Cobrança de honorários pelo cirurgião-dentista: o contrato como instrumento de gestão

06/10/2015 às 20:15
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A existência do Contrato de Prestação de Serviços é uma prova documental do valor e do serviço acordado, o que favorece a cobrança dos honorários devidos e não pagos e dispensa a produção de provas, como no caso de acordos verbais.

Na prática clínica o cirurgião-dentista pode se deparar com situações de atraso ou não pagamento das consultas e tratamentos prestados aos clientes, em particular nos casos de tratamentos longos, como nas especialidades de ortodontia e implantodontia, ou de custo elevado (reabilitações). Nestes casos, o contrato firmado entre as partes é um instrumento eficiente para propiciar uma cobrança célere.

Fundamentação Legal

Honorários correspondem à remuneração paga ao profissional liberal pelos serviços técnicos por ele prestados. O cirurgião-dentista recebe honorários como uma contraprestação econômica pelo serviço que presta ao paciente, pois entre profissional e paciente não existe vínculo de emprego.

No aspecto geral, o artigo 594 do Código Civil Brasileiro prescreve que “toda espécie de serviço e trabalho lícito pode ser contratado mediante remuneração”. Por sua vez, o Código de Defesa do Consumidor (CDC) contempla que o profissional tem a obrigação de informar o seu cliente e isto inclui as opções de tratamento pra o caso clínico e respectivos valores.

Sobre as bases legais, a ética odontológica recomenda por meio do seu Código que o profissional deve fixar o valor da consulta e dos procedimentos odontológicos, considerando fatores como as condições sócio-econômicas do paciente, o conceito do profissional, a complexidade do caso, o tempo do atendimento e os  custos operacionais da clínica. Ainda estabelece que o profissional deve comunicar previamente ao paciente os custos.

A melhor prática clínica recomenda, no seu aspecto ético-legal, que o cirurgião-dentista estabeleça com o paciente, antes do início do tratamento, um acordo por escrito sobre o valor dos honorários e a forma de pagamento destes, por meio de um contrato de prestação de serviços.

O Contrato como Ferramenta de Gestão

O Contrato de Prestação de Serviços deve contemplar a qualificação do profissional e do cliente (nome, RG, endereço completo), estabelecer as obrigações do profissional e do cliente para o desfecho da intervenção, estipular o valor dos honorários pela prestação de serviço, a forma de parcelamento, o índice de correção monetária ou juros (no caso de pagamento fora do prazo), com assinatura das partes.

Como uma ferramenta de gestão, este instrumento deve simplificar e não burocratizar a rotina administrativa da clínica. Neste sentido, pode ser apresentado na consulta inicial como um benefício ao cliente, pois demonstra responsabilidade e organização do profissional em relação ao tratamento, além de funcionar, conforme abordado, como um instrumento eficiente para cobrança judicial de honorários devidos e não pagos, conforme dispõe o artigo 275, letra f, do Código de Processo Civil.

Se o contrato possuir a assinatura de duas testemunhas, esta formalidade o tornará um título executivo extrajudicial, nos termos do artigo 585, inciso II do Código de Processo Civil, possibilitando uma ação judicial mais célere, qual seja, uma ação de execução de título extrajudicial.

Quando apenas um acordo verbal é feito entre profissional e paciente, no caso de inadimplência, caberá ao profissional provar na Justiça (por testemunhas e outros documentos) qual o tratamento realizado e o valor combinado. No artigo 596 do Código Civil estão normatizados os critérios para a fixação de honorários profissionais em caso de cobrança judicial: “não se tendo estipulado, nem chegado a acordo as partes, fixar-se-á por arbitramento a retribuição, segundo o costume do lugar, o tempo de serviço e a sua qualidade”.

Sobre o prazo para reclamação de honorários, o Código Civil Brasileiro define que prescreve em cinco anos a pretensão dos profissionais liberais para cobrança destes, contado o prazo da conclusão do serviço ou da cessação do respectivo contrato.

Decisões Judiciais

Existem diversas ações de cobrança de honorários ajuizadas por cirurgiões-dentistas, citam-se algumas decisões como exemplo:

{C}·                Ação de cobrança. Honorários profissionais. Prova do débito realizada a partir da exibição de fichas do paciente. A prova produzida, quer pelos depoimentos das partes, quer pelas testemunhas inquiridas e pelas fichas de atendimento, provam que o autor prestou os serviços. Assim, há que se acolher o pedido de cobrança.” [1]

{C}·                “Interrupção de tratamento ortodôntico por falta de quitação de débitos. É direito do profissional liberal receber a contraprestação pelos seus serviços, não sendo obrigado a trabalhar ou despender gastos com materiais sem que haja remuneração. Caso em que a dentista, mesmo com o atraso dos pagamentos, permaneceu atendendo à paciente, ajuizando cobrança para receber os valores que lhe eram devidos.”[2]

{C}·                “Considerando que as partes ajustaram a prestação de serviços profissionais que não foram integralmente prestados e que o paciente já efetuara o pagamento de metade do valor ajustado, a ação de cobrança não é a adequada para que o cirurgião-dentista busque receber eventual saldo credor. Necessidade de ajuizamento de ação de arbitramento de honorários.” [3]

De acordo com as decisões judiciais relacionadas à cobrança de honorários por parte dos profissionais, denota-se que a existência do Contrato de Prestação de Serviços é uma prova documental do valor e do serviço acordado, o que favorece a cobrança dos honorários devidos e não pagos e dispensa a produção de provas, como no caso de acordos verbais. Ainda, o processo de cobrança será mais célere do que uma ação judicial onde a necessidade de provar o que foi acordado de modo verbal tornará o trâmite processual mais lento e oneroso.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm. Acesso em 28 out. 2014.

BRASIL. Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5869compilada.htm. Acesso em 28 out. 2014.

BRASIL. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078.htm. Acesso em 28 out. 2014.

CFO. Conselho Federal de Odontologia. Resolução CFO nº 59, de 07 de outubro de 2004. Aprova o Código de Ética do Cirurgião-dentista. Disponível em: http://cfo.org.br/wp-content/uploads/2009/09/codigo_proc_etico.pdf. Acesso em 28 out. 2014.


{C}[1]{C} (Recurso Cível Nº 71000908111, Segunda Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Clovis Moacyr Mattana Ramos, Julgado em 12/07/2006)

{C}[2]{C}  (Apelação Cível Nº 70052415676, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Alberto Schreiner Pestana, Julgado em 28/11/2013)

{C}[3]{C} (Apelação Cível Nº 70034856633, Décima Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ana Maria Nedel Scalzilli, Julgado em 28/06/2012)

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Sobre a autora
Giorgia Bach

Advogada. Especialista em Processo Civil. Atuação em processos da área da saúde. contato: [email protected]

Informações sobre o texto

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