DIÁLOGOS INSTITUCIONAIS E SOCIAIS

ATIVISMO JUDICIAL

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Neste artigo pretende-se analisar a notória expansão do Poder Judiciário no Brasil e no Mundo, protagonizado pelo modelo de constitucionalismo norte-americano e a disseminação do fenômeno da “judicialização da política”.

DIÁLOGOS INSTITUCIONAIS E SOCIAIS

Resumo

Neste artigo pretende-se analisar a notória expansão do Poder Judiciário no contexto institucional no Brasil e no Mundo, protagonizado pelo modelo de constitucionalismo norte-americano, o qual criou, de certa forma, um novo cenário público cada vez mais distante das tradicionais instituições político-reprentativas, colocando em cheque, a princípio, o princípio da separação dos poderes, criada por Aristóteles e aperfeiçoada por Charles de S. de Montesquieu[1] e, ainda, a neutralidade do Poder Judiciário, assim como a legitimidade de suas decisões judiciais. Assim é que, em sociedades democráticas, com prevalência ao Estado Democrático de Direito, estas decisões devem adquirir legitimidade a partir de um processo deliberativo, com o fim de viabilizar o diálogo entre as instituições e perante a própria sociedade, através de mecanismos de exercício direto ou representativo. E este é o papel dos diálogos institucionais e sociais, impedir, de certa forma, a disseminação do fenômeno da “judicialização da política”, moderando a atuação do Judiciário (minimalismo judicial) e restaurando sua neutralidade, com esteio na Teoria das Instituições.

Palavras – Chave: Diálogos Institucionais e Sociais. Judicialização da política. Judicial Review. Controle de Constitucionalidade.

Abstract:

This article aims to examine the notable expansion of the Judiciary in the institutional context in Brazil and worldwide, played by the US constitutional model, which in a way created a new public scene increasingly distant from traditional representative institutions, thus putting into question the principle of separate powers (created by Aristotle and improved by Montesquieu), and also the neutrality of the judiciary as well as the legitimacy of its judgements. In societies where a democratic state based on the rule of law prevails, those judgements must gain legitimacy from a decision-making process, making possible the dialogue between institutions and to society itself, through direct or representative participation. And that is the role of institutional and social dialogues: to somehow prevent the spread of "political judicialization", moderating judiciary actions (judiciary minimalism) and restoring its neutrality, relying on the Theory of Institutions.

Keywords: Institutional and Social dialogues. Judicialization of Politics, Judicial Review

1. Introdução

           O Brasil exerceu sua escolha política em ter um modelo rígido de Constituição, impingindo-lhe a mais grandiosa expressão jurídica da soberania. Definiu, ainda, ao longo das seis Constituições que precederam a atual Carta de 1988, um modelo de jurisdição constitucional misto. Junto a isto, nos termos do art. 102 da CRFB/88, o constituinte originário determinou o Supremo Tribunal Federal como o guardião da Constituição, de forma a garantir a abertura política e proteger a democracia.

           Contudo, não obstante a clara supremacia garantida ao Poder Judiciário pela Constituição em vigor, resta a indagação se cabe realmente a este poder - especificamente ao Supremo Tribunal federal -, dar a última palavra em nosso sistema democrático.

           O eminente Professor Fábio Corrêa Souza de Oliveira, em artigo publicado no ano de 2011[2] pondera de maneira clara sobre a real dimensão desta previsão constitucional (art. 102, CRFB/88). Indaga, de maneira crítica, o caráter derradeiro desta voz (STF) que acaba por vibrar mais alto. Alerta, ainda, que:

“O diálogo não conhece encerramento obrigatoriamente no STF. Pode continuar além dele. Seja pela via institucional ou pela via social. A voz do STF é uma voz, certamente com decibéis mais altos que outras, mas não invariavelmente com ressonância. No diálogo, o eco é importante, uma meta.”

           Não podemos entender como o melhor resultado para a democracia, um sistema que privilegia, imotivadamente, uma instituição (contramajoritária) em prol de outra como detentora da palavra final. Pelo menos não de forma absoluta.

           A propósito e nesses termos, novamente pondera Fábio Corrêa Souza de Oliveira, que:

“O juiz dialógico não é aquele descrito por Michel Foucault em outra seara, nada obstante aqui aplicável, como o professor-juiz, o médico-juiz, o educador-juiz, o ‘assistente social’-juiz. E nem assim o legislador ou o administrador. Ou se ouve ou se fala sozinho. Com o risco de se encantar narcisisticamente (solipsistamente) pela própria voz.”

           O diálogo encontra diversas facetas e formas de incorporação ao sistema democrático. O que definitivamente não pode ocorrer é um esvaziamento das demais instituições, fazendo do Judiciário um novo poder moderador, ilimitado, como já o fora, em terra brasilis. Assim, o diálogo, independentemente da via escolhida, deve continuar além do judiciário. Não deve encontrar um fim, especificamente, em nenhum dos poderes, mas ao contrário, deve ser criado de forma conjunta, cooperativa, a partir do diálogo, seja pela via institucional, seja pela via social e, quando possível, por ambas.

           Não obstante o fato de o Supremo Tribunal Federal desempenhar hoje, um papel ativo na condução das complexas discussões postas à sociedade, inclusive em ações individuais, com preponderância a um ativismo judicial crescente, perfazendo em alguns casos verdadeiras alterações constitucionais, com suposto suporte no instituto da mutação constitucional, há de se reconhecer, por outro lado, que o STF não é necessariamente “o último player nas sucessivas rodadas de interpretação da Constituição pelos diversos integrantes de uma sociedade aberta de intérpretes”.

           Com apoio de Fábio Corrêa Souza de Oliveira, podemos estender a crítica oriunda dos diálogos no papel das decisões judiciais solipsistas também ao Ministério Público e a todos os demais atores do sistema processual brasileiro, que por vezes, desenvolvem uma atividade (processo) que, por sua natureza e via de regra, é desvinculada do debate democrático, com exceção dos casos em que isto seja possível, como em audiências públicas, e amicus curiae.

           O agravamento desta situação possui fortes contornos no controle de jurisdição exercido atualmente no Brasil. Em primeiro plano, há de se dizer que tal controle de constitucionalidade pode ser preventivo, podendo ser exercido também pelo Poder Legislativo[3]. Ocorre que possuímos no Brasil um sistema misto (difuso e concentrado) de controle, sendo distintos os efeitos oriundos de um ou outro, pelo menos em tese e por enquanto. Exemplo claro disso é a regra inserta no art. 52, X da CRFB/88 (que determina ser de competência privativa do Senado Federal à suspensão da execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal).

           Contudo, temos tido evidentes sinais de um posicionamento mais que ativo do STF, no sentido de, através da mutação constitucional, afastar esta obrigatoriedade, de modo a se conceder eficácia erga omnes em decisão proferida em sede de controle incidental, no bojo de recurso extraordinário. Um exemplo desta postura que se segue claramente no STF ocorreu no julgamento da Reclamação n.º 4335-5/AC, em breve analisada. Outra questão, a seguir enfrentada, decorre de própria previsão legal, onde nos termos do art. 543-B do CPC, pode o STF conceder efeitos de uma ação individual, à coletividade.

           Por outro lado, não obstante o fato de o ordenamento jurídico pátrio, conceder ao STF a guarda da Constituição, muitas vozes soam no sentido de que por força de seu caráter contramajoritário (proteção das minorias contra o abuso das maiorias), certa dúvida poderia surgir com relação a sua legitimidade, sobretudo pelo fato de que a corte é composta por juízes não eleitos, onde a solução para as mais altas e complexas discussões (não apenas jurídicas, mas também de cunho político-social), restariam nas mãos de um grupo seleto de juízes. Esta é a “dificuldade majoritária”[4].

2. A problemática criada pela falta de diálogo

           São muitos os exemplos atualmente que retratam um avanço considerável do ativismo judicial no Brasil. Em muitos deles, o fenômeno é estimulado pela própria legislação, que confere ao Supremo Tribunal Federal a atribuição de guardar a Constituição. Em outros, encontramos as mais variadas formas de interpretação da Constituição como forma de se impor fim aos conflitos, inclusive, os de índole política. Nesta esteira, temos a mutação constitucional como verdadeiro caminho para a decisão. Contudo, em algumas situações, o instituto da mutação, de origem doutrinária, é deturpado e aplicado de forma antagônica ao que propriamente já se estabelecera no próprio Supremo Tribunal Federal.

2.1 Controle difuso e a Reclamação n.º 4335-5/AC

           O julgamento da Reclamação 4335-5/AC trouxe grande discussão sobre a possibilidade de concessão de efeitos vinculantes em sede de controle difuso.

           No ano de 2006, o STF julgou o HC 82.959-7/SP, em que o impetrante questionava a inconstitucionalidade da Lei n.º 8.072/90 (art. 2º, § 1º). O Tribunal, por maioria, deferiu o pedido de habeas corpus e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do § 1º do artigo 2º da Lei nº 8.072. Comunicado o Senado Federal, diante da regra inserta no art. 52, X da CRFB/88, este manteve-se inerte.

           Com isso, percebe-se que diante do controle judicial de constitucionalidade adotado pelo Brasil, uma decisão proferida incidentalmente em controle difuso, não poderia angariar os mesmos efeitos daquela proferida em controle concentrado.

           Contudo, no mesmo ano, o STF admitiu a Reclamação n.º 4335-5/AC, onde a Defensoria Pública da União questionava a decisão do juiz de direito da Vara de Execuções Penais de Rio Branco, no caso concreto, em que negou a progressão de regime prisional nos termos do que dispõe a Lei de Crimes Hediondos.

           A Reclamação em comento foi conhecida e julgada procedente em 2014. Acrescente-se que, não obstante a edição da Súmula Vinculante n.º 26 (que manda o juízo da execução observar a inconstitucionalidade do art. 2º, da Lei n.º 8.072/90) no transcurso da ação, alguns votos foram proferidos antes mesmo de sua edição, como os dos Ministros Gilmar Mendes e Eros Grau.

           O primeiro fato que nos chama atenção é a admissão de reclamação que tenha por objeto decisão do STF mantida em sede de controle difuso, sem que tenha o Senado suspendido a execução da lei. O segundo e, talvez mais preocupante efeito desta Reclamação, embora decorrente do primeiro, consistiu, na verdade, na substituição de um texto por outro texto – este construído pelo STF, sob a alcunha de mutação constitucional.

           Curioso, todavia, que o instituto da mutação constitucional foi completamente transmutado, para fins diversos que não aquele de se conceber nova norma ao texto, mas sim a criação de novo texto constitucional, onde nas palavras do próprio Ministro Eros Grau, em consonância com o Ministro Relator Gilmar Mendes, o sentido normativo do art. 52, X da CRFB/88 seria este:

“passamos em verdade de um texto [pelo qual] compete privativamente ao Senado Federal suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal, a outro texto: "compete privativamente ao Senado Federal dar publicidade à suspensão da execução, operada pelo Supremo Tribunal Federal, de lei declarada inconstitucional, no todo ou em parte, por decisão definitiva do Supremo".

           Passamos a ter no julgamento do STF, em sede de controle difuso, uma tese, uma teoria e não uma decisão.

2.2 Papel do Senado e a Repercussão Geral

           Não bastasse a fragilidade para a democracia e separação dos poderes resultante da aceitação pelo STF de reclamação contra seus julgados (e não teses) obtidas em sede de controle difuso, temos a questão da repercussão geral introduzida pela Reforma do Judiciário (EC 45/2004), e regulamentada pelo art. 543-B do Código de Processo Civil, onde o STF a partir de então, poderá conceder repercussão geral a determinada matéria e determinar a interpretação extraída em sede de controle difuso a todos os jurisdicionados.

           Isso permite que o STF seja não somente ativo, mas lhe confere maiores prerrogativas que os demais poderes. Atualmente o STF pode determinar uma forma de interpretação de norma constitucional e impô-la a todos mediante uma decisão tomada por maioria absoluta (seis ministros), quórum menos elevado que para a criação de uma súmula vinculante (oito votos).

              A propósito e nesses termos, merece relevo a recente decisão do STF, proferida em novembro de 2014, onde ao julgar o Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 709212/DF[5], concedeu-lhe repercussão geral, declarando a inconstitucionalidade do art. 23, § 5º da lei do FGTS e art. 55 do Regulamento do FGTS aprovado pelo Decreto 99.684/1990, na parte em que ressalvam o “privilégio do FGTS à prescrição trintenária”, haja vista violarem o disposto no art. 7º, XXIX, da Carta de 1988, entendendo, doravante, ser de cinco anos o prazo de prescrição aplicável à cobrança de valores não depositados no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), nos termos do art. 7º, XXIX da CRFB/88.

3. Da separação dos Poderes

           O modelo tradicional de divisão de poderes foi alimentado pela Revolução francesa e voltou a ser implementada após a queda do Estado absolutista.

           A Teoria da separação dos poderes embora tenha sido aperfeiçoada por Charles de S. de Montesquieu, fora formulada cerca de um século antes, por pensadores (Aristóteles). Esta teoria tinha o intuito de, através de uma divisão de funções (limitações) dos poderes, possibilitar a defesa do cidadão contra a tirania dos governantes. Nesses termos, Monstesquieu[6]:

"Quando na mesma pessoa, ou no mesmo corpo de magistrados, o poder legislativo se junta ao executivo, desaparece a liberdade(...). Não há liberdade se o poder judiciário não está separado do legislativo e do executivo(...). Se o judiciário se unisse com o executivo, o juiz poderia ter a força de um opressor. E tudo estaria perdido se a mesma pessoa ou o mesmo corpo de nobres, de notáveis, ou de populares, exercesse os três poderes: o de fazer as leis, o de ordenar a execução das resoluções públicas e o de julgar os crimes e os conflitos dos cidadãos".(Montesquieu, DO ESPÍRITO DAS LEIS, 1748)

           Essa limitação do poder, então, advinda do próprio poder, se denominou de mecanismo de freios e contrapesos (checks and ballances), que posteriormente à crise do Estado Liberal foi readaptada à eficiência do sistema político. Com isso, a separação dos poderes teve de ser alterada, a fim de se amoldar a uma nova realidade que não mais ansiava uma separação fervorosa dos poderes, mas sim uma harmonização entre eles. Nesse sentido, José Afonso da Silva[7]:

Se ao Legislativo cabe a edição de normas gerais e impessoais, estabelece-se um processo para sua formação em que o Executivo tem participação importante, quer pela iniciativa das leis, quer pela sanção e pelo veto. Mas a iniciativa legislativa do Executivo é contra-balanceada pela possibilidade que o Congresso tem de modificar-lhe o projeto por via de emendas e até de rejeitá-lo. Por outro lado, o Presidente da República tem o poder de veto, que pode exercer em relação a projetos de iniciativa dos congressistas como em relação às emendas aprovadas a projetos de sua iniciativa. Em compensação, o Congresso, pelo voto da maioria absoluta de seus membros, poderá rejeitar o veto, e, pelo Presidente do Senado, promulgar a lei, se o Presidente da República não o fizer no prazo previsto (...) Se os Tribunais não podem influir no Legislativo, são autorizados a declarar a inconstitucionalidade das leis, não as aplicando neste caso. O Presidente da República não interfere na função jurisdicional, em compensação os ministros dos tribunais superiores são por ele nomeados, sob controle do Senado Federal, a que cabe aprovar o nome escolhido (...) Tudo isso demonstra que os trabalhos do Legislativo e do Executivo, especialmente, mas também do Judiciário, só se desenvolverão a bom termo, se esses órgãos se subordinarem ao princípio da harmonia, que não significa nem o domínio de um pelo outro nem a usurpação de atribuições, mas a verificação de que, entre eles, há de haver consciente colaboração e controle recíproco (que, aliás, integra o mecanismo), para evitar distorções e desmandos.

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           Paulo Bonavides[8] confirma estes novos contornos de modelo de separação dos poderes, ilustrando os freios e contrapesos existentes hoje, ao aduzir que:

A verdade é que ele tomou nas formas constitucionais contemporâneas, depois de iluminado por uma compreensão interpretativa sem laços com a rigidez do passado, um teor de juridicidade só alcançado por aqueles axiomas cuja importância fundamental ninguém contesta nem fica exposta a sérias dúvidas doutrinárias [...] Com efeito, poderia afigurar-se um anacronismo, reproduzir aqui as lições dos constituintes e publicistas do liberalismo que, durante o curso dos séculos XVIII e XIX, vazaram, em fórmulas lapidares, tanto nas Constituições como nas páginas de doutrina, a intangibilidade da separação de poderes. Mas nunca essa censura se poderia fazer àqueles autores e àquelas Constituições que ainda no fim do século XX mantêm o princípio em apreço como uma das pedras inquebrantáveis do edifício constitucional, cavando alicerces que, se abalados fossem, fariam desabar toda a construção.

           No próprio Estados Unidos da América esta relação de equilíbrio já se mostrou frágil em alguns momentos de sua história constitucional. Uma delas em que os Estados poderiam anular ou invalidar lei federal, considerando-a inconstitucional, a partir do instituto da nullification.

4. Da Judicialização da Política

           A ideia de que as decisões emanadas pelo Poder legislativo, sob o albergue da mais alta legitimidade poderiam ser submetidas ao controle jurisdicional iniciou-se nos Estados Unidos da América (a partir do século XIX), com o julgamento de Malbury v. Madison (1803). A partir daí, disseminou-se o judicial review pelo mundo, passando a independência judicial a não ser mais a preocupação imediata, eis que atingida.

           Passou a Suprema Corte Americana a dar o sentido último da Constituição. Ressalte-se, neste diapasão, a diferença entre monopólio judicial e supremacia judicial. O primeiro constitui exclusividade do judiciário a interpretação da Constituição. O segundo, por sua vez, admite a interpretação advinda de outros poderes, restando certo, contudo, que o acerto final, é sempre do judiciário.

           Este modelo contrapôs-se ao modelo Britânico de supremacia do Parlamento.

           O processo na Europa, então, foi diverso, onde até início do século XX o controle jurisdicional dos atos provenientes do Poder Legislativo ficou afastado pelo positivismo formalista, ficando o judiciário relegado a cumprir os comandos legiferantes.

           No Brasil, a Constituição de 1988 traduziu a Carta mais democrática de todos os tempos, trazendo em seu bojo, o sistema misto de jurisdição constitucional (difuso e concentrado), estando certo que o judicial review, especificamente na modalidade de controle difuso, fora inserido em nosso ordenamento jurídico desde a Constituição de 1891, influenciado pelas ideias de Rui Barbosa[9].

           Com a criação do controle concentrado pela EC 16/65 e posteriormente mantida e aperfeiçoado pela Constituição de 1988, não só as instituições passaram a fazer parte, ao menos em tese, do processo dialógico, mas também a própria sociedade. Percebe-se isto com a alteração do rol de legitimados para propor ação declaratória de constitucionalidade (deixando de ser uma “ferramenta” de governo), o qual se igualou ao rol de legitimados para propor a ação direta de inconstitucionalidade.

           Junto a isto, percebemos que as funções do judiciário se ampliaram, tomando conta do que antes era conferido apenas ao legislativo, passando-se a um contexto ligado a concepção de decisões maximalistas (onde os juízes definem questões complexas sobre política, moral, filosofia, biologia e economia), em contrapartida do minimalismo constitucional.

           Alguns destes casos emblemáticos foram julgados recentemente no Brasil, por conta da ocupação de vazios antes ocupados pelo Poder Legislativo: União Homoafetiva (ADPF 154); Pesquisas com células-tronco embrionárias (ADI 3510); Demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol (Pet 3388 RR); Não recepção da Lei de Imprensa (ADPF 130); criação do município de Luís Eduardo Magalhães (ADI 2240); greve dos servidores públicos (MI 670 e 712); importação de pneus remoldados e reformados (ADPF 101); necessidade de diploma de jornalismo para o exercício da profissão de jornalista (RE 511961); marcha da maconha (ADPF 187);  Cotas (ADPF 186 e RE 597285). 

           Com o aumento deste “ativismo judicial”, surgem também algumas ponderações e questionamentos sobre a legitimidade do judiciário, que por força do avanço da jurisdição constitucional adquire cada vez mais a ideia de ser o detentor da última palavra.

           É certo que questões de enorme complexidade de ordem moral, filosófica política entre outras, são passadas para pessoas (juízes) não eleitas democraticamente, não obstante o argumento de que para o ingresso dos membros do Supremo Tribunal Federal se faça necessário a chancela (sabatina) pelo Congresso Nacional[10].

           Por outro lado, outro argumento torna valioso o julgamento por homens distantes da influência política, ao passo que da mesma forma, se distanciariam de acordos inidôneos e negociatas, concedendo-lhes certa imparcialidade em função disto.

           Por certo podemos dizer que, em sede de Constitucionalismo contemporâneo, questões com repercussão política ou social poderão ser levadas ao conhecimento do Judiciário, mas este, por sua vez, não deve de forma alguma substituir, como já dito, as decisões políticas tradicionais.

           Por oportuno, cabe-nos diferenciar o fenômeno da judicialização, de ativismo judicial, utilizando as palavras de Luis Roberto Barroso[11]:

A judicialização e o ativismo judicial são primos. Vêm, portanto, da mesma família, frequentam os mesmos lugares, mas não têm as mesmas origens. Não são gerados, a rigor, pelas mesmas causas imediatas. A judicialização, no contexto brasileiro, é um fato, uma circunstância que decorre do modelo constitucional que se adotou, e não um exercício deliberado de vontade política. Já o ativismo judicial é uma atitude, a escolha de um modo específico e proativo de interpretar a Constituição, expandindo o seu sentido e alcance.

           De um modo geral alguns fatores ensejaram o aumento da judicialização no brasil. Arantes[12], com base em Tate e Vallinder, elenca alguns motivos que levaram a judicialização da política: “a democracia restabelecida nos anos 80, seguida de uma Constituição pródiga em direitos em 1988, com um número cada vez maior de grupos de interesses organizados demandando solução de conflitos coletivos, contrastando com um sistema político pouco majoritário, de coalizões e partidos frágeis para sustentar o governo, enquanto os de oposição utilizam o Judiciário para contê-lo; além de um modelo constitucional que delegou à Justiça a proteção de interesses em diversas áreas, refletindo até mesmo o alto grau de legitimidade do Judiciário e do Ministério Público como instituições capazes de receber essa delegação.”

           Outro fator determinante de uma espécie de judicialização da política é oriunda do próprio Congresso Nacional, quando em disputas político-partidárias ou estritamente políticas, os partidos políticos fazem do judiciário uma nova etapa na respectiva disputa.

           Temos ainda que a Constituição de 1988 abrangeu, sistematicamente, um número elevado de matérias, antes deixadas ao crivo do processo político e legislação ordinária, transmutando-se, assim, debates políticos em debates litigiosos (políticas públicas, por exemplo).

           Um derradeiro fundamento desta judicialização seria nosso próprio sistema de jurisdição constitucional (misto), que permite enorme intervenção do judiciário, ampliando assim, a análise e julgamento de questões ligadas à esfera político-social. Por um lado, uma verdadeira disseminação dos métodos judiciais para arena políticas, por outro, uma incessante busca pela afirmação de direitos e garantias individuais constantes da Constituição. Há que se dizer, contudo, que a petrificação dos direitos fundamentais, adotado em um modelo rígido de Constituição, como em nosso caso, não significa naturalmente uma supremacia judicial.

           Outrossim, em sociedades complexas, ungidas pela diversidade e diferenças religiosas, morais e filosóficas, em que cidadãos com visões diametralmente opostas convivem em solo único, caracterizado pelo pluralismo (desacordo razoável), deve o Judiciário se manter imparcial quanto a todas estas visões específicas, garantindo a todos, a possibilidade de construção de suas vidas.

           Temos, então, que a discussão sobre questões de alta complexidade que envolvem princípios de alta carga moral em detrimento de regras jurídicas, deve ficar a cargo do poder que, por sua natureza, tem a vocação de fazer valer a vontade do cidadão, por conta de sua legitimidade representativa (Poder Legislativo). Traz-se à baila, por oportuno, o art. 68 da Constituição de 1934 e o art. 94 da Constituição de 1937 que vedavam a análise de questões exclusivamente políticas pelo Poder Judiciário.

           Não bastasse isso, a mesma Constituição de 1937 contemplou a possibilidade do Poder Legislativo de invalidar as decisões tomadas pelo Poder Judiciário em controle de constitucionalidade. Guardadas as devidas proporções, isto é o que pretende as PEC’s 03/2011 e 33/2013, ou seja, permitir o controle do Legislativo das decisões do Judiciário em sede de controle de constitucionalidade.

           Para o fim de se homogeneizar as distintas visões, por si só, heterogêneas, deve o Judiciário se ater ao princípio da razão pública, de origem Kantiana e desenvolvida posteriormente por John Rawls. Este princípio circunda-se na ideia de que o judiciário só deve levar a cabo argumentos desnudos de doutrinas religiosas ou metafísicas controvertidas, sobretudo diante do fato de não ser o Judiciário composto de representantes eleitos pelo povo, ficando-lhe vedado, modificar decisões tomadas pela Casa Legislativa, com argumentos que não ligados à razão pública.[13][14]

           Como visto a seguir, para Habermas[15] e Garapon[16] a judicialização da política possui contornos e conquistas sociais relativas ao bem-estar social, que pode propiciar a recuperação do sentido original da soberania popular. Para Dworkin[17], o fenômeno da judicialização (intervenção ativa do Judiciário nas questões políticas) possui o condão de suprir os desejos da maioria em detrimento ao conservadorismo do Poder Legislativo.

           Tal fenômeno da judicialização (protagonismo judicial, ativismo judicial) possui contornos mais expressivos nos países que adotam a common law, em detrimento daqueles que adotam a civil law, pois naqueles, o Judiciário cria o próprio direito por meios dos precedentes judiciais (jurisprudência), enquanto neste, o ativismo se faz presente por conta das interpretações constitucionais, diante do alto número de normas com natureza de princípio existentes na Constituição.

           Convém destacar, nesta esteira, o posicionamento tomado pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ação sobre células-tronco embrionárias, onde o Ministro Gilmar Mendes afirma, de forma peremptória, que o sistema Constitucional no Brasil garante ao Judiciário um predomínio sobre os demais Poderes. Pontua, ainda, citando Alexy, que muito embora o parlamento represente o cidadão politicamente, o tribunal o faz, da mesma forma, argumentativamente, senão vejamos[18]:

“É em momentos como este que podemos perceber, despidos de qualquer dúvida relevante, que a aparente onipotência ou o caráter contramajoritário do Tribunal Constitucional em face do legislador democrático não pode configurar subterfúgio para restringir as competências da Jurisdição na resolução de questões socialmente relevantes e axiologicamente carregadas de valores fundamentalmente contrapostos. (...) Apesar dessa constatação, dentro de sua competência de dar a última palavra sobre quais direitos a Constituição protege, as Cortes Constitucionais, quando chamadas a decidir sobre tais controvérsias, têm exercido suas funções com exemplar desenvoltura, sem que isso tenha causado qualquer ruptura do ponto de vista institucional e democrático. Importantes questões nas sociedades contemporâneas têm sido decididas não pelos representantes do povo reunidos no parlamento, mas pelos Tribunais Constitucionais.(...) Muito se comentou a respeito do equívoco de um modelo que permite que juízes, influenciados por suas próprias convicções morais e religiosas, dêem a última palavra a respeito de grandes questões filosóficas, como a de quando começa a vida. Lembro, em contra-argumento, as palavras de Ronald Dworkin que, na realidade norte-americana, ressaltou o fato de que "os Estados Unidos são uma sociedade mais justa do que teriam sido se seus direitos constitucionais tivessem sido confiados à consciência de instituições majoritárias". (...) O Supremo Tribunal Federal demonstra, com este julgamento, que pode, sim, ser uma Casa do povo, tal qual o parlamento. Um lugar onde os diversos anseios sociais e o pluralismo político, ético e religioso encontram guarida nos debates procedimental e argumentativamente organizados em normas previamente estabelecidas. As audiências públicas, nas quais são ouvidos os expertos sobre a matéria em debate, a intervenção dos amici curiae, com suas contribuições jurídica e socialmente relevantes, assim como a intervenção do Ministério Público, como representante de toda a sociedade perante o Tribunal, e das advocacias pública e privada, na defesa de seus interesses, fazem desta Corte também um espaço democrático. Um espaço aberto à reflexão e à argumentação jurídica e moral, com ampla repercussão na coletividade e nas instituições democráticas. Ressalto, neste ponto, que, tal como nos ensina Robert Alexy, "o parlamento representa o cidadão politicamente, o tribunal constitucional argumentativamente (...)”

5. Concepções de Ronald Dworkin e Jerewy Waldron

           As teorias dos autores muito embora caminhem em sentidos diversos, possuem uma característica em comum: tentar estabelecer os limites e possibilidades da interpretação constitucional, sobretudo no quesito legitimidade democrática (ativismo judicial ou moderação das decisões judiciais).

           Enquanto Ronald Dworkin dá ênfase ao Poder Judiciário como ator principal na concretização das normas constitucionais, através de ilimitada judicial review, Jerewy Waldron[19] sugere a releitura das funções do Poder legislativo, reverenciando às funções proclamadas na Constituição.

           Na ótima de Dworkin, a finalidade de aperfeiçoar o sistema democrático, cabe justamente ao Judiciário, através de decisões arraigadas de fundamentos legais e morais. O autor, ao criar a figura metafórica do juiz “Hércules” [20] pretende que o juiz ao se deparar com questões de difícil e complexa solução, deva questionar-se filosoficamente para decidir corretamente[21].

           Assim, o almejado por Dworkin era justamente uma decisão embasada em princípios, com o intuito de privilegiar a forma em relação ao conteúdo, em que estaria o aspecto moral envolvido.

           Jerewy Waldron defende a recuperação da dignidade do Poder legislativo, desprezada por tempos, sob a ideia de fortalecimento do Estado Democrático de Direito na função judicial, senão vejamos[22]:

Nosso silêncio nessa questão é ensurdecedor se comparado com a loquacidade sobre o tema dos tribunais. Não há nada sobre legisladores ou legislação na moderna jurisprudência filosófica que seja remotamente comparável à discussão da decisão judicial. Ninguém parece ter percebido a necessidade de uma teoria ou de um tipo ideal que faça pela legislação o que o juiz-modelo de Ronald Dworkin, “Hércules”, pretende fazer pelo raciocínio adjudicatório.

           Jerewy Waldron acredita que a decisão proferida no seio das assembleias legislativas, apesar de, da mesma forma que àquelas proferidas pelo Poder Judiciário, poderem não ser unânimes (e quase nunca serão), terão estas maior teor democrático, privilegiadas pelo debate democrático, estabelecido em razão de sua representatividade.

           Para tanto, tenta resgatar a qualidade e autoridade do Poder legislativo, rechaçando a notória má-reputação, oriunda de processos obscuros e egoísticos como negociatas, troca de favores, manobras de assistência mútua, intrigas por interesses.  Nesses termos Waldron demostra seu intento, entendendo o Poder Legislativo como a vontade máxima do povo, dono do poder [23]:

Quero que vejamos o processo de legislação – na sua melhor forma – como algo assim: os representantes da comunidade unindo-se para estabelecer solene e explicitamente esquemas e medidas comuns, que se podem sustentar em nome de todos eles, e fazendo-o de uma maneira que reconheça abertamente e respeite (em vez de ocultar) as inevitáveis diferenças de opinião e princípio entre eles. Esse é o tipo de compreensão da legislação que eu gostaria de cultivar. E penso que, se capturássemos isso como a nossa imagem de legislação, haveria, por sua vez, uma saudável diferença no nosso conceito geral do direito.

           Waldron critica o ativismo judicial, norteado pelo sistema norte-americano, em três facetas, a saber: 1 – os limites à regra da maioria; 2 – a hipertrofia de práticas contramajoritárias; e 3 – a fixação do centro das atenções nos tribunais, o qual passa a escolher determinados princípios, em função de um provável fundamento de ordem moral, que o torna, neste sentido, arbitrário.

           Nesta linha de raciocínio, Wandron[24], Condorcet e Maquiavel defendem que quanto maior o número de cidadãos presentes na elaboração da lei, nas casas legislativas, mais serão estas democráticas. Nesse sentido:

Todos supomos que, mesmo que o executivo e o judiciário sejam ocupados nas suas instâncias mais elevadas por apenas um punhado de pessoas, a legislatura – sozinha entre todos os ramos de um governo – deve reunir centenas de pessoas. Qual é a base dessa suposição? O que ela nos diz sobre a legislação? Como algo que é tão evidentemente uma má ideia – a legislação por uma grande congregação – pode ter se entrincheirado tanto como princípio de organização constitucional? Nos capítulos que se seguem, argumentarei que esse consenso a respeito de “grandes congregações” não é tão monolítico como parece. Maquiavel nos preveniu, quase quinhentos anos atrás, que não nos deixássemos lograr e pensar que calma e solenidade são a marca de uma boa política, e que o barulho e o conflito são sintoma de patologia política. ‘Boas leis’, disse ele, podem surgir de “desses tumultos que muitos maldizem inconsideravelmente”.

           Em sentido diverso, Ronald Dworkin defende um sistema de decisão judicial fundamentado em princípios, nos termos da figura do semideus Hércules (sentido figurado que reconhece no juiz, qualidade ética equiparada a um semideus), não esquecendo jamais da integridade moral existente na comunidade.

6. Conclusão

           A teoria dos diálogos institucionais, conforme Batteup[25], defende em suma, que o Judiciário não pode, sob o ponto de vista empírico e, não deve, sob o ponto de vista normativo, deter o monopólio da interpretação constitucional, ensejando, ao menos em tese, que a decisão final deve ser construída com a participação dos demais atores, além do Judiciário, de modo a angariar representatividade e, sobretudo, legitimidade.

           Conforme Fábio Corrêa Souza de Oliveira, o mais importante não é quem dará a palavra final, mas sim, e o mais importante, será como chegaremos a esta conclusão. Que meios utilizaremos para o debate. A indagação, portanto, passa a ser outra: a sociedade e as instituições criarão de forma dialógica esta decisão? Haverá a participação de outros atores nesta “elaboração”, fora o Judiciário? Se a resposta for afirmativa, o fato da palavra final partir de um ou outro poder não terá grandes repercussões maléficas ao nosso sistema democrático, pois nos afastaremos, nesta ocasião, da arbitrariedade e subjetividade solipsista.

           Ainda com Fábio Corrêa Souza de Oliveira, o desejável seria a “perspectiva de um constitucionalismo cooperativo, integrativo comunicativamente (para mais dos órgãos estatais) entre Estados, cujo alicerce deve repousar no protagonismo da comu­nidade (sociedade aberta dos intérpretes)”.

           Nesta esteira, são os argumentos de Cass R. Sunstein e Adrian Vermeule, no sentido de haver uma “rede de reciprocidade”, projetada a partir a elaboração democrática de decisão coletiva convergente com as distintas noções de justiça de uma sociedade pluralista, de modo a ultrapassarmos um monólogo judicial em um legítimo diálogo interinstitucional.

   Voltamos a enfatizar as palavras conclusivas de Fábio Corrêa Souza de Oliveira, onde afirma que:

“O Tribunal Constitucional não é a ressurreição de um Poder Moderador dos diálo­gos, alguém que vê as conversações de um local privilegiado, harmoniza os discursos e, assim, põe termo ao debate, altaneiro por saber que a fala derradeira será a sua. O diálogo não conhece encerramento obrigatoriamente no STF. Pode con­tinuar além dele. Seja pela via institucional ou pela via social. A voz do STF é uma voz, certamente com decibéis mais altos que outras, mas não invariavelmente com ressonância. No diálogo, o eco é importante, uma meta”.

           Os diálogos institucionais e sociais são portanto uma forma de se evitar essa estreita e solitária função de decidir de um único Poder. Exemplos marcantes disso, seria a possibilidade de alteração da Constituição por apelo popular, através de projeto de emenda, referendo para aprovação de reforma Constitucional, mandatos para os ministros do STF, a revocatória del mandato, existente hoje em alguns de nossos vizinhos sul-americanos. 

           Quando não atendidos esses diálogos, de forma a moldar as deliberações através de legítimos processos dialéticos que legitimem as decisões, a consequência pode vir por meio de backlash (rejeição de uma decisão pelas many minds, nas palavras de Cass Sunstein[26]), ou seja, uma reação da própria sociedade, contrária àquela tomada de forma solipsista ou mesmo unilateral, consagrando sua inautenticidade, obrigando o ator público, a retornar ao romance em cadeia, ou mesmo, o inverso, quando o inconformismo decorre do próprio capítulo da novela.

           Temos certo que quanto maior a contrariedade da decisão, em relação ao senso comum, maior as chances de backlashes, na medida em que normalmente promovidas pelo Poder Judiciário, típico Poder contramajoritário. Por isso, a prudência sugerida por Cass Sunstein, é no sentido de se manter cautela em relação às decisões que guardam singularidade com questões morais, filosóficas e políticas de alta complexidade, pois um deslize e as reações da sociedade poderão trazer intensos prejuízos ao avanço da causa, em muitos casos, um verdadeiro public outrage.

           Um exemplo recente de diálogo institucional foi decorrente do julgamento pelo STF da verticalização das coligações partidárias, quando o Congresso aprovou Emenda Constitucional alterando o texto e o sentido emprestado na ação em relação ao antigo texto. Demais exemplos podemos intuir dos institutos da interpretação conforme a Constituição, a modulação de efeitos das decisões e a declaração de inconstitucionalidade sem redução de texto.

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[1] O modelo norte-americano do Checks and balances, proposto pelos federalistas, é uma evolução dessa teoria.

[2] Juris Poiesis, ano 14, n. 14, jan-dez. 2011 ISSN 1516-6635. http://portal.estacio.br/media/3463493/juris-poiesis-14-11-maio1.pdf

[3] Além do controle de constitucionalidade jurisdicional existe o chamado controle político que é realizado “por órgãos especiais [...], distintos dos demais poderes”.(ALMEIDA, 2005, p.14)

[4] BICKEL, Alexander. The least dangerous branch: the Supreme Court at the bar of politics. 2. ed. New Haven: Yale University Press, 1986

[5] Demonstra-se como pode o STF derrubar um entendimento tido por décadas (Súmula n.º 362 do TST) e, através de uma ação individual, lhe atribuir efeitos vinculantes, nos termos do art. 543-B do CPC.

[6] MONTESQUIEU. Do espírito das leis. São Paulo: Nova Cultural, 2000. V1.

[7] SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 23. ed. São Paulo: Malheiros,

2004.

[8] BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 23. ed. São Paulo: Malheiros, 2008.

[9] Não obstante o fato de que juízes que exerceram tal controle sofreram processos criminais.

[10] BICKEL, Alexander. The least dangerous branch: the Supreme Court at the bar of politics. 2. ed. New Haven: Yale University Press, 1986.

[11] BARROSO. Luis Roberto. http://www.plataformademocratica.org/Publicacoes/12685_Cached.pdf

[12] ARANTES, Rogério Bastos. Judiciário entre a Política e a Justiça. In: AVELAR, Lúcia, CINTRA, Antônio Octávio (Org.). Sistema Político Brasileiro: uma introdução. Editora Unesp, São Paulo, 2007.p. 81-116.

[13] RAWLS, John. O liberalismo político. 2. ed. São Paulo: Ática, 2000. 

[14] RAWLS, Justiça e democracia. São Paulo: Martins Fontes, 2000b 

[15] HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms: contributions to a discourse Theory of Law and Democracy. Translated by W. Regh. Cambridge: MIT Press, 1996. 

[16] GARAPON, Antoine. O juiz e a democracia: o guardião das promessas. Trad. Maria Luiza de Carvalho, Rio de Janeiro: Revan, 1999.

[17] DWORKIN, Ronald. O império do direito. Tradução de: Jefferson Luiz Camargo. São Paulo: Martins Fontes, 2003.  

[18] Voto do Min. Gilmar Ferreira Mendes no julgamento da ADI nº 3.510 – Plenário do STF sessão de julgamento em 29/05/2008. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2008-mai-31/leia_voto_gilmar_mendes_pesquisas_celulas-tronco?pagina=2>. Acesso em 12/11/2014.

[19] WALDRON, Jeremy. A dignidade da Legislação. Tradução Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

[20] Ao comparar o juiz ao semideus Hércules, pretende o autor conferir às decisões os adjetivos de certeza, segurança, justiça e moralidade, prolatada como “respostas certas”, mesmo nos casos de difícil resolução.

[21] DWORKIN, Ronald (1999). O império do direito. Tradução de Jefferson Luiz Camargo. São Paulo: Martins Fontes.

[22] WALDRON, Jeremy. A dignidade da Legislação. Tradução Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, p. 1, 2003.

[23] WALDRON, Jeremy. A dignidade da Legislação. Tradução Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, p. 3, 2003.

[24] WALDRON, Jeremy. A dignidade da Legislação. Tradução Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, p. 41, 2003.

[25] BATEUP, Christine. The dialogic promise: assessing the normative potential of theories of constitucional dialogue. In: Brooklyn Law Review, v 71, 2006.

[26] SUNSTEIN, Cass R. A. Constitution of many minds

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