4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerando o que foi alegado e objetivando uma análise do exercício do poder familiar frente ao abandono afetivo, é possível concluir que a Constituição Federal inovou no conceito das prerrogativas do poder-dever, no âmbito das relações familiares, em face das quais foi desconstituída a soberania do pátrio poder, exercido pelo chefe da família, a saber, o pai, em busca de uma isonomia de obrigações entre os cônjuges.
A esse respeito, família pode ser compreendida como uma relação baseada na afetividade e na solidariedade, por buscar mecanismos que visem a assegurar a convivência familiar e a proteção integral da criança e do adolescente, pelo menos conforme expõem os juristas e doutrinadores do âmbito do direito de família.
A Carga Magna é muito clara ao impor prerrogativas aos pais como garantidores de direitos e deveres aos menores, no sentido de desempenharem um papel de salvaguarda frente aos riscos à integralidade física e psíquica da criança e do adolescente, oferecendo um lar digno e respeitoso e uma estrutura que vise a garantir proteção integral e um desenvolvimento saudável.
Nesse sentido, analisou-se a possibilidade de destituição do poder familiar tendo como motivo ensejador o abandono afetivo, sendo possível concluir que o entendimento dos Tribunais se constrói, majoritariamente, no sentido da viabilidade da interposição de ação civil na busca da perda da relação familiar, diante de provas concretas de que houve um abandono afetivo que configurou inviável a manutenção do vínculo entre o genitor e o filho.
Posicionam-se os Tribunais nesse sentido, pois aquele que abandona não merece permanecer com o vínculo familiar e obter vantagens em face do filho abandonado. Nesse sentido, a doutrina ressalta que a destituição do poder familiar não exime das obrigações alimentícias e da sucessão hereditária, por se tratar de uma facilidade que seria conferida àquele que abandona sua prole.
O procedimento da perda do poder familiar em face do abandono afetivo deixa a desejar para aqueles que objetivam se desligar completamente de algum vestígio da frustrada relação familiar. Uma vez concedida por sentença judicial, a destituição dessa relação ficará averbada no registro de nascimento, gerando uma anotação ao lado do nome da pessoa excluída dessa relação. Sendo possível ainda, ingressar com outra ação que vise à supressão do sobrenome do sujeito passivo no registro de nascimento.
O que se espera é o desvinculamento de qualquer laço frente à destituição do poder familiar, tendo reflexo automático na retirada do sobrenome no registro de nascimento. Há, ainda, a possibilidade da total retirada do nome no documento público, em virtude do princípio da liberdade e igualdade, e já que a lei garante que a maioridade civil da pessoa faz com que ela esteja apta a praticar atos sob a sua própria responsabilidade, de modo que, assim, caberia a ela a escolha de tal supressão do nome.
Nessa perspectiva, se não existiu afetividade ou qualquer vínculo que atestasse interesse do genitor em manter os laços familiares, é cabível a destituição do poder familiar pelo abandono afetivo, com a possibilidade de ser retirado o sobrenome.
Em decorrência do princípio da imutabilidade do nome e da indisponibilidade do sistema registral, não é viável a supressão total do nome do genitor, assunto em torno do qual caberia uma discussão por parte dos juristas e doutrinadores, versando sobre a natureza absoluta de tais princípios. O tema, enfim, deve ser tratado, em determinados casos, como um ônus levado a vida toda pelo filho, o que poderia ensejar responsabilidade pelos danos sofridos.
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Nota
1 De acordo com Pablo Stolze, (2012, p. 978) a responsabilidade civil deriva da transgressão de uma norma jurídica preexistente, impondo, ao causador do dano, a consequente obrigação de indenizar a vítima.