No Brasil, a regra de impenhorabilidade de salários sempre foi absoluta, não se admitindo penhora parcial de rendimentos provenientes de trabalho, com exceção de dívida alimentar.
Ou seja, todos os rendimentos de pessoa natural, que sejam decorrentes de salário, independentemente de valor, eram regidos pelas normas de impenhorabilidade absoluta previstas no artigo 649, inciso IV, do Código de Processo Civil de 1973 cumulado com o artigo 7º, inciso VI, da Constituição Federal, que prevê a irredutibilidade salarial.
No entanto, tal matéria foi uma das novidades do Novo Código de Processo Civil, passando a ser admitida a penhora de salário de um executado.
Tal inovação visa garantir a efetividade da prestação jurisdicional no processo de execução, objetivando minimizar as constantes fraudes contra credores e também à execução.
Nesse sentido, a regra de impenhorabilidade de salário está assegurada no artigo 833, do Novo Código de Processo Civil, que apresenta o rol elencando diversas hipóteses de impenhorabilidade, ou seja, situações nas quais, por força de lei, a penhora não é admitida.
A novidade encontra previsão no próprio artigo 833, do Novo Código de Processo Civil, em seu parágrafo 2º, conforme abaixo transcrito:
“Art. 833 – São impenhoráveis:
(...)
§ 2º O disposto nos incisos IV e X, do caput não se aplica a hipótese de penhora para pagamento de prestação alimentícia, independentemente da sua origem, bem como às importâncias excedentes a 50 (cinquenta) salários mínimos mensais, devendo a constrição observar o disposto no artigo 528, § 8º, e no artigo 529, § 3º.”
Desta forma, importa dizer que, ainda que se trate de salário ou de reserva pessoal, o valor é passível de constrição para pagamento de prestação alimentícia (regra já prevista no Código de Processo Civil de 1973) e, quanto aos valores superiores a 50 (cinquenta) salários mínimos mensais, para pagamento de quaisquer débitos diversos do débito alimentar.
Importante ressaltar que, tratando-se de penhora para pagamento de prestação alimentícia, a mesma pode ser decorrente de qualquer origem, seja em razão de direito de família, seja decorrente de ato ilícito. A possibilidade de penhora para pagamento de prestação alimentícia decorrente de ato ilícito também é uma novidade implementada no Novo Código de Processo Civil.
É de se observar que, apesar da mudança do ordenamento jurídico objetivar a satisfação do crédito por parte do devedor, provavelmente terá pouco efeito prático e acabará por se tornar irrelevante.
Isto porque o valor de 50 (cinquenta) salários mínimos mensais a título de salário é considerado bastante expressivo para a realidade brasileira, visto que poucos trabalhadores recebem mais de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) mensais.
Ainda, importante mencionar que a regra de possibilidade de penhora de valor superior a 50 (cinquenta) salários mínimos mensais refere-se ao valor bruto do salário, isto é, antes dos descontos legais, como imposto de renda e INSS.
De destacar que, em determinados meses do ano, como aqueles em que há pagamento de décimo terceiro e participação nos lucros, a quantia recebida pelo Executado pode ultrapassar o piso estabelecido no Novo Código de Processo Civil. Assim, tendo em vista que a legislação não faz qualquer ressalva ou exclusão, pode-se afirmar que é possível a penhora de salários em referidos meses do ano, desde que a somatória ultrapasse a base de 50 (cinquenta) salários mínimos.
Outrossim, considerando a disposição do artigo 1.046 do Novo Código de Processo Civil: “Ao entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973”, vale dizer que a regra de penhora de salários é aplicada às execuções iniciadas no sistema do antigo Código de Processo Civil.
No mais, apesar de não haver previsão legal, existem alguns precedentes admitindo a penhora de rendimentos provenientes de salário, ainda que o crédito não constitua prestação alimentícia, quando não houver risco para a sobrevivência digna do devedor, conforme demonstra o seguinte julgado:
“PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. PENHORA. VALORES PROVENIENTES DE SALÁRIO. SÚMULAS N. 7 E 83 DO STJ. PRECLUSÃO PRO JUDICATO. SÚMULA N. 284 DO STF.
1. omissis;
2. A regra geral da impenhorabilidade inscrita no art. 649, IV, do CPC pode ser mitigada, em nome dos princípios da efetividade e da razoabilidade, nos casos em que ficar demonstrado que a penhora não afeta a dignidade do devedor. Precedentes.
3. Não se conhece do recurso especial se o exame da suposta contrariedade do julgado a dispositivos de lei estiver condicionado à (re)avaliação de premissa fático-probatória já definida no âmbito das instâncias ordinárias.
4. Agravo regimental desprovido.”
(AgRg no REsp 1473848/MS, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/09/2015, DJe 25/09/2015) g.n.
Assim, é possível verificar que o Colendo Superior Tribunal de Justiça, ponderando os valores envolvidos no caso concreto, em situações excepcionais, já admitia a penhora de uma fração dos rendimentos do devedor.
Dessa forma, apesar do valor estipulado no Novo Código de Processo Civil (50 salários mínimos mensais) ser expressivo, tal admissão representa a quebra do dogma de absoluta impenhorabilidade de salários, sendo assim um passo importante no sentido da satisfação das obrigações legalmente exigíveis.
Ainda, a tendência é que a Corte Superior continue a admitir, em casos excepcionais, a penhora de fração da remuneração do devedor, desde que não afete a dignidade do mesmo, ponderando os valores envolvidos no caso concreto.
Com isso, diante da mudança existente no Novo Código de Processo Civil e da posição adotada pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, é possível concluir que o principal objetivo do ordenamento jurídico é encontrar meios a fim de garantir o êxito em execuções e a efetividade da prestação jurisdicional, aplicando sempre os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.