A Lei nº 12.984/2014 e o novo crime de discriminação aos portadores do vírus da imunodeficiência humana (HIV) e doentes de Aids

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A tutela das minorias, em especial os portadores do vírus da imunodeficiência humana (HIV) e doentes de AIDS, que teve um grande avanço diante da promulgação da nova Lei nº 12.984.

RESUMO: O tema central do presente artigo é a tutela das minorias, em especial os portadores do vírus da imunodeficiência humana (HIV) e doentes de AIDS, que teve um grande avanço diante da promulgação da nova lei nº 12.984, de 02 de junho de 2014, instituiu a criminalização da discriminação às estas pessoas, em função da sua doença. A lei busca a proteção da dignidade da pessoa humana, garantindo a essa minoria a tutela de seus direitos, punindo com pena de 1(um) a 4 (quatro) anos algumas condutas  tipificadas neste norma contra os dos portadores de HIV e doentes de AIDS.

Palavras-chave: Minorias. Criminalização. Discriminação. HIV. AIDS.


1. INTRODUÇÃO

São minorias, as pessoas integrantes de grupos de riscos, com precárias condições de vida, com proteção constitucional, infraconstitucional e internacional dos seus direitos e sua efetivação estão ligadas diretamente não apenas à defesa de tais grupos, mas também aos direitos individuais e coletivos, uma vez que tutela desses interesses estão integrados ao restante da população.

A sociedade está em constante transformação. E tais avanços só se concretizam graças as diversas e modernas providências de conscientização e apoio da sociedade, bem como, pelas legislações contemporâneas, que têm se mostrado cada vez mais rápida afim identificar e corrigir falhas, aperfeiçoamento de todas as ciências humanas e, mais especificamente, do direito.  A busca de uma melhor proteção às pessoas integrantes das minorias vulneráveis, lhe assegurando melhores condições de vida em harmonia com os princípios básicos indicadores dos direitos humanos, põe em evidencia nestes casos a proteção da dignidade da pessoa humana.

O vírus da HIV (Vírus Imunodeficiência Humana) foi descoberto em 1981, na época os enfermos não resistiam por muito tempo e logo faleciam. Mas com o avanço da medicina, os estudos, tratamentos e medicamentos, hoje a AIDS - Acquired Immunodeficiency syndrome em português: síndrome da imunodeficiência adquirida - SIDA, pode ser considerada hoje uma doença crônica, pois os indivíduos convivem com o vírus por vários anos e com uma qualidade de vida melhor, tornado assim tais pacientes uma espécie minoria, que deve ser respeita e protegida principalmente da discriminação da sociedade.

O reconhecimento do direito constitucional à saúde, dignidade da pessoa humana, e a rede de direitos humanos do Programa Nacional de Saúde, voltada aos portadores de HIV e doentes de Aids e garante a regulamentação e a aplicação de uma legislação que equacione e proponha a solução dos conflitos gerados pela manifestação das doenças e seus reflexos nestes grupos de paciente/cidadãos.

A Legislação brasileira em saúde, mais especificamente ligada às políticas de prevenção de HIV e tratamento aos doentes de AIDS, tem como objetivo maior oferecer extenso material de consulta, comparação e reflexão sobre as diversas leis e suas interpretações à realidade da epidemia, para melhor enfrentar esse desafio à saúde pública e manter os princípios da cidadania, resultado da luta por reconstruir e preservar na democracia, às estas minorias.

Acontece que mesmo com essa grande garantia constitucional e infraconstitucional os portadores do vírus HIV e os doentes de AIDS, sempre foram vítimas de preconceito,  discriminação e segregação, ou seja frequentemente são excluídos de editais de concursos públicos, seleção de empregos, na  sociedade, que e já algum tempo vem sendo objeto de debates na mídia e meios jurídicos, sendo que já há inclusive precedentes e decisões lhes tutelando na área civil, trabalhista e de saúde pública, todo afim de coibir a tais práticas abusivas e vexatórias.

Inclusive o próprio STJ – Superior Tribunal de Justiça[3],  já se posicionou a respeito da necessidade de proteção desta minoria, que ultimamente vem sendo muito injustiçadas, tanto que nos julgamentos, decisões têm contribuído para firmar jurisprudência sólida sobre o tema, inclusive contribuindo para mudanças legislativas

Assim nova Lei 12.984, de 02 de junho de 2014, veio de encontro com tudo, isso ou seja trazer mais um forma de coibir tais práticas e puni-las criminalmente, afim de proteger esse grupo de minoria tão sofrido ao logo destas décadas.


2. A DISCRIMINAÇÃO E LEGISLAÇAO

A discriminação sempre esteve presente na história, desde o Código de Hamurabi, havia a previsão de punição e castigos proporcionais ao mal causado, assim como se faziam distinções nas penas de acordo com a classe social da vítima. Ou seja, ferir ou matar um escravo era menos grave do que alguém do clero.

Já com a vinda do Código de Manu, já não se levava em conta a classe social da vítima, mas apenas a proteção dos valores dos brâmanes, cujo poder se encontrava no ápice dos demais poderes da sociedade hindu.

Na Lei das XII Tábuas, diferentemente dos demais códigos, estabeleceu, ainda Que provisoriamente uma igualdade social inédita, excluindo do Direito Penal toda e qualquer distinção de classes sociais.

No entender de Norberto Bobbio[4], por discriminação entende-se uma diferenciação injusta ou ilegítima porque vai contra o princípio fundamental de justiça, segundo o qual devem ser tratados de modo igual aqueles que são iguais.

Há hoje grande legislação proibitiva de qualquer forma de discriminação e desrespeito aos princípios de igualdade, justiça, liberdade e dignidade do homem, tanto a nível constitucional, como infra e supra-constitucional, que de forma genérica estão a agasalhar os portadores do vírus HIV e doentes de AIDS.

A Declaração Universal dos Direitos do Homem reconhece solenemente a dignidade da pessoa humana, como base da liberdade, da justiça e da paz.

A Constituição Federal de 1988, em seu Preâmbulo, dispõe que o Estado Democrático instituído destina-se "a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça, como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos...".

Já nos seus incisos III e IV do artigo 1º[5], trata como fundamento do estado democrático de direito a dignidade da pessoa humana, bem como objetivos fundamentais promover o bem sem preconceitos ou qualquer outras formas de discriminação.

Assim no Brasil, a legislação brasileira, em especial a Carta Magna, proíbe diversas práticas discriminatórias, baseadas em diferentes critérios e a principal das vedações previstas tanto em normas constitucionais como infraconstitucionais é a garantia do princípio da igualdade, previsto no artigo 5º, caput, da Constituição Federal, mas infelizmente esse aparato legislativo, não é suficiente, daí a necessidade de criação de novos tipos penais como a Lei Lei 12.984, ou a majoração das penas já existentes.


3. O CRIME DE DISCRIMINAÇÃO DOS PORTADORES DO VIRUS DA IMONODEFICIENCIA HUMANA – HIV E DOENTES DE AIDS

A aprovação no dia 02 de junho de 2014 na nova Lei 12.984, é resultado do Projeto de Lei  do Senado nº 51/2003, apresentado pela Ex-senadora Serys Slhessarenko, no dia 07/03/2003, acabou passando por Audiência Pública da Comissão de Direitos Humanos e  Legislação Participativa do Congresso Nacional, presidida pelo senador Paulo Pain, no dia 13/05/2013, que contou neste dia com o grande apoio da sociedade e do Grupo de Incentivo à Vida, Rede Nacional de Pessoas que Vivem com HIV/Aids, Departamento DST/Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde, Frente Parlamentar de Enfrentamento às Doenças Sexualmente Transmissíveis e Grupo pela Vida Niteroi, que são entidades que buscam a proteção deste grupo de minoria.

A Lei 12.984, define o crime de discriminação dos portadores do vírus da imunodeficiência humana – HIV e doentes de AIDS,  assim estabelece  em seu artigo 1º, vejamos :

“Art. 1º  Constitui crime punível com reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa, as seguintes condutas discriminatórias contra o portador do HIV e o doente de aids, em razão da sua condição de portador ou de doente:

I - recusar, procrastinar, cancelar ou segregar a inscrição ou impedir que permaneça como aluno em creche ou estabelecimento de ensino de qualquer curso ou grau, público ou privado;

II - negar emprego ou trabalho;

III - exonerar ou demitir de seu cargo ou emprego;

IV - segregar no ambiente de trabalho ou escolar;

V - divulgar a condição do portador do HIV ou de doente de aids, com intuito de ofender-lhe a dignidade;

VI - recusar ou retardar atendimento de saúde.”

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A nova lei dispõe em seu bojo condutas dolosas, distribuídas em 6 (seis) incisos,  identificando como fato típico e punível qualquer uma das condutas preconceituosas e discriminatórias contra a vítima portador  de HIV ou de doente da AIDS.

Percebemos que as condutas típicas previstas nos incisos I, II e III, são uma forma de coibir obstáculos ou empecilhos, presentes até hoje no dia a dia dos portadores do Virus de HIV e doentes de Aids, que são a dificuldade de ingressar ou permanecer em estabelecimentos educacionais de qualquer espécie ou de trabalho, não importando se públicos ou privados.

Já no inciso IV, podemos identificar uma forma de coibir a segregação, ou marginalização dos portadores dos portadores do Virus de HIV e doentes de Aids no local de trabalho ou de estudo, hipótese em que a vítima é apartada do convívio dos demais colegas, muitas vezes sob o manto da falsa justificativa de que à ela (pessoa portadora do vírus ou doente) se está concedendo tratamento especial.

No inciso seguinte V, pune a conduta típica daquele que tem como objetivo ofender a vítima (animus ofendendi), usando a divulgação da condição do portador do HIV ou de doente de aids da vítima.

Por fim, a lei não poderia deixar de tipificar em su inciso VI como crime a conduta dos profissionais da saúde que recusam ou retardam, injustificadamente (elemento implícito no tipo), atendimento ao paciente portador do HIV ou de doente de AIDS.

Com relação a pena pode variar de 1 a 4 anos de reclusão. Assim, trata-se, portanto, de infração penal de médio potencial ofensivo, admitindo assim suspensão condicional do processo (art. 89, da Lei 9.099/95).


3 - CONCLUSÃO

A discriminação e segregação dos portadores do vírus da imunodeficiência humana – HIV e doentes de AIDS, é hoje uma infeliz realidade na nossa sociedade, e o sofrimento e pouco caso que algumas pessoas fazem não pode ficar impune, assim a tutela dos direitos deste grupo de minoria é tão importante.

Encontra-se relevância essa na nova disciplina legal, pois ao criminalizar essas condutas, a nova lei, a busca a proteção jurídica aos portadores do HIV e do doente de AIDS, já fragilizado pela gravidade de seu quadro de saúde. É indiscutível avanço e a importância da nova lei na busca de concretização dos objetivos constitucionais de construção de uma sociedade livre, justa e solidária, com a promoção do bem de todos, sem preconceitos e quaisquer formas de discriminação.

Assim diante dos pontos traçados durante o presente trabalho cientifico, concluí-se que a  Lei 12.984,  trouxe importante contribuição a tutela dos direitos dos portadores do vírus do HIV e doença da AIDS.


REFERÊNCIAS

BRASIL. Ministério da Saúde. O que é HIV. Disponível em:<http://www.aids.gov.br/pagina/o-que-e-hiv>. Acesso em: 09 out. 2014.

BRASIL. Presidência da República. Lei n. 12.984/2014. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>Acesso em: 09 out. 2014

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>Acesso em: 09 out. 2014

BOBBIO, Norberto. Dicionário de política. 10. ed. Brasília: UnB, 1997

______. Elogio da serenidade e outros escritos morais. São Paulo: Unesp, 2002.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. - AREsp 104.069, REsp 605.671, REsp 650.400, REsp 244.847.  Disponível em: <http://www.stj.jus.br>Acesso em: 09 out. 2014.


Notas

[3] ARESP 104.069, RESP 605.671, RESP 650.400, RESP 244.847

[4] BOBBIO, Elogio da serenidade e outros escritos morais. São Paulo: Unesp, 2002, p.108-109. Nesse sentido, o renomado filósofo explicou que: “Num primeiro momento, a discriminação se funda num mero juízo de fato, isto é, na constatação da diversidade entre homem e homem, entre grupo e grupo. Num juízo de fato deste gênero, não há nada reprovável: os homens são de fato diferentes entre si. Da constatação de que os homens são desiguais, ainda não decorre um juízo discriminante. O juízo discriminante necessita de um juízo ulterior, desta vez não mais de fato, mas de valor: ou seja, necessita que, dos dois grupos diversos, um seja considerado bom e o outro mau, ou que um seja considerado civilizado e o outro bárbaro, um superior (em dotes intelectuais, em virtudes morais etc.) e o outro inferior... Um juízo deste tipo introduz um critério de distinção não mais factual, mas valorativo”.

[5] Artigo 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

(...)

III - a dignidade da pessoa humana; 

E ainda, no inciso IV do artigo 3º e no inciso II do artigo 4º:

Artigo 3º - Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

(...)

IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. 

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Sobre os autores
Thiago Daniel Ribeiro Tavares

Mestre em Direito Coletivos e Cidadania pela Universidade de Ribeirão Preto – UNAERP, Especialista em Direito Civil e Processo Civil pela Universidade do Norte Paulista – UNORP, Licenciado em Direito pela Universidade Nove de Julho – Uninove. Advogado e Professor.

Bruno Freire e Silva

Graduado em Direito na Universidade Federal da Bahia, Especialização em Direito Processual do Trabalho na Fundação Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia, Mestre em Direito Processual Civil na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Doutor em Direito Processual na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Professor Adjunto de Teoria Geral do Processo na Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ e Professor titular no programa de mestrado da Universidade de Ribeirão Preto – UNAERP, Advogado.

CAROLINA DE BRITO RAMALHO LUZ TAVARES

Advogada, Pós-Graduação Latu Sensu (Especialização) em Direito Médico e Saúde pelo Centro Universitários Barão de Maua - Ribeirão Preto-SP/BR; Bacharel em Direito pela Universidade de Ribeirão Preto - UNAERP; Intercambista em 2011 de Lingua Espanhola / Don Quijote - Salamanca-Espanha, e Lingua Inglesa - ELS Languages Centers - Las Vegas/EUA; devidamente inscrita na OAB/SP nº 303.323, militante nas Áreas Cível, Família, Trabalhista e Direito Médico e Saúde na comarca de Bebedouro -SP e região.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Artigo elaborado e apresentado no II Congresso de Direito Coletivo e Cidadania da Universidade de Ribeirão Preto - Unaerp, para posterior publicação nos anais.

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