O intervalo da trabalhadora mulher

03/09/2015 às 22:16
Leia nesta página:

Trata do artigo 384 da CLT, sua recepção constitucional e posição da jurisprudência do TRT/4a Região.

Determina o artigo 384 da CLT a concessão de 15 minutos prévios à prorrogação da jornada da trabalhadora mulher, entretanto este direito não é de conhecimento das trabalhadoras, não sendo arriscado afirmar que a maioria nem sequer desconfia da existência deste tipo de intervalo.

DO DISPOSITIVO LEGAL

Vejamos o texto legal, conforme Capítulo III – Da Proteção do Trabalho da Mulher inserto da CLT:

"Art. 384 - Em caso de prorrogação do horário normal, será obrigatório um descanso de 15 (quinze) minutos no mínimo, antes do início do período extraordinário do trabalho."

Este tipo de intervalo, denominado intervalo da mulher, não é direito extensível ao homem, sendo parte da tutela especial destinada única e exclusivamente à trabalhadora mulher. Não por acaso encontra-se no Capítulo que trata da Proteção do Trabalho da Mulher, sendo parte da redação original da CLT.

Todavia sabemos que toda regra tem também exceção. A consulta ao artigo 413, parágrafo único da CLT nos ensina que o intervalo de 15 minutos antes da prorrogação de jornada é também aplicável aos trabalhadores menores de idade. Portanto, pode-se afirmar que se aplica aos trabalhadores, porém somente aos menores de 18 anos.

DA RECEPÇÃO CONSTITUCIONAL

Com a promulgação da Constituição Federal em 1988 restou expressamente declarada a igualdade entre homens e mulheres em direitos e obrigações, dentre os direitos e garantias fundamentais, nos termos do inciso I do artigo 5º. Vale transcrever o dispositivo constitucional: 

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

I -  homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição; (...)”

A tutela especial do trabalho da mulher é realização do princípio constitucional da igualdade, pois concedendo intervalo diferenciado à mulher, trata de forma desigual a quem é de fato social e fisiologicamente desigual.

Não se pode desconsiderar a realidade da dupla jornada realizada pela mulher, onde ao final da oferta de sua mão de obra ainda tem que cumprir nova jornada em casa, sabidamente subvalorizada.

Muito se discutiu a respeito da recepção constitucional ou não do intervalo da mulher disposto no artigo 384 da CLT. Recentemente restou solucionada a controvérsia através do julgamento do RE nº 658312 pelo Supremo Tribunal Federal, com expressa declaração de recepção constitucional, bem como sua aplicação a todas as trabalhadoras mulheres, com repercussão geral.

NORMAS COLETIVAS

A redação do artigo 384 da CLT é expressa ao determinar que o intervalo à mulher deve ser de, no mínimo, 15 minutos. Portanto não há qualquer impedimento para que na esfera coletiva possa ser ampliado o tempo de intervalo, independente da via de negociação coletiva escolhida. Em benefício do trabalhador, deve ser sempre observada a autonomia coletiva.

Todavia o oposto não é possível, pois não se pode utilizar Acordo, Convenção ou Dissídio Coletivo para diminuir ou suprimir direitos do trabalhador. É neste sentido que se apresenta a OJ nº. 342, item I da SDI-1 do TST. O ordenamento processual apresenta remédio para a irregularidade, cabendo a distribuição de Ação Anulatória para anular a cláusula ou norma coletiva prejudicial.

NATUREZA JURÍDICA

A natureza jurídica do intervalo da mulher é também controversa, sendo comum a tese do trabalhador quanto à natureza remuneratória, assim como patronal a tese de sua natureza indenizatória.

Tendo natureza indenizatória, se trataria a supressão do intervalo como mera infração administrativa, sendo resolvido através do pagamento de correspondente indenização.

Entretanto, em sentido oposto, tratando-se de 15 minutos suprimidos de intervalo, devem seguir o mesmo caminho dos intervalos intrajornadas, que possui natureza remuneratória declarada pelo item III da Súmula nº. 437 do TST, sendo este o entendimento majoritário. Consequentemente deve o intervalo suprimido integrar as demais parcelas remuneratórias.

JURISPRUDÊNCIA REGIONAL

Ainda que pouco questionada a matéria perante o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, demonstrativamente, se apresenta a Corte Regional como tendo posição majoritária tanto a respeito da necessidade de concessão do intervalo da mulher, quanto a possuir natureza remuneratória.

Tanto é assim que resta pacificada a questão no âmbito regional através da edição da Súmula nº. 65 do TRT/4ª Região. Vale transcrever:

"Súmula nº 65 - INTERVALO DO ART. 384 DA CLT. A regra do art. 384 da CLT foi recepcionada pela Constituição, sendo aplicável à mulher, observado, em caso de descumprimento, o previsto no art. 71, § 4º, da CLT."

Ao declarar a recepção constitucional e a aplicação das penalidades do artigo 71, §4º da CLT encontra-se superada qualquer discussão em sentido oposto à natureza salarial do intervalo da mulher.

CONCLUSÃO

Ainda que o intervalo da trabalhadora mulher de 15 minutos anteriores à prorrogação da jornada não seja concedido, não sendo objeto da atenção sindical, ainda persiste sua inserção no ordenamento jurídico pátrio.

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Neste mesmo sentido se apresenta a jurisprudência, inclusive no âmbito da 4ª Região, com atenção tão especial que ensejou a edição de súmula específica sobre a matéria. A postulação deste direito é obrigação dos operadores do direito, bem como a difusão da informação através das mais variadas formas.

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Sobre o autor
Gabriel Núñez

Advogado formado em Ciências Jurídicas e Sociais pela UFRGS e Pós-Graduado Especialista em Direito do Trabalho pelo PPGD/UFRGS. Professor de Direito Processual do Trabalho no SEPBOOK (www.sepbook.com.br).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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