Acidente de trabalho e a responsabilidade civil do empregador

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12/12/2014 às 11:42
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9. Excludentes de responsabilidade do empregador

Pode-se dizer que este capítulo é um dos, senão o mais importante desta pesquisa, pois nele serão apresentadas as únicas hipóteses legais e doutrinárias onde o empregador pode ser eximido da responsabilidade e do dever de pagar as diversas previsões indenitárias apontadas anteriormente neste trabalho.

Como visto no decorrer de toda essa monografia, o acontecimento de um acidente de trabalho, mesmo que ausente o dolo por parte do empregador, pode trazer enormes dissabores financeiros para sua empresa, haja vista ter que arcar com indenizações que, quando fixadas pelo juízo, podem, inclusive, levar à falência, dependendo dos critérios adotados pelo julgador na hora de pautar as indenizações que entende devidas ao obreiro acidentado, assim como a sua forma de pagamento.

Todavia, não obstante essas considerações, o que realmente procura o empregador é se livrar da responsabilidade acidentária, deixando somente a cargo da responsabilidade estatal pelo acidente de trabalho, no entanto, as únicas hipóteses de se salvaguardar dessas indenizações, se encontram taxativamente previstas na lei, quais sejam, fato exclusivo da vítima, fato de terceiro, caso fortuito e força maior e prescrição e decadência, vejamos uma a uma essas hipóteses.

Inicialmente, cumpre discorrer que a principal função dessas excludentes, com exceção da prescrição e da decadência, é desconstituir o nexo de causalidade, que consiste em um dos requisitos que ensejam a responsabilidade. O nexo causal nada mais é que o suporte, o liame que existe entre o dano e a conduta do agente ofensor, que não necessariamente deva ser o empregador.

9.1. Prescrição e decadência

Começa-se pela prescrição e decadência, pois estas são as hipóteses mais fáceis e simples de serem caracterizadas e visualizadas, dispensando a necessidade de tecer muitos comentários, já que não se trata de discutir o mérito do acidente em si, que se mostra desnecessário, haja vista o decurso do tempo para o empregado pleitear qualquer indenização em face de seu empregador.

Quando o objeto da ação visar a reparação civil, fundada em direito comum, deverá ser utilizada a regra geral contida no Código Civil, disposta no artigo 206, parágrafo 3º, inciso V, que determina a prescrição da pretensão da reparação civil no prazo de 3 (três) anos.

Ademais, quanto ao termo inicial para a contagem deste prazo, houve por bem o E. Superior Tribunal de Justiça editar súmula a fim de nortear e consolidar o entendimento jurisprudencial que gerava grande controvérsia, fixando da seguinte forma: “O termo inicial do prazo prescricional, na ação de indenização, é a data em que o segurado teve ciência inequívoca da incapacidade laboral.”

Sendo assim, não necessariamente deverá ser considerada a data de ocorrência do acidente para mover a ação indenizatória, mas sim a ciência de sua incapacidade laboral.

Defendo o entendimento de que o prazo prescricional disposto no inciso XXIX do artigo 7º da Constituição Federal não deve ser utilizado quando a reclamatória tiver como objeto somente a responsabilidade civil aqui discutida, vez que a prescrição bienal e a quinquenal dizem respeito somente aos créditos resultantes da relação de trabalho, assim, não há que se falar que um acidente possa gerar crédito para o obreiro.

9.2. Fato exclusivo da vítima

Quanto ao fato exclusivo da vítima, nada mais elucidativo do que trazer o entendimento fixado por Rui Stoco:

“Embora a lei civil codificada não faça qualquer menção à culpa exclusiva da vítima como causa excludente da responsabilidade civil, a doutrina e o trabalho pretoriano construíram a hipótese, pois como se dizia no Direito Romano: quo quis ex culpa sua damnum sentit, non intelligitur damnum sentire.

É certo que o art. 945 do CC estabelece que, "se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano", questão sobre a qual discorremos no item 9.05 do Capitulo 1.

Mas não se pode confundir concorrência de culpas com culpa exclusiva.

Como ensinava Aguiar Dias, a conduta da vítima como fato gerador do dano elimina a causalidade.

Realmente, se a vítima contribui com ato seu na construção dos elementos do dano, o direito não se pode conservar alheio a essa circunstância.

Da idéia da culpa exclusiva da vítima, que quebra um dos elos que conduzem à responsabilidade do agente (o nexo causal), chega-se à concorrência de culpa, que se configura quando a essa vítima, sem ter sido a única causadora do dano, concorreu para o resultado, afirmando-se que a culpa da vítima "exclui ou atenua a responsabilidade, conforme seja exclusiva ou concorrente" (Aguiar Dias. Da Responsabilidade Civil. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, v. 1, n. 221).

Assim emerge importante para apurar-se a responsabilidade considerar-se a parte com que a vitima contribuiu para o evento, de modo que na liquidação do dano calcular-se-á proporcionalmente a participação de cada um, reduzindo, em consequência, o valor da indenização” (2007, p. 185).

De primordial dessas elucidações, pode-se absorver que o fato exclusivo da vítima não se encontra disciplinado em nenhuma norma, todavia, a doutrina e a jurisprudência a aplicam quando incorrida.

Igualmente, de suma importância o disposto no artigo 945 do Código Civil, que trata da gradação do percentual da indenização e da responsabilidade quando a vítima do dano houver concorrido para a consecução do acidente, ou seja, a gravidade da culpa deve ser apurada para uma escorreita taxação da responsabilidade do empregador, o que não será compactuado com o ideal da culpa exclusiva da vítima, haja vista que culpa exclusiva não ser responsabilidade concorrente.

9.3. Fato de terceiro

Por fato de terceiro, entenda-se, é qualquer pessoa além da vítima e do responsável, que não tenha relação alguma com estes, mas que o ato executado por ele é a causa exclusiva do evento gerador do ilícito, o que afasta a responsabilidade do autor aparente (empregador), acabando por desvincular o nexo de causalidade com a vítima.

Defendo a opinião de que esta isenção de responsabilidade não pode ser aplicada quando houver relação de trabalho.

Na hipótese de ocorrer essa situação, o empregador se mostrará como principal responsável, devendo para tanto, indenizar a vítima, que é seu empregado e estava a seu serviço quando da ocorrência do acidente e, procurar a defesa de seus direitos perante o agente causador do dano por meio de uma ação de regresso, consoante lhe assegura o disposto no artigo 930 do Código Civil[4].

9.4. Caso fortuito e força maior

Por fim, as últimas hipóteses previstas pelo Código Civil, doutrina e jurisprudência para descaracterizar o nexo causal e assim não responsabilizar o empregador pelo acidente sofrido por seu empregado, é o caso fortuito e a força maior.

Tal previsão se encontra estabelecida no artigo 393 do Código Civil que assim dispõe:

“Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.

Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir.”

Como pode-se ver na simples leitura da transcrição acima, o próprio Código Civil não procurou diferenciar no que consiste cada uma dessas hipóteses, apenas esclareceu que são fatos onde não se era possível evitar ou impedir o acontecimento do ilícito. Tal tarefa coube à doutrina.

Para tanto, uma vez mais far-se-á uso das brilhantes elucidações trazidas por Sergio Cavalieri Filho:

“Muito já se discutiu sobre a diferença entre o caso fortuito e a força maior, mas até hoje não se chegou a um entendimento uniforme. O que é indiscutível é que tanto um como outro estão fora dos limites da culpa. Fala-se em caso fortuito ou de força maior quando se trata de acontecimento que escapa a toda diligência, inteiramente estranho à vontade do devedor da obrigação.

O Código Civil, no parágrafo único do citado art. 393, praticamente os considera sinônimos, na medida em que caracteriza o caso fortuito ou de força maior como sendo o fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar, ou impedir. Entendemos, todavia, que diferença existe, e é a seguinte: estaremos em face do caso fortuito quando se tratar de evento imprevisível e, por isso, inevitável; se o evento for inevitável, ainda que previsível, por se tratar de fato superior às forças do agente, como normalmente são os fatos da Natureza, como as tempestades, enchentes etc., estaremos em face da força maior, como o próprio nome o diz. É o act of God, no dizer dos ingleses, em relação ao qual o agente nada pode fazer para evitá-lo, ainda que previsível.

A imprevisibilidade, portanto, é o elemento indispensável para a caracterização do caso fortuito, enquanto a inevitabilidade o é da força maior. Entende-se por imprevisibilidade, conforme já assinalado (item 8.8), a imprevisibilidade específica, relativa a um fato concreto, e não a genérica ou abstrata de que poderão ocorrer assaltos, acidentes, atropelamentos etc., porque se assim não for tudo passará a ser previsível. A inevitabilidade, por sua vez, deve ser considerada dentro de certa relatividade, tendo-se o acontecimento como inevitável em função do que seria razoável exigir-se. Assim, por exemplo, tratando-se de roubo de cofres mantidos por um banco, é de presumir-se sejam tomadas especiais providências visando à segurança, pois a garanti-la se destinam seus serviços. O mesmo não sucede se o assalto foi praticado em um simples estacionamento (RSTJ 132/313, Min. Eduardo Ribeiro). É preciso, destarte, apreciar caso por caso as condições em que o evento ocorreu, verificando se nessas condições o fato era imprevisível ou inevitável em função do que seria razoável exigir-se” (2009, p. 65 e 66).

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Para encerrar os esclarecimentos destinados a este capítulo, mostra-se de suma importância trazer o entendimento exposto por Rui Stoco, o qual também se utilizou da notável visão de Humberto Theodoro Junior quanto ao ônus da prova do empregador nos casos de acidente de trabalho, in verbis:

“O ônus da prova segue a regra geral, cabendo a quem alega.

Como lembrou Humberto Theodoro Júnior, "essa responsabilidade concorrente, como é intuitivo, não pode ser objetiva como a da infortunística, nem pode fundar-se em mera presunção de culpa, derivada do caráter perigoso da atividade desenvolvida ou por qualquer mecanismo de apoio da responsabilidade indenizatória na teoria do risco" (Acidente do Trabalho... cit., p. 124).

Esse entendimento decorre das regras atualmente vigentes e do sistema estabelecido nas leis de regência.

Mostra-se inaceitável imputar-se ao empregador o ônus de provar, por exemplo, a ocorrência de caso fortuito, força maior ou culpa exclusiva da vítima e, ao mesmo tempo, presumir culpa daquele tão só porque o acidente ocorreu durante o horário de trabalho ou in itinere, ou, ainda, porque houve a quebra de uma ferramenta, a explosão de uma caldeira, circunstâncias nas quais não se apurou culpa alguma do empregador.

Até que haja alteração na Carta Magna (que se faz necessária) para ampliar o espectro de proteção ao trabalhador, alterando o sistema de custeio mas convertendo a responsabilidade tanto do Estado como do empregador de subjetiva em objetiva, mostra-se irrespondível o argumento trazido pelo notável e sempre lembrado Humberto Theodoro Júnior, in verbis: "Essas presunções de culpa, aceitas pela teoria do risco (fato da coisa, ou dever de transportar incólume o passageiro), vigoram nas relações comuns do dano da coisa perigosa com terceiros, ou do transportador com o usuário do seu serviço. Não podem, definitivamente, ser transferidas para o campo do acidente do trabalho, porque representariam sujeitar o empregador duas vezes a responder pelo risco de sua atividade: a primeira, ao custear o seguro previdenciário; e a segunda, ao ser condenado a uma indenização, sem culpa efetivamente comprovada e apenas presumida" (Acidente do Trabalho... cit., p. 26")” (2007, p. 633 e 634).

Destarte, faz-se uso dessas mesmas palavras a fim de concluir esse capítulo, já que o empregador sabidamente é responsável pelo acidente de trabalho, todavia quando age com culpa ou dolo para a sua consecução, assim, imputar ao empregador a produção de todas essas provas é um encargo muito grande, quando o ônus probatório recai à regra geral, ou seja, àquele que está pleiteando seus supostos direitos.

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Sobre o autor
Anderson Fortti Pereira

Advogado pós graduado em Direito Civil, Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Departamento de Pós-Graduação da Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie como requisito parcial para obtenção do título de Especialista em Direito Civil.

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