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Do penhor

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6. Bem empenhado. 

Bens inalienáveis não podem ser dados em penhor; nem as coisas impenhoráveis, já que não permitiriam a excussão e, portanto, a garantia em si seria imprestável à sua finalidade, de garantir o débito. Entretanto, há quem se posicione pela admissibilidade do penhor sobre coisas impenhoráveis. Nesse sentido, exemplificativamente, como o penhor é decorrente de negócio bilateral,

“Se o devedor oferece os bens em penhor, de forma livre e espontânea, em princípio está renunciando à impenhorabilidade, que é benefício instituído pela lei em seu favor, diferentemente do que ocorre nas hipóteses de inalienabilidade, quando então o impedimento decorre de lei de ordem pública, sendo inderrogável pela vontade das partes. Insta lembrar que o art. 1.433, IV, permite que a venda da coisa empenhada seja feita de forma amigável, de modo que se reforça aí o entendimento no sentido de que o devedor pode abrir mão da impenhorabilidade. O caso concreto, no entanto, será o melhor termômetro para essa conclusão. Em qualquer situação, deve ser tolhido o abuso de direito. O devedor que maliciosamente alega impenhorabilidade após ter oferecido bem a penhor não pode ser protegido. Por idênticas razões, não pode o credor ser beneficiado por conduta maliciosa, que tenha levado o devedor a empenhar bem essencial para sua sobrevivência.”[53]

Ainda que assim seja, há que enfrentar-se uma questão, no que toca ao penhor legal, que, por não ser convencional, não se sobressai sobre a impenhorabilidade. É que, como vimos acima, o CC/2002 estipulou o penhor legal em favor do locador. É credor pignoratício, independentemente de convenção, o dono do prédio rústico ou urbano, sobre os bens móveis que o rendeiro ou inquilino tiver guarnecendo o mesmo prédio, pelos aluguéis ou rendas (CC, art. 1.467, II). Entretanto, aqui parece haver conflito aparente de normas, em face da Lei nº 8.009, de 29 de março de 1990 (“lex specialis”), que dispõe que:

“Art. 1º O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.

Parágrafo único. A impenhorabilidade compreende o imóvel sobre o qual se assentam a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa, desde que quitados.

Art. 2º Excluem-se da impenhorabilidade os veículos de transporte, obras de arte e adornos suntuosos.

Parágrafo único. No caso de imóvel locado, a impenhorabilidade aplica-se aos bens móveis quitados que guarneçam a residência e que sejam de propriedade do locatário, observado o disposto neste artigo.”[54]

Ao referir-se a “imóvel locado”, evidentemente o parágrafo único do art. 2º quer dizer da proteção dos bens móveis quitados que guarneçam a residência e que sejam de propriedade do locatário, contra o credor, que é o locador. Por outro lado, a exceção à impenhorabilidade só é prevista no inciso VII do art. 3º da Lei do Bem de Família, por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação (incluído pela Lei nº 8.245, de 1991), que é ato negocial, ademais, garantia fidejussória, diferentemente do penhor legal, onde tem-se ato unilateral do credor, em garantia real.

Ocorre que, se o bem é impenhorável, não pode ser levado à praça pública na execução da dívida. No caso, não se tem renúncia do devedor à impenhorabilidade, porque estamos a falar de penhor legal, não penhor convencional. Assim, prevalecendo a impenhorabilidade, não pode o bem ser tomado pelo locador em penhor legal. E o que vale para interpretação da Lei n. 8.009/90 igualmente aplica-se à impenhorabilidade prevista no CPC, autorizando inclusive que o devedor tenha deferido pedido de reintegração de posse nos bens móveis que lhe tenham sido tomados pelo credor.[55]

O penhor também é possível em caso de condomínio (copropriedade ou compropriedade) sobre o bem dado em garantia. Entretanto, nessa situação, a coisa comum a dois ou mais proprietários não pode ser dada em garantia real, na sua totalidade, sem o consentimento de todos, mas cada um pode individualmente dar em garantia real a parte que tiver (CC/2002, art. 1.420, § 2º).

Ainda que os titulares de conta poupança mantida em conjunto sejam credores solidários do banco, a recíproca não é verdadeira, ou seja, penhor constituído por um dos titulares de conta solidária com o banco não faz o outro titular da conta ser devedor solidário da dívida assumida e garantida por penhor. Portanto,

“(…) 2. O saldo mantido na conta conjunta é propriedade condominial dos titulares. Por isso, a existência de condomínio sobre o saldo, que é bem divisível, impõe-se que cada titular só pode empenhar, licitamente, sua parte ideal em garantia de dívida (Arts. 757 do Código Beviláqua e 1.420, § 2º, do novo Código Civil).

3. O Banco credor que, para se pagar por dívida contraída por um dos titulares da conta conjunta de poupança, levanta o saldo integral nela existente, tem o dever de restituir as partes ideais dos demais condôminos que não se obrigaram pelo débito.”[56]

Admite-se o segundo penhor sobre a mesma coisa, nos casos em que o devedor se mantém na posse da coisa, ressalvada a prioridade do credor da dívida anterior. Por exemplo, a Lei nº 492, de 30 de agosto de 1937, que regula o penhor rural e a cédula pignoratícia, dispõe (art. 4º, §§ 1º e 2º) que pode o devedor, independentemente de consentimento do credor, constituir novo penhor rural se o valor dos bens ou dos animais exceder ao da dívida anterior, ressalvada para esta a prioridade de pagamento. Paga uma das dívidas, subsiste a garantia para a outra, em sua totalidade.

O Código Civil argentino (Código de Vélez Sarsfield) fora mais detalhista, ao especificar inclusive que o segundo credor deve ter a posse da coisa empenhada conjuntamente com o primeiro credor, ou deve a mesma ficar sob guarda de terceiro. Veja-se:

“Art. 3.210. Una nueva prenda puede ser dada sobre la misma cosa, con tal que el segundo acreedor obtenga conjuntamente con el primero, la posesión de la cosa empeñada, o que ella sea puesta en manos de un tercero por cuenta común. El derecho de los acreedores sobre la cosa empeñada seguirá el orden en que la prenda se ha constituido.”[57]

O segundo penhor sobre a mesma coisa pode ocorrer, também, quando da incidência de penhor legal sobre objeto anteriormente dado em garantia de dívida em penhor convencional.

Situação um tanto distinta, porque o credor é o mesmo, mas que na prática gera um segundo penhor, conhecido como penhor tácito, é aquela em que o devedor adquire nova dívida, mas sem expressa menção contratual a novo empenho do bem, dado em penhor à primeira dívida, como garantia desta segunda dívida. Foi prevista esta hipótese em vários ordenamentos jurídicos. Por exemplo, no art. 3.218 do Código Civil argentino (Código de Vélez Sarsfield):

“Si existiere, por parte del deudor que ha dado la prenda, otra deuda al mismo acreedor contratada posteriormente, que viniese a ser exigible antes del pago de la primera, el acreedor no está obligado a devolver la prenda antes de ser pagado de una y otra deuda, aunque no hubiese estipulación de afectar la cosa al pago de la segunda.”

O Código Penal prevê pena de reclusão, de um a cinco anos, e multa, para defraudação de penhor (modalidade de estelionato), mediante alienação da garantia pignoratícia não consentida pelo credor ou por outro modo, quando o autor do crime tem a posse do objeto empenhado (CP, art. 171, § 2º, III).

A legislação civil, ordinária ou extravagante, vem em reforço da necessidade de anuência do credor para venda do bem apenhado. Exemplificativamente: no penhor pecuário, o devedor não poderá alienar os animais empenhados sem prévio consentimento, por escrito, do credor (CC, art. 1.445); no penhor mercantil, o devedor não pode, sem o consentimento por escrito do credor, alterar as coisas empenhadas ou mudar-lhes a situação, nem delas dispor e o devedor que, anuindo o credor, alienar as coisas empenhadas, deverá repor outros bens da mesma natureza, que ficarão sub-rogados no penhor (CC, art. 1.449); também, a venda dos bens apenhados ou hipotecados pela cédula de crédito rural depende de prévia anuência do credor, por escrito.[58] 

No caso de penhor de veículos, a alienação, ou a mudança, do veículo empenhado, sem prévia comunicação ao credor, importa no vencimento antecipado do crédito pignoratício (CC, art. 1.465).

Ainda, o Código Penal prevê também pena de reclusão, de um a quatro anos, e multa, se o fato não constitui crime contra a economia popular (Lei nº 1.521, de 1951), à conduta do diretor ou gerente que, como garantia de crédito social, aceita em penhor ou caução ações da própria sociedade. É preciso compreender este dispositivo da legislação penal substantiva em consonância com a Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976 (“Lei das Sociedades por Ações”, também conhecida como “Lei das Sociedades Anônimas”, LSA), que dispõe, no § 3º do art. 30, que:

“A companhia não poderá receber em garantia as próprias ações, salvo para assegurar a gestão dos seus administradores.”


7. Extinção do penhor.

Extingue-se o penhor (CC, art. 1.436): I - extinguindo-se a obrigação; II - perecendo a coisa; III - renunciando o credor; IV - confundindo-se na mesma pessoa as qualidades de credor e de dono da coisa; V - dando-se a adjudicação judicial, a remissão ou a venda da coisa empenhada, feita pelo credor ou por ele autorizada.

Na hipótese do inciso I do art. 1.436 do Código Civil, como o penhor é acessório da obrigação principal, extinta esta, extingue-se aquele, seja qual for a causa da extinção da obrigação principal, se por pagamento direto, pagamento indireto, como na consignação em pagamento, ou sucedâneo de pagamento, como na compensação, transação ou novação.[59] Mas, como já vimos, admitem-se exceções, como a ressalva expressa, na novação (CC, art. 364), transmitindo a garantia para a nova obrigação.

Exige-se a quitação total do débito principal, para extinção do penhor. Se a quitação for apenas parcial, ainda que quase total, permanece o penhor na integralidade, em razão do princípio da indivisibilidade da garantia (CC, art. 1.421).

Ainda, vale lembrar que a sub-rogação transfere ao novo credor todos os direitos, ações, privilégios e garantias do primitivo, em relação à dívida, contra o devedor principal e os fiadores (CC, art. 349), seja sub-rogação legal (CC, art. 346) ou convencional (CC, art. 347). É que, ainda que a sub-rogação cause o fim da obrigação, tal se dá por substituição de uma dívida por outra e o penhor subsiste como garantia desta nova obrigação.[60]

Resolve-se o penhor também pelo perecimento da coisa apenhada (CC, art. 1.436, II), isto é, se todo o objeto perece (“Sicut re corporali extincta, ita et usufructu extincto pignus vel hypotheca perit”).

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É que a própria existência do penhor, enquanto contrato, depende da existência do penhor, enquanto coisa dada em garantia, por tratar-se o penhor, ademais, de direito real de garantia, i.e., que incide sobre coisa (res). Em havendo o perecimento da coisa garantidora do débito, resolve-se a garantia, mas a obrigação principal continua a existir. Como já vimos, o perecimento da coisa, sem substituição da garantia, ocasiona o vencimento antecipado da dívida (CC, art. 1.425, IV).[61]

Se o perecimento do bem deu-se por caso fortuito ou força maior, o penhor se resolve ficando o credor sem qualquer garantia especial e a obrigação passa, então, à condição de crédito quirografário, perdendo a preferência; se por culpa do credor, este responde pelo prejuízo causado ao proprietário da coisa, seja o devedor pignoratício, seja o terceiro garantidor; mas, havendo indenização, por seguro ou por terceiro responsabilizado pelo perecimento da coisa (ressarcimento do dano), a garantia se sub-roga no valor desta indenização, em benefício do credor, a quem assistirá sobre ela preferência até seu completo reembolso (CC, art. 1.425, § 1º). Inclusive, não se fará o penhor de veículos sem que estejam previamente segurados contra furto, avaria, perecimento e danos causados a terceiros (CC, art. 1.463).

Também, extingue-se o penhor pela desapropriação da coisa empenhada, já que o proprietário passará a ser a Fazenda Pública, que nada tem com esta relação travada entre particulares. A desapropriação, inclusive, gera a antecipação do vencimento da dívida garantida pelo penhor, hipótese na qual se depositará a parte do preço que for necessária para o pagamento integral do credor (CC, art. 1.425, V). Em reforço, diga-se que o art. 31 do Decreto-lei 3.365/41 prevê que:

“Ficam subrogados no preço quaisquer ônus ou direitos que recaiam sobre o bem expropriado.”[62]

Há, todavia, que atentar-se que a sub-rogação dos créditos com garantia real no valor da indenização (preço da desapropriação) não se opera automaticamente, querendo isto significar que é necessária a prévia excussão da dívida pelas vias próprias, pelo credor contra o devedor, para recebimento do crédito depositado em seu favor nos autos da ação expropriatória.[63]

O inciso III do art. 1.436 do Código Civil trata da extinção do penhor pela renúncia do credor, enquanto ato unilateral, que pode ser expressa, por ato inter vivos ou causa mortis, ou tácita. O dispositivo trata exclusivamente da extinção do penhor por renúncia do credor a esta garantia, passando o crédito à condição de quirografário. No entanto, se o credor renunciar ao crédito da obrigação principal, evidentemente o penhor também estará extinto, em razão de seu caráter acessório.

A renúncia do credor, ao penhor, será tácita, nas hipóteses do § 1º do art. 1.436 do Código Civil, isto é, quando o credor consentir na venda particular do penhor sem reserva de preço, anuir à substituição do penhor por outra garantia, ou, ainda, restituir a posse da coisa apenhada ao devedor (neste caso, obviamente, se tinha a posse do bem, por transmissão efetiva quando da avença de garantia real). Neste último caso, é relevante recordar também que a restituição voluntária do objeto empenhado prova a renúncia do credor à garantia real, não a extinção da dívida (CC, art. 387). Por isso, mais uma vez frisamos que no inciso III do art. 1.436 do Código Civil trata-se exclusivamente da extinção do penhor, não da extinção da obrigação principal. 

A Lei nº 11.101, de 09 de fevereiro de 2005, dispõe (art. 50, XI) que a venda parcial dos bens constitui meio de recuperação judicial, observada a legislação pertinente a cada caso. Todavia, faz ressalva, no § 1º do mesmo art. 50, de que na alienação de bem objeto de garantia real, a supressão da garantia ou sua substituição somente serão admitidas mediante aprovação expressa do credor titular da respectiva garantia.

O penhor também se extingue pela confusão (CC, art. 1.436, IV), ou seja, se o credor vier a tornar-se o proprietário da coisa empenhada, por ato inter vivos ou causa mortis. De outro modo, dá-se a confusão também se o proprietário da coisa empenhada, devedor pignoratício ou terceiro, vier a tornar-se o titular do direito de crédito ao qual dirige-se a garantia. Operando-se a confusão apenas quanto a parte da dívida pignoratícia, subsistirá inteiro o penhor quanto ao resto, em razão do princípio da indivisibilidade da garantia (CC, art. 1.436, § 2º).

Nos termos do inciso V do art. 1.436 do Código Civil, extingue-se o penhor pela adjudicação judicial, remissão ou venda da coisa empenhada, feita pelo credor ou por ele autorizada. O legislador errou a redação, claramente. “Remissão” da dívida é:

“o ato de liberalidade do credor, perdoando a dívida ou renunciando ao direito de exigi-la”.[64]

A remissão do penhor seria, então, a renúncia à garantia, que, todavia, já veio prevista no inciso III do art. 1.436 do CC/2002. Ademais, por referir-se ainda à adjudicação judicial e à venda da coisa empenhada, o inciso V do art. 1.436 do CC/2002 insere-se num contexto que mais favoreceria à redação do instituto da “remição”, por sua vez,

“…a exoneração ou a salvação do ônus ou encargo ou da execução, pelo resgate ou pagamento, que se efetiva, do valor do débito, da obrigação, do ônus ou da execução”.[65]

E assim,

“Na ortografia oficial, no sentido de resgate, é remição, de remir, não remissão, de remitir”.[66]

Vale registrar que, na falência, ao administrador judicial compete, sob a fiscalização do juiz e do Comitê de Credores, remir, em benefício da massa e mediante autorização judicial, os bens apenhados (Lei nº 11.101/2005, art. 22, III, “m”).

Finalmente, o penhor pode ser extinto por outras causas não previstas no Código Civil, conforme entendimento presente na doutrina pátria. Por exemplo, pela resolução da propriedade da coisa gravada, pelo lapso do tempo pelo qual incide o ônus real conforme a avença pactuada ou, ainda, ocorrência de condição determinada pelas partes.[67] 

Ressalte-se que produz efeitos a extinção do penhor somente depois de averbado o cancelamento do registro, à vista da respectiva prova (CC, art. 1.437). Assim, conforme for o caso, não havendo prova hábil ao cancelamento do registro, será necessária a decisão judicial transitada em julgado em favor do proprietário do bem dado em penhor. 

Como vimos acima, são títulos executivos extrajudiciais os contratos garantidos por penhor. Contudo, o art. 785 do CPC/2015 vem com a estranha proposta de que:

“A existência de título executivo extrajudicial não impede a parte de optar pelo processo de conhecimento, a fim de obter título executivo judicial”.

Com base nesse dispositivo, não será inadmissível, portanto, que o credor pignoratício proponha ação de conhecimento, para condenação do devedor ao pagamento da dívida, ao invés de propor a execução do título extrajudicial.

Em nosso entendimento, todavia, tal iniciativa processual poderá significar a renúncia tácita do credor à garantia real, sendo hipótese de extinção do penhor, malgrado não esteja prevista no § 1º do art. 1.436 do Código Civil.

Assim o será, porque a intenção do credor, ao propor a ação de conhecimento, será a de poder receber o valor da dívida a partir do título judicial, sem execução que se dê pelo título extrajudicial e penhora preferencial sobre o bem empenhado. Assim, dá-se a renúncia tácita ao penhor.

A consumação desta renúncia é quando, citado o devedor, tiver este contestado a ação, pois o credor (autor) não mais poderá desistir da ação de conhecimento sem o consentimento do réu. Com efeito, dispõe o novo CPC/2015:

“Oferecida a contestação, o autor não poderá, sem o consentimento do réu, desistir da ação” (art. 485, § 4º).

A partir daí, pendente de julgamento a lide do processo de conhecimento, o credor não terá interesse de agir para propositura da execução do contrato garantido por penhor, enquanto título executivo extrajudicial, porque já ocorreu a extinção do penhor, de forma tácita. Melhor dizendo: o credor nem mais disporá de título executivo extrajudicial.

É bem verdade que o § 1º do art. 784 do CPC/2015 também dispôs que:

“A propositura de qualquer ação relativa a débito constante de título executivo não inibe o credor de promover-lhe a execução." 

Mas, note-se que, no caso do crédito pignoratício, tem-se como título executivo extrajudicial o contrato garantido por penhor e, não mais subsistindo o penhor por renúncia tácita do credor, não há mais título executivo extrajudicial, já que o contrato em si terá perdido tal eficácia, situação que difere de outros títulos executivos extrajudiciais, para os quais possa ser aplicado o referido § 1º do art. 784 do Novo CPC.[68]

Entretanto, em razão do disposto no art. 1.437 do Código Civil, deve haver decisão judicial, transitada em julgado, reconhecendo que, em hipótese como esta, houve renúncia tácita do credor ao penhor, o que pode obter-se por ação declaratória ajuizada pelo proprietário da coisa empenhada contra o credor, ou, ainda, por meio de embargos do devedor pignoratício à execução extrajudicial movida pelo credor, após ter o devedor contestado a ação do processo de conhecimento a que nos referimos acima, ou mesmo por meio de embargos de terceiro, quando for terceiro o proprietário da coisa empenhada. A sentença, transitada em julgado, funcionará, na hipótese, para as finalidades do art. 1.437 do CC/2002, como título idôneo para extinção do penhor, mediante averbação.

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Sobre o autor
Thiago Cássio D'Ávila Araújo

Procurador Federal da Advocacia-Geral da União (PGF/AGU) em Brasília/DF. Foi o Subprocurador Regional Federal da Primeira Região (PRF1). Ex-Diretor Substituto e Ex-Diretor Interino do Departamento de Contencioso da Procuradoria-Geral Federal (DEPCONT/PGF), com atuação no STF e Tribunais Superiores; Ex-Coordenador do Núcleo de Assuntos Estratégicos do Departamento de Contencioso da Procuradoria-Geral Federal (NAEst/DEPCONT/PGF); Ex-Coordenador-Geral de Matéria Finalística (Direito Ambiental) e Ex-Consultor Jurídico Substituto da Consultoria Jurídica do Ministério do Meio Ambiente (CONJUR/MMA); Ex-Consultor Jurídico Adjunto da Matéria Administrativa do Ministério da Educação (MEC); Ex-Assessor do Gabinete da Consultoria Jurídica do Ministério da Justiça. Desempenhou atividades de Procurador Federal junto ao Instituto Brasileiro de Turismo (EMBRATUR), junto ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), dentre outras funções públicas. Foi também Conselheiro Titular do Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN). Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN/2001) e Mestre em Direito e Políticas Públicas pelo Centro Universitário de Brasília (UniCEUB/2010). Em 2007, aos 29 anos, proferiu uma Aula Magna no Supremo Tribunal Federal (STF).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ARAÚJO, Thiago Cássio D'Ávila. Do penhor. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4653, 28 mar. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/47617. Acesso em: 28 mar. 2024.

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