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Escola sem Partido: em defesa da liberdade

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Resumo:


  • O Programa Escola Sem Partido visa descontaminar e desmonopolizar as escolas, respeitar a integridade dos estudantes e garantir o direito dos pais à educação moral.

  • A proposta do PLS nº 193/2016, que incorpora o Programa Escola Sem Partido na Lei de Diretrizes e Bases da Educação, encontra respaldo jurídico na Constituição Federal.

  • A aprovação do PLS nº 193/2016 trará segurança jurídica contra o aparelhamento político-partidário do sistema de ensino, defendendo a liberdade de cátedra no ensino brasileiro.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

PROGRAMA ESCOLA SEM PARTIDO DEFENDE A LIBERDADE DE CÁTEDRA

A comunicação racional consubstancia o ser humano, é inerente à sua natureza de ser pensante. Dimensão da comunicação humana é a liberdade de expressão, a qual foi erigida à categoria direito individual fundamental pela Carta da República, artigo 5º, inciso IV (é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato).

Desta feita, aspecto relevante do Programa Escola Sem Partido, que merece aprofundamento específico neste artigo, é a distinção entre liberdade de expressão e liberdade de cátedra, sobretudo diante do aparelhamento político-partidário de órgãos e instituições de ensino.

No regime dos direitos e das garantias constitucionais, destacam-se: 1) liberdade econômica; 2) liberdade de reunião e associação; 3) liberdade de circulação e locomoção; 4) liberdade de consciência religiosa; 5) liberdade de informação comunicação e expressão; e 6) liberdade de cátedra.

A liberdade de expressão caracteriza o pensar livremente. Em cotejo com o livre pensamento, deve ser assegurada a sua função instrumental consistente na possibilidade de escolha dos meios mais adequados para transmitir o conteúdo do pensamento. A liberdade de expressão integra, de forma indissociável, a natureza pensante do ser humano, aspecto da sua autonomia individual. Significa dizer que se privilegia o homem como ser soberano, o senhor de si, protegido contra a imposição de grilhões do pensamento.

No entanto, a liberdade de expressão, assim como as demais, não é absoluta, uma vez o seu exercício encontra limites na própria moldura normativa e funcional, que não permite o afastamento, puro e simples, de outros direitos e garantias de igual estatura constitucional. Portanto, é apenas aparentemente contraditório que a liberdade de expressão se choque com outros direitos e garantias de mesma estatura, sobremodo com a liberdade de expressão de que são titulares outros sujeitos, por si e nas suas relações sociais. Destarte, o próprio ordenamento jurídico soluciona tal aparente antinomia mediante o concurso de métodos próprios de interpretação e concretização das normas constitucionais e legais.

Ressalte-se, outrossim, que exercício de qualquer função pública ou privada não despe o seu titular da sua liberdade de expressão, pelo que não decai do seu status de pessoa titular de direitos e garantias individuais fundamentais.

Nessa perspectiva, a liberdade de expressão é amplamente assegurada, também, ao indivíduo que exerce a função de professor, nas suas atividades alheias à relação catedrática mantida com seus alunos. Assim, pode ele desenvolver e enunciar o seu pensamento sobre os mais variados temas, conforme lhe aprouver. A docência não impede, portanto, o exercício de exercer atividades político-partidária, de escrever livros ou artigos sobre qualquer assunto, de concorrer a cargos eletivos, de participar de comícios e de manifestações públicas etc., conforme lhe agradar, respeitados os direitos e garantias alheias.

Porém, no contexto da relação catedrática entre aluno e professor, é preciso obtemperar o exercício dos direitos e garantias fundamentais, inclusive as liberdades, com o exercício das funções de magistério. Tal relação, em que pese seja constantemente permeada de troca de saberes, entre professor e aluno, sob diversos aspectos, é de natureza vertical do ponto de vista da autoridade máxima e hierarquia do docente dentro de sala de aula, detentor do dever-poder de ministrar aula, regular e mediar debates, fiscalizar normas de comportamento e de aprovar ou reprovar o aluno no âmbito das instâncias de ensino. Como sói ocorrer nas relações hierárquicas, o educando é a parte mais frágil na relação catedrática.

Destarte, a liberdade de cátedra – que se define como liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber – não se confunde com a liberdade de expressão. Aquela se encontra estampada no capítulo específico da Constituição Federal referente à Educação, Cultura e Desporto, ao contrário da liberdade de expressão, que está fincada entre as categorias dos direitos e garantias individuais fundamentais.

O posicionamento topográfico constitucional da liberdade catedrática é coerente, de forma a apartá-la dos objetivos e propósitos da liberdade de expressão. Enquanto a liberdade de expressão caracteriza o livre desenvolvimento do indivíduo como ser pensante, a liberdade catedrática denota o livre ensino, aprendizado, pesquisa e divulgação do conhecimento nos âmbitos escolar e acadêmico.

A par disso, a liberdade de ensino é uma das dimensões da liberdade de cátedra. Por conseguinte, a liberdade de ensino é bifronte porque só existe diante da liberdade de aprendizado. Em suma: não há liberdade de ensino sem a liberdade de aprendizado e vice-versa. A liberdade de expressão consubstancia direito individual, enquanto a liberdade de ensino e de aprendizado é direito complexo de dupla titularidade, que se perfaz na relação aluno-professor.

Nessa direção, a Carta da República, artigo 205, enuncia os objetivos da educação (A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho). Tais objetivos guardam correspondência com o exercício da função de professor. Noutras palavras, a figura do professor é de natureza instrumental, funcionalizada à concretização dos objetivos do processo educacional circunscritos na Constituição da República.

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Forte nessa disposição constitucional e naquelas anteriormente aludidas, cuidando-se da relação professor-aluno, mediante ponderação de valores em jogo, a liberdade de expressão deve ceder lugar à liberdade de cátedra, quando menos, dois motivos: primeiro, a relação de proeminência e de autoridade do professor, quando não observados os estritos limites do ensino, pode subjugar ideias divergentes e, até mesmo, sonegar informações e conhecimentos, restringindo ou impedindo a pluralidade de pensamento e opinião em sala de aula. Segundo, os educandos, mormente na educação básica, estão em processo de formação como sujeitos pensantes, não tendo maturidade suficiente, em muitos casos, para desenvolver pensamento crítico sobre os temas que lhes são apresentados.

Sobreleve-se que professor, como sujeito titular de direitos individuais, continua detendo ampla liberdade de expressão, de modo alheio às funções que desenvolve no sistema de ensino: pode livremente, sob seu exclusivo juízo, defender concepções ou preferências ideológicas, religiosas, morais, políticas e partidárias, assim como participar de manifestações, atos públicos, passeatas etc.

Todavia, no âmbito da relação catedrática, não é lícito ao professor promover atividades que conduzam o aluno a determinada preferência ideológica, religiosa, moral, política e partidária. É ilícita, por exemplo, a conduta do professor que, em sala de aula, realiza proselitismo político-partidário ou incita seus alunos a participarem de manifestações, atos públicos e passeatas etc. Vale dizer, os temas políticos, sociais e culturais, durante a atividade escolar, devem ser apresentados aos alunos de forma equidistante, com as principais versões, teorias, opiniões e perspectivas concorrentes a respeito.

Malgrado, no entanto, a relevância do tema, a liberdade de ensinar e aprender, como dimensões da liberdade de cátedra, os opositores do Programa Escola Sem Partido, deliberadamente, contrafazem, dissimulam, enganam suas vítimas, inclusive os dignos professores. Escamoteiam que a liberdade de cátedra consubstancia proteção do docente contra eventuais pressões de grupos político-partidários que circunstancialmente dominam o aparelho do Estado, inclusive órgãos e instituições de ensino, e, a partir desse lugar privilegiado de poder, afrontam o ordenamento jurídico, impõem pautas político-partidárias, sociais e culturais aos estudantes.

Pois bem. O Programa Escola Sem Partido visa proteger a liberdade de cátedra, a fim de que aluno possa receber do professor o conteúdo de informações, conhecimento, arte e saberes adequados ao seu pleno desenvolvimento individual, social e cultural; e o professor possa exercer o seu ofício sem pressões indevidas de grupos político-partidários que, circunstancialmente, dominam o Poder Público.


CONCLUSÕES

Postos os argumentos, chega-se às seguintes conclusões:

1) O Programa Escola Sem Partido já encontra respaldo jurídico na Constituição Federal, na Convenção Americana dos Direitos Humanos, no Código Civil e no Estatuto da Criança e do Adolescente;

2) O PLS nº 193/2016, que incorpora o Programa Escola Sem Partido na Lei de Diretrizes e Bases da Educação, é perfeitamente constitucional;

3) A aprovação do PLS nº 193/2016 representará segurança jurídica para estudantes, famílias, professores, órgãos e instituições de ensino contra o aparelhamento político-partidário do sistema de ensino, que tem ocasionado graves prejuízos ao pleno desenvolvimento individual, social e cultural dos estudantes brasileiros;

4) O Programa Escola Sem Partido é instrumento de defesa do pleno exercício da liberdade de cátedra no sistema de ensino brasileiro.


Notas

[1] http://www.programaescolasempartido.org/

[2] http://www.escolasempartido.org/apresentacao

[3] http://www.em.com.br/app/noticia/politica/2016/07/22/interna_politica,786322/projeto-de-lei-para-implementar-escola-sem-partido-tem-consulta-recor.shtml

[4] Arthur Schopenhauer. Como Vencer um Debate sem Precisar Ter Razão. Introdução, notas e comentários de Olavo de Carvalho. Toopbooks, São Paulo, 2003.

[5] http://www.escolasempartido.org/apresentacao

[6] http://www.escolasempartido.org/objetivos

[7] George Orwell. 1984. Companhia das Letras, São Paulo, 2010.

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Sobre os autores
Ailton Benedito de Souza

Procurador da República no Estado de Goiás, onde exerce a função de Procurador Regional dos Direitos do Cidadão. Ex-Promotor de Justiça. Ex-Defensor Público. Especialista em Direito e Gestão Ambiental pela ESMPU/UnB.

Douglas Santos Araujo

Procurador da República Ex-Procurador do Ministério Público junto ao TCE/RJ Mestrando em Direito pela UERJ

Clarisier Azevedo Cavalcante de Morais

Procuradora da República. Ex-Juíza de Direito do Rio Grande do Norte. Ex-Advogada da União. Especialista em Direito Público pela UFCe. Ex-Professora Substituta da UFCe. Ex-Professora da Escola Superior da Magistratura do RN

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUZA, Ailton Benedito ; ARAUJO, Douglas Santos et al. Escola sem Partido: em defesa da liberdade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4815, 6 set. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/51017. Acesso em: 18 dez. 2024.

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