O vício de inconstitucionalidade por quebra de decoro parlamentar e sua configuração na aprovação da Emenda Constitucional nº 41/2003

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4. DISCUSSÃO ACERCA DA INCONSTITUCIONALIDADE DA EC N° 41/2003 POR VÍCIO DE DECORO PARLAMENTAR - ADIs N°S 4887, 4888 E 4889

Inicialmente, cumpre frisar que, para a maior parte da doutrina, dentre eles José Afonso da Silva (2010, p. 47), a incompatibilidade, tecnicamente denominada de inconstitucionalidade, pode ocorrer de duas maneiras:

(a) formalmente, quando tais normas são formadas por autoridades incompetentes ou em desacordo com formalidades ou procedimentos estabelecidos pela constituição; (b) materialmente, quando o conteúdo de tais leis ou atos contraria preceito ou princípio da constituição.

Contudo, merece destaque a hipótese peculiar de inconstitucionalidade por quebra de decoro parlamentar, a qual desafia o controle jurisdicional de constitucionalidade, conforme tese idealizada e lançada por Pedro Lenza em 2005.

A tese de nova hipótese para o controle de constitucionalidade agora encontra respaldo para ser aplicada, em razão do julgamento do caso do “mensalão” na Ação Penal (AP) n° 470, oportunidade em que se concluiu pela existência de um esquema de compra de votos de sete parlamentares, para que projetos de lei fossem aprovados de acordo com os interesses do governo à época. Atualmente, a Ação Penal se encontra em sede de embargos infringentes no Supremo Tribunal Federal, e seu mérito já foi amplamente discutido e analisado, tendo os Ministros se manifestado por diversas vezes no sentido de que houve, sim, a compra de votos na Câmara dos Deputados.

Consoante o decisum do STF, verifica-se a ocorrência de grave vício no processo legislativo da Emenda Constitucional n° 41/03. Entretanto, questão nodal a ser enfrentada pelo STF nas ADIs n°s 4887, 4888 e 4889 reside antes na possibilidade de controle de constitucionalidade por quebra de decoro parlamentar em face da comprovada existência de esquema de compra de votos.

Lenza entende ser possível o controle de constitucionalidade pelo Judiciário por vício decorrente de quebra do decoro parlamentar (2013, p. 273):

(...) trata-se de vício de decoro parlamentar, já que, nos termos do art. 55, § 1º, “é incompatível com o decoro parlamentar, além dos casos definidos no regimento interno, o abuso das prerrogativas asseguradas a membro do Congresso Nacional ou a percepção de vantagens indevidas”.

Frise-se que, embora desde 2005 Lenza levante a possibilidade de controle de constitucionalidade por supramencionado motivo, somente agora o Supremo Tribunal Federal se manifestará sobre esse vício, uma vez que tramitam na Corte Suprema três ações sobre a matéria.

Nesse passo, é oportuno registrar que a Associação dos Delegados de Polícia do Brasil (ADEPOL), a Confederação dos Servidores Públicos do Brasil (CSPB) e o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) ajuizaram, respectivamente, as Ações Diretas de Inconstitucionalidade n°s 4887, 4888 e 4889 no Supremo Tribunal Federal, tendo as três como relatora a Ministra Carmem Lúcia, todas com o fito de ver declarada a inconstitucionalidade da Emenda Constitucional n° 41, de 19 de dezembro de 2003.

Nesse sentido, Fonseca (2012, online) assevera que:

Há algum tempo o Prof. Pedro Lenza vem levantando a discussão sobre a inconstitucionalidade decorrente da quebra de decoro parlamentar. Este assunto já foi até objeto de questionamento em concurso público. O tema é polêmico, não havendo consenso doutrinário sobre ele. Agora o STF terá a oportunidade de se manifestar sobre o assunto. Tratam-se de ADIs que questionam a Reforma da Previdência (EC n° 41/2003), sob a alegação de que foi aprovada por meio de votos de parlamentares comprados por réus condenados no Mensalão (AP 470).

Passemos agora a uma breve análise das Ações Diretas de Inconstitucionalidade que estão com julgamento pendente no Supremo Tribunal Federal, atualmente conclusas à relatora Ministra Carmem Lúcia, ressaltando que, inobstante essas ADIs apresentem também outros vícios formais e materiais da Emenda Constitucional n° 41/03, no presente trabalho, deter-nos-emos nos argumentos que se referem a inconstitucionalidade por quebra de decoro parlamentar.

Ao final, destacaremos outros argumentos favoráveis à referida inconstitucionalidade dessa Emenda por esse vício, além de expor os argumentos contrários, os quais defendem a sua constitucionalidade.

4.1. Análise da ADI N° 4887

Ação ajuizada pela Associação dos Delegados de Polícia do Brasil, com pedido cautelar, pugnando pela inconstitucionalidade de toda a Emenda Constitucional n° 41/2003, em especial do Art. 40, § 7o, I e II, CRFB/88, com as alterações trazidas pela emenda rechaçada, bem como pela totalidade da EC n° 47/2005.

Buscaremos, por enquanto, trazer alguns argumentos que militam em favor da inconstitucionalidade da Emenda Constitucional n° 41/2003 por vício decorrente de quebra do decoro parlamentar.

A Associação dos Delegados de Polícia do Brasil sustentou na exordial que a Emenda Constitucional n° 41/2003 foi introduzida em nosso ordenamento jurídico mediante processo legislativo viciado, uma vez que restou comprovado, na Ação Penal n° 470, a existência de esquema de compra de votos de deputados federais por integrantes do Executivo à época, violando princípios como os da moralidade e da representatividade popular, assegurados por nossa Carta Magna. Senão vejamos:

[...] afronta ao princípio da moralidade (C.F.. art. 37, caput, tendo em conta que o processo legislativo foi, inequivocadamente, imoral e fraudado, como ficou já demonstrado nos presentes autos (venda de votos). Maculada, destarte, “a essência do voto e o conceito de representatividade popular (C.F., art. Io, § único) (grifo original)

Ao ser aprovada por meio de procedimento viciado, em que parlamentares votaram pela aprovação da Emenda por interesses particulares, resta clarividente que houve vício decorrente da quebra de decoro parlamentar por ofensa ao Art. 55, § Io, da CRFB/88, bem como a diversos princípios constitucionais, o que esvazia a legitimidade da aprovação da Emenda.

Por conseguinte, toma-se premente a necessidade de se expurgar a Emenda Constitucional n° 41/2003 de nosso ordenamento.

Nesse sentido, colaciono trecho da inicial em comento:

Em suma, o vício ocorrido no processo legislativo demonstrado é inequívoco e, portanto, tornam os atos normativos impugnados in totum inconstitucionais e nulos, de forma chapada, data vênia, expressão utilizada, no cotidiano, pelo então Ministro Sepúlveda Pertence, isto é, na espécie, a totalidade das Emendas Constitucionais 41/03 e 47/05. (grifo original)

Por sua vez, o Sindicato dos Auditores Fiscais da Receita Estadual do Rio de Janeiro (SINFRERJ) e o Sindicato Nacional dos Servidores Federais Autárquicos nos Entes de Formulação, Promoção e Fiscalização da Política da Moeda e do Crédito (SINAL) requereram o ingresso no feito na condição de amicus curiae, conforme previsto no Art. 7o, § 2o, da Lei n° 9.868/99 [11].

Cumpre trazer à baila o Parecer do Procurador-Geral da República, que reconheceu não haver dúvida de que houve vício na formação da vontade no procedimento legislativo, e que houve nítida violação aos princípios democrático e do devido processo legislativo. Todavia, ao final, alegou não ter havido comprovação de mácula na vontade de parlamentares em número suficiente para alterar o quadro de aprovação do ato normativo, e, em respeito ao princípio constitucional de presunção de não culpabilidade (art. 5o, LVII, CRFB/88), não poderia ser presumido esse esquema de compra e venda de votos e apoio político aos demais parlamentares envolvidos, razão pela qual deu parecer pela improcedência do pedido autoral.

Os autos de referida ação, até o momento do fechamento deste capítulo, estão conclusos à relatora. Aguardemos como o Supremo Tribunal Federal analisará essa nova hipótese de vício de inconstitucionalidade.

4.2. Análise da ADI N° 4888

Nesta ADI, a Confederação dos Servidores Públicos do Brasil (CSPB) afirmou a inconstitucionalidade dos Arts. Io e 4o da Emenda Constitucional n° 41/2003 por contrariarem o disposto no Art. 55, § Io da CRFB/88, ao defender que “as normas em questão foram editadas em um contexto e em uma dinâmica de vício insanável de decoro parlamentar, vedado expressamente no artigo 55. § 1°. da Constituição da República Federativa do Brasil”. (grifo original)

Na inicial, a parte autora revela a mácula no processo legislativo, votação da Emenda Constitucional n° 41/2003, ao descrever que:

O Supremo Tribunal Federal no julgamento da Ação Penal 470, também já reconheceu a comprovação induvidosa da existência de crime contra a República Federativa do Brasil, crime de lesa-pátria alojado no lamentável fenômeno de quebra de decoro parlamentar à ocasião do processo legislativo de formação e votação da Emenda Constitucional n° 41, de 19 de dezembro de 2003, publicada no Diário Oficial da União, em 31/12/03, emenda essa que ensejou a malfadada “Reforma da Previdência”, com redução de direitos previdenciários de servidores públicos e a privatização de parte do sistema político de seguridade.

A Confederação dos Servidores Públicos do Brasil destacou que as condutas criminosas dos parlamentares envolvidos no esquema organizado para ampliar a base de apoio do governo na Câmara dos Deputados acarretaram o malferimento da soberania popular, da moralidade e da probidade administrativas.

Ademais, a parte autora salientou a necessária existência de “instrumentos jurídicos capazes de inibir eventuais desvios de poder ou de conduta ocorridos quando do exercício da atividade parlamentar”. Assim, uma vez caracterizada a prática de abuso ou desvio desse poder, deve o Judiciário agir, a fim de impedir que atos normativos sejam elaborados e aprovados mediante processo legislativo viciado.

Destaque-se que a inicial em comento assenta-se em decisão, inaugural no âmbito do Poder Judiciário sobre o tema, de lavra do magistrado mineiro Doutor Geraldo Claret de Arantes, que, ao julgar o Mandado de Segurança n° 002412129593-5, declarou, em 3 de outubro de 2012, em sede de controle difuso, a inconstitucionalidade da Emenda Constitucional n° 41/2003 por vício decorrente da quebra de decoro parlamentar. Cópia integral da sentença encontra-se em anexo.

Colaciona-se excerto da decisão supracitada, in verbis:

[...] EC 41/2003 foi fruto não da vontade popular representada pelos parlamentares, mas da compra de tais votos, mediante paga em dinheiro para a aprovação no parlamento da referida emenda constitucional que, por sua vez, destrói o sistema de garantias fundamentais do estado democrático de direito.

Aguardemos como o Supremo Tribunal Federal vai se manifestar sobre a matéria; atualmente, os autos se encontram conclusos à relatora, Ministra Carmem Lúcia.

4.3. Análise da ADI N° 4889

A Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 4889 ajuizada pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) questiona a inconstitucionalidade da Reforma da Previdência, visto que restou comprovada a prática do crime de corrupção passiva de sete parlamentares, os quais venderiam seus votos para a aprovação de projetos importantes do governo em troca de benefícios financeiros.

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Conforme a parte autora, estaria, dessa forma, evidenciado o vício de inconstitucionalidade por violação dos princípios da representação democrática e da moralidade.

Para reforçar o exposto, colacionam-se trechos da inicial desta ação:

Está-se diante de uma conduta que comprovadamente afrontou o princípio da representação popular, na forma do quanto arguido. O vício de vontade dos parlamentares, para além de contaminar o de outros parlamentares, que seguiram a orientação do seu partido, num total de 108 votos, contaminou o próprio processo legislativo, que, não pode prevalecer face à patente inconstitucionalidade que o inquina.

[...]

Inegavelmente, a votação da PEC 40/2003 foi fraudada, corrompida, vilipendiada por dinheiro e razões outras escusas, por exercício de indevido poder político e por meios ilícitos e vedados que burlaram o devido processo legislativo e inconstitucionalmente fixada a Emenda - ferindo notadamente os princípios da moralidade, da ética, da democracia, da representação popular - art. Io, Parágrafo único da CF/88, da boa-fé, da segurança jurídica, do devido processo legislativo - culminou na inconstitucionalidade formal da Emenda Constitucional 41/2003, razão pela qual se requer à essa Corte o controle de constitucionalidade abstrato para declarar a inconstitucionalidade da referida norma, retirando-a do ordenamento.

Por fim, em sucinta análise das três ADIs que estão aguardando julgamento no Supremo Tribunal Federal, todas versando sobre o vício de inconstitucionalidade por quebra de decoro parlamentar, destaca-se a condução dos processos pela relatora Ministra do STF, Carmem Lúcia, a qual fez por bem atribuir o rito abreviado do Art. 12 da Lei n° 9.868/99, determinando que sejam prestadas com urgência informações do Congresso Nacional sobre os dispositivos questionados, abrindo vista ao Procurador-Geral da República e ao Advogado- Geral da União para manifestação, além de levar a matéria diretamente ao Plenário do Supremo Tribunal Federal, consoante trechos do seguinte despacho:

2. Adoto o rito do art. 12 da Lei n. 9.868/99 e determino sejam requisitadas, com urgência e prioridade, informações do Congresso Nacional, para que as preste no prazo máximo e improrrogável de dez dias.

Na seqüência, dê-se vista ao Advogado-Geral da União e ao Procurador- Geral da República, sucessivamente, para manifestação, na forma da legislação vigente, no prazo máximo e igualmente improrrogável e prioritário de cinco dias cada qual (art. 12 da Lei n. 9.868/99). (grifo original)

Frise-se que será a primeira vez que nossa Suprema Corte se manifestará sobre a inconstitucionalidade por quebra de decoro parlamentar, razão pela qual se mostra assaz relevante seu pronunciamento, seja para declarar a inconstitucionalidade ou constitucionalidade da Emenda Constitucional n° 41/2003 por esse motivo.

4.4. Fundamentos jurídicos favoráveis à constitucionalidade e inconstitucionalidade da EC n° 41/2003 por quebra de decoro parlamentar

Nesse ponto, inicialmente, teceremos breves comentários sobre os argumentos a favor da constitucionalidade da Emenda Constitucional n° 41/2003, para somente depois destacar os fundamentos favoráveis à declaração de inconstitucionalidade.

Um dos fundamentos contrários à inconstitucionalidade da Emenda Constitucional n° 41/2003 se baseia na competência exclusiva do Congresso Nacional para averiguar a ocorrência de quebra de decoro parlamentar de seus componentes, cuja matéria seria interna corporis, o que, por sua vez, impossibilitaria a apreciação pelo Judiciário.

Entretanto, em que pese a suposta competência exclusiva do Congresso Nacional para averiguar a ocorrência de quebra de decoro parlamentar, da análise dos autos da Ação Penal n° 470, não restam dúvidas acerca da atuação dos parlamentares condenados, que infringiram de forma aviltante e das mais variadas maneiras as disposições do Código de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados.

Todavia, a conduta desses parlamentares também violou princípios expressos da CRFB/88, razão pela qual se faz necessária à apreciação pelo Poder Jurisdicional. Inviabilizar a análise dessa questão pelo Judiciário em casos tão flagrantes como esse, é atentar contra a soberania popular, a moralidade administrativa e o Estado Democrático de Direito como um todo.

Frise-se que não se objetiva com isso, desconstituir a legitimidade ou mesmo minar a competência das casas legislativas para avaliar o decoro de seus próprios membros. O que se deseja esclarecer é que, ante a comprovada existência de compra de votos de parlamentares para aprovação de propostas de interesse do Governo à época, resta patente a ofensa a uma série de princípios constitucionais. Logo, o Supremo Tribunal Federal, como guardião da Constituição, deve protegê-la dessas “normas compradas”.

É cediço que cabe somente à respectiva casa legislativa analisar a conduta atentatória ao decoro praticada por seus integrantes e puni-los quando necessário, mas - repise- se - o que se está a defender é a possibilidade de análise pelo Supremo Tribunal Federal sobre a constitucionalidade de uma norma em razão desse vício - corrupção dos membros do parlamento no processo legislativo.

Ademais, é salutar esclarecer que omitir-se quanto à tarefa de apreciar referida quebra de decoro parlamentar difere e muito do ato de declarar a inconstitucionalidade de uma norma em razão dessa comprovada violação.

Em outras palavras, o objeto de controle jurisdicional não repousaria sobre as condutas parlamentares em si mesmas consideradas, mas sim sobre o resultado final delas. A exemplo do que se defende nas ADIs n° 4887, 4888 e 4889, a Emenda Constitucional 41/2003, aprovada sob esse esquema de corrupção parlamentar, seria inconstitucional. Ou seja, não se trata de tarefa do Supremo Tribunal Federal julgar o ato do parlamentar em si, mas sim com relação à norma resultante deste. Se a malversação das prerrogativas parlamentares foi determinante para o advento da Emenda na ordem jurídica, deve, portanto, ser declarada inconstitucional, pois já nasceu maculada pelo vício volitivo representativo.

Outro argumento a favor da constitucionalidade dessa Emenda reside no fato de que apenas sete parlamentares, condenados na AP n° 470, estariam envolvidos nesse esquema de compra de votos. Para os defensores desse argumento, referido número de parlamentares corrompidos seria irrelevante frente ao total de votos necessários para a aprovação da Emenda.

Dessa forma, não seria tal violação suficiente para comprometer as votações da PEC n° 40/2003, uma vez que, retirados os votos viciados, permaneceria respeitado o quórum de três quintos, necessários à sua aprovação.

Ocorre que, apesar do reduzido número de parlamentares investigados e condenados frente ao total de membros presente na Câmara, deduz-se que a atenção do corruptor se volta para peças importantes no jogo político, de modo que o “investimento traga resultados”. Assim, embora não se possa afirmar qualquer desdobramento desse esquema de compra de votos com precisão, é de se inferir que, no mínimo, como alguns dos deputados condenados eram líderes de bancadas de seus partidos políticos, tenham eles influenciado os demais integrantes de seus partidos, no sentido de se ver aprovada a PEC n° 40/2003.

Mesmo que isso não tenha ocorrido, tomamos a dizer que a cormpção de uns poucos congressistas em sua função precípua, qual seja, votar pela aprovação de leis, já se afigura suficiente para embasar a declaração de inconstitucionalidade de norma decorrente dessa prática. Assim deve se dar, tendo em vista que o mais importante é a manutenção da ordem pública e do Estado Democrático de Direito, com o devido respeito aos mais diversos princípios constitucionais, como os da soberania popular, moralidade e representatividade popular.

Cumpre agora destacar alguns argumentos favoráveis à inconstitucionalidade da Reforma da Previdência de 2003, em decorrência do vício de quebra de decoro parlamentar.

Os que são contrários à constitucionalidade da Emenda Constitucional n° 41/2003 defendem não haver dúvidas da ocorrência da quebra de decoro parlamentar pelos deputados envolvidos no esquema de compra de votos e indiciados na Ação Penal n° 470, visto que a exigência constitucional do decoro, estatuída no Art. 55, § Io, CRFB/88, representa justamente a fidúcia que deve existir entre o eleitor e o eleito, durante o mandato parlamentar.

Ora, resta claro que os condenados, ao venderem seus votos, deixaram de exercer seu mandato com a necessária moralidade administrativa, dignidade e respeito à coisa pública e à soberania popular.

Ao terem votado de acordo com interesses escusos, estão os deputados condenados abusando de seu poder, em nítido desvio de finalidade.

Isso macula não apenas os princípios da moralidade e probidade administrativa, mas o próprio modelo democrático traçado pela nossa Constituição atual como um todo, o que, consequentemente, retira a validade do processo legislativo de formação da Emenda Constitucional n° 41/2003.

Ante o exposto, torna-se evidente que permitir a subsistência da Emenda Constitucional n° 41/2003 implica em desrespeitar uma gama de princípios e valores estatuídos em nossa CRFB/88, razão pela qual reputamos essencial a declaração de inconstitucionalidade dessa Emenda pelo Supremo Tribunal Federal, de modo que seja ela expurgada de nosso ordenamento.

Todavia, cumpre ressaltar que na decisão do STF pode ser aplicado o instituto de modulação dos efeitos, por razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, por maioria qualificada de 2/3 de seus Ministros, podendo-se restringir os efeitos dessa declaração ou decidir que ela tenha eficácia a partir do trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado, conforme Art. 27 da Lei n° 9.868/99.

É de extrema relevância para o caso essa possibilidade de modulação de efeitos das decisões proferidas pelo STF no controle concentrado de constitucionalidade, porque permite uma ponderação e conciliação dos interesses social, jurídico, político e econômico, de modo a se resguardar a segurança jurídica no ordenamento.

Por enquanto, só nos resta aguardar o pronunciamento do Supremo Tribunal Federal sobre o tema nas ADIs n° 4887, 4888 e 4889.

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Sobre o autor
João Henrique de Brito Marinho

Defensor Público do Estado de Sergipe.Pós-Graduado em Direito Constitucional pela Faculdade de Direito Damásio de Jesus. Pós-Graduado em Direito Penal e Direito Processual Penal pela FACET. Pós-Graduado em Acesso à justiça e Defensoria Pública pelo Centro Universitário Uniprojeção em Brasília. Graduado em Direito pela Universidade Federal do Ceará - UFC. Aprovado nos concursos da Defensoria Pública dos Estados do Maranhão, Sergipe e Rio Grande do Norte. Aprovado nos concursos de Analista Judiciário do MP/CE, TRF - 5ª Região e TJ/PE. Aprovado no concurso de Oficial de Justiça do TJ/PE. Aprovado no concurso de Advogado da FUNSAÚDE. Aprovado nos concursos de Técnico Judiciário do TRF - 5ª Região e TJ/PE.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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