A comprovação do desinteresse dos licitantes na modalidade de licitação carta-convite

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Este artigo aborda a modalidade de licitação carta convite, uma das mais utilizadas pelos municípios brasileiros para contratações de pequeno porte, na qual participam, no mínimo, três licitantes, cadastrados ou não, pela Administração Pública.

Resumo: Este artigo aborda a modalidade de licitação carta convite, uma das mais utilizadas pelos municípios brasileiros para contratações de pequeno porte, na qual participam, no mínimo, três licitantes, cadastrados ou não, pela Administração Pública. Vários questionamentos têm surgido ao longo dos anos quanto à necessidade da comprovação do desinteresse dos licitantes convidados que, ao não enviarem suas propostas à administração, frustram de certa forma o certame gerando assim insegurança na contratação ou dúvidas quanto à necessidade de repetição de todo o procedimento licitatório pela Administração Pública. Dessa forma, o presente estudo, por meio da legislação, doutrina e jurisprudência apresentadas avaliará se é possível à Administração Pública realizar a licitação pela modalidade convite mesmo que o número necessário de convidados não tenha sido obtido, bem como as alternativas cabíveis para a concretização do certame sem a necessidade de repetição do deste. Analisar-se-á ainda de forma mais detalhada os §3º e §7º do artigo 22 da Lei n.º 8.666/93, principalmente quanto à possibilidade de se continuar o procedimento licitatório na modalidade convite, em caso de comparecimento de licitantes em numero inferior ao mínimo exigido pela lei em face do desinteresse dos demais, bem como os procedimentos necessários que devem ser tomados pela Administração, necessários para a validade de todo o procedimento.

Palavras-chave: Licitação. Convite. Licitantes. Desinteresse. Contratação.


1. INTRODUÇÃO

A Administração Pública necessita de bens e serviços para a realização de seus objetivos, sendo obrigada assim, a celebrar contratos com terceiros para a realização de obras, prestação de serviços e fornecimento de bens entre outros.

Para que não houvesse desvios de verbas públicas em tais contratações, foi criado pelo legislador, um conjunto de regras jurídicas estabelecendo critérios que devem ser observados pela administração no processo de escolha das pessoas a serem contratadas, para que não ocorra margem para má contratação e, consequentemente prejuízo ao erário.

Tema de grande relevância no âmbito da Administração Pública, instituto da licitação consagrado na Constituição da República de 1988, e materializado pela Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, é o meio utilizado no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios para a obtenção da proposta mais vantajosa para a Administração em suas contratações com os particulares.

Neste diapasão, este artigo abordará mais pormenorizadamente o inciso V do artigo 24 da Lei de Licitações, e sua aplicação à modalidade convite, em que serão analisados o eventual desinteresse dos licitantes convidados, e a omissão destes na apresentação de propostas no certame e suas implicações legais.

Examinar-se-á ainda, os §§ 3º e 7º do art. 22, que tratam respectivamente da obrigatoriedade da Administração convidar o mínimo de três licitantes na modalidade estudada, bem como da necessidade do ente público justificar a não obtenção do número necessário de convidados, seja em face da limitação de mercado ou manifesto desinteresse dos convidados para a validação de todo o procedimento.

Após análise das normas pertinentes à licitação, do posicionamento da doutrina e da jurisprudência pátrias, serão apresentadas sugestões para que a Administração Pública não incorra em crimes previstos na Lei nº 8.666 /93, com a realização de contratação direta quando na verdade teria o dever legal de licitar.


2. LICITAÇÃO NO BRASIL

No Brasil, as licitações públicas surgiram, basicamente, com a edição do Decreto nº. 2.926, de 14 de maio de 1862, que visava a normatização das arrematações dos serviços a cargo do então Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas.

Posteriormente, surgiram outras legislações tratando do assunto, das quais convém ressaltar o Decreto nº 4.536, de 28 de janeiro de 1922 que criou o Código da Contabilidade da União, ou Código de Contabilidade Pública, consolidando toda a legislação sobre o assunto, e para o qual a licitação equivalia à concorrência.

Em pleno regime militar, a licitação foi disciplinada pelo Decreto-Lei nº. 200, de 25 de fevereiro de 1967.

Já em 1986, foi promulgado o Decreto-Lei 2.300/86, que aprimorou o instituto da licitação, deixando ainda lacunas que só viriam a ser supridas com a edição da Lei 8.666/93, mais conhecida como “Lei de Licitações e Contratos Administrativos”.

A licitação, tal qual a conhecemos nos dias atuais, está prevista no artigo 37, XXI da CF/88 e regulamentada pela Lei 8.666/93 e suas alterações.

Temos ainda legislações mais recentes como a Lei 10.520, de 17 de julho de 2002, que trata precipuamente da modalidade de licitação denominada pregão. E a Lei 12.462, de 04 de agosto de 2011 que institui o Regime Diferenciado de Contratações Públicas – RDC.

Assim, diante da normatização atual, ficaram sujeitas à licitação, basicamente as pessoas jurídicas de direito público previstas no artigo 22, XXVII da Constituição Federal, como os entes da Administração Direta, União, Estados, Distrito Federal e Municípios, e aqueles da Administração Indireta como as Autarquias, Empresas Públicas, Sociedades de Economia Mista e Fundações Públicas.


3. CONCEITO DE LICITAÇÃO

O Segundo Acquaviva (2010, p. 530), termo licitação vem do “latim licitatione, licitatio, que significa venda por lances”.

A própria Lei n.º 8.666/93 criou um conceito de licitação no caput do art. 3º:

A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos. (Redação dada pela Lei nº 12.349, de 2010).

Na doutrina, Meirelles (2006, p. 271-272), conceitua licitação como sendo o “procedimento administrativo mediante o qual a Administração Pública seleciona a proposta mais vantajosa para o contrato de seu interesse”.

Para Maria Sylvia Zanella Di Pietro:

Trata-se de procedimento administrativo pelo qual um ente público, no exercício da função administrativa, abre a todos os interessados, que se sujeitam às condições fixadas no instrumento convocatório, a possibilidade de formularem propostas dentre as quais selecionará e aceitará a mais conveniente para a celebração do contrato. (DI PIETRO, 2008, p. 331).

Ante os conceitos apresentados, é possível entender a licitação como um procedimento prévio previsto em lei que é realizado pela Administração Pública visando sempre a obtenção da proposta que lhe seja mais vantajosa, e que garante a igualdade de condições entre os particulares interessados em com ela contratar.


4. PRINCÍPIOS APLICADOS À LICITAÇÃO PÚBLICA

A ideia de princípios jurídicos sugere um sistema primário de normas, de onde todas as demais normas derivam. É o começo, o ponto de partida, a pedra angular de qualquer conjunto normativo.

Para Silva (2001, p. 639), “princípios, no plural, significam as normas elementares ou os requisitos primordiais instituídos como base, como alicerce de alguma coisa”.

Miguel Reale afirma que princípios são:

[...] verdades fundantes de um sistema de conhecimento, como tais admitidas, por serem evidentes ou por terem sido comprovadas, mas também por motivos de ordem prática de caráter operacional, isto é, como pressupostos exigidos pelas necessidades da pesquisa e da práxis. (REALE, 1980, p. 299).

Pode-se então afirmar que os princípios constituem verdadeiras premissas lógicas, sendo os fundamentos do sistema jurídico vigente, repousando neles a essência de uma ordem, seus preceitos essenciais e orientadores de todo o sistema. Assim, todas as normas jurídicas que lhe forem posteriores têm de estar em perfeita sintonia com suas diretrizes.

Os princípios do direito administrativo são tão relevantes para o instituto da licitação que receberam destaque especial no corpo da própria Lei n.º 8.666/93:

Art. 3º (...) processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhe são correlatos.

Entretanto, mesmo constituindo os princípios citados diretrizes essenciais que norteiam todo o instituto da licitação pública e compreendendo que a observância de tais princípios são indissociáveis do procedimento licitatório, o estudo pormenorizado dos mesmos não é relevante para o deslinde deste trabalho, motivo pelo qual não serão abordados.


5. DO DEVER GERAL DE LICITAR E AS EXCEÇÕES PREVISTAS NA LEI 8.666/93

Vimos que a licitação no Brasil tem previsão na própria Constituição da República, constituindo sua maior característica aquela que a representa, não como uma obrigação, mas como um dever do ente público. Deste modo, a licitação tem um sentido de regra de ação que não pode ser descumprida pela administração, salvo de forma justificada, nos casos que a lei permitir.

Di Pietro ensina que:

Estão assim obrigados à licitação todos os órgãos da Administração Pública direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios. (DI PIETRO, 2008, p. 343).

Portanto, o dever de licitar materializado na CF/88 e na Lei 8.666/93 é aquele que constrange a Administração Pública como preceito padrão, a obrigação de definir quem vai com ela contratar mediante um procedimento anterior ao próprio contrato, formalmente definido e previamente divulgado, nos termos traçados pelas normas de licitação.

Entretanto, como será visto adiante, este dever não se constitui em dever incontestável, haja vista que a licitação não é regra obrigatória em todas as situações, permitindo a lei, em alguns casos, a contratação direta.

Como exceção ao dever geral de licitar examinar-se-á inicialmente neste trabalho aquela prevista no inciso V do art. 24. da Lei n.º 8.666/93:

Art. 24. É dispensável a licitação:

V. quando não acudirem interessados à licitação anterior e esta, justificadamente, não puder ser repetida sem prejuízo para a Administração, mantidas, neste caso, todas as condições preestabelecidas.

Para Meireles (2008, p. 280), “o simples desinteresse pela licitação anterior é também motivo para a contratação direta, mantidas as condições preestabelecidas no edital ou no convite”.

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Entretanto, para Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2008, p. 350), “o dispositivo legal atendendo ao princípio da motivação, exige que seja justificada a impossibilidade de repetir a licitação sem prejuízo para a Administração”.

Pela exegese do referido dispositivo, é possível entender que ele autoriza expressamente a administração realizar determinada contratação sem o devido processo licitatório em razão de desinteresse dos licitantes. Mas, para tanto, é necessário o fracasso da licitação anterior, que fique caracterizado o risco a pessoas e bens, e que a contratação direta somente seja realizada para eliminar tal situação.

Para Edmir Araújo Netto:

O não comparecimento de licitantes regularmente convocados configura o que se denomina licitação deserta. Não se confunde esta hipótese, portanto, com a assim chamada licitação fracassada: nesta ocorre o comparecimento de licitantes que apresentam propostas, mas a Comissão não habilita nenhum deles ou não classifica nenhuma delas, por motivos jurídicos, técnicos ou financeiros, não propiciando a dispensa para o mesmo objeto com este fundamento. (ARAÚJO, 2010, p. 566).

Nosso estudo tem relação com a licitação deserta descrita acima, a qual ocorre quando a administração, tomando todas as providências cabíveis, procede regularmente ao convite do número mínimo previsto para a modalidade convite, mas ao certame, não comparece nenhum proponente interessado.

Conforme bem explicado acima, não há como se confundir a licitação deserta, fracassada e frustrada. Na licitação fracassada, nenhum dos participantes é selecionado por não atender aos requisitos do edital, ficando, portanto inabilitados e, abrindo-se o prazo previsto em lei, permanecem as causas que deram margem às respectivas inabilitações. Na licitação frustrada, ocorre o comparecimento de licitantes bem como os mesmo podem até estar habilitados. Entretanto, as propostas apresentadas pelos mesmos extrapolam a verba prevista para aquela contratação em um percentual superior a 10% (dez por cento) do valor da pesquisa efetuada. Já na licitação deserta, os licitantes são devidamente convocados, mas simplesmente por desinteresse, deixam de comparecer, ocasionando assim o insucesso do procedimento licitatório.


6. MODALIDADES DE LICITAÇÃO

A Lei n.º 8.666/93 prescreve, em seu art. 22, cinco modalidades de licitação, que são a concorrência, a tomada de preços, o convite, o concurso e o leilão. Existe ainda a modalidade denominada pregão regida pela lei n.º 10.520 de 17/07/2002, e a nova modalidade prevista na Lei 12.462, de 04 de agosto de 2011 que instituiu o Regime Diferenciado de Contratações Públicas – RDC, basicamente voltado para as obras da Copa das Confederações, Copa do Mundo e Olimpíadas realizadas no Brasil..

Não obstante a importância de todas as modalidades, abordar-se-á apenas alguns aspectos da modalidade de licitação convite, mais relevantes ao objeto de estudo deste trabalho.

6.1. DO CONVITE

A modalidade de licitação denominada convite é definida na própria Lei n.º 8.666/93 no §3º do artigo 22:

Convite é a modalidade de licitação entre interessados do ramo pertinente ao seu objeto, cadastrados ou não, escolhidos e convidados em número mínimo de 03 (três) pela unidade administrativa, a qual afixará, em local apropriado, cópia do instrumento convocatório e o estenderá aos demais cadastrados na correspondente especialidade que manifestarem seu interesse com antecedência de até 24 (vinte e quatro) horas da apresentação das propostas.

O convite é a modalidade de licitação utilizada para a aquisição de materiais e serviços até o limite de R$ 80.000,00 (oitenta mil reais), e para a execução de obras e serviços de engenharia até o valor de R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais).

Para Carlos Pinto Coelho Motta (2004, p. 382), “a modalidade convite é a mais simples de todas sendo utilizada para contratações de valores modestos, dispensando inclusive a publicação do instrumento convocatório em órgão da imprensa”.

O § 7º do art. 22. da Lei 8.666/93 determina:

Quando, por limitações do mercado ou manifesto desinteresse dos convidados, for impossível a obtenção do número mínimo de licitantes exigidos no § 3º deste artigo, essas circunstâncias deverão ser devidamente justificadas no processo, sob pena de repetição do convite.

Celso Antônio Bandeira de Mello concorda com o dispositivo legal do § 7º do art. 22:

Mesmo que não se atinja o número mínimo de três licitantes, por limitações de mercado ou desinteresse dos convidados, o certame pode ser realizado, desde que tais circunstâncias sejam justificadas no processo. (MELLO, 2004, p. 515).

O Tribunal de Contas da União decidiu de forma diferente no sentido de que, “não se deve adjudicar licitação na modalidade convite com menos de três propostas válidas por item licitado, para não ferir o disposto no art. 22, § 7º, da Lei n.º 8.666, de 1993”. (BRASIL, TCU, Decisão 472/1999. Plenário).

Para o TCU, caso não haja no mínimo três propostas válidas, o convite deve ser repetido obrigatoriamente.

Entretanto, para a professora Maria Sylvia Zanella Di Pietro:

Essa orientação há de ser entendida em termos que a tornem compatível com o Art. 22. § 7º da referida lei de licitações. Isso que dizer que, o simples fato de se apresentarem menos de três interessados não é suficiente, por si só, para determinar a repetição do convite. Pelo contrário, será possível prosseguir-se na licitação se ficar demonstrado o manifesto desinteresse dos licitantes convidados. (DI PIETRO, 2008, p. 365).

Já o Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina adota postura mais branda e, conforme se extrai de trecho do prejulgado n.º 332:

É admissível a adjudicação do objeto licitado ao único interessado entre os convidados na modalidade de licitação Convite, desde que, por limitações do mercado ou manifesto desinteresse dos convidados, for impossível a obtenção do número mínimo de licitantes exigidos no § 3º do artigo 22 da Lei Federal n.º 8.666/93, sendo que essas circunstâncias deverão ser devidamente justificadas no processo, sob pena de repetição do convite, nos termos do § 7º do artigo 22 da Lei Federal n.º 8.666/93. (TCE-SC, Prejulgado n.º 332).

Ou seja, o TCE-SC admite a hipótese de validade do procedimento do convite, mesmo que não sejam apresentadas três propostas válidas, exigindo, porém que o desinteresse dos convidados ou as limitações de mercado sejam devidamente justificados.

Na modalidade de licitação convite, ou carta-convite, é a Administração Pública quem realiza a escolha dos licitantes que participarão do certame, estejam eles cadastrados ou não no órgão de licitações do ente público.

Conforme ensina Justen Filho essa faculdade de escolha deve ser exercida com cautela:

A faculdade de escolha pela Administração dos destinatários do convite deve ser exercida com cautela, diante dos riscos de ofensa à moralidade e à isonomia. Se a Administração escolher ou excluir determinados licitantes por preferências meramente subjetivas, estará caracterizando desvio de finalidade e o ato terá de ser invalidado. (JUSTEN FILHO, 2004, p. 200-201).

Entretanto, para evitar abusos e paternalismo por parte da Administração, a lei prevê que, mesmo que determinado particular não tenha sido convidado, o mesmo, caso se interesse, pode participar do Convite, desde que solicite seu cadastramento junto à Administração Pública licitante, devendo ainda manifestar o seu interesse no certame com antecedência de até 24 (vinte e quatro) horas antes da apresentação das propostas.

Tal dispositivo com certeza visa evitar que os procedimentos do convite, exatamente pela fragilidade de todo o sistema, sejam mais facilmente fraudados e manipulados, frustrando assim o caráter de competitividade do instituto da licitação.


7. O DESINTERESSE DOS LICITANTES E A SUA COMPROVAÇÃO

O objetivo central deste trabalho remete especificamente à possibilidade de se continuar o procedimento do convite em caso de comparecimento de numero inferior aos três licitantes anteriormente convidados em face do desinteresse dos demais.

Na vigência do Decreto-lei 2.300/86 o TCU, entendia ser “necessária a repetição do convite sempre que não comparecessem ao menos três licitantes”. (TCU. Decisão n. 56/92).

A Lei 8.666/93, que revogou o Decreto 2.300/86, criou duas situações em que, mesmo sem o comparecimento do número mínimo de licitantes, é possível a contratação pela Administração. A primeira refere-se às limitações de mercado em que não se tenha, em determinada localidade, interessados suficientes que possibilitem à obtenção do número mínimo de três licitantes no certame. A segunda é aquela em que por razões desconhecidas, não haja licitantes interessados em participar do certame. Nestes casos, como largamente exposto, torna-se obrigatória a justificativa do acontecido pela Administração, a fim que se possa prosseguir com a licitação com número de licitantes inferior ao mínimo legal.

O Tribunal de Contas da União sumulou o seguinte:

SÚMULA 248 – Não se obtendo o número legal mínimo de três propostas aptas à seleção, na licitação sob a modalidade Convite, impõe-se a repetição do ato, com a convocação de outros possíveis interessados, ressalvadas as hipóteses previstas no parágrafo 7º, do artigo 22, da Lei 8.666/93. (BRASIL, TCU. Acórdão n. 1.290/2005).

Note-se que, é apresentada a locução "três propostas aptas à seleção" e não "três licitantes" como alude o § 3º do art. 22. da Lei 8.666/93. Entretanto, a mesma súmula ressalva as hipóteses previstas no parágrafo 7º do artigo 22 da Lei 8.666/93. Não obstante o TCU ter sumulado tal exigência, convém ressaltar que tal imposição não consta na Lei 8.666/93.

Analisados os § 3º e § 7º do artigo 22 da lei 8.666/93 percebe que: Para a validade do certame, em primeiro lugar, a Administração terá de convidar um número mínimo de três interessados (§ 3º do art. 22); em segundo lugar, caso se configure a hipótese de limitação de mercado ou mesmo o desinteresse dos licitantes, pode a Administração convidar um número inferior de interessados (§ 7º do art. 22), ou seja, um número de licitantes inferior aos três estatuídos no § 3º do art. 22; em terceiro lugar, para realizar a convocação de numero inferior a Administração deve obrigatoriamente motivar sua decisão, embasada exatamente nas duas hipóteses acima descritas, quais sejam, a limitação de mercado ou desinteresse dos convidados, implicando a ausência de tal justificativa na obrigatoriedade de repetição do convite.

Segundo parecer do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais:

Deve o administrador demonstrar as razões de seu convencimento sobre a limitação do mercado ou o desinteresse dos licitantes, de forma clara, objetiva e documentada, sempre que possível. A preocupação do administrador em realizar o interesse público deve sempre ser equivalente à de comprovar seus atos. Com frequência, os órgãos de controle examinam os fatos somente após o decurso de um razoável período de sua realização, oportunidade em que, muitas vezes, o agente nem mais está vinculado à Administração e, ao ser citado, encontrará dificuldades extremas em arcar com o ônus da prova de suas alegações. Não obrigatório, mas aconselhável, é que essa justificativa, por analogia com o disposto no art. 26, caracterize e, se possível, demonstre a limitação do mercado (declaração da junta comercial, do sindicato da cidade ou outro meio adequado e idôneo para comprovar ou servir de ‘início de prova’, sendo aceitável até, por exemplo, cópia da página do catálogo telefônico comercial) ou documento que comprove o desinteresse dos licitantes (carta abdicando de participar da licitação, [...] ou simplesmente a juntada de cópia dos comprovantes de entrega dos convites); razão da escolha do fornecedor ou executante (sendo mais de um, deverá haver julgamento, na forma preconizada no próprio convite) e, principalmente, a justificativa do preço [...]. (TCE-MG. CONSULTA N. 862.126. RELATOR: CONSELHEIRO SEBASTIÃO HELVECIO). Grifo Nosso.

O Tribunal Regional Federal da Terceira Região se posicionou da seguinte forma:

ADMINISTRATIVO - LICITAÇÃO - CARTA-CONVITE - REPETIÇÃO DO ATO - POSSIBILIDADE. Na licitação - modalidade convite - não se alcançando o número mínimo de licitantes, é facultado à Administração a repetição do ato, desde que pautada nos princípios da legalidade, da impessoalidade e da moralidade. A Lei 8.666/93, que trata das licitações e dos contratos da Administração Pública, estabelece que, quando, por limitações do mercado ou manifesto desinteresse dos convidados, for impossível a obtenção do número mínimo de licitantes, essas circunstâncias deverão ser devidamente justificadas no processo, sob pena de repetição do convite. No caso, o segundo certame obteve 3 novas propostas, indicando a existência de competitividade, objetivo buscado pela Administração ao abrir novo edital. Apelação não provida.

(TRF-3 - AMS: 33799 SP 0033799-09.2004.4.03.6100, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL NERY JUNIOR, Data de Julgamento: 20/06/2013, TERCEIRA TURMA). (BRASIL, TRF-3, 2013). Grifo Nosso.

O Superior Tribunal de Justiça se posicionou de forma semelhante:

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AGRAVO REGIMENTAL. IRREGULARIDADES NO PROCEDIMENTO LICITATÓRIO. SANÇÃO DE MULTA. MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. O Tribunal de origem consignou "o que houve foi a inobservância de regras procedimentais (ausência de renovação do convite em razão de não ter sido atingido o número mínimo de três licitantes pela inabilitação de uma das interessadas) e ausência de justificação técnica para a aquisição do bem nos moldes em que foi descrito no edital. Tendo em conta esses fatos, afigura-se proporcional e razoável o pedido dos apelantes para que seja mantida apenas de multa, fixada 10 subsídios mensais de prefeito para o réu Vicente Solda e em 05 remunerações mensais para os demais réus. A cominação isolada da pena de multa revela-se adequada à gravidade da conduta e ao dano dela decorrente." 2. Modificar a conclusão a que chegou a Corte de origem, de modo a acolher a tese do recorrente, demanda reexame do acervo fático-probatório dos autos, o que é inviável em Recurso Especial, sob pena de violação da Súmula 7/STJ. 3. O acórdão recorrido está em sintonia com o atual entendimento deste Tribunal Superior, razão pela qual não merece prosperar a irresignação. Incide, in casu, o princípio estabelecido na Súmula 83/STJ. 5. Agravo Regimental não provido.

(STJ, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 27/05/2014, SEGUNDA TURMA). (BRASIL, STJ, 2014). Grifo Nosso.

De acordo com o posicionamento de nossos tribunais, o desinteresse dos licitantes deve ser comprovado pela Administração a qual deve demonstrar cabalmente todas as razões que levaram ao prosseguimento do certame em face das hipóteses previstas no § 7º do artigo 22 da lei 8.666/93. Deve a Administração juntar ao processo de licitação, todos os documentos necessários à comprovação da limitação de mercado, ou do desinteresse dos convidados conforme descrito na consulta respondida pelo Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais.

Mesmo diante de súmula do TCU, pela simples leitura da Lei 8.666/93, é possível depreender que, em nenhum momento, o legislador determinou a necessidade de se obter número mínimo de três propostas válidas para que o certame fosse válido.

Dessa forma, é perfeitamente admissível a continuidade de procedimento licitatório na modalidade convite, desde que todo o procedimento seja devidamente justificado e instruído com documentos probantes das alegações de desinteresse dos licitantes convidados ou da existência de limitação de mercado.

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Sobre os autores
Geraldo Flávio Campos Lage

Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito de Ipatinga – FADIPA. É especialista em Direito Público pelo Instituto Aprobatum e ANAMAGES (Associação Nacional dos Magistrados Estaduais). MBA em Administração Pública e Gerência de Cidades pela UNINTER. Atuou na área de Contabilidade do Setor Público e de entidades do Terceiro Setor. Foi professor das disciplinas de Introdução ao Estudo do Direito e Contabilidade do Estado de Minas Gerais. Trabalhou na área Tributária e de Pessoal, exercendo também o cargo de Secretário Municipal de Saúde. Foi vereador por dois mandatos consecutivos e atualmente é servidor efetivo do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais.

Letiene Vanessa Lopes Laborne Lage

Letiene Vanessa Lopes Laborne Lage é Bacharel em Ciências Contábeis Pelo Centro Universitário do Leste de Minas Gerais - UNILESTE. Pós Graduada em Direito Público pelo Instituto Aprobatum e ANAMAGES (Associação Nacional dos Magistrados Estaduais). MBA em Administração Pública e Gerência de Cidades pela UNINTER. Foi Contadora de Órgãos Governamentais e Professora de Contabilidade e Economia do Estado de Minas Gerais. Servidora do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais desde o ano 2000 no cargo de Escrevente Judicial exerceu por várias vezes o cargo de Escrivã Judicial e Contadora Tesoureira Judicial em substituição no Tribunal.<br>

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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