4.4. REQUISITOS PARA FORMAÇÃO E VALIDADE DOS CONTRATOS DE EXPORTAÇÃO E IMPORTAÇÃO
O Direito Internacional Privado (DIPr) tem como escopo a solução dos conflitos da lei, diante da possibilidade de aplicação de dois ordenamentos jurídicos distintos na regulamentação do mesmo caso concreto. Assim, o contrato internacional, encontra-se sujeito a duas ou mais legislações.
Pode-se dizer que o elemento de conexão, o qual é escolhido pelo legislador nacional [...], representa o aspecto fático da relação jurídica que aponta o ordenamento jurídico a ser aplicado no caso concreto, funcionando como uma verdadeira “seta indicativa” do direito aplicável em questão. A importância do DIP caminha pari passu com a internacionalização das relações jurídicas, em face da proliferação dos contratos internacionais do comércio que, por sua natureza, não restringem seus vínculos a um único e exclusivo sistema legal. (AMARAL, 2004, p. 220).
Os contratos internacionais, quando formados de maneira direta, é aplicado o princípio geral em matéria de conclusão dos contratos, que versa que o contrato se forma no momento em que a oferta for aceita pelo oblato. “A aceitação, mesmo que oral, deve observar os princípios de clareza, firmeza e precisão, ou seja, deve ser inteligível ao proponente, pois somente desta forma será considerada válida”. (BASSO, 1998, p. 83).
Independente se uma obrigação estiver restrita a somente um ordenamento jurídico (nacional) ou vinculada a mais de um ordenamento jurídico (internacional), para que a obrigação produza efeitos é necessário preencher alguns requisitos essenciais, sob pena de o ato jurídico ser negado ou anulado. Um dos requisitos fundamentais para que a obrigação não tenha vícios é a capacidade das partes, sendo que compete ao Direito Internacional Privado (DIPr) determinar qual lei deverá reger a capacidade das pessoas físicas ou jurídicas para adquirir direitos e contrair obrigações.(AMARAL, 2004, p. 220-221).
No que tange à capacidade das pessoas físicas, existem três elementos para determinar qual a legislação aplicável:
a) a territorialidade (lex fori), segundo a qual se aplica a lei do Estado para todos aqueles que se encontram em seu território, mesmo que estrangeiros de passagem (tal sistema tende a desaparecer, visto que dificulta o comércio internacional); b) a nacionalidade (ex patriae), segundo a qual a capacidade do indivíduo é regida pela lei de seu respectivo país (sistema predominante nos países de emigração); e c) o domicílio (lex domicilii), segundo o qual as leis do Estado onde a pessoa é domiciliada regem sua capacidade (tal sistema predomina, ao contrário do anterior, nos países de imigração). (AMARAL, 2004, p. 221-222).
Com relação à capacidade da pessoa jurídica, sua previsão está no artigo 11 da Lei de Introdução ao Código Civil que dispõe: “as organizações destinadas a fins de interesse coletivos, como as sociedade e fundações, obedecem às leis dos Estados em que se constituíram”.
Apesar de ser uma das questões mais relevantes quanto a aplicabilidade do ordenamento jurídico adequado nos contratos internacionais, esta não é a única problemática desta espécie contratual. Também devem ser determinados o costume aplicável e o foro que decidirá eventual litígio.
Ademais, também integram os contratos internacionais algumas cláusulas, sendo as mais comuns denominadas boiler-plate clauses ou cláusulas padrão, sendo elas:
a) acordo integral (entire agreement): disposição contratual que estabelece a prevalência do instrumento em questão sobre todos os demais entendimentos anteriores, escritos ou orais, havidos entre as partes, relativos ao mesmo objeto; b) cessão (assigment): cláusula que veda a qualquer uma das partes ceder ou transferir a terceiros direitos e obrigações decorrentes do contrato, no todo ou em parte, sem a prévia autorização por escrito da outra parte; c) aditamento (amendment): cláusula que determina que todos os aditamentos ou modificações ao contrato em questão deverão ser feitos por escrito, devendo o referido instrumento ser assinado pelas partes contratantes; d) sucessores (sucessors): disposição que estabelece que os direitos e obrigações decorrentes do contrato beneficiam e obrigam as partes e seus respectivos sucessores a qualquer título; e) renúncia (no waiver): cláusula segundo a qual o não-exercício de determinado direito previsto no contrato ou em lei não representa a sua renúncia; f) independência das disposições (severability): disposição contratual que determina que a nulidade de determinada cláusula não invalida as demais nem o contrato como um todo; g) idioma (language): quando, por determinação legal ou conveniência das partes, o contrato internacional for redigido em duas línguas, determinação daquela que deverá prevalecer; h) notificações (notices): disposição que estabelece a forma em que serão realizadas as notificações, solicitações, exigências e determinações previstas no contrato e, eventualmente, o momento em que as mesmas serão consideradas feitas. (AMARAL, 2004, p. 229-230).
O contrato mais frequente no comércio internacional é o contrato de compra e venda de mercadorias. Esta espécie contratual pode ser regida tanto pela legislação de determinado Estado, quanto por um tratado internacional devidamente ratificado e internalizado pelos Estados.
De acordo com o artigo 23 da Convenção de Viena “O contrato conclui-se no momento em que a aceitação de uma proposta contratual se torna eficaz em conformidade com as disposições da presente Convenção”. (Convenção de Viena. Disponível em: <http://www.globalsaleslaw.org/__temp/CISG_portugues.pdf>)
Assim, a proposta de contrato deve ser feita a pessoas determinadas, sendo precisa e devendo indicar a intenção do proponente, sendo que a oferta torna-se eficaz no momento em que chegar ao seu destinatário.
A referida Convenção em seu artigo 25 prevê ainda os direitos e deveres no que tange à obrigação contratual do comprador e do vendedor, estabelecendo os remédios disponíveis em caso de inadimplemento. “Uma violação do contrato cometida por uma das partes é fundamental quando causa à outra parte um prejuízo tal que a prive substancialmente daquilo que lhe era legítimo esperar do contrato, salvo se a parte faltosa não previu esse resultado [...]”.(Convenção de Viena. Disponível em: <http://www.globalsaleslaw.org/__temp/CISG_portugues.pdf>).
No contrato de compra e venda, tanto o vendedor, quanto o comprador têm direitos e obrigações, também regulamentados pela Convenção de Viena de 1980. “De maneira geral, o vendedor está obrigado a entregar as mercadorias na quantidade, qualidade e descrição exigidas pelo contrato de compra e venda [...]”. (AMARAL, 2004, p. 237).
Cabe ao comprador [...] pagar o preço das mercadorias e recebê-las nas condições estabelecidas no contrato de compra e venda [...]. A obrigação de pagar o preço compreende três elementos, quais sejam: a) a fixação do preço: via de regra, o preço das mercadorias é fixados pelas partes, de mútuo acordo, no contrato [...]; b) o lugar do pagamento: caso o comprador não esteja obrigado a pagar o preço em lugar determinado, dispõe o art. 57 da Convenção que ele deve pagá-lo: no estabelecimento do vendedor; ou no lugar em que se efetue a entrega, se o pagamento houver de ser feito contra a entrega das mercadorias ou documentos; c) o momento do pagamento: [...] se o comprador não estiver obrigado a pagar o preço no momento determinado, deve pagá-lo quando o vendedor colocar à sua disposição as mercadorias ou documentos que as representem [...].(AMARAL, 2004, p. 239-240).
Por fim, pode-se afirmar em resumo que a formação e a validade dos contratos internacionais, em especial o de importação e exportação, dependem de dois fatores importantes: preencher os requisitos essenciais para a sua formação, assim como as demais espécies contratuais que preveem determinados aspectos formais, bem como respeitar e aderir ao ordenamento jurídico escolhido que irá determinar as regras no que tange ao aspecto internacional.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A globalização acarreta o aumento substancial com que ocorrem as relações econômicas internacionais, sendo tais relações estabelecidas a partir de contratos submetidos a legislações distintas. Portanto, constata-se que o contrato internacional é o instrumento jurídico que regulamenta as relações comerciais entre ordenamentos jurídicos de países distintos.
O entendimento adotado por juristas brasileiros e de outros países é no sentido de que o contrato internacional é caracterizado por um elemento de conexão entre o contrato e mais de um sistema jurídico, no qual aquele está submetido.(CRETELLA NETO, 2010, p. 16).
Os contratos internacionais estabelecem vínculo jurídico entre as partes, gerando obrigações, sendo o mais frequente o contrato de compra e venda em razão de ser uma operação que ocorre com mais frequência entre o exportador e o importador.
A Convenção de Viena de 1980 provou ser possível conciliar os objetivos de nações com regimes políticos econômicos e ideológicos visivelmente antagônicos oriundos de sistemas jurídicos distintos. A referida convenção estabelece o momento da formação do contrato de compra e venda, bem como versa acerca do conteúdo da oferta e de perdas e danos. Todavia, apesar de ser ratificada por diversos países, o texto da referida convenção ainda não foi ratificado pelo Brasil, o que implica certo distanciamento do país, inclusive no que tange às relações comerciais do Mercosul, vez que Argentina, Paraguai e Uruguai acataram o disposto na Convenção de Viena de 1980. (MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES. Exportação passo a passo. Disponível em: <http://www.brasilexport.gov.br/sites/default/files/publicacoes/manuais/PUBExportPassoPasso2012.pdf>).
Para a constituição do contrato de compra e venda, deve-se primeiramente, ser realizada a proposta do contrato que deverá ser precisa e feita à pessoa determinada. Contudo, a oferta somente se torna eficaz quando chega ao destinatário final, podendo este aceitá-la ou recusá-la. (AMARAL, 2004, p. 236).
Demonstra-se que o contrato mais utilizado nas relações comerciais internacionais de importação e exportação é o contrato de compra e venda. Assim, esta espécie contratual é a de maior destaque no âmbito internacional, deve-se atentar, ainda, que os contratos que dão movimento às relações de comércio exterior são o contrato de importação e o contrato de exportação. Definir o que vem a ser importação e exportação é algo muito simplório, vez que tal expressão faz parte do cotidiano de grande parte da sociedade, entendendo por exportação a saída de produtos produzidos em determinado país, enquanto que a importação é a entrada de produtos em determinado país.
Ademais, deve-se atentar aos requisitos de formação e validade dos contratos internacionais, ressaltando-se que neste caso, o maior desafio encontrado é fazer com que um único contrato seja válido em ordenamentos jurídicos distintos, sempre levando em consideração o interesse das partes contratantes, sendo respeitados os princípios inerentes a qualquer espécie contratual.
Ressalta-se que deve ser analisada a tributação devida no contrato de importação e no contrato de exportação, destacando-se sua respectiva incidência tributária, a fim de garantir a validade e a eficácia contratual.
Assim, concluiu-se que a competência para instituir os tributos referentes ao contrato de importação e de exportação aduaneiros é da União. Importante destacar que os impostos de importação e de exportação não precisam respeitar o princípio da anterioridade tributária e a observância do prazo nonagesimal da anterioridade legislativa, vez que as incidências tributárias sobre o comércio exterior tem por base a função fiscalizatória e regulatória. (AMARAL, 2004, p. 129-130).
Sobre o contrato de importação, incidirá seu respectivo imposto, qual seja, o imposto de importação. A União detém a competência normativa, sendo também sujeito ativo do referido imposto, em contrapartida o sujeito passivo será o importador, que pode ser pessoa física ou jurídica que irá realizar a importação, arrematar o produto ou adquirir mercadoria. (AMARAL, 2004, p. 130).
Com relação ao contrato de exportação, haverá a incidência do imposto de exportação, cujo sujeito ativo também será a União e o sujeito passivo será aquele que promover a saída da mercadoria do território aduaneiro, ou seja, o exportador. (AMARAL, 2004, p. 132).
Assim sendo, constata-se que é de suma importância conhecer as espécies contratuais no âmbito internacional, em especial aquelas que tratam sobre compra e venda de produtos e serviços. Pode-se afirmar, ainda, que o mundo atual e o presente processo de globalização exige que países com culturas e ideias distintos se relacionem entre si, a fim de se realizar contratos, pactos, acordos e convenções, visando o fortalecimento do país, bem como se destacar e crescer economicamente no mercado de comércio internacional.
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