1. INTRODUÇÃO
O termo “políticas públicas” é extremamente polissêmico e interdisciplinar. A delimitação de seu conceito e regime jurídico, assim, é uma tarefa que perpassa por diversos obstáculos teóricos e práticos. Nesse sentido, questionamos: é possível o estabelecimento de um conceito e de um regime jurídico das políticas públicas brasileiras?
O presente trabalho almeja responder esse problema científico à luz da doutrina, legislação e jurisprudência nacionais bem como por meio da utilização do método hermenêutico e da técnica hipotético-dedutiva.
Destacamos, inicialmente, a concepção genérica do termo “política” e os diversos obstáculos para a construção de um conceito propriamente jurídico das políticas públicas.
Em seguida, buscamos selecionar e sistematizar os traços identificadores das políticas públicas na legislação, doutrina e jurisprudência nacionais. A partir dessa síntese, estabelecemos um conceito jurídico atrelado à ideia de atuação positiva do Estado na concretização dos direitos fundamentais e do interesse público no caso concreto.
Por derradeiro, foi estabelecido a vinculação desse conceito a um regime jurídico específico. Essa tarefa foi realizada com a análise da interdependência entre o Direito Constitucional e do Direito Administrativo bem como do protagonismo do Poder Executivo na construção das políticas públicas brasileiras através da função administrativa do Estado.
2. CONCEITO JURÍDICO DE POLÍTICAS PÚBLICAS
2.1. Os principais significados da política
O termo “política” pode assumir duas conotações principais, que os países de língua inglesa diferenciam através das expressões politics e policy.
O primeiro possui um sentido mais amplo e usual, significa a atividade humana ligada à obtenção e manutenção dos recursos necessários para o exercício do poder sobre o homem. Representa a relação de poder entre o soberano (governante) e os governados em um determinado território.[1]
Já a policy é uma dimensão mais concreta da política e que tem relação com orientações para a decisão e ação, denotando a ideia de programas governamentais.[2]
O termo “política pública” (public policy) está vinculado a esse segundo sentido da palavra “política”, pois trata do conteúdo concreto das decisões políticas, e do processo de construção e atuação dessas decisões.[3]
2.2. Os obstáculos para a construção de um conceito jurídico das políticas públicas
A delimitação de um conceito jurídico para as políticas públicas é tarefa extremamente complexa, pois esta é uma expressão relativamente nova no direito brasileiro[4], extremamente polissêmica[5], de cunho interdisciplinar[6] e forte conotação política.[7]
São tantos obstáculos que, segundo Maria Dallari BUCCI, “é plausível considerar que não exista propriamente um conceito jurídico de políticas públicas, pois as categorias que estruturam essa expressão são próprias da ciência política e da ciência da Administração”. As políticas públicas, assim, não seriam uma categoria jurídica autônoma, de acordo com a autora.
Todavia, cabe questionar esse entendimento: para se reconhecer determinado conceito como jurídico é imprescindível que as categorias que o estruturam sejam próprias do Direito, ou que ele tenha importância e utilidade para o Direito diante de sua vinculação a determinado regime jurídico?
Celso Antônio BANDEIRA DE MELLO já advertia que o conceito jurídico é uma síntese, uma aglutinação de elementos comuns retirados do direito positivo ou construídos pela doutrina a partir de traços identificados no ordenamento jurídico.[8]
Nesse sentido, as dificuldades apresentadas não podem servir de escusa à missão de se buscar uma definição jurídica razoavelmente precisa das políticas públicas, de acordo com a legislação, jurisprudência e doutrina nacionais. A construção desse conceito, assim, destacará a importância do tema para o direito (sobretudo na concretização dos direitos fundamentais) e será atrelada a um regime jurídico específico.
2.3. As políticas públicas no direito brasileiro
Segundo a doutrina, existem três categorias de abordagens com relação às políticas públicas. Cada categoria pode ser denominada de “nó conceitual”, de acordo com Leonardo SECCHI.[9]
Em síntese, são três “nós conceituais”, a saber: 1) uma abordagem estatal (state-centered policy-making) e outra multicêntrica; 2) uma abordagem que considera a omissão estatal também como política pública e outra que leva em consideração apenas os atos comissivos e 3) uma abordagem estrutural (de nível estratégico) e outra que também considera os aspectos operacionais.[10]
No primeiro nó conceitual, segundo uma abordagem estatal (state-centered policy-making) a política somente pode ser considerada como “pública” quando emanada da decisão de um ator estatal. Já a abordagem multicêntrica, entende que a política é “pública” quando o problema que se tenta enfrentar é público, independentemente de ter sido emanado pelo Estado ou por organizações não-estatais.[11]
Nesse diapasão, malgrado SECCHI traga os argumentos favoráveis a uma abordagem multicêntrica[12], entendemos como mais apropriada uma abordagem estatal, pois 1) as instituições estatais dão às políticas públicas maior legitimidade, universalidade e coercitividade[13]; 2) as políticas públicas estão vinculadas historicamente a uma tradição intervencionista do Estado Social em prol de direitos fundamentais[14]; 3) a abordagem multicêntrica amplia exageradamente o conceito de políticas públicas, de modo que, toda ação destinada a resolver um problema público seria uma política pública[15] e 4) a definição de um “problema público” é quase sempre nebulosa e está atrelada às vontades políticas e individuais dos gestores.[16]
Não desconhecemos, entretanto, que organismos não-estatais também são fundamentais para resolução de problemas públicos. Um banco privado, v.g, que lança uma campanha nacional de redução da poluição ambiental, melhoria da mobilidade urbana e qualidade de vida através de disponibilização de bicicletas patrocinadas para a população, teve uma atitude fundamental para resolver problemas públicos.[17] Todavia, não compreendemos essa ação como propriamente uma “política pública”, mas sim uma “ação privada de interesse público”.[18] Essa ação privada, a nosso ver, só pode tornar-se política pública se for incorporada pelo Estado.[19] Seguimos, assim, a abordagem estatista defendida, sobretudo, por doutrinadores como BUCCI, RUA, GRAU, COMPARATO, MASSA-ARZABE, BERCOVICI, FONTE e DYE.[20]
O segundo nó conceitual, é baseado na afirmação capitaneada por Thomas DYE de que política pública é “tudo aquilo que os governos escolhem fazer ou não fazer”. Nessa concepção, a política pública também significa uma omissão, é dizer, quando o Estado não faz nada em relação ao problema isso também seria uma política pública.[21] Seria o caso, por exemplo, da seca no agreste nordestino, em que a inação do governante em enfrentar o problema poderia gerar questionamentos sobre seus interesses na manutenção do status quo.
Essa abordagem, entretanto, segundo SECCHI apresenta uma grande desvantagem, a saber, se todas as omissões ou negligências dos atores governamentais fossem políticas públicas, tudo seria uma política pública. Ademais, seria impossível visualizar a implementação e os impactos destas. Nesses casos, o que se tem, segundo o autor, é uma falta de política pública, melhor dizendo, uma falta de inserção do problema na agenda política.[22] Por exemplo, se um grupo de ambientalistas pressionasse o Executivo para criar um sistema de irrigação contínua e sustentável no agreste nordestino, e o Executivo negasse a demanda, essa recusa em si não seria uma política pública.
Nesse aspecto, concordamos com SECCHI e acreditamos que as políticas públicas têm a ver com ações comissivas do Estado, sobretudo, no Brasil, em que essas políticas foram desenvolvidas sob a égide do intervencionismo estatal pós Constituição Federal de 1988.[23] As políticas públicas, nesse diapasão, denotam a ideia do “Estado em ação”: é o Estado implantando um projeto de governo, através de programas, de ações voltadas para setores específicos da sociedade.[24]
Vale ressaltar que esse é o entendimento da jurisprudência nacional que identifica, como regra, as políticas públicas enquanto ações estatais vocacionadas à concretização dos direitos fundamentais, notadamente os direitos sociais de cunho prestacional. Inúmeros julgados referentes às políticas públicas[25], por exemplo, são relacionados com direito à saúde (concessão de tratamento médico[26], melhoria no atendimento[27] , estocagem e entrega de medicamentos e insumos[28] e saneamento básico[29]); educação (construção e reforma de escolas públicas[30], provimento de professores[31], garantia de vaga e matrícula[32], garantia de transporte para a escola[33]); moradia (fornecimento de abrigo[34]), meio ambiente (regularização do lixão público[35]); segurança pública (realização de concursos públicos e contratações de policiais[36], atendimento de plantão pela brigada militar[37], reforma e construção de presídios[38]) e o direito das crianças e adolescentes (manutenção de rede de assistência à saúde[39], construção de delegacia especializada[40], disponibilidade de vaga em creche[41]).
O terceiro e último “nó conceitual” diz respeito ao grau de operacionalidades das políticas públicas. Segundo uma parte da doutrina (COMPARATO, BUCCI, GRAU e MASSA-ARZABE) as políticas públicas seriam as macrodiretrizes estratégicas, é dizer, um conjunto de programas; uma atividade. Nessa interpretação, elas são estruturantes e os programas, planos, projetos, atos e normas são apenas seus elementos operativos, não podendo ser considerados políticas públicas individualmente.[42] Por outro lado, SECCHI entende que as políticas públicas podem ser decompostas em mais políticas públicas que a operacionalizam. A análise partiria, assim, do nível macro até o nível mais operacional, segundo o autor. [43]
Por exemplo, uma política pública federal de educação, visando a oferta de vagas em universidades públicas federais, é composta de diversas normas e regulamentos; depende da implantação de vários programas como PROUNI, FIES e o REUNI e de atividades ainda mais operacionais como a construção de universidades novas, contratação de professores e servidores, compra de materiais, etc. Todos esses atos, normas, programas e planos seriam políticas públicas numa abordagem operacional, mas, em sentido diverso, seriam apenas “partes de um todo”, na vertente macroestrutural.
Filiamo-nos a abordagem macroestratégica, pois entendemos que 1) política pública tem a ver com a ideia de atividade, é dizer, um conjunto de atos, normas e programas em uma sequência processualizada, planejada e vinculada por uma mesma finalidade;[44] 2) a abordagem operacional possibilita que qualquer suporte legal[45] (lei, portaria, decreto, etc.) que designe ações estatais em prol de resolução de problemas públicos, por exemplo, seja considerado uma política pública.
No sentido operacional, v.g, a edição de uma lei seria uma política pública. Não concordamos com esse sentido, a lei não esgota uma política pública, mas é um elemento desta. Por mais que no Brasil, o termo seja utilizado para designar normas-gerais que instituem políticas nacionais – como as políticas nacionais sobre drogas (Lei 11.343∕06); meio ambiente (Lei 6.938∕81); turismo (Lei 11.771∕2008); saneamento básico (Lei 11.445∕07) e telecomunicações (Lei 9.472∕97) – a mera edição de um diploma legislativo não garante que o Estado praticará qualquer ação concreta para implementá-lo.[46]
2.3. Concepção adotada
Destarte, após ultrapassarmos os principais obstáculos conceituais do tema, adotamos para fins dessa pesquisa, uma abordagem estatal de atuação comissiva e macroestratégica das políticas públicas.
A política pública, desse modo, consiste em uma atividade estatal complexa[47] e processualizada[48] que visa a concretização dos direitos e objetivos sociais juridicamente relevantes e determinados no meio politico-administrativo[49], em prol do interesse público qualitativo[50] e, sobretudo, da dignidade da pessoa humana.[51]
Estabelecemos, portanto, um conceito jurídico primário de políticas públicas, a partir de uma aglutinação dos elementos essenciais retirados do direito positivo, da doutrina e a da jurisprudência nacionais.
A utilidade desse conceito reside em atrelar a atuação político-administrativa do Estado à concretização dos direitos fundamentais e do interesse público no caso concreto.
Corrobora-se, assim, com a construção de um efetivo Estado Democrático de Direito, pois os direitos fundamentais não são cartas de intenções, eles estão na Constituição para serem concretizados[52], e a principal forma dessa concretização estatal é através das políticas públicas. A democracia, nesse sentido, se apoia em uma defesa intransigente de direitos que assegure e proteja a autonomia, a inviolabilidade e a dignidade dos cidadãos.[53]
3. REGIME JURÍDICO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS
3.1. A insuficiência do Direito Constitucional
De acordo com a clássica tripartição das funções estatais, as grandes linhas das políticas públicas (diretrizes e objetivos), por serem entendidas como opções políticas, caberiam ao Poder Legislativo e deveriam ser regidas pelo Direito Constitucional. Ao Executivo caberia, por sua vez, a posterior execução dessas políticas. [54]
Ocorre que a política pública, enquanto atividade estatal complexa e processualizada, mantém uma intrínseca relação com o Direito Administrativo, pois este é ramo jurídico que cuida do Estado em atividade, é dizer, sua vertente executiva, sua função administrativa.[55]
Qual seria, assim, o regime jurídico predominante na realização das políticas públicas: o Direito Constitucional ou o Direito Administrativo?
Segundo a lição de Paulo BONAVIDES, o Direito Constitucional é um direito “em repouso” enquanto o Direito Administrativo é um direito “em movimento”[56]. Ou seja, enquanto o primeiro rege os princípios e normas fundamentais do Estado (sua estrutura, organização e direitos fundamentais a serem respeitados e concretizados)[57], o segundo disciplina as atividades administrativas necessárias para a realização dos direitos fundamentais e a organização e o funcionamento das estruturas estatais e não estatais encarregadas de seu desempenho.[58]
Isso significa que o Direito Administrativo possui uma íntima relação com o conceito de “atividade”[59], pois rege o “Estado em ação”, é dizer, a atividade processual administrativa planejadora e executora dos programas constitucionais, estabelecendo uma ligação direta entre o político e o jurídico.[60]
Com efeito, como adverte o jurista português Paulo OTERO, de nada adianta a Constituição proclamar que todos têm direito à educação e saúde, v.g, se a Administração Pública não agir para possibilitar a construção de escolas e hospitais; a contratação de professores e médicos e a compra de meios materiais para seu efetivo funcionamento. Sem a atividade administrativa, portanto, os direitos fundamentais e as políticas públicas nunca passarão de meras proclamações de papel.[61]
Nesse sentido, Fábio Konder COMPARATO ressalta, por exemplo, sobre a insuficiência do Direito Constitucional em relação ao seu juízo de constitucionalidade. Esse juízo somente prevê o controle das leis e dos atos normativos, mostrando-se incapaz de controlar, sozinho, a validade das atividades de concreção constitucional.[62] Falta, portanto, ao Direito Constitucional o perfil dinâmico e concretizador que é inerente ao Direito Administrativo Contemporâneo.
3.2. O Poder Executivo enquanto policy maker e as políticas públicas como reflexo da função administrativa do Estado
Hodiernamente, o Poder Executivo possui uma grande normatividade com relação às políticas públicas, realizando-as por sua própria iniciativa, segundo as diretrizes e dentro dos limites aprovados pelo Legislativo.[63] A construção das políticas públicas (policy making), assim, decorre de um processo dinâmico envolvendo todo o corpo administrativo do Estado.[64]
Ilustra essa realidade, v.g, a formulação da Política Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável pelo atual Prefeito de Salvador. O Poder Executivo Municipal elaborou o Projeto de Lei nº 166∕2015 disciplinando toda a política pública municipal (desde os princípios, diretrizes e objetivos até a aplicação de sanções por infração administrativa ambiental) e o encaminhou para a aprovação Câmara Legislativa de Salvador.[65]
Dessa forma, em um Estado Democrático (e Social) de Direito, o Poder Executivo não apenas executa as políticas públicas, mas também é o principal responsável pela sua formulação. Isso significa que é o Executivo (e não o Legislativo), em regra, o formulador nato das políticas públicas (policy maker).[66] Ele assume a função de maior relevância, que é a função administrativa de idealização e concretização do programa político (policy-making).[67]
Nessa linha de raciocínio, segundo Larissa BELTRAMIM, as políticas públicas são uma espécie de função administrativa do Poder Público. Basta percebermos a correlação entre os dois conceitos: a função administrativa e as políticas públicas.[68]
A função administrativa é a função, regida pelo direito público (regime jurídico administrativo), em que o Estado exerce, direta ou indiretamente, dentro de uma estrutura hierárquica e sob controle legal do Judiciário, comportamentos infralegais ou infraconstitucionais com a finalidade de satisfazer o interesse público, através da concretização das finalidades estabelecidas no sistema do direito positivo. [69]
As políticas públicas, por sua vez, também são 1) regidas pelo regime jurídico administrativo, pois visam concretizar o interesse público e encontram-se vinculadas aos objetivos determinados e executados pela Administração Pública; 2) função do Estado dentro de uma estrutura hierárquica, já que são desenvolvidas diretamente pelo Executivo dentro da estrutura do ciclo de políticas públicas (policy cycle)[70]; 3) desempenhadas por comportamentos infralegais ou infraconstitucionais, pois dependem de uma atividade de concretização desses comandos normativos; 4) submetidas ao controle de legalidade do Judiciário, por conta da universalidade da jurisdição (Art.5º, XXXV, CRFB∕88) e 5) destinadas a satisfazer o interesse público através da concretização de direitos fundamentais, sobretudo.[71]
Compreendemos, assim, a política pública como uma das formas de manifestação da função administrativa do Poder Executivo. Esse reconhecimento reafirma a importância do estudo da política pública no campo da disciplina do Direito Administrativo Contemporâneo contribuindo para o aprofundamento acadêmico do tema. Nesse sentido, essa seara do direito incorpora novas problemáticas e possibilita novas interpretações jurídicas sobre a gestão pública brasileira visando o aperfeiçoamento da Administração Pública na efetivação dos direitos humanos.[72]
3.3. Regime jurídico adotado: o Direito Administrativo Constitucionalizado
O Direito Administrativo tradicional ainda está apegado a uma atividade omissiva do Estado (visão liberal clássica de limitação do poder), e não a uma atividade comissiva em prol da concretização dos direitos fundamentais. Nesse diapasão, visando superar esse déficit teórico tradicional, o Direito Administrativo deve ser constitucionalizado, é dizer, adotar o sistema constitucional de direitos e valores fundamentais para desempenhar com sucesso as prestações positivas do Estado.[73]
Entendemos, assim, que, sob a lógica neoconstitucionalista[74], o Direito Administrativo Constitucionalizado é aquele que sofreu um amadurecimento teórico com base numa filtragem constitucional, desconstruindo diversos dogmas obsoletos. Além de se preocupar com limitação do poder estatal, ele também é destinado à atuação positiva na concretização dos direitos fundamentais em prol da dignidade humana.[75]
Destarte, existe uma nítida interdependência entre o Direito Administrativo e o Direito Constitucional. O Direito Administrativo depende dessa filtragem constitucional para atualizar e “oxigenar” sua base teórica e o Direito Constitucional depende de uma efetiva atividade administrativa para ser posto em movimento e concretizar-se.[76]
Ante o exposto é, mais especificamente, esse “Direito Administrativo Constitucionalizado” que deve reger o sistema de realização das políticas públicas brasileiras.[77] Assim, todo o processo de formação e implementação das políticas públicas (policy cycle) é regido pela atividade administrativa e pelo Direito Administrativo Contemporâneo (Constitucionalizado).[78]
4. CONCLUSÃO
Diante do exposto, concluímos que:
- A política pública juridicamente consiste em uma atividade administrativa comissiva e macro estratégica do Estado na concretização dos direitos fundamentais (sobretudo, da dignidade da pessoa humana) e do interesse público qualitativo.
- Com esse conceito podemos, por exclusão, dizer o que não é uma política pública, a saber: a) uma omissão estatal (é, na verdade, uma falta de política pública); b) atos mais operacionais do Estado na concretização dos direitos fundamentais (normas, programas, planos, atos administrativos, etc.), pois são apenas “partes de um todo”, uma atuação macro que é a política pública e c) a atuação de um organismo não estatal (este desempenha no máximo uma atividade privada de interesse público).
- O regime jurídico mais adequado para as políticas públicas brasileiras é o Direito Administrativo Contemporâneo (Constitucionalizado). Esta é a seara do direito mais atrelada à atividade estatal de concretização dos direitos fundamentais e à elaboração das políticas públicas através da função administrativa do Poder Executivo (policy maker).
São essas as conclusões que derivam de tudo o que foi desenvolvido ao longo dessa pesquisa. A partir de então, lançamos as bases para um debate acerca das políticas públicas no âmbito jurídico do direito administrativo brasileiro.
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