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A responsabilidade subsidiária da administração pública tomadora de serviços, a ADC 16, o STF, o TST e o ônus da prova

Afinal de contas, o ônus de provar a (ir)regularidade da fiscalização e da contratação é do reclamante ou do ente público?

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02/01/2017 às 10:10
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6. CONCLUSÕES

Sobre a ADC 16:

a)Após análise detalhada do acórdão da Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 16, percebeu-se que Supremo Tribunal Federal fixou uma tese principal muito clara de que não é possível a responsabilização do ente público tomador de serviços em decorrência do mero inadimplemento das obrigações trabalhistas por parte da prestadora.

b)Complementarmente, mesmo que de forma não tão sistematizada, foi adotada a tese de que subsiste a possibilidade de responsabilização do tomador de serviços ente público, porém esta deve ser empreendida em concreto, levando em conta eventual ação ou omissão culposa (culpa in eligendo, in vigilando etc.) do ente público que tenha contribuído para a configuração do dano (inadimplemento das obrigações trabalhistas por parte da prestadora) sofrido pelo trabalhador terceirizado.

Sobre os fundamentos teóricos da responsabilização subsidiária do ente público tomador de serviços:

c)Contatou-se que o dever de o ente público adotar medidas que garantam a escolha de empresa idônea e capaz de executar o objeto do contrato administrativo decorre da necessária observância de procedimento licitatório por parte da Administração Pública (artigos 22, XXVII, 37, XXI, e 173, §1º, III, Constituição Federal), mais precisamente das disposições legais que exigem a habilitação jurídica, a qualificação técnica, a qualificação econômico-financeira e a regularidade fiscal e trabalhista da candidata à adjudicação do objeto licitado (artigos 27 a 33 da Lei 8.666/1993) e que o dever de o ente público tomador de serviços fiscalizar o cumprimento, pela empresa prestadora, das obrigações trabalhistas atinentes aos empregados desta que prestam(ram) serviço em prol da tomadora decorre do Princípio da Legalidade, do Princípio da Moralidade Administrativa e dos artigos 55, XIII, 58, III, e 67, caput e §1º, da Lei 8.666/1993.

d)Nesse sentido, considerando que tais deveres integram a formação/execução do contrato administrativo e que visam proteger o trabalhador terceirizado, e levando em conta que o descumprimento de tais deveres, na linha preconizada pelo STF na ADC 16, configura inadimplemento da Administração Pública, concluiu-se que, por uma interpretação sistemática, a responsabilidade subsidiária do ente público decorre do próprio art. 71, §1º, da Lei. 8.666/1993. Isso porque tal dispositivo, ao exonerar o ente público tomador de qualquer responsabilidade, parte do pressuposto de que o inadimplemento da empresa prestadora não decorreu de ou foi possibilitado por qualquer ação ou omissão da Administração Pública.

e)Pontuou-se, nessa trilha, que o não cumprimento regular dos deveres de cautela na escolha e de fiscalização implica em conduta presumidamente dolosa/culposa da Administração Pública, pois tal postura implica em inadimplemento, conforme inclusive salientado pelo Ministro Cezar Peluso no julgado da ADC 16 pelo STF. E, justamente por se tratar de inadimplemento, este somente poderia ser considerado escusável na hipótese de caso fortuito ou força maior (art. 393, Código Civil, aplicável subsidiariamente aos contratos administrativos por força do art. 54 da Lei 8.666/1993). Ou seja, descumpridos os deveres de cautela na escolha e de fiscalização restam configuradas, respectivamente, as chamadas “culpa in eligendo” e “culpa in vigilando”.

Sobre a análise teórica do ônus probatório da culpa in vigilando e in eligendo da Administração Pública tomadora de serviços:

f)Definida a aplicabilidade do art. 373 do Código de Processo Civil ao Processo Laboral, constatou-se que, ao empregado que postula a responsabilidade subsidiária do tomador de serviços ente público – supondo que tenha direitos trabalhistas a receber de sua empregadora (a empresa prestadora) - basta: a)comprovar, caso exista controvérsia a respeito, a prestação de serviços em prol da Administração Pública (fato constitutivo de seu direito, nos termos do art. 373, I, CPC); b)alegar o descumprimento, pelo ente público, dos deveres de cautela na escolha e de fiscalização. Basta a alegação de descumprimento, pois o adimplemento (“pagamento”) de um dever/obrigação é um fato extintivo do direito da parte reclamante (art. 373, II, CPC) e, portanto, incumbe ao ente público (réu) comprovar que efetivamente adotou as cautelas na escolha da empresa prestadora e que regularmente fiscalizou o cumprimento dos haveres trabalhistas.

g)Frisou-se que, entender de modo contrário, seria atribuir ao autor um ônus que este não possui (se o adimplemento é fato extintivo, certamente não poderíamos entender que o inadimplemento seria um fato constitutivo, sob pena de cairmos no mesmo impasse criticado e possivelmente ocorrente quando aplicado exclusivamente o artigo 818 da CLT) e, o pior, significaria impor um encargo praticamente impossível (provar que a Administração não cumpriu seus deveres) e absurdo (o inadimplemento da empresa prestadora, por mais que não seja suficiente por si só para a responsabilidade subsidiária da tomadora, é no mínimo um provável e gigante indício de que esta não cumpriu com seus deveres contratuais).

Por fim, sobre o entendimento do Tribunal Superior do Trabalho e do Supremo Tribunal Federal acerca do tema “ônus da prova”:

h)Verificou-se verdadeiro caos jurisprudencial, com total ausência de uniformização de entendimento no âmbito interno do TST e do STF.

i)Percebeu-se que seis Turmas do Tribunal Superior do Trabalho atribuem o ônus probatório ao ente público e duas Turmas do mesmo Tribunal vem decidindo ser do obreiro o encargo de provar o descumprimento dos deveres por parte do Poder Público.

j)No âmbito do Supremo Tribunal Federal, pontuou-se ser lamentável que este Egrégio não consiga manter minimamente a uniformidade no trato de um problema que, no caso, é: o que foi decidido na ADC 16? Aparentemente, cada Ministro entende ao seu modo o acórdão da ADC 16. No Pleno, a questão foi tratada de forma divergente e nenhuma posição clara foi firmada sobre o tópico. Além disso, cada Turma do STF firmou posicionamento em um sentido. A Primeira Turma sustenta que o tema “ônus da prova” não foi objeto de deliberação na ADC 16. A Segunda Turma oscila no fundamento, mas aparentemente compreende que precisa ser apontada alguma prova no feito que indique a responsabilidade do Poder Público, direta ou indiretamente refutando que o ônus probatório de demonstrar o adimplemento dos deveres da tomadora de serviços ente público seja deste.

k)Opinou-se no sentido de que a confusão existente é tão absurda quanto atribuir o ônus probatório à parte reclamante. Na ADC 16, o Supremo Tribunal Federal não fixou ônus probatório. Refutou-se a responsabilidade subsidiária decorrente do mero inadimplemento dos débitos trabalhistas pela empresa prestadora. A condenação por mero inadimplemento é que é a tal “responsabilização por presunção de culpa”, rechaçada pelo STF.

l)Não bastasse, percebeu-se que a possibilidade, respaldada pelo STF na ADC 16, de fixar a responsabilidade subsidiária da tomadora, no caso concreto, por consequência de eventual ação ou omissão culposa (culpa in eligendo, in vigilando etc.) do ente público nada define acerca do tema “ônus da prova”. No caso concreto, as instâncias ordinárias devem solucionar a matéria levando em conta as alegações, as provas e a distribuição do encargo probatório. Por qualquer caminho podemos chegar validamente à conclusão de que a Administração Pública cumpriu ou não com seus deveres de cautela na escolha e de fiscalização. Em um processo, um “fato” considerado verdadeiro não é necessariamente fruto de prova. Pode também decorrer do encargo probatório, da incontrovérsia, da ausência de impugnação específica etc. A ADC 16 não definiu que o Poder Público somente poderia ser responsabilizado por “fato provado”.

m)Por fim, compreendeu-se que razão assiste ao entendimento majoritário do E. TST e da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, haja vista que, nos termos expostos ao longo do artigo, seria do ente público tomador de serviços o ônus de comprovar que adimpliu com seus deveres de cautela na escolha e de fiscalização (fato extintivo do direito da parte reclamante).


REFERÊNCIAS25

BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Resolução nº 96, de 11 de setembro de 2000. Diário da Justiça [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, n. 180-E, Seção 1, p. 290, 18 set. 2000. Disponível em: <http://aplicacao.tst.jus.br/dspace/bitstream/handle/1939/4294/2000_res0096.pdf?sequence=1>. Acesso em: 8 ago. 2016.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 16, do Tribunal Pleno, Relator Ministro: Cezar Peluso, Brasília, DF, 24 de novembro de 2010. Diário da Justiça Eletrônico do Supremo Tribunal Federal, Brasília, DF, n. 173, 8 set. 2011. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=627165>. Acesso em: 8 de ago. 2016.

BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Resolução nº 174, de 24 de maio de 2011. Edita as Súmulas nºs 426, 427, 428 e 429; Revisa as Súmulas nºs 74, 85, 219, 291, 326, 327, 331, 364, 369 e 387; Mantém o teor da Súmula nº 102 e; Cancela a súmula nº 349. Diário Eletrônico da Justiça do Trabalho, Brasília, DF, n. 738, Caderno do Tribunal Superior do Trabalho, p. 4-24, 27 mai. 2011a. Disponível em: <http://aplicacao.tst.jus.br/dspace/bitstream/handle/1939/13179/2011_res0174.pdf?sequence=3>. Acesso em: 8 ago. 2016.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental na Reclamação nº 10.829, do Tribunal Pleno, Relator Ministro: Celso de Mello, Brasília, DF, 19 de novembro de 2014. Diário da Justiça Eletrônico do Supremo Tribunal Federal, Brasília, DF, n. 27, 10 fev. 2015. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=7708397>. Acesso em: 18 de ago. 2016.

BRUXEL, Charles da Costa. O artigo 15 do novo código de processo civil e os critérios de aplicação do direito processual comum ao processo do trabalho. 2016. 67 f. Monografia (Graduação) – Curso de Direito, Faculdade de Direito, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2016.

DIDIER JÚNIOR, Fredie. Curso de direito processual civil: teoria da prova, direito probatório, decisão, precedente, coisa julgada e tutela provisória. 10 ed. Salvador: Ed. Jus Podivm, 2015.

GODINHO DELGADO, Maurício. Curso de direito do trabalho. 15 ed. São Paulo: Ltr, 2016.

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GRAU, Eros Roberto. Nota sobre a distinção entre obrigação, dever e ônus. Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, n. 77, p. 177-183, 1982. Disponível em: <http://www.revistas.usp.br/rfdusp/article/viewFile/66950/69560>. Acesso em: 13 de ago. 2016.

SCHIAVI, Mauro. Manual de direito processual do trabalho. 8 ed. São Paulo: Ltr, 2015.


Notas

1.“CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE (nova redação do item IV e inseridos os itens V e VI à redação) - Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011

I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).

II - A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988).

III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.

IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.

V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.

VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.”

2.Em definição livre, verifica-se a “terceirização” quando uma empresa (“tomadora de serviços”) contrata outra empresa (“prestadora de serviços” ou “empresa interposta”) para prestar serviços, em prol da tomadora, por meio de mão-de-obra contratada pela empresa “prestadora”. Godinho Delgado (2016, p. 487), com maior detalhamento, assim define: “Para o Direito do Trabalho terceirização é o fenômeno pelo qual se dissocia a relação econômica de trabalho da relação justrabalhista que lhe seria correspondente. Por tal fenômeno insere-se o trabalhador no processo produtivo do tomador de serviços sem que se estendam a este os laços justrabalhistas, que se preservam fixados com uma entidade interveniente. A terceirização provoca uma relação trilateral em face da contratação de força de trabalho no mercado capitalista: o obreiro, prestador de serviços, que realiza suas atividades materiais e intelectuais junto à empresa tomadora de serviços; a empresa terceirizante, que contrata este obreiro, firmando com ele os vínculos jurídicos trabalhistas pertinentes; a empresa tomadora de serviços, que recebe a prestação de labor, mas não assume a posição clássica de empregadora desse trabalhador envolvido.”

3.“Art. 71. O contratado é responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato. § 1º A inadimplência do contratado, com referência aos encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou restringir a regularização e o uso das obras e edificações, inclusive perante o Registro de Imóveis. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)”

4.“Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: [...] XXVII - normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1°, III; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)”

5.“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) [...] XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.”

6.“§1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) [...] III - licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações, observados os princípios da administração pública; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)”

7.“INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA - ENUNCIADO Nº 331, IV, DO TST - RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA - ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA - ARTIGO 71 DA LEI Nº 8.666/93. Embora o artigo 71 da Lei nº 8.666/93 contemple a ausência de responsabilidade da Administração Pública pelo pagamento dos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato, é de se consignar que a aplicação do referido dispositivo somente se verifica na hipótese em que o contratado agiu dentro de regras e procedimentos normais de desenvolvimento de suas atividades, assim como de que o próprio órgão da administração que o contratou pautou-se nos estritos limites e padrões da normatividade pertinente. Com efeito, evidenciado, posteriormente, o descumprimento de obrigações, por parte do contratado, entre elas as relativas aos encargos trabalhistas, deve ser imposta à contratante a responsabilidade subsidiária. Realmente, nessa hipótese, não se pode deixar de lhe imputar, em decorrência desse seu comportamento omisso ou irregular, ao não fiscalizar o cumprimento das obrigações contratuais assumidas pelo contratado, em típica culpa in vigilando, a responsabilidade subsidiária e, conseqüentemente, seu dever de responder, igualmente, pelas conseqüências do inadimplemento do contrato. Admitir-se o contrário, seria menosprezar todo um arcabouço jurídico de proteção ao empregado e, mais do que isso, olvidar que a Administração Pública deve pautar seus atos não apenas atenta aos princípios da legalidade, da impessoalidade, mas sobretudo, pelo da moralidade pública, que não aceita e não pode aceitar, num contexto de evidente ação omissiva ou comissiva, geradora de prejuízos a terceiro, que possa estar ao largo de qualquer co-responsabilidade do ato administrativo que pratica. Registre-se, por outro lado, que o art. 37, § 6º, da Constituição Federal consagra a responsabilidade objetiva da Administração, sob a modalidade de risco administrativo, estabelecendo, portanto, sua obrigação de indenizar sempre que cause danos a terceiro. Pouco importa que esse dano se origine diretamente da Administração, ou, indiretamente, de terceiro que com ela contratou e executou a obra ou serviço, por força ou decorrência de ato administrativo.” (IUJ-RR - 297751-31.1996.5.04.5555, Relator Ministro: Milton de Moura França, Data de Julgamento: 11/09/2000, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJ 20/10/2000)

8.“Estou de acordo. Eu supero a preliminar e, no mérito, julgo a ação procedente, porque não tenho dúvida nenhuma sobre a constitucionalidade.”

9.“Eu supero a questão do não conhecimento. Ressalvo o meu ponto de vista quanto ao não conhecimento; e, no mérito, como não tenho dúvida nenhuma sobre a constitucionalidade, eu julgo a ação procedente.”

10.Até esse ponto, a Ministra dá a entender, apesar de não ser possível afirmar isso com certeza, que, a despeito de reconhecer o dever fiscalizatório do ente público tomador de serviços, mesmo o descumprimento de tal dever não implicaria na responsabilidade subsidiária da Administração Pública

11.“IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.”

12.Vide art. 37, caput, Constituição Federal.

13.Vide art. 37, caput, Constituição Federal.

14.“Art. 55. São cláusulas necessárias em todo contrato as que estabeleçam: [...] XIII - a obrigação do contratado de manter, durante toda a execução do contrato, em compatibilidade com as obrigações por ele assumidas, todas as condições de habilitação e qualificação exigidas na licitação.”

15.“Art. 58. O regime jurídico dos contratos administrativos instituído por esta Lei confere à Administração, em relação a eles, a prerrogativa de: [...] III - fiscalizar-lhes a execução;”

16.“Art. 67. A execução do contrato deverá ser acompanhada e fiscalizada por um representante da Administração especialmente designado, permitida a contratação de terceiros para assisti-lo e subsidiá-lo de informações pertinentes a essa atribuição. § 1º O representante da Administração anotará em registro próprio todas as ocorrências relacionadas com a execução do contrato, determinando o que for necessário à regularização das faltas ou defeitos observados.”

17.Grau (1982, p. 178) assim define a noção de “dever”: “O dever jurídico consubstancia precisamente uma vinculação ou limitação imposta à vontade de quem por ele alcançado. Definido como tal pelo ordenamento jurídico, o dever há de ser compulsoriamente cumprido, sob pena de sanção jurídica – o seu não atendimento configura comportamento ilícito”. Em seguida, o mesmo autor conceitua “obrigação” (GRAU, 1982, p. 179): “Podemos, pois, ter que — tal como no dever — na obrigação, o cumprimento da prestação, pelo devedor, importa atendimento de interesse, o alheio, isto é, do credor. O descumprimento da prestação, por outro lado, é juridicamente sancionado.” Por fim, Grau (1982, p. 178) tenta diferenciar as espécies: “Obrigação — tomado o vocábulo em sentido estrito — supõe uma situação de dever, em que se coloca o devedor. Não obstante, é certo que o conceito de dever transcende o âmbito do direito das obrigações: há deveres jurídicos que não compreendem obrigação de nenhuma espécie. Assim, v.g., com, relação ao dever, de todos, de abstenção da prática de condutas definidas como crimes.”. Na prática, a acepção de “obrigação” é tão ampla, abrangendo as relações contratuais e extracontratuais (responsabilidade civil), que a distinção entre dever e obrigação, no âmbito do Direito Civil, termina por ser aparentemente inútil. O descumprimento (inadimplemento) de um(a) dever/obrigação, decorrente de lei ou contrato, sujeitará o inadimplente às consequências previstas na lei ou no contrato. Nesse artigo preferiu-se adotar o termo “dever”, na mesma linha costumeiramente adotada em relação aos chamados “deveres anexos” decorrentes da boa-fé objetiva. Cumpre destacar, por outro lado, que o próprio TST (Súmula 331, V) se refere a tais deveres como sendo obrigações (“...caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora...”), o que somente reforça a ausência de distinção prática entre os termos.

18.“Art. 373. O ônus da prova incumbe:

[…]

§ 1º Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, poderá o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído.

§ 2º A decisão prevista no § 1º deste artigo não pode gerar situação em que a desincumbência do encargo pela parte seja impossível ou excessivamente difícil.

§ 3º A distribuição diversa do ônus da prova também pode ocorrer por convenção das partes, salvo quando:

I - recair sobre direito indisponível da parte;

II - tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito.”

19.“Agregando ao estudo desenvolvido a possibilidade de aplicação analógica da própria legislação processual trabalhista para integrar as omissões do Direito Processual do Trabalho, podemos chegar às seguintes conclusões em torno da melhor solução a ser dada ao aparente conflito entre os artigos 769 e 889 da CLT e 15 do CPC/2015:

a) A normatização processual trabalhista, em caso de omissão parcial ou total, deverá ser integrada pela norma de direito processual comum ou pela norma da própria legislação processual trabalhista aplicável por analogia que, em concreto, se apresentar mais compatível com o Processo Laboral;

b) Na fase de conhecimento, deverá o operador do Direito levar em conta em sua busca integrativa a possibilidade de encontrar a melhor solução dentro da própria legislação processual do trabalho (aplicação analógica, nos termos do art. 4º da LINDB) ou do Código de Processo Civil de 2015, prevalecendo, em qualquer caso, a importação da norma de direito processual comum mais compatível com o Processo do Trabalho;

c) Na fase de liquidação/execução, deverá o operador do Direito levar em conta em sua busca integrativa a possibilidade de encontrar a melhor solução dentro da própria legislação processual do trabalho (aplicação analógica, nos termos do art. 4º da LINDB), da Lei das Execuções Fiscais ou do Código de Processo Civil de 2015, prevalecendo, em qualquer caso, a importação da norma de direito processual comum mais compatível com o Processo do Trabalho.” (BRUXEL, 2016, p. 47-48)

20.“Com base nos conceitos apresentados quando da análise da integração normativa, temos que a omissão ou lacuna pode ser parcial ou total. Reforça tal pensamento o sentido da expressão subsidiariedade que, segundo Houaiss (2009), seria o “que subsidia, ajuda, socorre”, “que reforça, aumenta, contribui” ou “que reforça ou dá apoio a (algo anteriormente apresentado)”. Ou seja, tanto a omissão total (ausência completa de normas sobre determinada matéria) como a omissão parcial (existência de normas, porém em magnitude insuficiente para tutelar de forma adequada o tema) seriam em tese aptas a atrair a aplicação subsidiária do direito processual comum.

[…]

No caso da omissão total, determinada matéria só pode ser tida como não regulada pelas normas processuais trabalhistas, caso seja devidamente tratada pelas normas processuais comuns. A configuração da omissão depende, ainda, do entendimento de que não houve “silêncio eloquente” do legislador, ou seja, de que não houve omissão proposital justamente com o intuito de afastar a incidência da matéria não tratada pelo Processo do Trabalho.

Maior relevo merece a noção de omissão parcial. Algo só pode ser considerado incompleto se comparado com outra coisa, considerada mais completa. Algo só pode ser considerado incompleto, se entendermos que não houve “silêncio eloquente” do legislador no trato supostamente incompleto da matéria (temos que averiguar se o legislador não pretendeu exaurir o tema daquele modo, afastando implicitamente quaisquer normatizações complementares).” (BRUXEL, 2016, p. 28-29)

21.“Nesse aspecto, podemos perceber que a norma de direito processual comum (mais) compatível com o processo laboral é aquela que:

a) Na maior medida possível, traga ao processo trabalhista Informalidade, Simplicidade e Oralidade, facilite/privilegie a conciliação, assegure tratamento diferenciado à parte hipossuficiente, imprima Celeridade ao andamento do feito, garanta Efetividade ao processo e assegure o exercício do contraditório e da ampla defesa adequados (por razões lógicas, nem sempre todos os critérios serão aplicáveis simultaneamente para aferir a compatibilidade, haja vista a natural variabilidade da natureza das normas objeto de possível importação); e/ou

b) Garanta a melhor observância, pelo Processo do Trabalho, dos princípios constitucionais processuais.” (BRUXEL, 2016, p. 34)

22.“Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:

I - processar e julgar, originariamente:

[…]

l) a reclamação para a preservação de sua competência e garantia da autoridade de suas decisões;

[…]

§ 2º As decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)”

23.“Art. 988. Caberá reclamação da parte interessada ou do Ministério Público para:

[…]

III – garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; (Redação dada pela Lei nº 13.256, de 2016)”

24.A presunção de veracidade e legitimidade é dos atos administrativos. E, no caso, o principal problema é justamente saber se alguma atitude foi tomada, se os deveres da Administração foram cumpridos. A presunção de veracidade/legitimidade não faz nascer a presunção – totalmente absurda, diga-se de passagem - de que houve cautela na escolha e de que houve fiscalização do Poder Público, mormente quando inadimplidos os créditos trabalhistas do trabalhador terceirizado. Entender assim seria o mesmo que presumir que a Administração Pública é perfeita e só fala a verdade, pouco importando as consequências danosas desse raciocínio – no caso, tal compreensão faria atribuir à parte reclamante o ônus praticamente impossível de provar que o ente público não adimpliu com seus deveres.

25.Evitou-se a excessiva inflação da quantidade de referências que seria causada pelo registro de toda a vasta legislação e jurisprudência citadas no corrente artigo. Nesse sentido, apenas os principais atos normativos e julgados foram formalmente citados e inseridos nas referências.

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Sobre o autor
Charles da Costa Bruxel

Doutorando em Direito pela Universidade Federal do Ceará. Mestre em Direito na área de concentração de Constituição, Sociedade e Pensamento Jurídico pela Universidade Federal do Ceará (2021). Especialista em Direito Processual Civil pela Damásio Educacional (2018). Especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Gama Filho (2013). Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Ceará (2016). Bacharel em Ciências Econômicas pela Universidade Federal do Ceará (2011). Analista Judiciário - Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região (CE), exercendo atualmente a função de Assistente em Gabinete de Desembargador. Explora pesquisas principalmente o Direito Processual do Trabalho, Direito do Trabalho, Direito Processual Civil e Direito Constitucional.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BRUXEL, Charles Costa. A responsabilidade subsidiária da administração pública tomadora de serviços, a ADC 16, o STF, o TST e o ônus da prova: Afinal de contas, o ônus de provar a (ir)regularidade da fiscalização e da contratação é do reclamante ou do ente público?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 4933, 2 jan. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/51484. Acesso em: 27 abr. 2024.

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