Os honorários devidos ao advogado e à Defensoria Pública na sucumbência recíproca (parcial) antes e depois do CPC de 2015

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5. OS HONORÁRIOS NA SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA(PARCIAL) NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015 ANTE O DEFERIMENTO DE GRATUIDADE DE JUSTIÇA

Na linha das diretrizes jurídicas acima explanadas, o novel Código de Processo Civil no parágrafo quatorze de seu artigo 85, de uma só vez, declara a titularidade por parte do advogado dos honorários e sua natureza alimentar, bem como estabelece, a partir de tais premissas e de forma diametralmente oposta ao art. 21 do atual CPC, a vedação à compensação quando houver sucumbência parcial, que é a outra denominação para a sucumbência recíproca:

Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.

(...)

§ 14. Os honorários constituem direito do advogado e têm natureza alimentar, com os mesmos privilégios dos créditos oriundos da legislação do trabalho, sendo vedada a compensação em caso de sucumbência parcial.

Desse modo, vale repisar, o Código de Processo Civil de 2015 estabeleceu regra coerente com as disposições de nosso Código Civil concernentes à compensação de dívidas, de modo que os honorários decorrentes de sucumbência recíproca incontestavelmente devem ser fixados quer aos advogados das partes, quer a instituição de defesa de direitos que tenha oficiado, pois está expresso (tal como já ocorria no art. 23 da Lei nº 8.906) que o titular do direito é o advogado, o que por analogia deve também ser estendido às entidades de assistência jurídica (públicas e privadas), principalmente ante o disposto no art. 4º, XXI, da LC nº 80 e no art. 134 da Constituição da República.

Além disso, o novo CPC alinhou a regência dos honorários devidos especificamente a advogado na sucumbência recíproca à regra da impenhorabilidade das verbas alimentares prevista também em tal código (art. 833, IV), já consagrada no art. 649, IV, do atual CPC, como anteriormente destacado:

Art. 833. São impenhoráveis:

(...)

IV - os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as remunerações, os proventos de aposentadoria, as pensões, os pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, ressalvado o § 2º;

Vale destacar também que, apesar de não haver norma, no art. 98 do CPC de 2015, que explicite que o benefício da gratuidade de justiça impede a compensação dos honorários em caso de sucumbência recíproca, tal dispositivo acarretou a mesma conseqüência. É que, somado ao artigo 85 que vedou a compensação de verbas honorárias, o artigo 98 deste código suspende em seu parágrafo terceiro os honorários devidos pelo titular de tal benefício enquanto permanecer o estado de hipossuficiência econômica, a deixar claro que a verba não está vencida:

Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei.

(...)

§ 2º A concessão de gratuidade não afasta a responsabilidade do beneficiário pelas despesas processuais e pelos honorários advocatícios decorrentes de sua sucumbência.

§ 3º Vencido o beneficiário, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos 5 (cinco) anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário.

É de se destacar por fim que o novel Código de Processo Civil, no parágrafo terceiro do dispositivo acima citado, aperfeiçoou a dicção da norma contida no art. 12 da Lei nº 1.060, de 1950, inclusive explicitando a natureza jurídica de condição suspensiva do benefício.


6. CONCLUSÃO

Em face da interpretação literal que advém das disposições do art. 21 do CPC de 1973, têm nossos tribunais, em sua maioria, sobretudo com fulcro na Súmula nº 306 do STJ, determinado a compensação entre os honorários devidos ao representante judicial de quem goza de gratuidade de justiça e aqueles a que tem direito o representante da parte que não usufrui de tal benefício, nos casos de sucumbência recíproca.

Ocorre, contudo, que os requisitos para compensação, previstos no art. 369 do Código Civil brasileiro, não se mostram presentes em tal situação. Primeiramente, porque as figuras dos credores e devedores não coincidem. Por outro lado, uma das verbas honorárias não se mostra vencida, o que impede sua compensação com a outra, já vencida. Especificamente, em relação aos advogados, também não é possível a compensação ao termos em conta o art. 373 do Código Civil conjugado com art. 649, IV, do CPC de 1973 e o art. 23 do Estatuto da Advocacia, que respectivamente estabelecem se tratar de valor impenhorável e de verba alimentar. Ademais, em relação à Defensoria Pública brasileira, é indevida a compensação da verba honorária que lhe é devida (art. 4º, XXI, da LC 80, de 1994), pois, além das duas primeiras razões acima explicitada neste parágrafo, trata-se de verba indisponível e, portanto, infungível, à luz do princípio da indisponibilidade do interesse público, que obviamente impõe que não se pode trocar a execução de honorários em face de quem pode pagá-los por uma execução, sob condição suspensiva, em face de quem comprovou para a referida Instituição insuficiência de recursos e teve deferida a gratuidade de justiça pelo Judiciário.

Neste contexto, forçoso, portanto, é concluir que, ao contrário do que tem feito nossos tribunais, o art. 21 do CPC de 1973 precisa de uma interpretação sistemática com para que suas disposições sejam adequadamente aplicadas nos casos em que um dos sucumbentes é beneficiário de gratuidade de justiça, ante o que determina do Código Civil, o Estatuto da Advocacia, a Lei Complementar nº 80, de 1994, e o próprio CPC de 1973.

Diante disso, vê-se que o Código de Processo Civil de 2015 inovou ao vedar a compensação de honorários na sucumbência recíproca, como regra geral (art. 85, § 14), mas não o fez para a sucumbência de tal natureza entre beneficiário de gratuidade de justiça e não beneficiário, pois a compensação já é vedada pela interpretação sistemática do art. 21 do CPC com as referidas normas.

Nesses termos, há de ser, portanto, adequado o enunciado da Súmula nº 306 do Superior Tribunal de Justiça, para explicitar a situação antes e depois do CPC de 2015, em ambos os casos vedando a compensação de honorários em caso de sucumbência recíproca (denominada também de parcial) quando pelo menos uma das partes é beneficiária de gratuidade de justiça.


REFERÊNCIAS

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Sobre o autor
Paulo Rogério Cirino de Oliveira

Defensor Público Federal desde 2008, com atuação nas unidades da Defensoria Pública da União em Maceió-AL e Brasília-DF, nas quais exerceu as funções de defensor público-chefe, defensor público-chefe substituto e coordenador dos ofícios cíveis; membro titular do Comitê Distrital de Enfrentamento ao Tráfico de Seres Humanos; bacharel em Direito pelo Centro Universitário de Brasília/UniCEUB; especialista em Direito Público pelo Centro Educacional Fortium/Faculdade Projeção; especializando em Direito Administrativo pela Universidade Anhanguera-Uniderp; ex-técnico judiciário do Supremo Tribunal Federal, onde compôs os gabinetes dos Ministros Marco Aurélio, Carlos Velloso e Ricardo Lewandowski; ex-analista processual do Ministério Público da União, com lotação nos gabinetes dos subprocuradores-gerais da República Lindôra Maria Araújo, Wallace de Oliveira Bastos e Rodrigo Janot Monteiro de Barros e na Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, no mandato da Dra. Ella Wieco Volkmer de Castilho.

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