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Flexibilização de direitos e garantias individuais no processo penal brasileiro e sua relação com o direito processual penal do inimigo

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19/09/2016 às 14:12
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CONCLUSÃO

A má interpretação feita entre a flexibilização de direitos e garantias individuais no processo penal e o direito processual penal do inimigo gera uma consequência indesejada, que é a cristalização de tais direitos e garantias. De acordo com o exposto neste trabalho, os direitos e as garantias individuais são conquistas oriundas de muita luta e resistência e, por tal razão, devem ser preservados. O que não significa que são absolutos, podendo, por meio de uma ponderação de valores, serem mitigados em prol de outros direitos ou garantias de mesmo valor.

O direito processual penal do inimigo, como desdobramento do direito penal do inimigo, apresenta-se como um direito processual diverso, paralelo, separado de um direito processual penal convencional. Não é uma lei específica, por exemplo, lei que eleva o período de uma prisão temporária, ou condiciona um maior cumprimento de pena para a progressão de um regime prisional, que configura um direito penal/processual penal do inimigo. O agravamento de sanções pode ser uma medida necessária diante de um contexto social.

Uma redução no número de recursos previstos no direito processual penal pode ser entendida como uma mitigação/flexibilização da ampla defesa, porém, não como a sua supressão. Daí pergunta-se: tal flexibilização significa a influência de um direito processual penal do inimigo? Entendemos que não. Talvez a redução no número de recursos, previstos atualmente no processo penal, torne a persecução penal mais efetiva e alinhada com a justiça.

A flexibilização de um direito ou garantia individual não significa, necessariamente, a influência de um direito penal/processual penal do inimigo. Podendo significar uma opção de política criminal diante de um contexto social que se apresenta. Uma flexibilização deve ser entendida como um ajuste, algo aberto a mudanças.

Entendemos ser plenamente possível a flexibilização de direitos e garantias individuais no processo penal, desde que mediante lei e por uma ponderação de valores. Que tal flexibilização se dê em observância a um bem jurídico tão importante quanto o que está sendo flexibilizado. Não defendemos flexibilizações temerárias, como o presente no direito penal simbólico[xvii], mas sim, pautadas por uma atuação legislativa fundamentada, que se apresente como uma melhoria para a situação que se tenta ajustar.

Um direito ou uma garantia fundamental deve servir para favorecer a aplicação da justiça, e não como instrumento de violação de outros tantos direitos e garantias.

A idealização de um Estado onisciente, onipresente e onipotente apresenta-se como algo pueril. O Estado, como detentor do poder-dever de punir (jus puniendi), possui suas limitações. Determinados crimes devem ser tratados com maior rigor processual penal, o que não representa violação aos direitos e às garantias individuais.

A preservação da identidade e de dados pessoais de uma testemunha, por exemplo, que depõe contra membros de uma organização criminosa, pode ser feita sem que o direito à ampla defesa e o contraditório seja violado. O direito do réu de contraditar tal testemunha seria preterido em face da preservação à integridade física e à vida da testemunha. Ou seja, pode haver uma flexibilização de um direito ou garantia individual sem que haja violação, o que pode ser feito por uma técnica de ponderação de valores.

É nesse sentido que entendemos razoável o tratamento penal/processual penal mais rigoroso de leis, como: a que trata do crime organizado, a lei de drogas e a lei de crimes hediondos, sem que isso represente resquícios de um direito penal/processual penal do inimigo, senão medidas que se alinhem à realidade, já que uma visão romântica da atuação criminosa, sobretudo das organizações criminosas, pode levar o direito penal/processual penal à inutilidade.


Notas

[i] CANOTILHO, J.J.Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 1993. p. 520.

[ii] MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional. 4. Ed. Coimbra: Coimbra Editora, p.88-89.

[iii] CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. San José de Costa Rica, em 22/11/1969. Disponível em: < http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/instrumentos/sanjose.htm>. Acesso em: 10/01/2014.

[iv] BRASL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 349.703-1/RS. Recorrente: Banco Itaú S/A. Relator originário: Min. Carlos Brito, Julgado em: 03/12/2008, DJe nº 104, Divulgado em: 04/06/2009, Publicado em: 05/06/2009.

[v] MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. – 24. Ed. – São Paulo: Atlas, 2009. p. 34 e 35.

[vi] SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo. 33. Ed. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 191.

[vii] SILVA, José Afonso da. Ob. Cit., pp. 192 e 193.

[viii] Preferimos utilizar a expressão teoria do direito penal do inimigo pelo fato de não existir, formalmente, um ordenamento com tais regramentos.

[ix] GRECO, Rogério. Direito Penal do Inimigo. Disponível em < http://www.rogeriogreco.com.br/?p=1029>. 

[x] Günther Jakobs é atualmente professor aposentado da Universidade de Bonn (Rheinische Friedrich-Wilhelms-Universität Bonn), localizada na cidade de Bonn, Alemanha.

[xi] JAKOBS, Günther; CANCIO MELIÁ, Manuel. Direito penal do inimigo: noções e críticas. Org. e trad. André Luís Callegari, Nereu José Giacomoli. 2. Ed. – Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2007. p. 25/26.

[xii] JAKOBS, CANCIO MELIÁ, Ob. Cit. p. 27.

[xiii] JAKOBS, CANCIO MELIÁ, Ob. Cit., pp. 28-29.

[xiv] MORAES, Alexandre de. Ob. Cit., pp. 32 e 33.

[xv] SOUZA, Bárbara. JOZINO, Josmar. Dos 564 mortos durante os ataques do PCC em maio de 2006, 505 eram civis. O Estado de S.Paulo, São Paulo, 27/06/2009. Disponível em <http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,dos-564-mortos-durante-os-ataques-do-pcc-em-maio-de-2006-505-eram-civis,393894,0.htm>. Acesso em: 01/01/2014.

[xvi] O ESTADO DE S.PAULO, São Paulo, 28/12/2012. Disponível em <http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,em-11-meses-106-policiais-foram-mortos-por-bandidos-no-estado-,978309,0.htm>. Acesso em: 08/01/2014.

[xvii] Direito penal simbólico é aquele editado com fama de excessivo rigor, mas que na prática se mostra ineficaz, impraticável. Geralmente é editado como resposta a clamores momentâneos, como, p. ex., um crime brutal praticado por um menor que gera uma repercussão em favor da redução da maioridade de 18 para 15 anos.


REFERÊNCIAS

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TUCCI, Rogério Lauria. Direitos e Garantias Individuais no Processo Penal Brasileiro.4ª Ed. São Paulo, SP: Revista dos Tribunais, 2011.

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Sobre o autor
Jean Pierry Brito

Graduado em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba - UEPB e pós-graduado em Direito Constitucional pela universidade Anhanguera-Uniderp.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BRITO, Jean Pierry Brito. Flexibilização de direitos e garantias individuais no processo penal brasileiro e sua relação com o direito processual penal do inimigo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4828, 19 set. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/51929. Acesso em: 25 nov. 2024.

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