveis de menor complexidade e das infrações penais de menor potencial ofensivo.


8. A DIFERENÇA DE TRATAMENTO ENTRE HOMEM E MULHER

Haverá questionamento a constitucionalidade da lei, vez que, num primeiro momento, parece discriminatória, tratando a mulher como “eterno” sexo frágil, deixando desprotegido o homem, presumidamente imponente.

O caráter de diferenciação, como se sabe, há muito foi afastada pela Constituição Federal que, no seu art. 226, parágrafo 5.º, equipara ambos os sexos em direitos e obrigações, garantindo aos dois sexos, no parágrafo 8.º, proteção no caso de violência doméstica. É o que pareceu, em bem elaborado artigo, por João Paulo de Aguiar Sampaio Souza e Tiago Abud da Fonseca, que ressaltem que:

“não é preciso muito esforço para perceber que a legislação infraconstitucional acabou por tratar de maneira diferenciada a condição de homem e mulher e o status entre filhos que o poder constituinte originário tratou de maneira igual criando, aí sim, a desigualdade na entidade familiar”.[15]

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Para tornar a questão mais clara, citam-se exemplos de absurda injustiça (para com o homem), a saber: Numa agressão mútua o que justifica a mulher ficar amparada pelo presente diploma e o homem não? Sabendo que a violência doméstica não se resume na agressão do marido contra a mulher, qual o motivo para se proteger a filha agredida pelo pai e o filho agredido não? Não bastasse, tipos penais que discriminava o homem foram alvos de recentes mudanças legislativas, corrigindo a odiosa discriminação, como aconteceu com o atentado ao pudor mediante fraude (onde se lia mulher honesta , a Lei 11.106/2005 alterou para alguém, abrangendo o homem) ou no tráfico de pessoas ( antes da Lei 11.106/05, tipificava-se somente o tráfico de mulheres).

Nessa linha é o pensar de Valter Foleto Santin: Como se vê, a pretexto de proteger a mulher, numa pseudopostura ‘politicamente correta’, a nova legislação é visivelmente discriminatória no tratamento de homem e mulher, ao prever sanções a uma das partes do gênero humano, o homem, pessoa do sexo masculino, e proteção especial a outra componente humana, a mulher do sexo feminino, sem reciprocidade, transformando o homem num cidadão de segunda categoria em relação ao sistema de proteção contra a violência doméstica, ao proteger especialmente a mulher, numa aparente formação de casta feminina e pior colocando-o como monstro causador do dano social , como já citado temos todos os tipos de lei protecionista como para o idoso para a criança e nada para o homem .

Todavia, nos crimes de gênero definidos no art. 5º, da Lei 11.340/06, somente a mulher pode ser sujeito passivo e somente o homem pode ser sujeito ativo, desde que entre eles exista uma relação de afetividade, independentemente de qualquer preferência sexual dos sujeitos, enquadrado analogicamente a casal homossexual feminino e não sendo estendido a casal homossexual masculino .

Frisaremos um aspecto curioso da Lei 11.340/06, a contradição endógena entre seus dispositivos iniciais, que, a toda evidência, configuram como sujeito passivo da proteção legal, exclusivamente, a mulher, enquanto o § 9º do art. 129 do Código Penal, recepcionado expressamente, no art. 44 da nova Lei, não faz distinção entre homens e mulheres. Assim, para efeitos deste dispositivo legal importa a violência praticada no ambiente doméstico contra homens e mulheres, adultos e crianças.

Posteriormente, este paradoxo poderá levantar a tese de que, como os objetivos da nova lei são exclusivamente a proteção da mulher, o dispositivo do § 9º, ora em comento, deve ser restrito ao sujeito passivo feminino. Não é, todavia, esta a solução correta, primeiro, porque ela contradiz o texto expresso da lei e, segundo, nos leva a uma interpretação literal do dispositivo, sempre recomendada em termos de tipicidade penal.

A Lei Maria da Penha é espécie da qual a anterior Lei 10.886/04 era gênero, pois enquanto aquela se refere especificamente à violência contra a mulher, instrumentalizando diversos meios para sua dissuasão, esta se refere a outros tipos de violência doméstica cujo combate é também socialmente relevante como a violência contra criança e idosos, e, como tal, subsiste íntegra em face do princípio da proibição de retrocesso social.O que é claro e latente no corpo da lei Maria da Penha onde prioriza a condição de mulher em detrimento de outros grupos de pessoas.

É inconstitucional decisão que não aplica Lei Maria da Penha Por Márcia Novaes Guedes ;A Lei Maria da Penha revelou que a crise que vem minando a concepção patriarcal e milenarmente cristalizada do masculino aportou no Judiciário. A irreversível conscientização da sociedade, porém, vem rompendo o silêncio que por séculos ocultou a discrepância entre um Judiciário hermético e estacionário e o sentimento de justiça latente. Novos episódios, revelados pela imprensa, tornam visível a separação entre uma sociedade cidadã e vigilante e as decisões de juízes apegados ao princípio da igualdade formal.

Ao negar as medidas protetivas, previstas na Lei Maria da Penha, em defesa de 12 mulheres em situação de risco, um juiz afirmou que esta lei "é um conjunto de regras diabólicas, um mostrengo tinhoso" e inconstitucional. Antes, uma decisão de segundo grau já havia salientado que a lei "fere o direito fundamental da igualdade entre homens e mulheres e o princípio da proporcionalidade". Estas decisões revelam o inconformismo pelo fato da lei ter elevado à categoria de violação dos direitos humanos a violência doméstica contra a mulher e o mesmo não ter feito em relação ao homem.

O Constituinte de 1988 exortou o legislador ordinário a adotar providências em defesa das vítimas da violência doméstica. Apesar de signatário da Cedaw e da Convenção de Belém do Pará, o Brasil negligenciava a questão da violência contra a mulher não dispondo de legislação específica. Precisou que o país fosse condenado pela OEA para que o legislador ordinário acordasse da sua cruel indolência e aprovasse, finalmente, a Lei 11.340/2006, que não é o primeiro instituto legal a selecionar e preferir certo segmento social para oferecer proteção, o que efetivamente não soluciona o caso só impregnar nosso ordenamento de mais leias sem eficácia plena

Ao sustentarem a inconstitucionalidade da lei por não abarcar também uma suposta "violência doméstica contra homens", os juízes esqueceram-se de uma regra elementar: em direito, o supérfluo é errôneo. Para além da igualdade formal do "todos são iguais perante a lei", o artigo 3º da nossa Magna Carta reafirma como objetivos fundamentais da República a remoção dos obstáculos econômicos e sociais que, limitando de fato a liberdade e a igualdade dos cidadãos impedem o pleno desenvolvimento da pessoa humana e a efetiva participação de todos e todas na organização política, econômica e social do país. Porque todos e todas devem ter as mesmas possibilidades concretas de exercer o próprio direito, os poderes públicos devem intervir para eliminar os privilégios e principais disparidades, eventualmente criadas pelo sistema econômico e social, através de leis que estabeleçam tratamento diferenciado a favor dos mais débeis, a fim de reequilibrar o jogo e alcançar o bem-estar e a justiça social.

Num certo sentido, portanto, podemos dizer que a Lei Maria da Penha é diabólica, porque desagrega a estrutura de pensamento patriarcal sedimentada ao longo de milênios e coloca a questão feminina como uma questão da humanidade inteira, e, ao mesmo tempo é simbólica, já que desafia e propõe uma nova antropologia cujo primado é a relacional idade dos seres entre si e com o mundo, e um feminismo que, longe de se reduzir à decepcionante superposição de papéis sociais, busca um novo pacto que une os princípios do masculino e do feminino a partir do respeito às qualidades pessoais de cada um na construção de uma humanidade diversa e harmônica.

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Sobre o autor
Anderson Santos

Bacharel em Direito pela Faculdade de Olinda – FOCCA

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Faculdade de Olinda – FOCCA, como requisito necessário para obtenção de grau de Bacharel em Direito, sob a orientação da Profª. Nicely Cursino.

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