O clamor de parcela da população, somada à vontade do Presidente da Câmara Federal são fatores suficientes, para a cassação de mandato da Presidente da República?
De inicio é preciso se fazer uma separação clara entre: opinião popular que endossa manobra política, de fundamentos e fatos jurídicos, provas estas que podem conduzir à extinção de mandato eletivo de um Presidente da República.
A leitura dos artigos 85 e 86 da Constituição Federal de 1988 respondem esta indagação, tendo-se em visa que é preciso prova cabal e inequívoca, de que a Presidente Dilma burlou a Lei Maior de 1988; ou agiu contra a existência da União; ou desfavor do funcionamento dos Poderes Legislativo e Judiciário, dentre outras instituições; ou em face do exercício dos direitos políticos, individuais e sociais; ter ainda a Presidente abalado a segurança interna do Brasil, o que não se constatou, mediante os inflamados discursos de parcela do bloco oposicionista.
Um questionamento, por parte da oposição, que mais se aproxima do caráter técnico que a questão merece, é em relação à lei orçamentária. Por outro lado, o jurista Dalmo Dalarri (2015) destaca que além de os atrasos de repasses aos bancos públicos terem se dado no mandato anterior, o que a Constituição Federal veda como requisito de cassação do atual mandato; nem os defensores da cassação levantaram a hipótese de proveito pessoal da Presidente, ao promover tais atrasos. Nesta esteira, vale destacar que o § 4° do art. 86 da Lei Maior veda cassação do mandato da Presidente, em virtude de fatos que ocorreram no mandato anterior. Portanto, pela via Constitucional, descartada a possibilidade de impeachment, devido ao suposto equivoco na execução orçamentária.
Outro ponto decantado pelos defensores da cassação é a responsabilidade, na modalidade culposa, da Presidente Dilma. Uma analise do inciso II do art. 18 do Código Penal Brasileiro o qual define crime culposo, mediante um agir com imprudência, imperícia e /ou negligência. No entanto, o texto Constitucional, o qual na hierarquia das leis está acima de toda a legislação pátria, em seu art. 84 é claro ao condenar um ato doloso (e não culposo), por parte do Chefe de Estado. Neste sentindo, o jurista Dallari (2015) também descarta a possibilidade de cassação de mandato presidencial, com base em crime culposo.
Assim, é possível ter o entendimento que o clamor, leigo e desprovido de fundamentação jurídica, de parcela da população, pró cassação, se dá em relação ao fraco desempenho atual da economia.
Estapafúrdio correlacionar a popularidade como fundamento jurídico. Neste contexto, relembra-se o governo Médici, uma das fases mais cruéis da Ditadura Militar, o qual gozava de alto índice de aprovação popular, graças tão somente aos frutos da economia internacional, conforme elucidado pelo Cientista Social CANCIAN (2006), em sua obra.
Sobre a questão de a crise política atual despertar tanto incomodo, vale destacar que o próprio povo brasileiro, por duas vezes, em 1963 e em 1993, erroneamente rejeitou o sistema parlamentarista, mediante o qual o parlamento é dissolvido e novas eleições convocadas, em ambientes de crise política, como o atual.
Nesta linha de raciocínio, a jurista Maria Victória Benevides (1993) já alertava ao país, a respeito da concentração de poderes nas mãos do Poder Executivo, problema este que é no mínimo atenuado, no Parlamentarismo, quando o Chefe de Governo permanece, cara a cara, com os demais parlamentares, discutindo as grandes questões nacionais e não blindados, pela atual “harmonia” dos poderes que impede, por exemplo, que um Presidente da República seja sequer convocado a prestar esclarecimentos, direitamente aos parlamentares, em reunião do Congresso Nacional.
Se por um lado, a população tem o sagrado direito de se manifestar pacificamente contra ou a favor ao impeachment, esta garantia fundamental não pode ser confundida com fundamentação jurídica, que sustente a cassação do mandato presidencial de Dilma Rousseff. Parecendo-nos, assim, que muitas outras crises políticas virão, fruto do analfabetismo funcional e político desta parcela da população tal feroz em pedir a cassação, e ao mesmo tempo tão omissa ao exigir de nossos representantes, um sistema educacional no mínimo eficiente, para que nossos jovens aprendam, desde os primórdios de sua formação escolar que voto é coisa muito séria e que os conflitos do Presidente da Câmara, não podem, por si só, cassar um mandato eletivo de Presidente da República.
REFERENCIA: