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Constitucionalismo plurinacional da América Latina

11/02/2016 às 08:13
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Uma análise do novo constitucionalismo da América Latina e sua contraposição ao constitucionalismo tradicional.

Resumo: O presente trabalho visa analisar o sentido de constituição e de constitucionalismo. Primeiramente, é apresentada a ideia de constituição e constitucionalismo tradicionalmente estudada nos manuais de Direito constitucional. Sendo que este constitucionalismo clássico possui como base a história da Europa, a qual foi difundida para a América e para outras localidades em virtude de questões históricas, principalmente pela colonização. Em contraponto a este modelo tradicional de constitucionalismo, o segundo ponto é a apresentação de um novo movimento constitucional que vem sendo desenvolvido na América Latina, qual seja o constitucionalismo plurinacional. Este novo movimento pode ser visto com mais destaque nas Constituições do Equador de 2008 e da Bolívia de 2009. O novo constitucionalismo que vem sendo desenvolvido na América Latina configura uma verdadeira quebra de paradigmas e uma conquista na busca da identidade dos seus povos originários e na concretização de seus direitos. 

Palavras-chave: Constituição. Constitucionalismo. Constitucionalismo plurinacional. Constitucionalismo da América Latina.


1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho visa analisar o sentido de constituição e de constitucionalismo, partindo da ideia de que a constituição é organização e estruturação, do Estado e que o constitucionalismo é o movimento que impulsiona a formação das constituições.

Ocorre que não é possível chegarmos a uma definição exata sobre o que seja uma constituição. É bastante árdua a tarefa da doutrina de definir o termo “constituição”. O que existe de fato são várias concepções sobre o que seja uma constituição. Da mesma forma, não há uma única forma de constitucionalismo, mas vários tipos de movimentos constitucionais.

Primeiramente, será apresentada a ideia de constituição e constitucionalismo tradicionalmente estudada nos manuais de Direito constitucional. Sendo que este constitucionalismo clássico possui como base a história da Europa, a qual foi difundida para a América e para outras localidades em virtude de questões históricas, principalmente pela colonização.

Em contraponto a este modelo tradicional de constitucionalismo, o segundo ponto é a apresentação de um novo movimento constitucional que vem sendo desenvolvido na América Latina, qual seja o constitucionalismo plurinacional.

Este novo movimento pode ser visto com mais destaque nas Constituições do Equador de 2008 e da Bolívia de 2009. O novo constitucionalismo que vem sendo desenvolvido na América Latina configura uma verdadeira quebra de paradigmas e uma conquista na busca da identidade dos seus povos originários e na concretização de seus direitos.   


2 DESENVOLVIMENTO

2.1 Constituição e constitucionalismo

 A palavra constituição tem sua origem no verbo construir. A constituição é a construção/estruturação de algo. Se trouxermos esse raciocínio para o âmbito jurídico, teremos a constituição como um documento que organiza e estrutura os elementos de um Estado. Nas palavras de Kildare Gonçalves Carvalho, “o direito constitucional refere-se à estruturação do poder político, seus contornos jurídicos, limites de sua autuação, e aos direitos fundamentais”. (CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional. p. 1)

 Partindo da ideia de que a constituição é organização e estruturação, podemos afirmar que sempre que houver uma sociedade minimamente organizada, haverá também uma constituição. "Em todos os lugares do mundo e em todas as épocas sempre existiu e sempre existirá isso que chamamos de constituição”. (Digressão desenvolvida propedeuticamente por Ferdinand Lassalle em seus estudos – 1863)

 Explicando a digressão desenvolvida por Lassalle, o doutrinador Bernardo Gonçalves Fernandes expõe que:

Mesmo não definindo o que seja uma constituição e seu significado, partimos de uma digressão de que ela sempre existiu e sempre existirá (perspectiva temporal) em todos os lugares (perspectiva especial-universal).  

(...) Bem, para provar a existência da constituição devemos nos ater a seguinte pergunta: o que necessitamos para vislumbrar uma determinada comunidade, sociedade ou (modernamente falando) um Estado? Ou seja, quais as matérias (fundantes, basilares) para que consigamos enxergar determinadas comunidades (sociedades ou Estados)? Entre vários elementos (matérias) podemos trabalhar com três: a) identidade: ideia de “nós e outros” (alteridade, noção de pertencimento. Aquilo que me permite afirmar que sou cidadão de Esparta e não de Atenas, b) organização social e especialização (hierarquia e linha sucessória) quem detêm o poder (mando), e como se dá a reprodução social nessa estrutura, c) valores subjacentes (regras) preestabelecidos e naturalizados a partir de um processo constritivo que permitiu, inclusive e sobretudo, desenvolver um tipo de organização social e especialização do poder, bem como possibilitou a construção de uma identidade, diferenciando-se de outras identidades.

(...) essas matérias explicitam como os Estados se reproduzem como tais com seus respectivos “modos de ser”. E se existem como comunidade, sociedade ou Estado é porque foram constituídos e, portanto, a parti daí eles têm uma determinada constituição.” (FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 2015, p. 29 e 30)

 Assim, podemos afirmar que a constituição é a organização e a estruturação do Estado e a limitadora do poder político. Essa é a ideia básica trazida pelo termo “constituição”.

Ocorre que não é possível chegarmos a uma definição exata sobre o que seja uma constituição. É bastante árdua a tarefa da doutrina de definir o termo “constituição”. Em verdade, não temos um consenso ou uma única definição. Como afirma Pedro Lenza, “existem várias concepções ou acepções a serem tomadas para definir o termo “constituição”. Alguns autores preferem a ideia da expressão tipologia dos conceitos de constituição em várias acepções.” (LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 2015. p. 89)

Podemos citar algumas das mais estudadas concepções de constituição, como por exemplo, a concepção sociológica de Ferdinand Lassalle, para a qual a constituição é a soma dos fatores reais de poder; a concepção política de Carl Schmith, na qual a constituição pode ser definida como uma decisão política fundamental. Temos ainda a concepção jurídica de Hans Kelsen, na qual há uma constituição jurídico-positiva situada no vértice de uma pirâmide (se imaginado um escalonamento normativo) que deve ser obedecida pelas demais normas do ordenamento jurídico. A constituição jurídico-positiva retira seu fundamento de validade de uma constituição lógico-jurídica ou normativa abstrata, a qual existe apenas no plano lógico-hipotético. Por fim, citamos a concepção jurídico-normativa de Konrad Hesse que, de certa forma, se aproxima da concepção jurídica. Esta concepção afirma que a norma é um texto concretizado dentro de um contexto.  Este movimento de aliar o texto e o contexto é chamado pela doutrina de círculo-hermenêutico. (LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 2015. 19ª Ed. p. 89 a 92)

Pois bem, visto o significado do termo constituição, passaremos ao fenômeno de formação das constituições: o constitucionalismo.

O constitucionalismo pode ser visto sob um viés amplo, abrangendo toda a história de formação das constituições desde os tempos mais remotos. Pode ser visto ainda por um viés restrito, no qual o constitucionalismo é definido e estudado como sendo uma técnica de limitação de poder. É a partir desse segundo viés que analisaremos o constitucionalismo.

Canotilho relata a existência de vários tipos de constitucionalismo ou movimentos constitucionais, como o inglês, o americano e o francês. E define estes movimentos como uma técnica específica de limitação do poder com fins garantísticos. (J. J. Gomes Canotilho. Direito Constitucional e teoria da constituição. 7ª Ed. p. 51) 

 Assim, o constitucionalismo moderno poder ser definido como um movimento formador de uma nova ordem jurídica, sem precedentes na história da constituição das sociedades, formando um “conceito ocidental de constituição”. O grande objetivo do constitucionalismo moderno seria a limitação do poder, organização e estruturação do Estado, bem como a consecução de direitos e garantias fundamentais. (FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 7ª Ed. p. 32 e 33)

 O constitucionalismo moderno ou conceito ocidental de constitucionalismo é decorrência de uma “dimensão histórico-constitucional” de viés inglês que se desenvolveu por meio de movimentos constitucionais desde a Magna Carta de1215 à Petition of Rights de 1628, do Habeas Corpus Act de 1679 ao Bill of Rights de 1689.  (FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 7ª Ed. p. 33)

 Ao falar sobre o conceito ocidental de constitucionalismo, afirma Kildare Gonçalves que:

Apesar de tudo, entendemos indispensável destrinçar no Estado constitucional ocidental três grandes famílias, três grandes sistemas-tipos, não como tipos ideais, insista-se, mas como tipos históricos bem situados. Em vez de dualismo ou polarização, a pluralidade em razão da complexidade de fatores de poder. O direito tem que ser visto numa dimensão muito mais ampla que a da ideologia e a da afinidade de sistemas políticos ou econômicos. O Direito faz parte da vida dos povos e o Direito constitucioal ostenta, positiva ou negativamente, as particularidades da sua conveniência política, da sua cultura, do seu ambiente humano. O fim dos regimes autoritários e totalitários, em primeiro lugar, e, em segundo, os progressos da integração comunitária levaram a que por toda a Europa triunfasse uma concepção comum sobre o Estado e sobre os direitos das pessoas. No entanto, ultrapassados afrontamentos ideológicos, tornaram-se também mais patentes os contrastes de organização jurídica e política entre os diversos países, de moda arecortarem-se, com mais serenidade e clareza, os trações identificadores dos sistemas constitucionais. (CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional. 15ª Ed. p. 28)

 A maior parte da doutrina estuda a história do constitucionalismo a partir da história da Europa, a qual poder ser dividida em Idade Antiga, Idade Média, Idade Moderna e Idade Contemporânea.

 Na Idade Antiga, Karl Loewenstein identificou dois importantes acontecimentos que retratam a limitação do poder político, caracterizando o constitucionalismo desta época. Primeiramente, Loewenstein aponta o povo hebreu, que vivia em um Estado teocrático, o qual tinha o poder político limitado pelas previsões bíblicas. Em segundo, é apresentada experiência das cidades-Estado gregas como exemplo de democracia constitucional, estando o poder político distribuído entre todos os cidadãos ativos. . (LOEWENSTEIR, Karl. Teoría de La constitución. 2.ed. p. 154 e155)

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O Constitucionalismo medieval, durante a Idade Média, é representado, ainda que formalmente, pela Magna Carta de 1215, pois estabelecia importantes direitos individuais. (LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 2015. 19ª Ed. p. 71) Durante a Idade Moderna, temos como destaque o Petition of Rights de 1628, o Habeas Corpus Act de 1679, o Bill of Rigths de 1689 e o Act of Settlement de 1071.

Segundo a doutrina de Manoel Gonçalves Ferreira Filho, a Magna Carta de 1215 e o Petition of Rigths são exemplos dos chamados pactos. Estes podem ser definidos como acordos entre o monarca e os súditos para estabelecer o modo de governo e direitos individuais. (Curso de direito constitucional, 32ª Ed. p. 4 e 5).

Por fim, temos o constitucionalismo moderno, da Idade contemporânea, o qual se caracteriza pelas constituições escritas como mecanismo de combater o poder arbitrário.

Dois são os marcos históricos e formais do constitucionalismo moderno: a constituição norte-americana de 1787 e a francesa de 1791 (que teve como preâmbulo a Declaração Universal dos direitos do Homem e do Cidadão de 1789) movimento este deflagrado durante o Iluminismo e e concretizado como uma contraposição ao absolutismo reinante, por meio do qual se elegeu o povo como titular legítimo do poder. (LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 2015. 19ª Ed. p. 72)

O constitucionalismo moderno pode ser analisado conforme suas fases. Inicialmente, temos o constitucionalismo liberal, próprio de um Estado Liberal, o qual é caracterizado pelo individualismo, absenteísmo estatal, valorização da propriedade privada e proteção do indivíduo. A conseqüência desse modelo liberal é a concentração de renda e a exclusão social, gerando para o Estado um dever de intervenção a fim de evitar abusos e limitar o poder econômico. É nesse ponto que vão surgir os direitos de segunda dimensão, amparados pelo Estado Social de Direito. Temos como destaque nesta fase inicial do Estado Social a Constituição do México de 1917 e a de Weimar de 1919, bem como a Constituição brasileira de 1934.

Hodiernamente, o constitucionalismo contemporâneo está centrado na ideia de totalitarismo constitucional, pautado por normas de conteúdo social e constituição programática. (BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal anotada. 5 ed. p. 16)

2.2 Constitucionalismo Plurinacional

Um movimento, de certa forma, bastante recente, tem desenvolvido um novo tipo de constitucionalismo, chamado de plurinacional, o qual visa à construção de um Estado plurinacional.

Esse novo movimento chega para contrapor a forma adotada no Estado moderno e seu respectivo sistema jurídico. A ideia central do novo constitucionalismo plurinacional é a quebra da forma dos Estados modernos, tendo em vista que foram idealizados a partir da lógica da homogeneização e uniformização, ou seja, foram criados com o ideal de negar a diversidade.

A forma moderna de Estado é estruturada através de instrumentos de normatização e estabilização a partir da construção de uma identidade nacional própria que afasta as possibilidades de construção de um pensamento ou uma ordem plural.

Esse processo de “ocultamento e encobrimento” teria se iniciado, sobretudo , no século XV (aqui teríamos a formação do “Estado Moderno”, tendo como data “simbólica” o ano de 1492, com a invasão das Américas pelos europeus e a expulsão dos mulçumanos da Europa) e se desenvolveu até o final do século XIX com a formação dos últimos Estados Nacionais europeus (Itália e Alemanha). Com isso, ocorre a preponderância dos valores europeus e de um processo civilizatório eurocêntrico que determina a homogeneização de um “modelo de vida”, de “Estado”, de “constituição” e de “direitos humanos de matriz européia”. Com isso, o colonizador se apresenta como alguém superior frente ao colonizado (relação: nós e outros/ iguais e diferentes/ superiores e inferiores). As bases jurídicas desse arcabouço foram determinadas de forma monologa pelo direito de propriedade, direito de família e pela proteção jurídica à economia capitalista (e seus marcos regulatórios).” (FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 7ª Ed. p. 102)

 O novo constitucionalismo plurinacional ou da América Latina é um movimento que se contrapõe ao modelo homogêneo e uniformizador europeu. O novo constitucionalismo traz como destaque a diversidade no âmbito da cultura, da ciência, da política, da economia, entre outros. Bem como a constitucionalização da referida diversidade.

O constitucionalismo plurinacional advoga uma transformação radical nos modos de ver, pensar, trabalhar e aplicar o direito, bem como as constituições adstritas ao mesmo. Para tal, parte da afirmação de que o atual modelo de Estado nacional e de direito estatal, e até mesmo de direito internacional se encontram em xeque. (FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 7ª Ed. p. 101)

Nem sempre foi esse o pensamento reinante na América Latina. Pois, esta é uma área marcada pela centralização política e a concentração de poder.

“A América Latina, que ao longo de sua história foi marcada por práticas políticas de centralização e concentração de poderes, fatores culturais e sociais, problemas econômicos e instabilidade política, incorporou institutos do sistema constitucional norte-americano, como o federalismo, o controle de constitucionalidade e o presidencialismo. O direito constitucional da América Latina distanciou-se, no entanto, do sistema constitucional dos Estados-Unidos, em decorrência, sobretudo, da prática do presidencialismo, que assume, em diversos países latino-americanos, contornos nitidamente autoritários e centralizadores, acompanhado de um sistema político-partidário que lhe dá adequada sustentação e que envolve multipartidarismo e representação proporcional.” (CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional. 15ª Ed. p. 34)

 Como afirmamos de início, o constitucionalismo plurinacional é bastante recente, aparecendo com mais enfoque na Constituição Boliviana de 2009 e na Constituição do Equador de 2008, apresentando-se como uma verdadeira ruptura com modelo tradicional europeu. Este novo movimento vem recebendo diversos nomes por parte da doutrina, temos: novo constitucionalismo democrático latino-americano, Estado plurinacional, Estado intercultural, constitucionalismo pluralista, andino ou indígena.  

Trata-se, inegavelmente, de necessária e real transformação estrutural, e, assim, conforme aposta Grijalva, “o constitucionalismo plurinacional só pode ser profundamente intercultural, uma vez que ele corresponde constituir-se no âmbito de relação igual e respeitosa de distintos povos e culturas, a fim de manter as diferenças legítimas e eliminar –ou, ao mesmo, diminuir- as ilegítimas, mantendo a unidade como garantia de diversidade.” (GRIJALVA, Augutín. O Estado plurinacional e intercultural na Constituição equatoriana de 2008. In: LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 19ª Ed. p. 81)

 Como afirmado, o constitucionalismo plurinacional pressupõe a quebra de paradigmas, sendo os principais, na apreciação de Raquel Yrigoyen Frajano, o colonialismo, o constitucionalismo liberal, o constitucionalismo social-integracionista e o constitucionalismo pluralista. No colonialismo vigora um modelo de “inferioridade natural dos índios” em uma estrutura de subordinação. No constitucionalismo liberal do século XIX temos um único sistema jurídico geral para todos. Assim, não era admitido, dentro do mesmo Estado-nação, a coexistência de vários sistemas jurídicos, isso gerava a exclusão de povos originários, afrodecententes, entre outros. No constitucionalismo social-integracionista, que possui como marco as constituições do México de 1917 e de Weimar de 1919, define-se o modelo de integração dos índios, faltando ainda o rompimento com a ideia de Estado-nação e com o monismo jurídico. Por fim, o constitucionalismo pluralista é definido por Yrigoyen Frajano a partir da divisão em três clicos: o ciclo multicultural, o ciclo pluricultural  e o ciclo plurinascional. (Raquel Yrigoyen Frajano, El horizonte Del constitucionalismo pluralista: Del multiculturalilismo a La descolonización. P. 139 e 140)  

O ciclo multicultural pode ser caracterizado pela introdução do direito à identidade cultural, junto com a inclusão de direitos indígenas específicos. Essa sistemática pode ser encontrada no Canadá,- 1982, no Brasil – 1988 entre outros. O ciclo pluricultural incorpora os direitos estabelecidos na convenção 169 da OIT, desenvolvendo o conceito de nação multiétnica  e reconhece o pluralismo jurídico. Por fim, no ciclo plurinacional os povos indígenas demandam que sejam reconhecidos não apenas culturas diversas, mas como nações originárias e como sujeitos políticos coletivos com direito a participar dos novos pactos do Estado. Neste caso, temos como exemplo as constituições do Equador – 2008 e da Bolívia 2009.

 Na constituição boliviana há a definição de 36 novos povos originários (que viviam na Bolívia antes da colonização europeia) os quais passaram a ter participação no Estado e na economia. No parlamento boliviano passa a existir uma cota de parlamentares vinda dos povos indígenas. Ainda, os índios passam a ter a propriedade exclusiva sobre recursos florestais e hídricos de suas comunidades. Percebe-se não apenas um reconhecimento das diferenças, mas uma efetivação da diversidade e os respectivos direitos. (FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 7ª Ed. p. 103)


3 CONCLUSÃO

 A história da constituição e do constitucionalismo sempre foi vista e estudada a partir da história da Europa. O modo de pensar e os valores europeus estão bastante infiltrados em outros continentes por conta de fatores históricos e sociais. A colonização dos povos da América e da África teve como conseqüência o enraizamento do pensamento europeu na política, na economia, na forma de identificar e estabelecer direitos.

 Esta ainda é uma realidade bastante presente nos países que outrora foram colonizados. Não é fácil abandonar os padrões que estão fortemente abraçados a estas sociedades. Não é fácil se despir de um modo imposto de ser que os encobre há centenas de anos.

O novo constitucionalismo da América Latina é uma grande evolução no resgate da identidade dos seus povos originários. Este novo constitucionalismo vem para quebrar o paradigma unitário imposto pelos europeus colonizadores. Os povos originários resgatam seus padrões de cultura, seu modo de pensar e de ser, bem como de construir seu espaço e seus direitos. Não é apenas uma questão de reconhecimento como sendo uma cultura diversa, mas de reconhecimento como povos originários e sujeitos de direito com poder de influenciar na construção no Estado. 


REFERÊNCIA

BULOS, Uadi Lammêgo. Cosntituição Federal anotada. 5 ed. São Paulo. Saraiva: 2000.

CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 6ª Ed. rev. Coimbra:Almedina, 1993 (7ª Ed. 2003). 

CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional. 15ª Ed., rev., atual. e ampl. – Belo Horizonte: Del Rey, 2009.

LENZA, Pedro. Direito Constitucional esquematizado. 19ª Ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Saraiva, 2015.

LOEWENSTEIR, Karl. Teoría de La constitución. 2.ed. Barcelona: Ariel, 1970.

FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 7ª Ed. Salvador: Editora Juspodivm, 2015.

FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional. 34 ed. ver. Atual. São Paulo: Saraiva, 2008.

FRAJANO, Raquel Yrigoyen. Aos 20 anos da convenção 169 da OIT: balanço e desafiosda implementação dos direitos dos povos indígenas na América Latina.

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Sobre a autora
Raquel de Melo Freire Gouveia

Advogada. Pós-graduada em Direito Público.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GOUVEIA, Raquel Melo Freire. Constitucionalismo plurinacional da América Latina. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4607, 11 fev. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/46280. Acesso em: 19 mar. 2024.

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