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Benefício assistencial e o critério de miserabilidade versus o princípio da dignidade da pessoa humana

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4 BENEFÍCIOS ASSISTENCIAIS

O Estado contemporâneo possui entre suas funções, a proteção dos indivíduos em relação a fatos que venham lhe causar dificuldades ou até mesmo impossibilidade de manter sua subsistência e de sua família.

Diante disso, criaram-se políticas públicas voltadas a atender essas pessoas, que devido a determinadas circunstâncias não conseguem manter sua subsistência por conta própria, ou através da atividade laborativa.

Os benefícios assistenciais, criados pelo Estado, como um meio de proteção social aos desafortunados, integram políticas de assistência social, configurando-se como direito do cidadão e dever estatal.

Esses benefícios são prestados por meio da inclusão dos beneficiários e de suas famílias em serviços socioassistenciais, ampliando a proteção social e promovendo a superação das situações de vulnerabilidade e risco social a que essas pessoas são colocadas.

Os Benefícios Assistenciais se dividem em duas modalidades, que são direcionadas a públicos específicos, sendo eles, o BPC – benefício de prestação continuada, que também pode ser classificado como benefício permanente, e os Benefícios Eventuais.

4.1 Espécies de Benefícios Assistenciais

4.1.1 Benefícios Permanentes

O benefício classificado como permanente está previsto na Constituição Federal, especificamente no artigo 203, V e, vem regulamentado pela Lei 8.742/93, comumente conhecida como LOAS – Lei Orgânica da Previdência Social.

É considerado um benefício assistencial de prestação continuada, de trato sucessivo, pago mensalmente a quem deles necessitar, conforme requisitos que são exigidos pela lei.

Importante salientar que, o BPC é administrado pelo Fundo Nacional da Previdência Social, e é repassado ao Instituo Nacional do Seguro Social – INSS, que concede e mantém o assistencialismo, através do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.

Frise-se que o benefício assistencial de prestação continuada possui caráter pessoal, extinguindo-se com a morte do beneficiário, de modo que não se transfere a outrem a sua prestação, como acontece com outros benefícios previdenciários, como a pensão por morte.


4.1.2 Benefícios Eventuais

De outro vértice, na mesma classe dos benefícios assistenciais, estão os benefícios eventuais, que caracterizam-se, por seu caráter suplementar e provisório, prestados aos cidadãos e às famílias em virtude, por exemplo, do nascimento, da morte, situação de vulnerabilidade temporária e de calamidade pública.

Essa espécie de benefício vem elencada no artigo 22, da Lei Orgânica da Assistência Social (BRASIL, 1993), e prevê a seguinte redação: “entendem-se por benefícios eventuais as provisões suplementares e provisórias que integram organicamente as garantias do Suas e são prestadas aos cidadãos e às famílias em virtude de nascimento, morte, situações de vulnerabilidade temporária e de calamidade pública.”

Tem-se como exemplo de benefícios eventuais, o auxílio- natalidade, auxílio-funeral, que serão concedidos àquelas pessoas que não provem condições financeiras de arcar com estas situações. Percebe-se que para que haja a concessão dessa modalidade de assistencialismo, é necessário que a situação que atinge o indivíduo seja temporária, e que o sujeito não tenha condições de lidar com tal acontecimento momentâneo.

Frise-se, que a concessão e o valor dos benefícios eventuais serão regulamentados pelos Conselhos de Assistência Social dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, mediante critérios e prazos definidos pelo Conselho Nacional de Assistência Social.


5 BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA

5.1 Conceito e Requisitos

Prima facie, vale lembrar que, os benefícios assistenciais não devem ser confundidos com os benefícios previdenciários, uma vez que estes são devidos àquelas pessoas que contribuem, enquanto aqueles são concedidos baseados na necessidade de sobrevivência do indivíduo, afinal, o que aconteceria com as pessoas que não contribuem, durante suas vidas, quando não tiverem mais condições de sustentabilidade?

A partir dessa premissa, fica clara a importância dos direitos sociais para a garantia de um mínimo existencial, por meio de ações destinadas a garantir a dignidade humana.

Deveras, com a promulgação da Constituição Federal de 1988, trazendo em seu texto constitucional, a garantia de um salário mínimo para as pessoas idosas ou deficientes, sem condições próprias de se manter, criou-se a necessidade de regulamentação desse direito, estabelecendo critérios para a concessão desse benefício.

Como observado, o Benefício de Prestação Continuada, popularmente conhecido como BPC, foi estabelecido pela Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988), em seu artigo 203, V, conforme segue:

“Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:

[...]

V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.”

O constituinte originário determinou que o valor dessa prestação pecuniária fosse equivalente a um salário mínimo, e remeteu à legislação ordinária a tarefa de dispor sobre as condições necessárias para a concessão assistencial.

Dessa forma, a Lei 8.742 de 1993 – Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS, veio regulamentar o disposto na Carta Magna acerca do benefício assistencial.

A referida Lei é um dos pilares da Assistência Social, que objetiva assegurar condições de uma sobrevivência digna àqueles que, embora não tenham vertido contribuições previdenciárias ou tenham perdido a qualidade de segurado, não se encontram em condições de se autosustentarem.

O benefício assistencial de prestação continuada consiste no pagamento de um salário mínimo para aquelas pessoas que preenchem os requisitos que são estipulados pela Lei.

Esses requisitos vêm elencados no artigo 20 (BRASIL, 1993) da citada lei que estabelece que o benefício de um salário mínimo é garantido a todos os idosos e deficientes que não sejam capazes de prover seu próprio sustento.

Dessa forma, dispõe o artigo 20 da Lei 8.742 de 1993 (BRASIL, 1993): “art. 20.  O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.”

Leitão e Meirinho (2008, p. 445) aduzem que o citado diploma legal estabelece pressupostos subjetivos e objetivos para a concessão do benefício assistencial, e os classificam da seguinte forma: “os critérios subjetivos atuais são: a) ser pessoa idosa com idade de 65 anos ou mais; ou b) ser pessoa portadora de deficiência. O critério objetivo é a hipossuficiência comprovada pela ausência de meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida pela família.”

Frise-se que para a configuração dos pressupostos supracitados, faz-se imprescindível a comprovação dos critérios estabelecidos, com a elaboração de exames periciais, um de natureza médica e outra de natureza socioeconômica, além da importante análise feita seja no âmbito administrativo ou judicial, do caso concreto.

Diante de tais considerações, passa-se a abordar cada um dos pressupostos necessários para a concessão do benefício de prestação continuada, trazendo importantes considerações a respeito de cada um deles.

5.1.1 Idade

A Carta Magna (BRASIL, 1988), ao estabelecer em seu artigo 203, V a garantia do beneficio assistencial a pessoa idosa, passou a considerar o idoso membro fragilizado da sociedade, elegendo-o como destinatário de especial proteção do Estado no âmbito do assistencialismo, quando este não possuir meios de prover a própria subsistência.

A regulamentação do requisito da idade para a concessão do benefício de prestação continuada, foi promovido pelos artigos 20 e seguintes da LOAS, bem como pelo artigo 34, da Lei 10.741/2003 – Estatuto do Idoso.

Salutar se faz pontuar que, o quesito idade para considerar a pessoa como idosa já foi objeto de algumas alterações, que reduziram significativamente a idade mínima para qualificação do idoso.

Oportuno se faz observar que, o texto original do artigo 20 da Lei 8.742/93 considerava o direito para a concessão do benefício o idoso com mais de 70 anos. Entretanto, em 1998 foi editada a Lei 9.720 que reduziu essa idade para 67 anos.

Contudo, as mudanças não pararam por ai. Com a vigência do Estatuto do Idoso – Lei 10. 741/2003, a idade mínima passou de 67 anos para 65 anos, para à percepção do benefício assistencial.

Destaca-se que embora o Estatuto do idoso tenha fixada a idade de 60 anos como paradigma para a qualificação da pessoa idosa com relação a outros direitos, o legislador optou estabelecer, em tópico próprio que para a concessão do BPC, far-se-á necessário atingir os 65 anos.

É o que dispõe o artigo 34 da Lei 10. 741/2003 (BRASIL, 2003): “art. 34. Aos idosos, a partir de 65 (sessenta e cinco) anos, que não possuam meios para prover sua subsistência, nem de tê-la provida por sua família, é assegurado o benefício mensal de 1 (um) salário-mínimo, nos termos da Lei Orgânica da Assistência Social – Loas.”

Desse modo, o objetivo do Estatuto do Idoso é conferir o benefício em questão para os idosos com mais de 65 anos, pois se trata de norma especial em relação à idade de 60 anos, considerada apenas como uma qualificante de pessoa idosa.

Assim, corroborando com este entendimento, salientam os Ilustres doutrinadores Leitão e Meirinho (2008, p. 446) que “a condição de pessoa idosa não apresenta maiores dificuldades, pois os textos legais são claros em fixar idade mínima para a concessão do beneficio assistencial de prestação continuada.”.

Registre-se que a idade limite é aplicada tanto para o homem como para a mulher, não havendo qualquer diferença etária, como ocorre no benefício previdenciário de aposentadoria, em razão das peculiaridades que envolvem o benefício em comento.

5.1.2 Incapacidade

Assim como o requisito da idade, o conceito de incapacidade passou por diversas alterações ao longo anos. Embora existam controvérsias, a incapacidade para a vida independente não pode ser somente aquela que impede a realização das atividades laborais do individuo.

Deveras, sabe-se quão grande são as dificuldades enfrentadas pelos deficientes atualmente, contudo, embora ainda exista a necessidade de tamanha evolução da sociedade brasileira nesse aspecto, as coisas melhoraram a partir do tratado internacional assinado sobre “Os Direitos da Pessoa com deficiência”.

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O Congresso Nacional ratificou a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, por meio de Decreto Legislativo n.º 186, de 9 de Julho de 2008, nos termos do art. 5º, § 3º, da Constituição Federal, possuindo tal convenção força de Emenda Constitucional.

Dessa forma, os direitos das pessoas com deficiência estabelecidos na Convenção Internacional devem ser aplicados e respeitados, como qualquer outro direito ou garantia que estão expressos na Carta Magna, pois a própria Constituição prevê a proibição de exclusão dos direitos decorrentes de outros regimes ou princípios, ou ainda dos tratados internacionais, por ela adotados.

Nesse sentido, dispõe o § 2º do artigo 5º da CF (BRASIL, 1988), a seguinte redação: “§2º. os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.”

Cabe salientar que, os principais princípios da Convenção Internacional adotados pelo Brasil, visam à dignidade da pessoa humana, e têm o propósito de promover e assegurar o exercício dos direitos humanos para todas as pessoas com deficiência.

O art. 20, § 2º, da Lei nº 8.742/93, traz em sua redação as mesmas palavras do artigo 1º da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que destaca o seguinte:

“Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.” (BRASIL, 1993).

Denota-se a partir da redação do dispositivo supra, que não mais se considera para a constatação da deficiência apenas a incapacidade para o trabalho, mas sim, qualquer situação que incapacite o sujeito de sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade com as demais pessoas.

Além da incapacidade, para concessão do benefício, há necessidade de que essa produza impedimentos de longo prazo.

A própria lei traz em seu texto que é considerado longo prazo, “[...] aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos” (BRASIL, 1998), logo, para efeitos de concessão do BPC, este será indeferido toda vez que os impedimentos forem classificados como de curto ou médio prazo.

De outro vértice, muito se discute a respeito da necessidade da incapacidade ser considerada total e permanente, pois existem posicionamentos que defendem que não existe necessidade de serem preenchidos ambos os requisitos.

A Turma Nacional de Uniformização editou a Súmula 48 (BRASIL, 2013), com a finalidade de uniformizar o entendimento a este respeito: “A incapacidade não precisa ser permanente para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada.”

Contudo, embora exista súmula a esse respeito, os tribunais vêm tomando diferentes decisões sobre esse assunto. O Superior Tribunal de Justiça (BRASIL, 2013), por exemplo, traz a necessidade da configuração da incapacidade permanente e definitiva para a concessão do benefício assistencial:

“[...] 2. No presente caso, o Tribunal a quo considerou a renda per capita pressuposto absoluto para a concessão do benefício assistencial, por isso o acórdão foi reformado, acrescentando-se que a ora agravada está incapacitada para o trabalho de acordo com laudo médico que atestou ter osteomielite crônica, configurando incapacidade permanente e definitiva, bem como o estudo social ter comprovado o estado de miserabilidade em que vive. (Argr no AREsp 379.927/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 15/10/2013).”

De outro giro, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (BRASIL, 2014), possui posicionamentos distintos, veja-se:

“[...] 1. O benefício assistencial é devido à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, situação de incapacidade laborativa total e permanente em razão de graves problemas de saúde configurada nos autos. (TRF4, AC 0014905-46.2014.404.9999, Quinta Turma, Relatora Taís Schilling Ferraz, D.E. 25/11/2014).”

“[...] Para fins de concessão do benefício assistencial, não há exigência legal de que a incapacidade laboral seja definitiva, bastando que se trate de impedimento de longo prazo (no mínimo por dois anos), que obstrua a participação plena e efetiva da pessoa na sociedade. (TRF4, AG 00000953-87.2015.404.0000, Quinta Turma, Relator Rogerio Favreto, D.E. 28/05/2015). (BRASIL, 2015).”

Frise-se que para a concessão do BPC à pessoa com deficiência, deverá o requerente sujeitar-se à avaliação social e médica, a qual considerará tanto fatores ambientais, sociais e pessoais que a pessoa vive, quanto a sua limitação nas atividades diárias e na participação social.

Vale ressaltar que quando se tratar de crianças e adolescentes menores de 16 anos, a deficiência deverá ser avaliada a partir do seu impacto nas atividades em que crianças da mesma idade realizam como brincar e estudar, por exemplo, tendo em vista que não se deve avaliar a capacidade laboral do menor, devido à vedação constitucional ao trabalho de menor de 16 anos.

5.1.3 Miserabilidade

Como já demonstrado, para que o benefício de prestação continuada seja concedido, imprescindível se faz o preenchimento dos requisitos exigidos pela Lei. Além dos requisitos da idade e da incapacidade, o dispositivo legal prevê uma terceira exigência para o beneficiário, qual seja o critério de miserabilidade.

O critério da miserabilidade encontra expressa previsão no artigo 20, § 3º da LOAS (BRASIL, 1993), que considera incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita não ultrapasse a ¼ do salário mínimo.

A priori, salutar se faz pontuar quem faz parte do conceito de grupo familiar que dispõe o supracitado dispositivo legal.

Utilizando critérios de interpretação mais comezinhos, o núcleo familiar utilizado para a aferição das condições de hipossuficiência, deve ser integrado pelo requerente do benefício, seu cônjuge ou companheiro, os pais e na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e ainda os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.

Cabe ressaltar que a assistência social é uma forma subsidiária de atendimento às pessoas necessitadas, cabendo ao Estado insurgir-se somente quando o requerente e seus familiares não possuírem condições de prover o próprio sustento.

De outro giro, vale trazer a baila a forte polêmica jurisprudencial acerca da possibilidade da flexibilização do critério de miserabilidade trazido pela Lei 8.742/93.

Em decisão proferida na ADI 1.232, o Supremo Tribunal Federal (BRASIL, 1998) havia pacificado o entendimento de constitucionalidade do critério estabelecido pela lei, com base em diversos julgados, sob a fundamentação de que seria inadmissível conceder o benefício assistencial quando a renda per capta do grupo familiar ultrapassar ¼ do salário mínimo.

Contudo, em 2013 novamente esse critério veio a ser rediscutido nos Recursos Extraordinários n.º 567.985 (BRASIL, 2013) e 580.963 (BRASIL, 2013), e o STF julgou pela inconstitucionalidade material incidental do § 3º, do artigo 20 da Lei 8.742/93, utilizando os seguintes fundamentos:

“[...] 3. Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se contornar o critério objetivo e único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias com entes idosos e deficientes. Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o bolsa família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de acesso a alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a Municípios que instituírem programas de garantia e renda mínima associados a ações educativas. Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrentes de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro). 4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronuncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93. 5. Recurso extraordinário a que se nega provimento. (RE 567.985, Relator: Min. Marco Aurélio, Relator do acórdão: Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 18.04.2013, acórdão eletrônico DJe-194, divulgado em 02.10.2013, publicado em 02.10.2013). (BRASIL, 2013).”

Frise-se que a inconstitucionalidade no Recurso Extraordinário 580.963 (BRASIL, 2013), foi declarada parcial, pois garantia a isenção da contagem de renda auferida somente por idoso maior de 65 anos, para o cálculo da renda familiar per capta, conforme consta no acórdão:

“[...] 4. A inconstitucionalidade por omissão parcial do art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/2003. O Estatuto do Idoso dispõe, no art. 34, parágrafo único, que o beneficio assistencial já concedido a qualquer membro da família não será computado para fins do cálculo da renda familiar per capta a que se refere a LOAS. Não exclusão dos benefícios assistenciais recebidos por deficientes e de previdenciários, no valor de até um salário mínimo, percebido por idosos. Inexistência de justificativa plausível para discriminação dos portadores de deficiência em relação aos idosos, bem como dos idosos beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de benefícios previdenciários no valor de até um salário mínimo. Omissão parcial inconstitucional. 5. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/2003. 6. Recurso Extraordinário a que se nega provimento. (RE 580.963, Relator: Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 18.04.2013, processo eletrônico repercussão geral – Mérito DJe- 225, divulgado em 13.11.2013, publicado em 14.11.2013).”

Como visto, essa inconstitucionalidade foi julgada sob fortes fundamentos de que o critério trazido pela Lei encontra-se defasado, pois ao longo dos anos, ocorreram significativas mudanças fáticas, tanto no âmbito político e econômico quanto no âmbito social, o que significa que as dificuldades e necessidades enfrentadas pela sociedade passaram a ser de maneira diferente.

No mesmo sentido, partindo para o lado jurídico, após a publicação da LOAS, outras leis tratando de benefícios assistenciais foram criadas, e utilizando de critérios mais flexíveis para tal concessão.

Dessa forma, e com base nesses fundamentos, o STF entendeu que existem outros critérios para a fixação desse requisito de miserabilidade, afinal, não se faz mais possível utilizar apenas do parâmetro da lei para aferir a hipossuficiência do requerente.

De outro vértice, não se pode olvidar que, seria impossível estabelecer um critério uniforme para todo o país em razão de suas peculiaridades regionais, ferindo assim o princípio da igualdade material, que consiste em tratar os iguais como iguais e os desiguais como desiguais.

Por outro lado, além do princípio da igualdade material, não restam dúvidas da violação do princípio da dignidade da pessoa humana, uma vez que ao estabelecer um critério extremamente baixo para a concessão do benefício assistencial é ferir sem sombra de dúvidas esse princípio, pois a Constituição menciona necessidade e não miséria, de modo que o ser humano não precisa se encontrar em um estado miserável, sem condições alguma de sobrevivência para que lhe seja concedido o amparo assistencial.

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Sobre os autores
Elirani de Sousa Chinaglia

Advogada. Especialista em Direito Civil e Processo Civil e Previdenciário. Professora do curso de Direito da Universidade Paranaense - UNIPAR - Umuarama - Paraná.

Bruna Izabelly Martin Antonio

Acadêmica do curso de Direito da Universidade Paranaense - UNIPAR - Umuarama - Paraná

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CHINAGLIA, Elirani Sousa ; ANTONIO, Bruna Izabelly Martin. Benefício assistencial e o critério de miserabilidade versus o princípio da dignidade da pessoa humana. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4626, 1 mar. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/46886. Acesso em: 30 abr. 2024.

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