Entre as penas impostas pela Lei nº 8.429/92, no campo da improbidade administrativa, está a perda da função pública.
Pergunta-se: Qual é a abrangência da sanção da perda da função pública? A sanção da perda função pública restringe-se ao cargo ocupado por ocasião do ato ímprobo, ou atinge qualquer vínculo que o acusado tenha com a Administração Pública por ocasião do trânsito em julgado da decisão judicial?
No julgamento do Recurso Especial 924.439 – RJ, Relatora Ministra Eliana Calmon, o tema foi enfrentado.
Inicialmente foi discutido o sentido da “função pública” mencionado no artigo 12, nos incisos I, II e III, da Lei de Improbidade Administrativa. Será toda atividade exercida por pessoa física, ainda que transitoriamente e sem remuneração, investida na categoria de agente pública por eleição, nomeação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função, na Administração Pública direta, indireta ou fundacional dos entes da Federação e dos poderes estatais, em empresas incorporadas ao patrimônio público ou em entidades para cuja criação, ou custeio o Erário haja concorrido ou concorra com mais de 50% do patrimônio ou da receita anual.
Naquele julgamento, bem disse a Ministra Eliana Calmon que a intenção do legislador ao prever a sanção da perda da função pública é de extirpar da Administração Pública aquele que exibiu inidoneidade(ou inabilitação) moral e desvio ético para o exercício da função pública.
Não será razoável entender que a referida sanção, nas ações civis de improbidade administrativa, incide apenas sobre a função exercida pelo agente público à época em que praticou o ato de improbidade administrativa reconhecido na sentença judicial, mas abrange qualquer função pública que ele esteja exercendo ao tempo da condenação irrecorrível.
Nessa linha de entendimento está o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, no julgamento da Apelação Civil 5001778-46.2012.404.7211/SC, Relator Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, quando se disse que a perda função pública se estende a todos os cargos que o condenado ocupa na administração, e não se aplica somente àquele em que se deram os atos de improbidade.
Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.069.603, entendeu que a expressão “perda da função pública”, prevista como sanção por ato de improbidade, implica em perda de direito de ocupar cargo púbico por meio do qual o agente a desempenhava.
Disse o Ministro Humberto Martins, naquele julgamento, que a sanção de perda da função pública visa a afetar o vínculo jurídico que o agente mantém com a administração pública, “seja qual for a natureza”. Isso porque a intenção da lei é afastar todo e qualquer agente ímprobo da administração.
A perda da função pública ou ainda do cargo público ou mandato eletivo pode vir como efeito de condenação criminal, a teor do artigo 92 do Código Penal.
Há os defensores de que tal perda do cargo público, função pública ou mandato eletivo é tão somente efeito administrativo da decisão judicial, de modo que a motivação, para esse efeito da pena, pode decorrer do próprio conjunto da decisão judicial(TRF5ª Região, Apelação Criminal 4230/PE).
Noutro sentido, está o Superior Tribunal de Justiça(REsp 810.931/RS, Relator Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, em 6 de agosto de 2007), quando deixou claro que os efeitos específicos da condenação não são automáticos, de sorte que, ainda que presentes, em princípio, os requisitos do artigo 92, inciso I, do Código Penal, deve a sentença declarar, motivadamente, os fundamentos da perda do cargo público. Assim ausente a fundamentação, a teor do artigo 93, IX, da Constituição Federal, é nula, neste ponto, o dispositivo de sentença condenatória penal. Entende-se que a perda da função pública como efeito da condenação penal deve ser apontada mediante circunstância particular que recomende a adoção de tal medida.
Mas, pontue-se, no campo penal, a lição de Cezar Roberto Bitencourt(Código Penal comentado, 2ª edição, 2004, pág. 306) de que “a perda deve restringir-se somente àquele cargo, função ou atividade no exercício do qual praticou o abuso, porque a interdição pressupõe que a ação criminosa tenha sido realizada com abuso de poder ou violação de dever que lhe é inerente”.
Já se entendeu que a perda de função pública, por violação de dever inerente a ela, necessita ser por crime cometido no exercício dessa função, valendo-se o acusado do cargo para a prática do crime. Vale dizer, deve ser condenado por crime funcional(RT 572/297).