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Recuperação judicial com base em plano especial para as microempresas e empresas de pequeno porte:

alterações promovidas pela Lei Complementar 147/2014

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07/07/2015 às 15:56
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3. APLICAÇÃO PRÁTICA DA RECUPERAÇÃO ESPECIAL

Apesar de estabelecer um regime diferenciado, com requisitos direcionados apenas às microempresas e empresas de pequeno porte, a recuperação judicial baseada em plano especial é pouco utilizada.

De acordo com o jornal Valor Econômico[13], em pesquisa realizada pelo Sebrae, demonstrou que dos seiscentos e noventa e cinco pedidos de recuperação feitos na Justiça de junho de 2005 até março de 2011, apenas cerca de vinte e três por cento partiram de micro e pequenas empresas, embora as mesmas representem noventa e nove por cento do total de empresas brasileiras e tenham um índice de mortalidade de vinte e dois por cento após o primeiro ano de vida.

De acordo com estudo realizado pela Fundação Getúlio Vargas[14], a pedido do Ministério da Justiça, o efeito prático da recuperação judicial com apresentação de plano especial é praticamente nulo.

Antes da lei complementar 147/2014, a lei 11.101/2005 ao invés de oferecer uma sistemática que proporcionasse a negociação de todos os débitos permitidos na recuperação judicial ordinária, possibilitava a inserção apenas dos créditos quirografários  ao plano especial, o que quase sempre não se mostrava eficaz para retirar a empresa da crise.

Hoje, com a possibilidade de se incluir outros créditos que não somente os quirografários no plano especial, bem como a possibilidade de se dilatar o prazo para o parcelamento fiscal em 20% com relação aos prazos concedidos para os demais tipos de empresa, é provável que o instituto da recuperação judicial com base em plano especial passe a ser mais utilizado, pois trará mais vantagens que quando das regras anteriores.

Porém, apesar do avanço, ainda não se trata de um regramento que atende totalmente à determinação constitucional de tratamento favorecido às microempresas e empresas de pequeno porte, pois à semelhança da antiga concordata preventiva, a lei fixou o modo como se dará a recuperação, vinculando a forma do plano de recuperação apenas ao parcelamento e a dilação do pagamento da dívida, enquanto que na recuperação judicial ordinária é possível escolher o melhor modo de se recuperar a empresa.

A doutrina critica essa limitação da forma de recuperação da empresa que opta pelo plano especial, pois muitas vezes o parcelamento não é a forma mais eficiente para retirar a empresa da crise.

Para André Luiz Santa Cruz Ramos[15], “o plano especial disciplinado pela LRE não atendeu às expectativas, uma vez que se resume, basicamente, a um curto parcelamento de seus débitos quirografários”.

Para o Senador Ramez Tebet[16], que participou da elaboração da atual lei de falências, o plano de recuperação especial foi inspirado nos moldes da concordata. Para ele, a recuperação especial “precisa estar sujeita a limitações e requisitos mais rigorosos, a fim de evitar o abuso por parte dos devedores. Por isso é que se prevê forma rígida e prazo de oito anos entre uma concessão e a seguinte”.

Tal argumentação vai totalmente de encontro ao que determina a Constituição Federal quanto ao tratamento diferenciado e mais benéfico às microempresas e empresas de pequeno porte.

A recuperação baseada em plano especial deveria estar pautada em requisitos e limitações mais benéficas, proporcionando, assim, maior acesso pelas microempresas e empresas de pequeno porte, contudo, as regras estabelecidas para a recuperação judicial especial tiveram o efeito de dificultar o acesso do micro e pequeno empresário à recuperação judicial, ou seja, o que se buscou com esses requisitos está completamente díspare com relação à determinação constitucional de tratamento favorecido às micro e pequenas empresas.

No parecer do Senador Ramez Tebet, relator da lei 11.101/05, ele esclarece:

Saliente-se, ainda, que a inclusão de créditos não quirografários e a maior flexibilidade nos termos do plano especial – ao contrário do que pode parecer em um exame desatento e ingênuo do assunto – traria prejuízo, e não benefício, às micro e pequenas empresas, pois o risco envolvido em qualquer negócio realizado com elas seria sobremaneira agravado na avaliação do mercado. Dessa forma, os pequenos teriam o custo do seu crédito aumentado significativamente ou simplesmente perderiam acesso ao financiamento de sua atividade.[17]

Diante disso, fica clara que a intenção de se estabelecer condições mais restritas e maior rigor para o acesso à recuperação específica para micro e pequenas empresas a pretexto de que se o acesso à recuperação judicial fosse facilitado, haveria dificuldades por parte das microempresas e empresas de pequeno porte para a realização de negócios, o que, mais uma vez, vai totalmente de encontro ao texto constitucional.

O que se conseguiu, na realidade, foi dificultar o acesso das pequenas empresas à recuperação judicial ordinária, devido aos elevados custos, e também o desestímulo à recuperação judicial baseada em plano especial, levando-se em conta a quantidade de restrições à elaboração do plano.

O Legislador acabou corrigindo algumas dessas distorções por meio da Lei complementar 147/2014, entretanto, manteve a sistemática de única forma de recuperação para quem opta pelo plano especial: o parcelamento do débito.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

 Levando-se em consideração todo o exposto, partindo-se de uma interpretação teleológica da Constituição Federal, passando pela comparação entre os dois regimes de recuperação judicial, bem como com o antigo regime da concordata preventiva, pode-se concluir que, apesar de a lei de falências ter se preocupado em estabelecer um regime de recuperação judicial próprio para as microempresas e empresas de pequeno porte, acabou por não atender ao preceito constitucional de tratamento diferenciado e favorecido a fim de proporcionar melhores condições de manutenção de tais empresas.

Sinal dessa dificuldade foi o resultado da pesquisa realizada pelo SEBRAE que aponta a quase inexistência de recuperações judiciais de microempresas e empresas de pequeno porte.

  Logo, diante da dificuldade de preenchimento dos requisitos necessários para a concessão da recuperação judicial ordinária, bem como seus elevados custos, e das demasiadas restrições ao plano especial de recuperação, o qual não abrange créditos que muitas vezes representa a maior parte da dívida da empresa, bem como estipula como forma de recuperação somente o parcelamento da dívida com juros fixos, a maioria das microempresas e empresas de pequeno porte ao entrar em dificuldades não dispõem de um meio de recuperação eficaz e menos custoso e acabam optanto pelo fechamento ou sofrendo falência.

Um verdadeiro tratamento diferenciado e benéfico à microempresa e empresa de pequeno porte, de forma a atender aos preceitos constitucionais, deveria proporcionar os mesmos meios de recuperação previstos para quem opta pelo procedimento comum, entretanto, flexibilizando algumas etapas do procedimento, de forma a diminuir os custos do pedido de recuperação, como ocorre com a dispensa da instalação da assembleia de credores, a qual já foi prevista pela lei atual.

As alterações promovidas pela lei complementar 147/2014 foram um avanço, pois corrigiu algumas das distorções observadas na redação original da lei 11.101/2005, a qual ao invés de possibilitar um tratamento mais favorecido às microempresas e empresas de pequeno porte para que pudessem realmente se recuperar, acabava por dificultar o acesso à recuperação judicial.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Do plano de recuperação judicial para microempresas e empresas de pequeno porte. In: BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Lei de recuperação de empresas e falência. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 167-172. 

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TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial: falência e recuperação de empresas. V.3. 3.ed. São Paulo: Atlas, 2014.


Notas

[1] SEBRAE (Brasil). Micro e pequenas empresas geram 27% do PIB do Brasil. Disponível em: <http://www.agenciasebrae.com.br/sites/asn/uf/NA/Micro-e-pequenas-empresas-geram-27%25-do-PIB-do-Brasil>. Acesso em: 07 dez. 2014. 

[2] FIGUEIREDO, Leonardo Vizeu. Lições de Direito Econômico. 7.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014. p.103. 

[3] RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Direito Empresarial Esquematizado. 2.ed. São paulo: Método, 2012, p.804-805.

[4] BRASIL. Constituição Federal de 1988. Promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em 30 de março de 2015.

[5] BRASIL. Lei Complementar 123, de 14 de dezembro de 2006. Institui o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte; altera dispositivos das Leis no 8.212 e 8.213, ambas de 24 de julho de 1991, da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943, da Lei no 10.189, de 14 de fevereiro de 2001, da Lei Complementar no 63, de 11 de janeiro de 1990; e revoga as Leis no 9.317, de 5 de dezembro de 1996, e 9.841, de 5 de outubro de 1999. Disponível em: <www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp123.htm>. Acesso em 30 de março 2015.

[6] NEGRÃO, Ricardo. Manual de direito comercial e de empresa. V.3. 5.ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p.231.

[7] TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial: falência e recuperação de empresas. V.3. 3.ed. São Paulo: Atlas, 2014, p.254.

[8] MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: recuperação de empresas. 5.ed. São Paulo: Atlas, 2012, p.170.

[9] TOMAZETTE, 2014, p.256.

[10] BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Lei de recuperação de empresas e falências comentada: Lei 11.101/05. 6.ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009, p.172.

[11] BEZERRA FILHO, 2009, p.170-171.

[12] BEZERRA FILHO, 2009, p. 168.

[13] PEDIDOS de recuperação vêm de empresas de maior porte. Valor Econômico, [S.l.], 14 abr. 2008. Legislação, p.E1. Disponível em: <http://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/485555/noticia.htm?sequence=1>. Acesso em: 07 dez. 2014. 

[14] MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. Secretaria de Assuntos Legislativos. Análise da nova lei de falências. Brasília: [s.n.], 2010.p.75-76. Disponível em:  <https://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=1&cad=rja&uact=8&ved=0CB8QFjAA&url=http%3A%2F%2Fportal.mj.gov.br%2Fservices%2FDocumentManagement%2FFileDownload.EZTSvc.asp%3FDocumentID%3D%257B68E6736C-4DF7-498B-ABC3-DBCFE29195F6%257D%26ServiceInstUID%3D%257B0831095E-D6E4-49AB-B405-C0708AAE5DB1%257D&ei=eFCHVOXRJoWbNpyihKgO&usg=AFQjCNEAYy7B-37ipn9s_C9tlv4JjdSBYA&bvm=bv.81449611,d.eXY>. Acesso em: 09 dez. 2014.

[15] RAMOS, 2012, p.735.

[16] TEBET, Ramez. Parecer 534: Lei 11.101/2005. Disponível em:  <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=580933>. Acesso em: 01 fev. 2015, p. 35.

[17]TEBET, Ramez. Parecer 534: Lei 11.101/2005. Disponível em:  <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=580933>. Acesso em: 01 fev. 2015, p. 36.

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Sobre a autora
Camila Barboza Yamada

Advogada,pós graduanda em Direito Tributário pela UNICURITIBA-PR

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

YAMADA, Camila Barboza. Recuperação judicial com base em plano especial para as microempresas e empresas de pequeno porte:: alterações promovidas pela Lei Complementar 147/2014. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4388, 7 jul. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/40656. Acesso em: 23 dez. 2024.

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