3. A ORIENTAÇÃO SUMULAR DO STJ ACERCA DA DESCONSIDERAÇÃO NAS EXECUÇÕES FISCAIS
Atualmente o Superior Tribunal de Justiça - STJ possui duas Súmulas editadas acerca da desconsideração da personalidade jurídica, sendo elas as Súmulas 430 e 435, que nos colacionam:
Súmula 430. O inadimplemento da obrigação tributária pela sociedade não gera, por si só, a responsabilidade solidária do sócio-gerente.21
Súmula 435. Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente.22
Nos dias de hoje essas duas Súmulas são a principal forma de orientação de como o julgador deve agir no caso de se deparar com um pedido de desconsideração da personalidade jurídica. De um lado, a Súmula 430 estipula que o mero inadimplemento da obrigação tributária não é causa para o redirecionamento da execução fiscal. Sobre isso, importante o comentário de Filipe Charone Tavares Lopes:
De fato, o próprio Código Tributário Nacional já vinha caminhando neste sentido, ao afirmar em seu Art. 135. ser possível a afetação de patrimônio dos sócios, ou mesmo de administradores, mas sendo necessário para isto que ocorresse a violação de contrato social ou estatutos, que deveria ser comprovado pela Fazenda Pública quando requerida a desconsideração da personalidade jurídica.
Caso comprovada, a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica é perfeitamente aceitável e legal, já que não se pode privilegiar com tal benefício um empresário que utiliza-se de meios ardilosos para a consecução de fins ilícitos (estes sempre contrários ao pretendido pela sociedade).
Apesar disto, o que vinha ocorrendo em alguns julgados era a imediata aplicação da desconsideração da personalidade jurídica ao perceber-se o simples descumprimento de obrigação tributária, para a direta afetação do patrimônio dos sócios administradores, sem que restasse sequer ventilado nos autos do processo a ocorrência da necessária fraude.23
Acerca da Súmula 435, faz-se necessário o apontamento de Ricardo Castilho, que muito bem assevera:
Quem já tentou encerrar uma empresa em nosso país conhece as dificuldades e o perigo que essa súmula representa. Com efeito, pelo menos no caso do pequeno empresário, a regra revelada pela experiência cotidiana é que, diante do insucesso da empresa ou da perspectiva nebulosa que se lhe apresenta, o empreendedor simplesmente feche as portas e deixe de prosseguir com a empresa, sem qualquer comunicação à Junta e à Receita. Isso é muito comum, e se deve não apenas ao custo inerente ao procedimento (a infinidade de guias, as sempre polpudas multas e o tempo e a paciência despendidos), mas, sobretudo, ao fato de que, no Brasil, a dissolução extrajudicial somente se faz possível após o integral cumprimento das obrigações tributárias pela sociedade e pelos sócios responsáveis.
Ora, não é difícil concluir que se o empresário encontrou dificuldades para prosseguir com seu negócio, também haverá de enfrentar dificuldades em satisfazer a ânsia do Fisco, ainda mais com nossa carga tributária.24
Este comentário é de suma importância no sentido de que expõem a realidade que a grande maiora das empresas de nosso país passa, onde o empreendimento acaba por não almejar o resultado pretendido e o empresário simplesmente acaba por encerrar a sua atividade de forma informal, sem a devida comunicação de baixa, e muitas vezes a baixa sequer é efetuada tendo em vista a necessidade do pagamento em dia de todos os impostos para se requerer. Ou ainda, já partindo para a Súmula 430 anteriormente indicada, quando a empresa não consegue honrar com os seus tributos e a fazenda pública (muito comum no Estado de Santa Catarina, apesar de arbitrário) acaba por cancelar a inscrição da empresa pela falta de pagamento dos tributos. Veja-se bem, a própria Súmula 430 estipula que o simples fato do não pagamento do tributo não é causa para a desconsideração, mas cancela a sua inscrição e assim impossibilita que esta se dissolva de forma regular, conflitando com a orientação jurisprudencial e causando alvoroço.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Após a pesquisa bibliográfica, onde foi reunido significativo material doutrinário, há condições de se chegar a um limitador na desconsideração da personalidade jurídica e o consequente redirecionamento para a pessoa física do débito.
O novo CPC ao regular de forma clara a forma de que deve ocorrer a desconsideração trouxe maior segurança jurídica ao processo, visto que agora temos uma regra a ser seguida e antes os julgadores decidiam sem possuir parâmetros fixos, causando uma insegurança. Ainda, não se pode falar que o instituto da desconsideração da personalidade jurídica presente no CPC não deve-se aplicar nos casos de execução fiscal, visto que a própria lei especial disciplina a subsidiariedade com o CPC.
Nossa legislação tem evoluído significativamente acerca da desconsideração das sociedades empresárias, como podemos notar pelo novo CPC que estabeleceu um marco muito importante ao disciplinar a prévia instauração de procedimento para decidir acerca do redirecionamento da execução fiscal, porém a legislação ainda precisa evoluir muito para estabelecer de forma clara o que seriam infrações e atos fraudulentos, visto que o judiciário ainda enfrenta muito debate e discussão dos reais casos em que se pode efetuar o redirecionamento, sendo que as duas Súmulas do STJ carecem de maior interpretação e abrangência, visto que necessário se faz a análise a fundo do caso para determinar se há a incidência das Súmulas ou não, e em muitos casos a dúvida persistirá, ante a falta de maiores ordenamentos sobre o caso.
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Notas
1 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. São Paulo: Forense, 1998. 204. p.
2 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil. 3°. ed. São Paulo: Atlas, 2003. 157. p. v. I.
3 BASTOS, Eduardo Lessa. Desconsideração da Personalidade Jurídica. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2003. 03. p.
4 KOCH, Deonísio. Desconsideração da Personalidade Jurídica. Florianópolis: Momento Atual, 2005. 44. p.
5 REQUIÃO, Rubens.Curso de Direito Comercial. São Paulo: Saraiva, 2006. 390. p.
6 FRANCO, Vera Helena de Mello. Direito Empresarial. 3°. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. 270. p. v. I.
7 BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito Societário. 5°. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. 15. p.
8 BRASIL. Lei Federal n. 8.078, de 11 de set. de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8078.htm>. Acesso em: 02 nov. 2015.
9 BRASIL. Lei Federal n. 10.406, de 10 de jan. de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm>. Acesso em: 02 nov. 2015.
10 BERTOLDI, Marcelo Marins. Curso Avançado de Direito Comercial. 5°. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. 152. p.
11 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 6°. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. 43. p.
12 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2002. 247. p. v. I.
13 BRASIL. Lei Federal n. 13.105, de 16 de mar. de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13105.htm>. Acesso em: 02 nov. 2015.
14 BRASIL. Lei Federal n° 6.830/80, de 22 de set. de 1980. Dispõem sobra a cobrança judicial da Dívida Ativa da Fazenda Pública, e dá outras providências. Lei de Execução Fiscal.
15 BRASIL. Lei Federal n. 5.172, de 25 de out. de 1966. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios.. Código Tributário Nacional, nov. 2015.
16 JUNIOR, Humberto Teodoro. Lei de Execução Fiscal: Comentários e Jurisprudência. 8°. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. 28. p.
17 MACHADO, Hugo de Brito. Responsabilidade de Sócios e Dirigentes de Pessoas Jurídicas e Redirecionamento da Execução Fiscal. São Paulo: Editora Dialética, 2000. 142. p.
18 MACHADO, Hudo de Brito. Curso de Direito Tributário. 18°. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. 125. p.
19 MARQUES, Leonardo Nunes;FUNKE, Haroldo. A Responsabilidade dos Membros da Sociedade Limitada pelas Obrigações Tributárias e o novo Código Civil. São Paulo: Revista Dialética de Direito Tributário, 2009. 76. p.
20 SANTA CATARINA. Lei Complementar n. 313, de 22 de dez. de 2005. Institui o Código de Direitos e Deveres do Contribuinte do Estado de Santa Catarina e adota outras providências.
Santa Catarina, dez. 2005. Disponível em: <https://legislacao.sef.sc.gov.br/html/leis/2005/lc_05_313.htm>. Acesso em: 07 nov. 2015.
21 BRASIL. Súmula n. 430, de 24 de mar. de 2010. STJ. Superior Tribunal de Justiça. Disponível em: <https://www.stj.jus.br/SCON/sumulas/doc.jsp?livre=%40docn&&b=SUMU&p=false&l=10&i=123>. Acesso em: 08 nov. 2015.
22 BRASIL. Súmula n. 435, de 13 de mai. de 2010. STJ. Superior Tribunal de Justiça. Disponível em: <https://www.stj.jus.br/SCON/sumulas/doc.jsp?livre=%40docn&&b=SUMU&p=false&l=10&i=118>. Acesso em: 08 nov. 2015.
23 LOPES, Filipe Charone Tavares. Reflexões sobre a Súmula 430 do STJ. Disponível em: <https://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=3938>. Acesso em: 07 nov. 2015.
24 CASTILHO, Ricardo. A Súmula 435 do STJ e a difícil tarefa de ser empresário no Brasil. Disponível em: <https://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI[135]698,51045-A+Sumula+435+do+STJ+e+a+dificil+tarefa+de+ser+empresario+no+Brasil>. Acesso em: 07 nov. 2015.