A problematização da estabilidade provisória da trabalhadora gestante no curso do aviso prévio

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21/09/2016 às 10:34
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Analisa-se as consequências jurídicas e sociais da descoberta da gravidez da empregada que se encontra no curso do aviso prévio.

            O direito se aprimora de acordo com a evolução da sociedade. As normas vigentes em certa época são sustentadas até um ponto em que se tornam arcaicas. Assim, surge a necessidade de aperfeiçoamento dessas normas a fim de instituir novos modelos capazes de atender às novas exigências sociais.

            A mulher, nos primórdios da existência humana, era tratada como objeto de posse, prazer e reprodução pelo homem. Essa subordinação justifica-se pela instituição do patriarcalismo, ou seja, do domínio do sexo feminino pelo sexo masculino na vida social. Desse modo, a única função da mulher era a de cuidados com a casa, filhos e marido.

            Com o advento da Revolução Industrial, e consequente aumento do número de desemprego por conta da substituição do trabalho humano pela máquina, a mulher saiu de casa para adentrar no mercado de trabalho a fim de ajudar nas despesas domésticas. Essa época foi marcada pela grande exploração do labor feminino, por ser esse considerado mão de obra mais barata e inferior à masculina.

            As primeiras normas protestativas ao trabalho da mulher foram instituídas com o surgimento da Organização Internacional do Trabalho. No Brasil, apesar das Constituições anteriores legislarem a respeito da proteção ao trabalho da mulher, foi com a Constituição Federal de 1988, que se eliminou qualquer prática discriminatória contra a mulher no âmbito empregatício ou capaz de afastá-la do mercado de trabalho.

            No escopo de lograr tais fins, a Consolidação das Leis do Trabalho destinou um capítulo para salvaguardar os direitos específicos da mulher, no âmbito trabalhista, referentes à condição de trabalho, à discriminação, e, especialmente, à maternidade.  

            Por ser o trabalho indispensável para a promoção da dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho encontram-se previstos dentre os fundamentos do Estado brasileiro.{C}[1] Além disso, o trabalho e a proteção à maternidade são considerados direitos sociais, previstos no artigo 6º da Constituição Federal de 1988.

            Não obstante a Carta Magna consagrar o princípio da igualdade, a proteção especial ao trabalho da mulher justifica-se pelas condições físicas e psicológicas singulares a ela. Nesse escopo, o ordenamento jurídico brasileiro dispõe de normas que protegem, principalmente, a maternidade.

            Desta forma, diante de toda evolução da proteção à mulher no âmbito do Direito do Trabalho, nota-se um prestígio maior em relação à fase gestacional, uma vez que o foco não é apenas a gestante, mas também a vida que está por vir.[2]

            Nesse sentido, a fim de garantir a proteção da vida do recém-nascido e a subsistência da mãe durante o período inicial de vida da criança, previu-se no artigo 10º, II, “b”, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, a garantia de emprego à trabalhadora gestante desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, assegurando-lhe o direito de reintegração caso sua dispensa se der durante o período de estabilidade.

            Em 14 de setembro de 2012, após grandes divergências, o Tribunal Superior do Trabalho alterou o item III da Súmula nº. 244, entendendo que a obreira gestante tem direito à estabilidade provisória na hipótese de admissão mediante contrato por prazo determinado. Entretanto, nada fora analisado, até então, para o caso quando no período do aviso prévio.

            O artigo 487, § 6º, da CLT prevê que o período referente ao aviso prévio integra o tempo de serviço para todos os efeitos legais. Desta forma, surgiram inúmeros questionamentos acerca da ocorrência da gravidez no curso desse período, como se a descoberta da gestação iniciada no curso do aviso prévio impediria o fim do contrato de trabalho conforme pretendera o empregador quando pré-avisou a obreira.

            Logo, o direito à estabilidade da gestante no curso do aviso prévio passou a ser objeto de diversas discussões, uma vez que de um lado estaria o entendimento de que as garantias de emprego em geral não se adquirem durante o pré-aviso, com a aplicação da Súmula nº. 371 do Tribunal Superior do Trabalho, e, de outro, o entendimento da proteção à maternidade, fundamentado na garantia constitucional da proteção do direito à vida, protegendo o nascituro desde o momento de sua concepção.

            Sendo assim, o enfoque deste trabalho recai sobre o estudo da estabilidade provisória da trabalhadora gestante no curso do aviso prévio, analisando a decisão do Tribunal Superior do Trabalho, de 15 de fevereiro de 2013, referente ao processo RR-490-77.2010.5.02.0038, que teve seu entendimento favorável ao direito da trabalhadora gestante à referida garantia de emprego.

            Em 16 de maio de 2013, foi sancionada a Lei nº. 12.812, que alterou a Consolidação das Leis de Trabalho, adicionando-a o artigo 391-A, garantindo à trabalhadora gestante o direito à estabilidade provisória quando da confirmação da gravidez no período do pré-aviso.

            Portanto, examinar-se-á toda trajetória do trabalho da mulher e suas conquistas no âmbito do Direito do Trabalho no decorrer da evolução da sociedade, com enfoque nas consequências jurídicas e sociais do direito à estabilidade provisória da empregada que se encontra em estado gravídico no curso do aviso prévio.


{C}[1] CUNHA JUNIOR, Dirley da; NOVELINO, Marcelo. Constituição Federal para Concursos. 3. ed. Salvador: Jus Podivm, 2012, p. 13.

{C}[2] SILVA, Homero Batista Mateus da Silva. Curso de direito do trabalho aplicado, vol. 3: Segurança e medicina do trabalho, trabalho da mulher e do menor. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009, pag. 166-167.

1: O TRABALHO DA MULHER

 

1.1       BREVE HISTÓRICO

            A mulher, desde os primórdios da humanidade, era subordinada ao homem, sendo o poder masculino explicado tanto por fatores biológicos como culturais, fato que acabou por influenciar toda a civilização.

            Através da análise de um viés biológico, percebe-se, assim como em outros seres vivos, mormente os mamíferos, uma dominância dos machos em relação às fêmeas no sentido de não haver compromisso daqueles com sua prole, variando de parceiras. Evidencia-se, portanto, uma subordinação sexual das fêmeas para com os machos. Além desse ponto, a vertente biológica explica o domínio do homem sobre a mulher, expondo peculiaridades da espécie humana, quais sejam: a diferença de porte e força física entre os gêneros; a necessidade das crianças de cuidado e de proteção da mãe; e a posição bípede que o ser humano passou a adotar. Desta forma, o homem passou a ser caçador e protetor das mulheres, uma vez que elas passaram a necessitar dos homens para que as protegessem e fornecessem alimentos a elas e aos filhos, caracterizando, assim, a dependência das mulheres aos homens[1].

            O surgimento da atividade de caça marcou a supremacia do homem. A firmação do padrão de domínio da mulher pelo homem se deu com o advento das sociedades agrárias e pastoris e a consequente noção de propriedade. Assim, enquanto os homens caçavam, as mulheres eram responsáveis pela agricultura, na época, de subsistência. Contudo, o crescimento da população humana tornou os alimentos escassos, pelo que surgiu a necessidade do intenso cultivo da terra, com a utilização de instrumentos agrícolas, como o arado, e da pecuária, afastando, assim, as mulheres da atividade laboral para cuidar dos filhos e afirmando, ainda mais, o poder masculino, marcando o surgimento do patriarcado[2].

            Percebe-se, desde logo, que o patriarcado, que nada mais é que o “controle exercido pelo pai”[3], está presente na sociedade desde os primórdios da existência humana, e, apesar da unidade básica de sua organização ser a família, evidencia-se o presente domínio do homem sobre a mulher na vida social.

            Nas esferas remotas do patriarcado, a mulher era vista como objeto, na medida em que eram trocadas como se mercadorias fossem e serviam como objeto de reprodução. Nas mais antigas tribos humanas, ao mesmo tempo em que eram dados direitos aos homens, os mesmos eram afastados das mulheres. Além do mais, as crianças eram vistas como força de trabalho para exploração, produção e lucro[4].

            O patriarcalismo, desta forma, no decorrer do tempo, induziu as mulheres a não valorizar suas habilidades e conhecimentos. Nesse sentido, no âmbito da economia e do trabalho, produziu a desvalorização do trabalho feminino e majorou o status do trabalho masculino, na medida em que construiu uma caluniosa dicotomia entre o emocional feminino e a racionalidade masculina, afastando, destarte, as mulheres do mercado de trabalho e os homens das tarefas do lar[5].

            Na época da escravidão, as mulheres eram escravizadas não apenas por sua força laboral, mas também por razões sexuais. As crianças, muitas vezes frutos dos abusos sexuais, eram consideradas propriedade dos donos de suas mães escravas[6].

            No período colonial, o trabalho da mulher era concebido como aquele de constituir família, sendo ela considerada objeto de posse e prazer do marido. Nessa época, havia, ainda, além da discriminação do sexo feminino, a discriminação de etnia, impondo-se à mulher branca a função de esposa, mãe e cuidadora do lar e à mulher negra, o papel de prostituta e o trabalho de menor valor[7].

            Evidencia-se, assim, que ao longo da históriaa mulher foi vista como objeto –considerada mercadoria, quando vendidas como escravas ou produtoras de crianças – além de serem consideradas propriedade exclusiva do homem.

            A Idade Moderna, especificamente no espaço de tempo que teve início no final do Século XVIII e se prolongou ao Século XIX, mais precisamente na Revolução Industrial, foi marcada pela exploração excessiva do trabalho da mulher. Essa época destacou-se pelo aproveitamento em larga escala desse labor.

            A preferência pelo trabalho feminino justificava-se pelos menores salários em relação aos homens, ou seja, mão de obra semelhante à masculina, entretanto, mais barata, devido à condição da suposta inferioridade feminina[8].

            Como a Revolução Industrial foi marcada pelo capitalismo, pelos lucros e pela substituição do trabalho manual pela máquina, a exemplo da utilização da máquina a vapor no lugar do trabalho humano, essa rápida industrialização influenciou de maneira negativa a vida dos trabalhadores na medida em que o número de desemprego sofre um aumentoalarmante. Desta forma, por necessidade, as mulheres aceitavam trabalhar da mesma forma que os homens, cumprindo as mesmas tarefas, em jornadas de quatorze a dezesseis horas diárias e em locais insalubres e perigosos, ganhando salários rebaixados, além de estarem sujeitas a espancamentos e assédio sexual para se manterem no emprego. Como possuíam salário bem abaixo em relação ao dos homens, no mercado de trabalho, eram consideradas “meia-força”[9].

            Ante a omissão do Estado nas relações jurídicas trabalhistas, todo tipo de exploração era permitido, não havendo, desta forma, limitação à jornada de trabalho, igualdade de direitos entre empregados homens e mulheres, ou respeito às possibilidades físicas femininas. A mulher enfrentava condições precárias de trabalho. Logo, não havia qualquer proteção ao labor feminino, muito menos à maternidade{C}[10].

            Através desse escorço histórico, percebe-se a inexistência de proteção aos trabalhadores, com condições ainda mais severas em relação às mulheres, haja vista o preconceito existente acerca de sua presença no ambiente laboral, uma vez que “a moral vigente na época considerava que o lugar das mulheres era em casa”[11].

            Sendo assim, com base em toda a problemática existente nesse cenário, isto é, diante de toda arbitrariedade contra a mulher, iniciou-se o surgimento das legislações protecionistas ao trabalho feminino.

1.2       PRIMEIRAS LEIS PROTESTATIVAS AO TRABALHO FEMININO NO ÂMBITO INTERNACIONAL

            No âmbito internacional, a própria Organização Internacional do Trabalho, que desde sua origem visa à diminuição das diferenças socioeconômicas existentes no mundo através da promoção da igualdade de condições de trabalho, enfatiza a importância da proteção à mulher por meio de edição de convenções a respeito do tema.

            Uma das suas primeiras regulamentações foi matéria referente ao trabalho da mulher e, conforme Alice Monteiro de Barros, duas foram as preocupações da Organização Internacional do Trabalho em relação à atividade laboral feminina: (1) proteger a mulher contra condições insalubres e perigosas da trabalhado, salvaguardando sua integridade física, principalmente quando em estado gravídico; e (2) garantir a igualdade de direito com os homens[12].

            Nesse contexto, Sérgio Pinto Martins leciona:

A Convenção nº. 3, de 1919, ratificada pelo Brasil, diz respeito ao trabalho da mulher antes e depois do parto; a Convenção nº. 4, de 1919, veda o trabalho da mulher em indústrias, sejam elas públicas ou privadas, salvo se o trabalho for feito em oficinas de família [...]; a Convenção nº. 100, de 1951, trata da igualdade de remuneração entre homem e mulher para o trabalho igual; a Convenção nº. 103, de 1952, ratificada pelo Brasil, e a Reconvenção nº. 95, do mesmo ano, dizem respeito à proteção à maternidade [...]; a Convenção nº. 156, de 1981, evidencia igualdade de oportunidades e de tratamento para trabalhadores dos dois sexos em relação às responsabilidades familiares; a Convenção nº. 171, de 1990, fala sobre trabalhos noturnos, que são realizados por um período de sete horas, entre meia noite e 5h da manhã, tendo as mulheres proteção especial apenas em razão da maternidade [...][13].

            Entrando em vigor em 13 de junho de 1921, a Convenção nº. 3 garantia à obreira gestante licença remunerada, mediante atestado médico que comprovasse a gravidez, de seis semanas antes e depois do parto, além de prever o direito a dois repousos, de trinta minutos cada, durante a jornada de trabalho, destinados à amamentação do recém-nascido. Assegurava, ainda, o pagamento pelo Poder Público de auxílio econômico durante o afastamento da trabalhadora destinado às despesas supervenientes originadas pelo nascimento de seu filho, garantindo, com isso, a sobrevivência e o bem-estar de ambos[14].

            Destaca-se que a Convenção nº. 103, de 1952, incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro através do Decreto nº. 58.820 de 14 de julho de 1966, que previa o período de licença maternidade de, no mínimo, doze semanas, apresentou alguns tópicos desatualizados. Razão pela qual foi editada, em 2000, a Convenção nº. 183, que previu o aumento da licença para quatorze semanas, além de manifestar-se acerca da garantia de emprego à gestante, apresentando, destarte, nova sistematização da proteção à maternidade. Contudo, esta não foi ratificada pelo ordenamento pátrio, que, por sua vez, em relação ao período de licença maternidade, é mais favorável à trabalhadora, uma vez que adota quatro meses, sem prejuízo de extensão a seis meses[15].

            A Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 10 de dezembro de 1948, em seu artigo segundo, versa acerca de regras de não discriminação por motivo de gênero:

Artigo II. Toda pessoa tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição{C}[16].

            No mesmo sentido, a Convenção das Nações Unidas sobre eliminação de todas as formas de discriminação contra a mulher, de 18 de dezembro 1979, adotada pela Resolução 34/180 da Assembleia Geral das Nações Unidas e ratificada pelo Brasil em 1º de fevereiro de 1984, proíbe a discriminação contra a mulher na esfera do emprego a fim de assegurar, em condições de igualdade entre homens e mulheres, os mesmos direitos, quais sejam: o direito às mesmas oportunidades de emprego, com a utilização de critérios idênticos de seleção para o emprego; o direito à promoção e à estabilidade no emprego; o direito à igual remuneração e tratamento relativo a um trabalho de igual valor ao do homem; e o direito à proteção da saúde e à segurança nas condições de trabalho{C}[17].

           

1.3       EVOLUÇÃO DA LEGISLAÇÃO PROTECIONISTA EM FAVOR DA MULHER NO BRASIL

            No âmbito da legislação brasileira, a primeira norma que tratou acerca do labor feminino foi o Decreto nº. 21.417-A, de 17 de maio de 1932, que instituiu, em seu artigo 2º, a proibição do trabalho da mulher, no período da noite, nos estabelecimentos industriais e comerciais, sejam eles públicos ou privados, no intervalo das 22 horas às 5 horas do dia seguinte. O mesmo Decreto previu, nos artigos 4º, 5º, 7º e 11, respectivamente, a proibição de remoção de pesos; a vedação do trabalho em locais subterrâneos, insalubres e perigosos; a concessão à gestante de licença de quatro semanas antes e depois do parto; e o direito a dois descansos diários destinados à amamentação pelos seis meses seguintes ao parto[18].

1.3.1    Proteção à mulher e as Constituições Federais

            A Constituição de 1934 foi a primeira a tratar sobre a proteção do labor feminino. Seu artigo 121 versava sobre a proibição da discriminação do trabalho da mulher quanto aos salários, à vedação da atividade laboral em ambientes insalubres, à garantia do repouso anterior e posterior ao parto, sem prejuízo de salário ou emprego, e previa serviços de amparo à maternidade.

            Posteriormente, a Constituição de 1937, que foi fruto de um golpe de Estado realizado pelo então Presidente Getúlio Vargas[19], vedou, em seu artigo 137, o trabalho feminino em indústrias insalubres, e garantiu assistência médica e higiênica à obreira grávida, com direito ao repouso antes e após o parto, sem prejuízo de salário{C}[20].

            Ressalta-se que em 1º de maio de 1943, o ordenamento pátrio editou a Consolidação das Leis do Trabalho, que teve como primeira alteração, mediante o Decreto-lei nº. 6.353 de 20 de março de 1944, a admissão de alguns trabalhos noturnos para mulheres acima de dezoito anos[21].

            Vigente em um cenário de mudanças socioeconômicas, com a instalação de parques industriais no país, a Constituição de 1946, no artigo 157, proibia a diferença de salário por motivo de sexo e o trabalho feminino em ambientes insalubres, certificava o direito da gestante a descanso antes e depois do parto, sem prejuízo de salário, assegurava a assistência médica à trabalhadora grávida, e previa a previdência em favor da maternidade[22].

            Além dos direitos assegurados pelas Constituições anteriores, a Constituição de 1967, no artigo 158, inciso XX, assegurou à mulher o direito a aposentadoria após trinta anos de trabalho com salário integral.

            A Emenda Constitucional nº. 1 de 17 de outubro de 1969 estabeleceu a impossibilidade de diferença salarial e de critérios de admissão por motivo de sexo, vedou o trabalho feminino em indústrias insalubres, além de ter assegurado o descanso remunerado à gestante, sem prejuízo de salário, na época do parto, e previsto a previdência social, com intuito de proteger a maternidade.

1.3.2    O trabalho da mulher da Constituição Federal de 1988

            Apesar de os textos constitucionais anteriores proibirem discriminação por motivo de diferença de sexo, foi com a Constituição Federal promulgada em 1988 que, seguramente, eliminou-se do Direito pátrio qualquer prática discriminatória contra a mulher no âmbito empregatício ou que lhe pudesse limitar o mercado de trabalho{C}[23].

            Sobre o tema, Maria Sbalqueiro Lopes assevera:

Após a promulgação da Constituição de 1988, iniciou-se um processo de adaptação das regras jurídicas aos novos princípios: proibição de discriminação em relação a sexo e abolição da “chefia” da sociedade conjugal. O primeiro passo foi a eliminação das normas pseudoprotetoras mediante revogação expressa da legislação incompatível[24].

            Em seu artigo 1º, a Constituição prevê as diretrizes fundamentais para toda a ordem constitucional. Por ser o trabalho imprescindível à promoção da dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho estão previstos dentre os fundamentos do Estado brasileiro. Logo, um sujeito que não tem expectativa de trabalhar mediante justa remuneração e com condições razoáveis de exercício, possui sua dignidade violada[25].

            Nesse sentido, o princípio da dignidade da pessoa humana está fortemente relacionado com o princípio da valorização do trabalho humano, de uma forma que a dignidade se torna inalcançável quando ao trabalho não é dado o merecido valor. Por esta razão, o artigo 6º da Constituição consagra o trabalho como um direito social[26].

            Considerando a dignidade da pessoa humana valor constitucional supremo, inerente tanto ao gênero masculino como ao gênero feminino, a Constituição vigente previu a igualdade de direitos entre pessoas de sexos distintos, com a finalidade de evitar discriminações e privilégios arbitrários. Sendo, portanto, vedada diferenças de tratamento, salvo se for com objetivo de enfraquecer os desníveis existentes{C}[27].

            Diante disso, o que se veda com o princípio da igualdade são as diferenças inexplicáveis e arbitrárias, uma vez que se incorpora ao sentido de justiça o tratamento desigual aos desiguais na medida de suas desigualdades[28].

            Assim, entende-se por lei arbitrária aquela que, sem justificativa, utiliza tratamento desigual nas situações objetivamente iguais ou tratamento igual nas situações objetivamente desiguais[29].

            O artigo 5º, caput, e inciso I do texto constitucional preveem a igualdade de todos perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, e a igualdade de direitos e obrigações entre homens e mulheres. Nesse sentido, Walber de Moura Agra entende que o princípio da isonomia, expresso no texto constitucional, visou o fim do preconceito em relação à mulher[30].

                Uadi Lammêgo Bulus, sobre o assunto, preleciona:

O constituinte, ao igualar homens e mulheres, acatou uma solicitação há muito reclamada. Expressou em termos constitucionais positivos as longas lutas travadas contra a discriminação do sexo feminino.

Ao fazê-lo garantiu muito mais que a igualdade “perante a lei”; assegurou a igualdade material de direitos e obrigações entre os sexos.

Logo, homens e mulheres, que estiverem em situação idêntica, não poderão, seja qual for o argumento, sofrer qualquer cerceamento em suas prerrogativas e nos seus deveres, sob pena de infringir a Carta de 1988[31].

            No âmbito das relações laborais, apresentando sua intenção antidiscriminatória em relação à diferença de sexo e o intuito de assegurar o princípio da isonomia, o artigo 7º, inciso XXX, da Constituição veda a “diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil”[32].

            A Constituição Federal consagra diversos dispositivos que tratam da proteção ao trabalho da mulher. O artigo 7º, inciso XX, permite uma prática diferenciada, ao estabelecer a proteção do trabalho feminino, mediante incentivos específicos desde que efetivamente estimule, proteja e amplie o mercado de trabalho da mulher. Esta norma é resultado das discriminações sofridas pelas mulheres. Contudo, apesar de ser uma proteção específica, não desrespeita a Carta Magna, uma vez que essa garantia se origina de uma condição fisiológica[33].

            O artigo 7º, XVIII, da Carta de 1988 discorre acerca da licença-maternidade, que recebe normatização especial e diferenciada. Logo, não afasta tratamento individualizado à mulher enquanto mãe. Este dispositivo prevê a licença à gestante, sem prejuízo de emprego ou salário, com a duração de cento e vinte dias[34].

            Além do mais, o artigo 10º, II, “b”, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias prevê, de maneira inovadora, já que nunca havia sido disposta em âmbito constitucional, a estabilidade provisória da trabalhadora gestante, garantindo-lhe o emprego desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.

            O artigo 39, § 3º, da Constituição, que dispõe que as normas referentes à proteção do labor feminino, previstas no art. 7º da referida Carta, são aplicadas também aos trabalhadores ocupantes de cargos públicos.

            Cumpre-se ressaltar, ainda, o artigo 201, II, que dispõe acerca da Previdência Social e sua proteção à maternidade, principalmente à obreira gestante. Sendo este dispositivo, portanto, um reflexo do princípio da solidariedade, que implica a correção das desigualdades sociais, o qual é envolvido o Direito Previdenciário, na medida em que este assume um papel de relevância para o alcance do objetivo de igualdade entre gêneros e compatibilização dos interesses familiares com os trabalhos[35].

            Logo, percebe-se que, apesar da Constituição Federal assegurar o princípio da igualdade como uma forma de evitar atos discriminatórios, no caso em questão, contra as mulheres, a proibição à discriminação não afasta a necessidade de garantias diferenciadas à mulher quando em situações peculiares.{C}[36]

            Portanto, a desigualdade entre homens e mulheres justificada unicamente pela diferença de sexo é inadmissível. Contudo, discriminar a atividade laboral da mulher, no que diz respeito, por exemplo, a proibição de seu trabalho no pós-parto por um período determinado em lei é plenamente admissível, uma vez que, nesse caso, a mulher se encontra em situação especial[37].

            Sendo assim, a Constituição Federal de 1988 caracteriza-se pela proteção e combate à discriminação em relação ao trabalho da mulher, respeitando a necessidade de tratamento diferenciado a ela. Entretanto, não há como afirmar, ainda, uma eficácia plena desses dispositivos constitucionais na esfera trabalhista brasileira.

                       

1.4       TRATAMENTO DESTINADO À MULHER NA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO

            A Consolidação das Leis do Trabalho, promulgada em 1º de maio de 1943, abarca em seu texto dispositivos referentes à proteção ao trabalho da mulher, uma vez que se constatou a necessidade de adoção de um sistema que dispusesse acerca do labor feminino e sua devida proteção, não somente pelo fator pessoal, físico ou econômico, mas também pela preservação e consequente defesa da dignidade do trabalho[38].

            Conforme Orlando Gomes e Elson Gottschalk, a questão física e a constituição fisiológica dos trabalhadores, tais como sexo e idade, são pontos relevantes os quais não podem ser descartados ao se falar em condições de trabalho, na medida em que inspiram limitações à capacidade. Entretanto, essas limitações não caracterizam restrição de direitos, devendo homens e mulheres possuírem os mesmos direitos, visto a igualdade de gênero, que é protegida pelo texto constitucional. Destarte, segundo os autores mencionados, “em relação à mulher, o legislador, com objetivo de assegurar o desenvolvimento demográfico, cuida de preservar a sua função fundamental da maternidade”[39].

            Pode-se falar na existência de um ciclo do Direito do Trabalho, que teve em seu início a presença de ideias e pensamentos liberais resultantes de total falta de proteção ao trabalho e, no final, a adoção de políticas trabalhistas, marcadas pelo surgimento de uma legislação destinada à proteção ao trabalhador, qual seja a Consolidação das Leis de Trabalho.

            Em seu Título III, Capítulo III, trata da proteção do trabalho da mulher. Logo, analisando o conteúdo destas normas, verifica-se que cada uma delas busca a proteção do labor feminino no tocante à moral, saúde e capacidade de reprodução, relacionando-se, assim, à efetividade do princípio da dignidade da pessoa humana{C}[40].

            Ao completar dezoito anos de idade, a mulher adquire capacidade absoluta referente às questões trabalhistas, não havendo mais, nesse caso, a aplicação do artigo 446 da consolidação trabalhista, que foi revogado pela Lei nº. 7855 de 24 de outubro de 1989 e que previa a possibilidade de vedação do pai ou do marido em relação ao contrato de trabalho celebrado pela mulher, que tinha que recorrer ao judiciário para este autorizar a supressão de tal veto[41].

            Seu artigo 390 dispõe acerca da proibição ao empregador de impor à obreira certo tipo de serviço que seja necessária a utilização de sua força muscular superior a vinte quilogramas de maneira contínua, ou a vinte e cinco quilogramas de forma eventual. Percebe-se, assim, que a legislação procurou proteger a trabalhadora, uma vez que, naturalmente, a massa muscular e a estrutura óssea feminina são mais frágeis que a masculina.

            Além da questão do carregamento de peso, a Consolidação das Leis Trabalhistas dispôs acerca do trabalho noturno da mulher, considerado aquele das 22 horas às 5 horas. Originalmente, o artigo 380 vedava o labor feminino no período da noite e previa poucas exceções, quais sejam, serviços de enfermagem e telefonia, cargos de chefia e, para as maiores de dezoito anos, serviços em bares e hotéis. Essas exceções, mais tarde, foram ampliadas para a inclusão de serviços bancários e ensino, mediante os Decretos-leis nº. 229, de 28 de fevereiro de 1967, e nº. 744 de 20 de fevereiro de 1969. Contudo, a regra ainda era a proibição desse tipo de trabalho, uma vez que a principal alegação para justificar tal veto dizia respeito à família, ou seja, a necessidade da presença da mulher no lar, responsável esta pela educação dos filhos e serviços domésticos. Entretanto, com o advento da Lei nº. 7855 de 24 de outubro de 1989, o artigo 380 foi totalmente revogado, sendo extinta, portanto, a vedação ao trabalho noturno feminino[42].

            Com o fundamento na questão da maternidade, isto é, da não lesão às funções reprodutoras da obreira, o trabalho realizado em locais considerados insalubres e perigosos também era proibido para as mulheres, pelo artigo 387 da consolidação trabalhista. Todavia, este dispositivo foi revogado pela Lei nº. 7855 de 24 de outubro de 1989, visto que não há como generalizar o desejo de ser mãe, na medida em que muitas mulheres não planejam ter filhos. Diante disso, não há mais a proibição do trabalho em ambientes subterrâneos, minerações em subsolo, pedreiras ou obras de construção pública ou particular. Sendo permitido, portanto, atividades perigosas ou insalubres. Destarte, o dano à função reprodutora da mulher pode ser prevenido com exames médicos repetitivos, através de diagnósticos precoces de qualquer problema relacionado à sua saúde, sendo esta prática, pois, sinônimo de uma ideal segurança do trabalho[43].

            Nesse sentido, afirma Alice Monteiro de Barros:

Os riscos reprodutivos ocupacionais devem ser eliminados, reduzidos ou distribuídos dentro de um sistema racional de trabalho, de acordo com as particularidades de cada sexo. Ademais, são poucas as profissões, se realmente existem, nas quais o trabalho insalubre ou perigoso é mais prejudicial às mulheres do que aos homens, se uns ou outros agirem com prudência necessária, exceção feita, evidentemente, à mulher no ciclo gravídico-puerperal[44]{C}.

            Além do mais, o ordenamento jurídico brasileiro prevê a possibilidade de transferência de função, considerada medida eficaz para as trabalhadoras que se encontram no período de gestação, conforme exposto no artigo 373,§ 4º, I, da Consolidação das Leis do Trabalho[45].

            No que diz respeito à contratação da mulher e ao consequente acesso ao mercado de trabalho, seu artigo 373-A, inserido pela Lei nº. 9799 de 26 de maio de 1999, estabeleceu certas proibições visando à correção das desigualdades existentes por motivo de gênero e às distorções prejudiciais ao acesso da mulher no referido mercado de trabalho. Não há mais espaço para esse tipo de discriminação pela evolução do conceito de igualdade e pela própria previsão constitucional de combate às desigualdades relacionadas ao sexo. Desta forma, é vedada a publicação de anúncio de emprego que faça referência ao sexo, salvo em situações que, de maneira pública e notória, sejam necessárias devido à natureza de sua função.

            Do mesmo modo, este dispositivo proíbe a recusa, promoção ou dispensa do emprego em razão do sexo, idade, cor ou estado gravídico, salvo quando a natureza da atividade, de maneira pública e notória, for incompatível. Além disso, é vedado que essas razões sejam consideradas variáveis determinantes para fins de remuneração, formação profissional e oportunidades de ascensão profissional[46].

            Destaca-se, ainda, consoante a Lei nº. 9.029 de 13 de abril de 1995, que regulamenta o inciso XXXIII do artigo 7º da Constituição Federal, a proibição de qualquer prática discriminatória como a exigência de atestado ou exame para comprovação de esterilidade ou gravidez, na admissão ou permanência no emprego{C}[47]. Entretanto, nada impede que a empresa solicite exame ou atestado que comprove o estado gravídico com intuito de manter a relação de emprego, uma vez que torna-se impossível saber do estado gravídico da trabalhadora sem a realização do devido exame{C}[48].

            Aduz Sérgio Pinto Martins:

A prática do empregador de solicitar o exame médico para a dispensa da empregada é um ato de segurança para as próprias partes da condição de garantia de emprego da obreira, para efeito da manutenção da relação de emprego no caso de estar ela grávida, não representando crime, infração administrativa ou outra qualquer{C}[49].

            O artigo 373-A também prevê, em seu inciso V, a vedação ao impedimento de acesso ou à adoção de critérios subjetivos para deferir inscrição ou aprovação em concursos, em empresas particulares, em razão de sexo, cor, idade ou estado gravídico.

O inciso VI desta norma prevê, por fim, a proibição de realização de revistas íntimas nas empregas ou funcionárias pelo empregador ou preposto{C}[50].

            Além dos dispositivos legais já mencionados, que apresentam temas exclusivos ao trabalho da mulher, o artigo 384 prevê a concessão de pausa obrigatória de quinze minutos para a obreira antes da realização de qualquer hora extra[51].

            A Consolidação das Leis do Trabalho, mediante o artigo 389, expõe as obrigações das empresas em relação aos métodos e meio ambiente de trabalhado a fim de preservar a saúde, moral e segurança de suas funcionárias. Sendo assim, é dever da empresa tomar medidas concernentes a higienização dos métodos e locais de trabalho, tais como ventilação e iluminação e outros que se fizerem fundamentais ao conforto e à segurança da trabalhadora.

            Além disso, cabe à empresa se utilizar de meios que previnam e evitem o esgotamento físico da empregada. Tais como instalação de bebedouros, lavatórios e aparelhos sanitários, assim como aqueles que garantam privacidade e conforto, como a instalação de vestuários com armários individuais, exceto em locais em que não seja necessária a troca de roupa[52].

            Ressalta-se, ainda, que a empresa possuidora de, pelo menos, trinta funcionárias com mais de dezesseis anos de idade tem o dever de instalar local apropriado para que as obreiras possam guardar, sob vigilância e assistência, os seus filhos durante o período de amamentação[53]{C}.

            Cumpre salientar a importância dos artigos 391 e 392, que tratam acerca da maternidade. Aquele proíbe como motivo de justa causa para rescisão do contrato de trabalho da mulher o fato de ter contraído matrimônio ou de encontrar-se em estado gravídico. Já este expressa o direito da trabalhadora gestante à licença-maternidade de cento e vinte dias, sem qualquer prejuízo de emprego ou salário[54].

            Diante do até aqui exposto, percebe-se uma preocupação do legislador em assegurar os direitos da trabalhadora mulher mediante os dispositivos expressos na consolidação trabalhista. Observa-se, portanto, uma evolução no conteúdo dessas normas, no que diz respeito não apenas ao alcance da igualdade de gênero e sua efetividade social, mas também à questão da proteção da mulher como um ser ímpar, na medida em que é o único ser humano capaz de gerar uma vida.

1.5       PROTEÇÃO À MATERNIDADE

            A proteção à maternidade consiste numa série de medidas prevista no âmbito do direito trabalhista a fim de beneficiar a mulher que se encontra em estado gravídico e que acabou de dar à luz[55].

            A proteção à maternidade possui duas vias de alcance. Em primeiro lugar, prestigia a trabalhadora grávida, para que não passe pela situação de desemprego nesse determinado momento da vida, em que necessita do salário para fins de cuidados com a saúde e para que evite passar pela dificuldade de encontrar novo emprego no curso de sua gravidez, uma vez que o empregador não contrataria uma gestante sabendo que tão logo teria que afastá-la e admitir outro funcionário a fim de compensar a ausência daquela, ou ficar sem seus serviços durante certo tempo. Em segundo lugar, essa proteção também se destina à figura do nascituro, objetivando, pois, seu desenvolvimento em condições adequadas, assim como sua boa formação e nascimento em condições saudáveis, ou ao menos medianas, de nutrição e higiene.

            Diante disso, Homero Batista Mateus da Silva expressa o motivo pelo qual há a proteção simultânea da gestação, do parto e dos primeiros dias do recém-nascido, assevera que essa seja uma proteção necessariamente “sincrônica e polivalente, a fim de envolver as oscilações que o organismo feminino experimenta e a chegada do novo ser humano”{C}[56].

            Cumpre salientar que as regras de proteção à maternidade estão dispostas tanto na Consolidação das Leis do Trabalho e Leis Complementares, quanto na Constituição Federal, em seu artigo 7º, e no artigo 10ºdo Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, em harmonia com a Convenção 103 da Organização Internacional do Trabalho, de 1952, que foi incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro mediante o Decreto nº. 58.820 de 14 de julho de 1966[57].

            A Convenção 103 da mencionada organização estabelece o direito à gestante de licença-maternidade de no mínimo doze semanas, realização do pré-natal, direito de amamentação com pausas ou redução de jornada e o direito de não haver descontos pelo período em que esteve de licença-maternidade.

             Em 2000, editou-se a Convenção 183 da Organização Internacional do Trabalho, não ratificada pelo ordenamento pátrio, mas que significou nova sistematização para a proteção à maternidade no cenário mundial, uma vez que amplia o período mínimo de licença-maternidade para quatorze semanas e discorre acerca da garantia de emprego da gestante e da lactante, observando o direito à reintegração em caso de dispensa abusiva pelo empregador, sendo deste o ônus de provar a justa causa da rescisão contratual[58].

            Ressalta-se, no entanto, que, apesar das Convenções supramencionadas discorrerem acerca do direito da gestante à licença-maternidade, o Brasil adota desde a promulgação da Constituição Federal de 1988 o período de licença de cento e vinte dias, isto é, um pouco mais que dezesseis semanas, sem prejuízo de extensão para seis meses, encontrando-se, assim, o direito do trabalho brasileiro mais favorável que as referidas Convenções da Organização Internacional do Trabalho[59].

            Consoante explica Amauri Mascaro Nascimento, a maternidade necessita de amparo da legislação mediante, principalmente, dois princípios, quais sejam a licença-maternidade e a estabilidade da trabalhadora gestante.[60]

            Como já mencionada, a licença-maternidade tem a finalidade de restabelecer não somente a saúde e bem-estar da mulher, mas também do recém-nascido em seus primeiros meses de vida. De acordo com o artigo 7º, caput, e inciso XVIII da Constituição Federal de 1988, sem prejuízo de emprego ou salário, essa licença possui duração de cento e vinte dias, abrangendo todas as empregadas, inclusive as rurais.

            A Lei nº. 10.421, de 15 de abril de 2002, que deu redação ao § 1º do artigo 392 da Consolidação das Leis do Trabalho, expressa, ainda, que essa licença poderá iniciar a partir devinte e oito dias antes do parto até a ocorrência deste[61], e, consequentemente, noventa e dois dias depois do parto, totalizando, assim, cento e vinte dias.

            Conceituada como proibição da dispensa da obreira grávida sem justa causa por determinado tempo, a estabilidade da gestante era prevista pelas convenções coletivas do trabalho. Com o advento da Constituição Federal de 1988, este princípio passou a beneficiarnão mais apenas a categoria profissional, mas também toda mulher de maneira generalizada. Desta maneira, de acordo com o artigo 10º, II, “b”, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, é vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa da trabalhadora em estado gravídico, desde a confirmação da sua gravidez até o período de cinco meses após o parto[62].

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            Nesse sentido, Amauri Mascaro do Nascimento dispõe:

A dispensa em desacordo com esse princípio é nula. A consequência da declaração da nulidade é a reintegração no emprego, continuando a proteção até o termo final da estabilidade. São assegurados também todos os direitos do contrato de trabalho do período. Dentro da estabilidade, em que o empregador, imotivadamente, obstou o desenvolvimento do vínculo jurídico[63].

            Desta forma, percebe-se que esses dois princípios concordam entre si. Logo, uma vez confirmado o estado gravídico da trabalhadora, inicia-se a vedação à sua dispensa imotivada. Essa vedação se prolonga até cento e vinte dias, quando ela retorna ao seu serviço. E, por fim, durante o período de estabilidade de cinco meses após o parto a trabalhadora não poderá ser despedida{C}[64].

            Cumpre ressaltar que a remuneração relativa à licença-maternidade é considerada salário. E, consoante Panuzzio e Nascimento, o salário-maternidade consiste na “remuneração que a segurada gestante tem direito durante seu afastamento, de acordo com o período estabelecido por lei e mediante comprovação médica”[65].

            A Organização Internacional do Trabalho determina que a sociedade, mediante um sistema de seguridade social, seja responsável pelo custeio da licença-maternidade com intuito de que o empregador não seja o único a ser onerado.

            Durante boa parte da história da proteção do direito em relação à maternidade, o empregador era o único responsável pelo pagamento do período em que a gestante encontrava-se afastada do emprego a fim de dar à luz ao recém-nascido. Desta forma, era evidente o número ínfimo de mulheres contratadas, haja vista o desinteresse do empregador em possuir essa obrigação{C}[66].

            Diante disso, e com objetivo de proteger o mercado de trabalho feminino, a legislação pátria passou a considerar que o salário-maternidade é uma despesa essencialmente previdenciária. Nesse caso, o empregador deve pagar os salários à trabalhadora que se encontra em licença-maternidade, contudo, possui o direito de compensá-los com recolhimentos devidos à Previdência Social[67].

            Através da Lei nº. 11.770 de 9 de setembro de 2008, criou-se o Programa Empresa Cidadã, destinado a estender a licença-maternidade, de maneira facultativa, por mais sessenta dias, visando à utilização do princípio da proteção integral da criança, garantindo-lhe saúde e amamentação durante todo esse período, como também seu vínculo com a família[68], desde que concedida imediatamente após o término dos cento e vinte dias, assumindo o empregador o pagamento da remuneração equivalente a esse período, já que esse não se trata de um direito previdenciário.

            Ressalta-se, ainda, que para que haja a prorrogação dessa licença, perfaz-se necessária a presença de duas condições, quais sejam: a adesão da empresa ao programa supracitado e o requerimento da empregada do benefício no prazo de até o primeiro mês após o parto[69].

            Com a finalidade de afastar qualquer discriminação à mulher no mercado de trabalho, o artigo 5º da Lei nº. 11.770 de 9 de setembro de 2008 prevê:

A pessoa jurídica tributada com a base de lucro real poderá deduzir do imposto devido, em cada período de apuração, o total da remuneração integral da empregada pago nos sessenta dias de prorrogação de sua licença-maternidade, vedada a dedução como despesa operacional{C}[70].

            Nesse sentido, concorda Amauri Mascaro Nascimento que a empresa tributada poderá deduzir do imposto devido, baseando-se no lucro real, a remuneração total paga para a trabalhadora que obteve o acréscimo de sessenta dias de licença-maternidade[71].

            Diante do exposto, percebe-se, portanto, que não apenas o empregador possui obrigação em relação ao período acrescido à licença-maternidade, qual seja, o pagamento da remuneração da obreira durante o tempo de extensão da licença, mas também a empregada deve seguir certas normas para que seja concedida a referida prorrogação. Logo, neste período, não poderá a trabalhadora desempenhar qualquer atividade remunerada, como também não poderá manter seu filho em creche ou qualquer outra organização similar[72].

            Consoante o artigo 392 da consolidação trabalhista, o afastamento da trabalhadora ocorrerá através da notificação ao empregador através de atestado médico, e poderá ocorrer entre os vinte e oito dias antes do parto. Excepcionalmente, também mediante atestado médico, os períodos de repouso, antes e após o parto, poderão ser acrescidos de duas semanas cada. Além do mais, em caso de parto antecipado, a mulher continua com o mesmo direito aos cento e vinte dias de licença-maternidade[73].

            Garante-se à empregada gestante, ainda, em casos excepcionais, a transferência de função quando necessária e mediante atestado médico, além de seu retorno à função anteriormente exercida[74]. Esse retorno é assegurado não apenas por questão financeira, mas também pelo fato de sua antiga função ser fruto de sua realização profissional.

            Essa transferência possui várias peculiaridades e abarca desde situações mais evidentes, como o afastamento da gestante de ambientes insalubres e perigosos, até casos mais perspicazes, como a retirada da empregada de trabalhados externos que necessitem de deslocamento, assim como a proporção de melhor ambiente e condições de trabalho, como no caso, por exemplo, de disponibilidade de assentos no local de labor para que a gestante mude de posição quando se sentir desconfortável.

            Evidencia-se, pois, que essa transferência de função pode ocorrer, de acordo com a necessidade, em qualquer etapa da gestação e, até mesmo, após o retorno da empregada após a licença-maternidade por motivo de fragilidade física ou amamentação{C}[75].

            À gestante, ainda é assegurado o direito à realização de exames pré-natais e acompanhamento médico em toda a fase gestacional. Pelo que o § 4º do artigo 392 da Consolidação das Leis Trabalhistas permite a dispensa da empregada pelo tempo necessário para a realização de, pelo menos, seis consultas médicas ou exames complementares, essenciais para o cuidado ideal nessa fase de desenvolvimento do feto.

            Ressalta-se que o número de consultas médicas pode ser ampliado de forma indeterminada por necessidade e exigência do médico. Ocorre que, quando esse número é dilatado de maneira excessiva, passa a ser tratado como licença médica por gravidez de alto risco. Nesse caso, o empregador arca apenas com os primeiros quinze dias da ausência da obreira, ficando a cargo do INSS o abono de todas as outras ausências após o referido período[76].

            Como a licença-maternidade, assim como o salário-maternidade, não somente visa o nascimento da criança, mas também a gestação, uma vez que gera transtornos físicos e psicológicos na mulher, o afastamento após o parto torna-se imprescindível. Não está, portanto, condicionado ao nascimento do ser humano com vida[77]. Nesse sentido, o artigo 395 revela que, em caso de aborto não criminoso, certificado por atestado médico, tem a mulher o direito a um repouso equivalente a duas semanas, podendo, ela, após o referido período, retornar à função que ocupara anteriormente.

            Com o advento da Lei nº. 10.421 de 15 de abril de 2002, o artigo 392 da consolidação trabalhista foi alterado no que diz respeito ao direito da mãe adotiva à licença-maternidade e salário-maternidade.

            Historicamente, no caso de adoção ou guarda judicial de uma criança, a licença-maternidade era assegurada de maneira proporcional, isto é, o período de licença era calculado de forma diretamente proporcional à idade da criança adotada, criando, assim, uma duração dessemelhante entre o direito da mãe biológica e o da mãe adotante.

            Yone Frediane preleciona:

A propósito do tratamento escalonado estabelecido pela Lei n. 10.421/02, em virtude da idade do adotado, duas outras colocações ainda merecem ser expostas; a primeira, no sentido de constituir fato público e notório que quanto maior a idade da criança adotada, maior será possivelmente sua dificuldade de adaptação no novo lar, daí porque os prazos previstos nos referidos diplomas legais inferiores aos 120 (cento e vinte) dias se afiguram insignificantes ao propósito a que se destinam, posto que discriminam a criança adotada em categorias em razão da respectiva idade[78].

            Destarte, com a promulgação da Lei nº. 12.010 de 3 de agosto de 2009 e a consequente inclusão do artigo 392-A na consolidação do trabalho, o período de licença-maternidade assegurado à mãe adotiva passou a ser o mesmo da mãe biológica, correspondente a cento e vinte dias[79].

            É garantida, portanto, a licença-maternidade à empregada que adotou ou obteve guarda judicial de uma criança, uma vez que, embora a mulher não tenha passado por mudanças originárias da gestação, essa criança necessita de cuidados especiais no início de uma nova etapa de sua vida em um novo lar. Desta maneira, assegura-se a licença-maternidade e o salário-maternidade à mãe adotiva, visando o alcance de uma melhora em sua condição social, assim como os mesmos direitos e qualificações aos filhos adotados de um filho biológico, havendo a vedação, portanto, de qualquer discriminação acerca da questão de filiação{C}[80].

            Em relação ao período de amamentação, a Convenção 103 da Organização Internacional do Trabalho, em seu artigo V, prevê que “se a mulher amamentar seu filho, será autorizada a interromper seu trabalho com esta finalidade durante um ou vários períodos cuja duração será fixada pela legislação nacional”{C}[81].

             Nesse sentido, a Consolidação das Leis do Trabalho concede à mulher, portanto, através do artigo 396, o direito a dois descansos especiais, com duração de meia hora cada, destinados à amamentação do recém-nascido, até que atinja seis meses de vida. Estabelece, também, o direito de extensão desse prazo caso a saúde da criança assim exigir[82].

            Como visto anteriormente, as empresas que tiverem mais de trinta empregadas acima de dezesseis anos de idade deverão guardar um local apropriado para que seus filhos fiquem protegidos durante o período de labor.

            Além do mais, conforme o artigo 400, esses locais destinados à guarda dos filhos das empregadas deverão possuir um berçário, uma saleta de amamentação, uma cozinha dietética e uma instalação sanitária. Contudo, a exigência do local de vigilância do recém-nascido poderá ser suprida mediante convênio realizado entre as empresas e creches, entidades públicas ou privadas, em regime comunitário, ou a cargo do SESI, SESC, da LBA ou entidades sindicais. Ressalta-se, ainda, que a Portaria nº. 3.296 de 3 de setembro de 1986 do Ministério do Trabalho passou a permitir a substituição da concessão de creches pelo reembolso-creche, que não possui natureza salarial, e consiste no pagamento em dinheiro em forma de auxílio-creche[83].

            Evidencia-se, portanto, diante de todo exposto, que a legislação brasileira expressa uma imensa preocupação em respeito à saúde e ao bem estar da mulher em estado gravídico, assim como ao desenvolvimento do feto e às condições em que o recém-nascido passará seus primeiros dias de vida.

            Essa proteção se encontra presente desde a fase gestacional, seja por meio de mudanças no ambiente de trabalho, seja pela concessão de tempo indeterminado para realização de exames ou pela transferência de função, até o pós-parto, período pelo qual a mulher se ver na obrigação de cuidado e guarda da vida do recém-nascido.

2: ESTABILIDADE

2.1       ANTECEDENTES HISTÓRICOS DA ESTABILIDADE NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

            O Direito do Trabalho brasileiro sempre buscou a criação de mecanismos que afirmassem a importância dos princípios da continuidade da relação de emprego, visando à valorização do vínculo empregatício e da inserção do trabalhador na empresa[84].

            A ideia de estabilidade no Brasil surgiu, primeiramente, no setor público. Com o advento da Lei nº. 2.924 de 5 de janeiro de 1915, foi proibida a dispensa do servidor público que tivesse dez anos de serviço[85].

            Segundo Alice de Barros Monteiro, surgiu no Brasil, através da Lei nº. 4.682 de 24 de janeiro de 1923, conhecida como Lei Elói Chaves, o instituto da estabilidade no emprego, que garantia estabilidade aos trabalhadores ferroviários depois de dez anos de serviço junto ao mesmo empregador[86]. Posteriormente, a estabilidade decenal foi estendida para as outras categorias.

             Cumpre ressaltar que a finalidade primária e imediata da estabilidade foi a de assegurar o custeio do sistema previdenciário, sendo apenas possível com a existência do emprego de forma permanente. Contudo, com o surgimento da Lei nº. 62 de 5 de junho de 1935, a estabilidade deixou de ser vinculada à legislação previdenciária.

            No âmbito constitucional, a Constituição de 1967 previu opção pelo Sistema de Fundo de Garantia, permitindo ao trabalhador a faculdade de escolha entre a estabilidade decenal ou o FGTS.

            A partir da Constituição Federal de 1988, o Regime do fundo de garantia se tornou obrigatório, extinguindo, assim, a figura da estabilidade no emprego e a opção pelo fundo de garantia, ressalvando o direito adquirido dos trabalhadores que já eram contemplados, devido aos dez anos de serviço.

            O inciso I do artigo 7º da Constituição Federal de 1988 dispõe acerca da proteção à dispensa arbitrária. E, não obstante esse dispositivo prever que a relação de emprego protegida contra a dispensa arbitrária ou sem justa causa deverá dar-se em conformidade com lei complementar que abarque sobre o tema, não há vedação de que lei ordinária disponha também acerca da estabilidade quando ocorrer os tipos de dispensas ora mencionados.

            O advento da Constituição atual trouxe, ainda, a relevância das garantias provisórias, chamadas também de estabilidades provisórias, que podem ser instituídas por lei ordinária ou complementar, que versará acerca das dispensas sem justa causa e das despedidas arbitrárias[87].

            Destarte, apesar de próximas por limitar as opções de extinção do contrato empregatício, estabilidade e garantia ou estabilidade provisória são institutos distintos, os quais merecem certa atenção.

           

2.2       NOÇÕES DE ESTABILIDADE

            Em sentido genérico, segundo Aurélio Buarque, a estabilidade possui como significado solidez,permanência, duração ou segurança{C}[88].

            No âmbito do Direito do Trabalho, estabilidade constitui, junto ao aviso prévio e à indenização, uma das limitações existentes acerca do poder de despedir do empregador.

            Sobre o tema, Sérgio Pinto Martins, ensina:

A estabilidade é o direito do empregado de continuar no emprego, mesmo contra a vontade do empregador, desde que inexista uma causa objetiva a determinar sua despedida. Tem assim, o empregado o direito ao emprego, de não ser despedido, salvo determinação de lei em sentido contrário[89].

            No mesmo sentido, Gustavo Filipe Barbosa Garcia entende por estabilidade:

[...] o direito do empregado de permanecer no emprego, restringindo o direito do empregador de dispensá-lo sem justa causa ou de forma arbitrária, só se autorizando a cessão em caso de falta grave, força maior, força maior que determine a extinção da empresa, ou cessão das atividades da empresa[90].

            Ainda, segundo Maurício Godinho Delgado:

Estabilidade é a vantagem jurídica de caráter permanente deferida ao empregado em virtude de uma circunstância tipificada de caráter geral, de modo a assegurar a manutenção indefinida no tempo do vínculo empregatício independentemente da vontade do empregador{C}[91].

            Não obstante a estabilidade se encontrar protegida pelo ordenamento jurídico brasileiro, perfaz-se necessária a ressalva de que ela não pode ser vista de maneira absoluta, haja vista a presença da justa causa e do motivo de força maior, entre outras, previstas em lei.

            Sendo assim, a estabilidade prevista na legislação é a jurídica, a qual consiste na impossibilidade de dispensa do empregado, com exceção das hipóteses expressa na lei. Esse direito decorre da aplicação do princípio da continuidade do contrato de trabalho, alicerce do direito trabalhista. Tem previsão na Consolidação das Leis Trabalhista e diz respeito à relação contratual fundada entre empregado e empregador.

            Com efeito, para o empregado, estabilidade consiste em sua garantia pessoal, o direito de continuação no emprego ainda que por vontade contrária do empregador, desde que não haja uma causa objetiva para sua dispensa. Para o empregador, consiste numa obrigação de não fazer, isto é, na proibição de dispensa do empregado, exceto nas hipóteses expressas em lei, entre as quais a dispensa por justa causa, força maior, ou encerramento das atividades da empresa[92].

2.3       CLASSIFICAÇÃO DA ESTABILIDADE

            Consoante mencionado anteriormente, a primeira estabilidade que surgiu no ordenamento jurídico brasileiro foi a estabilidade decenal, também chamada de absoluta, que entende que o empregado com dez anos ou mais de serviços prestados para determinada empresa não poderá ser despedido sem que haja a presença de falta grave, apurada mediante inquérito, ou de força maior.

            Essa estabilidade foi extinta quando foi assegurada ao trabalhador a relação de emprego protegida contra dispensa arbitrária ou sem justa causa, momento em que houve a instituição do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço.

            Com Constituição Federal de 1988, o supracitado fundo se tornou obrigatório. Contudo, aqueles trabalhadores com mais de dez anos de serviço e não optantes pelo instituto do FGTS na época anterior à Constituição vigente tiveram a estabilidade assegurada, uma vez que foi considerada como direito adquirido.

            Pois bem, além da chamada estabilidade absoluta, que no entender de Sérgio Pinto Martins, é aquela que ocorre quando ao empregador fica vedada a dispensa do empregado, salvo quando a lei expressa o contrário, há a chamada estabilidade provisória ou relativa, a qual permite a dispensa do empregado, após a passagem de certo período de tempo[93].

            Logo, a estabilidade provisória é aquela que versa sobre os trabalhadores protegidos de maneira provisória contra despedida arbitrária até que se extinga a condição e o período garantido por lei. Ressalta-se que, dentre os sujeitos garantidores dessa estabilidade, encontra-se a gestante.

            Na estabilidade absoluta, caso o empregado seja dispensado sem a devida autorização legal, terá direito de reintegração e de receber os salários referentes ao período de seu afastamento. Já na estabilidade provisória, caso haja dispensa no período protegido por lei, haverá o direito à indenização referente ao tempo da estabilidade.

            Em relação ao instituto da estabilidade provisória, a Súmula nº. 396 do Tribunal Superior do Trabalho dispõe acerca dos salários que o empregado faz jus do período que tem direito à estabilidade, sendo afastada a reintegração:

 SÚMULA 396 ESTABILIDADE PROVISÓRIA. PEDIDO DE REINTEGRAÇÃO. CONCESSÃO DO SALÁRIO RELATIVO AO PERÍODO DE ESTABILIDADE JÁ EXAURIDO. INEXISTÊNCIA DE JULGAMENTO "EXTRA PETITA" (conversão das Orientações Jurisprudenciais nºs 106 e 116 da SBDI-1) - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005

I - Exaurido o período de estabilidade, são devidos ao empregado apenas os salários do período compreendido entre a data da despedida e o final do período de estabilidade, não lhe sendo assegurada a reintegração no emprego. (ex-OJ nº 116 da SBDI-1 - inserida em 01.10.1997)

II - Não há nulidade por julgamento “extra petita” da decisão que deferir salário quando o pedido for de reintegração, dados os termos do art. 496 da CLT. (ex-OJ nº 106 da SBDI-1 - inserida em 20.11.1997)[94].

            Cumpre salientar, ainda, que a estabilidade pode ser classificada como legal ou convencional, podendo originar-se, respectivamente, de previsão legal ou de convenção ou acordo coletivo[95].

2.4       ESTABILIDADE PROVISÓRIA OU GARANTIA DE EMPREGO

            Não obstante a estabilidade e a garantia de emprego se voltarem de forma contrária ao exercício unilateral do poder empregatício, limitando o direito potestativo do empregador de dispensa do empregado com intuito de inviabilizar a extinção do contrato de trabalho por motivo meramente arbitrário, esses institutos, como já mencionado, divergem um do outro.

            A garantia de emprego está relacionada à política de emprego e é entendida como a impossibilidade, por certo período de tempo, de o empregador dispensar o empregado, com exceção das hipóteses previstas na legislação.

            Nesse contexto, percebe-se que, quando o empregado possui o direito à estabilidade provisória, o empregador tem seu direito potestativo de dispensa do empregado somente limitado, podendo o empregador dispensar seu empregado por motivo relevante ou causa justificada, caso em que ao empregado é assegurada indenização compensatória, prevista no inciso I do artigo 7º da Constituição[96].

            Segundo Maurício Godinho Delgado, garantia de emprego consiste na vantagem jurídica provisória deferida ao empregado por circunstância contratual ou pessoal obreira de caráter especial, visando assegurar a manutenção do vínculo empregatício por um lapso temporal determinado, independentemente da vontade do empregador{C}[97].

            Alice Monteiro de Barros entende que a expressão garantia de emprego seria a forma correta de se referir à estabilidade provisória, uma vez que, embora seja criação da jurisprudência, se é provisória, não poderá ser estabilidade[98].

            Como considerada matéria relevante para o ordenamento jurídico brasileiro, verifica-se que a Constituição Federal vigente introduziu dispositivos que garantem a estabilidade provisória de determinados empregados, quais sejam: dirigente sindical, previsto no artigo 8º, inciso VIII; empregado eleito membro da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes – CIPA – expresso no artigo 10, II, “a”,do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias; e a empregada em condição gravídica, protegida pelo artigo 10º, II, “b”, do mesmo texto normativo{C}[99].

           

2.5       ESTABILIDADE PROVISÓRIA E A LICENÇA MATERNIDADE

            O direito trabalhista brasileiro possui como um de seus maiores e mais importantes objetivos a proteção do obreiro de maneira contínua. E, para que essa meta seja atingida, é necessária a distinção das características singulares de cada grupo de trabalhadores,com o consequente tratamento diferenciado, de acordo com suas respectivas peculiaridades e realidade fáticas para que seja atingida a verdadeira igualdade na medida em que haja um tratamento isonômico, desde que respeitadas suas diferenças.

            Dentre os grupos que merecem tratamento específico, encontra-se aquele composto pelas mulheres, e de uma forma mais específica, pelas gestantes. Nesse sentido, a legislação brasileira expõe duas linhas de proteção à trabalhadora grávida: a estabilidade provisória e a licença maternidade[100].

            Como visto, esses institutos são de essencial importância não apenas para a vida da trabalhadora, mas também para o bem-estar, saúde e segurança do recém-nascido. E, apesar de serem próximos, não devem ser confundidos. Desta forma, perfaz-se necessária a diferenciação dessas duas esferas protecionistas.

            A licença maternidade está prevista no artigo 7º, inciso XVIII, da Constituição Federal, estabelecendo o direito à licença maternidade, sem prejuízo de salário e emprego, por período de cento e vinte dias, garantindo esse benefício à empregada celetista, doméstica, avulsa, seja com maternidade biológica ou adotiva{C}[101].

            Além do texto constitucional, a Consolidação das Leis do Trabalho, em seu artigo 392, estatui:

Art. 392. A empregada gestante tem direito à licença-maternidade de 120 (cento e vinte) dias, sem prejuízo do emprego e do salário.

§ 1o A empregada deve, mediante atestado médico, notificar o seu empregador da data do início do afastamento do emprego, que poderá ocorrer entre o 28º (vigésimo oitavo) dia antes do parto e ocorrência deste[102]{C}.

            Desta maneira, percebe-se que a Constituição Federal e a consolidação trabalhista encontram-se compatíveis em relação ao período de licença destinado à mulher gestante. Prevendo esta, ainda, o dever da empregada de notificar o empregador do início de seu afastamento, que poderá ocorrer a partir do vigésimo oitavo dia anterior ao parto.

            Cumpre ressaltar que a citada consolidação, apesar de dispor acerca da licença-maternidade, sempre foi omissa em relação à estabilidade provisória da gestante, que somente foi reconhecida com o advento da Constituição Federal de 1988[103].

            Sendo assim, a estabilidade provisória da gestante está prevista no artigo 10º, inciso II, “b”,do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que entende a estabilidade comoo direito que a trabalhadora grávida possui de não ser dispensada de seu emprego desde o momento da confirmação de seu estado gravídico até cinco meses após o parto.

            Evidencia-se, assim, que enquanto a licença maternidade determina o período em que a mulher poderá cuidar de sua saúde como de seu filho, sem prejuízo do emprego ou salário, a estabilidade determina o período pelo qual o empregador se encontra impossibilitado de despedir a obreira de maneira arbitrária ou sem justa causa.

            Portanto, essas medidas protecionistas asseguradas pelo ordenamento jurídico à mulher, que visam o cuidado à criança no início de sua vida familiar, a proteção da mãe empregada e sua segurança no emprego, são fundamentais quando há ausência de amparo espontâneo da sociedade a certos indivíduos, como no caso da proteção à atividade laboral da mulher[104].

2.6       ESTABILIDADE PROVISÓRIA DA GESTANTE

            A mulher, como ser capaz de gerar uma vida, possui um direito singular garantido durante e após sua fase gestacional, qual seja, a estabilidade provisória de seu emprego. Nesse sentido, essa estabilidade provisória consiste na proibição constitucional da dispensa sem justa causa da empregada gestante durante certo período de tempo[105].

            Indiscutivelmente necessária para os primeiros dias de vida do recém-nascido e com o fundamento de melhores condições de saúde, bem-estar e recuperação da mãe e do nascituro, a estabilidade provisória da gestante passou a ser assegurada pela legislação brasileira, mais precisamente pelo artigo 10º, II, “b”,do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

            Sendo assim, com o advento do referido dispositivo, ficou proibida a dispensa da trabalhadora gestante de forma arbitrária ou sem justa causa desde a confirmação da gravidez até os próximos cinco meses após o parto, garantindo à mulher seu salário e emprego durante esse período, além da tranquilidade de cuidar de seu filho sem a preocupação de busca por emprego para garantia do seu sustento e do recém-nascido.

Art. 10. Até que seja promulgada a lei complementar a que se refere o art. 7º, I, da Constituição:

[...]

II - fica vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa:

[...]

b) da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto[106]{C}.

            O dispositivo ora analisado, segundo Vólia Bomfim Cassar, concedeu o direito à estabilidade à trabalhadora grávida com o intuito de impedir sua demissão pelo motivo de encontrar-se em período gestacional. Além do mais, objetivou-se evitar o desemprego no período em que seu salário é ainda mais necessário, impedindo qualquer prejuízo em relação à trabalhadora e ao novo ser humano[107].

            Nesse sentido, Alice Monteiro de Barros aduz:

A medida legal atende ao elevado espírito social que essa situação particular reclama. A gestante, à semelhança do dirigente sindical, pode ser alvo da represália patronal, pela despedida injusta. E essa possibilidade, torna-se gravíssima, pois atinge a mãe trabalhadora em momento difícil de sua vida[108].

            Ademais, destacam-se duas teorias que tratam a respeito da estabilidade da gestante, quais sejam: a teoria subjetiva e a teoria objetiva.

            A teoria subjetiva é aquela que entende que deve haver a comprovação da gravidez pela trabalhadora perante o empregador, isto é, a empregada deve cientificar seu patrão de sua gravidez, mediante exame ou atestado médico que comprove seu estado. É a partir dessa comprovação que a empregada estaria protegida. Logo, caso a empregada não demonstre ou confirme o estado em que se encontra, e o empregador a demitir arbitrariamente, não há como responsabilizá-lo devido a esta dispensa pelo fato de não ter ciência da gravidez.

            Já a teoria objetiva entende que somente basta haver confirmação da gravidez para a própria empregada e não para o empregador. Desta forma, a estabilidade da gestante é garantida independentemente da comprovação da gravidez perante o empregador, restando por suficiente sua confirmação. Assim, a responsabilidade do empregador é considerada objetiva, na medida em que o desconhecimento da gestação não afasta o direito da obreira de sua estabilidade[109].

            Segundo GleibePretti, “a base de início da estabilidade é a confirmação da gravidez e não sua comprovação”[110].

            Nesse sentido está o posicionamento do Tribunal Superior do Trabalho, que com jurisprudência já pacificada, editou a Súmula nº. 244, inciso I, que prevê a irrelevância do conhecimento do empregador a respeito do estado gravídico da empregada para fins de estabilidade, não afastando, assim, a responsabilidade do empregador ao pagamento de indenização decorrente da estabilidade por desconhecer da gravidez da trabalhadora{C}[111].

            Com o advento da Constituição Federal de 1988, passou-se a assegurar à empregada gestante a garantia em seu emprego, descartando a figura da indenização, que passaria somente a ser devida de maneira excepcional, quando esgotada a possibilidade de reintegração da trabalhadora ao seu emprego, no caso do término do período da estabilidade ou em razão do grau de inimizade entre empregador e obreira, principalmente quando aquele é pessoa física[112].

            Segundo Sérgio Pinto Martins, o pedido somente de indenização demonstra-se o não interesse da obreira no retorno ao trabalho, sendo descartado, assim, seu direito à garantia de emprego. Do mesmo modo, quando a empresa disponibiliza o emprego e a obreira expressa o não interesse ao seu retorno, tem-se por renunciado o seu direito à garantia de emprego, uma vez que, como mencionado, a legislação brasileira garante o direito à estabilidade e não à indenização[113].

            Renato Saraiva entende que “a garantia de emprego à gestante só autoriza sua reintegração se esta se der durante o período de estabilidade. Do contrário, a garantia restringe-se aos salários e demais direitos correspondentes ao período de estabilidade”[114].

            Destarte, conforme a Súmula 244, II, do Tribunal Superior do Trabalho, a estabilidade provisória garante à trabalhadora gestante o direito à reintegração ao emprego caso seja dispensada arbitrariamente no curso de sua estabilidade. Se dispensada após o período de estabilidade, terá direito à indenização do período referente a essa.

            Cumpre ressaltar que, com o surgimento da Lei 11.324 de 2006, acrescentou-se o artigo 4º-A à Lei 5.859 de 1972, garantindo à empregada doméstica, que até então não era tutelada pela estabilidade provisória, o direito à garantia de emprego desde confirmada sua gravidez até o período de cinco meses após o parto{C}[115].

            A Súmula 244, III, do Tribunal Superior do Trabalho, até o início de setembro do ano de 2012, possuía o seguinte texto:

244 GESTANTE. ESTABILIDADE PROVISÓRIA.

I – O desconhecimento do estado gravídico pelo empregador não afasta o direito ao pagamento da indenização decorrente da estabilidade (art. 10, II, b, do ADCT) (ex-OJ nº 88 – Dj 16.4.04).

II – A garantia de emprego à gestante só autoriza a reintegração se esta se der durante o período de estabilidade. Do contrário, a garantia restringe-se aos salários e demais direitos correspondentes ao período de estabilidade (ex-Súmula nº 244 – Res. 121/03, Dj 21.11.03).

III – Não há direito da empregada gestante à estabilidade provisória na hipótese de admissão mediante contrato de experiência, visto que a extinção da relação de emprego, em face do término do prazo, não constitui dispensa arbitrária ou sem justa causa (ex-OJ nº 196 – Inserida em 8.11.00). (grifos nossos)[116].

            O contrato de experiência é espécie do gênero contrato de trabalho por prazo determinado, limitando-se a noventa dias; e sua prorrogação gera a pena de torna-se indeterminado. Assim como qualquer outro contrato por prazo determinado que possui data certa para se extinguir, para que seja válido, é necessário que a natureza do serviço a ser executado justifique a predeterminação do prazo e que as atividades empresariais tenham caráter transitório{C}[117].

            Percebe-se que o entendimento da Súmula 244, III, era a favor do afastamento do direito à estabilidade provisória da gestante no curso do contrato de experiência, pela razão de que esse tipo de contrato não teria coerência com o conceito de estabilidade, uma vez que prolongaria o contrato para além do que acordado pelas partes, que já tinham a ciência do término do pacto laboral[118]. Ressalta-se que, apesar do dispositivo não ter mencionado a figura do contrato determinado, este tinha o mesmo tratamento do contrato de experiência[119].

            Nesse sentido, Aldemiro Rezende Dantas Júnior leciona:

[...] a ocorrência de uma das causas de emprego, no curso do contrato a termo, não assegura a continuidade do contrato, que se extinguirá normalmente no término previsto. [...] em relação à gestante, esclarece a Súmula 244, do TST, que não há direito da empregada gestante à estabilidade provisória na hipótese de admissão mediante contrato de experiência, visto que, a extinção da relação de emprego, em face do término do prazo, não constitui dispensa arbitrária ou sem justa causa{C}[120].

            Todavia, a Constituição Federal, através do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, ao legislar acerca da estabilidade da gestante, não mencionou nenhuma distinção entre contratos por prazo determinado ou indeterminado, isto é, garantiu o emprego à mulher grávida sem distinguir nenhum tipo de contrato.

            Assim, o Tribunal Superior do Trabalho passou a mudar seu entendimento em relação ao direito da gestante à estabilidade provisória no decorrer do contrato por tempo determinado, uma vez que o objetivo maior, nesse caso, seria a saúde e assistência social da obreira e do recém-nascido[121], conforme se percebe do aresto colacionado:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA - CABIMENTO.GESTANTE. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. CONTRATO DE EXPERIÊNCIA. COMPATIBILIDADE. A potencial violação do art. 10º, II, “b”, do ADCT enseja o processamento o recurso de revista. Agravo de instrumento conhecido e provido. II - RECURSO DE REVISTA. 1. CONTRATO DE EXPERIÊNCIA. NULIDADE. O recurso de revista não merece processamento, quando não observados os requisitos traçados no art. 896 da CLT. Recurso de revista não conhecido. 2. GESTANTE. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. CONTRATO DE EXPERIÊNCIA. COMPATIBILIDADE. 1. A Constituição Federal prevê, no seu art. 6º, "caput", que são direitos sociais, entre outros que enumera, "a proteção à maternidade e à infância". O art. 10º, II, “b”, do ADCT, respondendo à diretriz do art. 7º, XVIII, da Carta Magna, afirma que "II - fica vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa: b) da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses parto". 2. Com atenção aos fins sociais buscados pela Lei (LIDB, art. 5º), não se deve rejeitar a estabilidade provisória da empregada gestante no curso de trabalho temporário. Os direitos decorrentes do disposto no art. 7º, XVIII, da Constituição Federal, e no art. 10º, II, “b”, do ADCT, não têm sua eficácia limitada aos contratos por prazo indeterminado, uma vez que erigidos a partir de responsabilidade objetiva. Enquanto se cuide de proteção ao nascituro, prevalecerão os benefícios constitucionais, ainda que a própria empregada, ao tempo da dissolução contratual, já aguardasse o seu termo final. 3. Diante do exposto, revela-se devida a estabilidade provisória, ainda quando se cuide de contrato por prazo determinado, na esteira dos precedentes do Excelso Supremo Tribunal Federal, restando superado o item III da Súmula 244/TST. Recurso de revista conhecido e provido.

(RR 49800-75.2009.5.02.0462, Ministro Relator: Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, 3º Turma. Data da publicação: 13/06/2012). {C}[122]

            Como se percebe do julgado acima, o Tribunal entendeu que não se deve rejeitar a estabilidade provisória da empregada gestando no curso de trabalho temporário, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, vedada a dispensa arbitrária do empregador. No mesmo sentido, outro julgado do mesmo Tribunal:

RECURSO DE REVISTA - PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO - GESTANTE - ESTABILIDADE PROVISÓRIA - CONTRATO DE EXPERIÊNCIA - COMPATIBILIDADE. Estabelece o art. 10º, II, “b”, do ADCT que é vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto. O único pressuposto para que a empregada tenha reconhecido seu direito à estabilidade provisória é o estado gravídico no momento da rescisão do contrato de trabalho, porque tal garantia visa à tutela do nascituro e o citado preceito constitucional não impõe nenhuma restrição quanto à modalidade do contrato de trabalho, se por prazo determinado, como é o contrato de experiência, ou por prazo indeterminado. Por conseguinte, a empregada admitida mediante contrato de experiência por prazo determinado tem direito à estabilidade provisória da gestante. Inaplicável a Súmula nº 244, III, do TST, por dissentir do moderno posicionamento do Supremo Tribunal Federal. Precedentes{C}[123]{C}.

            Sendo assim, em 14 de setembro de 2012, o Pleno do Tribunal Superior do Trabalho, mediante a Resolução nº. 185 de 14 de setembro de 2012, modificou o texto do inciso III da Súmula nº. 244, que passou a proteger a gestante, e consequentemente a criança, garantindo-a o direito à estabilidade provisória, ainda que tenha sido contratado por período determinado. Esse dispositivo passou a ter a seguinte redação:

GESTANTE. ESTABILIDADE PROVISÓRIA (redação do item III alterada na sessão do Tribunal Pleno realizada em 14.09.2012) - Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012

[...]

III - A empregada gestante tem direito à estabilidade provisória prevista no art. 10, inciso II, alínea “b”, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, mesmo na hipótese de admissão mediante contrato por tempo determinado[124].

            Logo, evidencia-se que o entendimento passou a ter harmonia com o artigo 10º, II, “b”,do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, uma vez que este dispositivo não limitou o direito à estabilidade provisória à determinada modalidade de contrato. Pelo contrário. Entende-se que a garantia prevista no texto constitucional condiciona-se apenas à confirmação da gravidez, afastando, assim, qualquer limitação acerca do tipo de contrato celebrado entre empregada e empregador.

            Ademais, como o Direito do Trabalho abarca uma relevante bagagem humana, o jurista se ver obrigado a ir além dos debates e controvérsias formais e argumentos jurídicos e observar, em primeiro lugar, a vida humana. E como no âmbito trabalhista o empregado encontra-se sempre do lado mais fraco da balança, as normas tendem a ser mais favoráveis à parte obreira.

            Desta forma, a alteração realizada na Súmula em questão conferiu à norma constitucional uma maior efetividade a respeito da estabilidade provisória garantida à gestante no período de cinco meses após o parto.

            Percebe-se, assim, que o artigo 10º, II, “b”,do Ato das Disposições Constitucionais Transitóriase a Súmula nº. 244 do Tribunal Superior do Trabalho são consideradas normas de garantia de caráter social adaptadas à necessidade e à realidade social, uma vez que a todas as trabalhadoras gestantes assegura-se o direito à maternidade[125].

            Diante de toda evolução normativa no que diz respeito à proteção da mulher no Direito do Trabalho e até de uma evidente discriminação em relação à legislação aplicada a ela, que justifica-se pelo fato de ser o único ser capaz de gerar uma vida, nota-se que o direito trabalhista, apesar de já integrar ao texto normativo o direito da mulher à estabilidade provisória em seja qual for a natureza do contrato de trabalho, se vê deparado com a problemática da aplicação dessa garantia de emprego no curso do aviso prévio.

            Observa-se, portanto, a importância da análise do tema, uma vez que, de um lado, encontra-se o empregador, que já havia dispensado a empregada que se encontra no curso do aviso prévio, e, do outro, a empregada, que engravidou no período de aviso prévio e agora encontra-se diante de uma situação delicada, na medida em que além de sua própria sobrevivência, torna-se responsável por uma vida humana que estar por vir.

3: ESTABILIDADE PROVISÓRIA DA GESTANTE NO CURSO DO AVISO PRÉVIO

 

3.1       AVISO PRÉVIO

            A Convenção nº. 158 de 1982 da Organização Internacional do Trabalho, em seu artigo 11, prevê o direito do trabalhador a um prazo razoável de aviso prévio, ou uma indenização, salvo se culpado por uma falta grave de tal natureza que não seria sensato pedir ao empregador a continuação de seu serviço durante o prazo do pré-aviso[126].

            O aviso prévio é um direito do trabalhador previsto na Constituição Federal de 1988, precisamente no artigo 7º, XXI, que garante o pré-aviso proporcional ao tempo de serviço, de, no mínimo, trinta dias.

            Segundo Amauri Mascaro do Nascimento, o aviso prévio é a comunicação da rescisão do contrato de trabalho pela parte que lhe pretende pôr fim, com a antecedência a que estiver obrigada, devendo manter o contrato após essa comunicação até o fim do prazo que ela prevê, sob pena de pagar uma quantia substitutiva, no caso de ruptura do contrato{C}[127]{C}.

            Assim, esse instituto consiste no ato de informar uma parte da relação de emprego à outra o desejo de romper o contrato de trabalho. Também consiste no prazo observado pelas partes, entre a comunicação e a extinção da relação empregatícia propriamente dita. Por fim, ainda, consiste na indenização paga pelo descumprimento desse prazo[128].

            Desta maneira, como afirma Maurício Godinho Delgado, observa-se que a natureza jurídica do aviso prévio é tridimensional, na medida em que cumpre as funções de comunicação, quando da expressão de vontade de rescindir o contrato; de tempo, posto o prazo para que haja a extinção da relação empregatícia; e de pagamento, mediante a prestação do serviço e respectivo salário ou através de indenização{C}[129].

            Em relação a como deve ser concedido o instituto do aviso prévio, não há exigência de formalidade para isso. A comunicação poderá ser exteriorizada tanto de maneira escrita quanto de forma verbal.

            Segundo a Súmula nº. 276 do Tribunal Superior do Trabalho, o instituto do aviso prévio é considerado um direito irrenunciável do trabalhador. Seu pedido de dispensa de cumprimento não exclui a responsabilidade do empregador pelo pagamento da respectiva quantia, salvo se comprovado que o prestador de serviços obteve novo emprego.

            Baseia-se o pré-aviso no princípio de reciprocidade entre empregado e empregador. Desta forma, tanto o trabalhador que faz o pedido de demissão quanto o empregador que dispensa o obreiro devem agir de forma a ofertar o pré-aviso à outra parte[130].

            Com efeito, quando não ofertado o aviso prévio pelo empregador, gera-se o direito do trabalhador aos salários referentes ao prazo do aviso, garantindo, ainda, a integração desse período no seu tempo de serviço. Do contrário, quando inexiste pré-aviso por parte do obreiro, surge o direito do empregador ao desconto do salário referente ao prazo do respectivo instituto.

            Conforme previsto no artigo 487 da consolidação trabalhista, não havendo prazo estipulado, a parte que deseja romper o contrato de emprego sem justo motivo deve informar à outra parte sua decisão com um tempo mínimo de antecedência.

            Logo, da análise desse dispositivo, percebe-se que o pré-aviso é cabível nos contratos por prazo indeterminado – quando sem justa causa – e, em conformidade com a Constituição Federal, sua comunicação deve ser realizada com o período mínimo de trinta dias. Quando da dispensa por justa causa, isto é, nos casos de falta grave e força maior, o contrato empregatício extingue-se de forma imediata, inexistindo a figura do aviso prévio.

            Nos contratos por prazo determinado, quando houver dispensa antecipada, o aviso prévio não será cabível, mas sim as indenizações previstas no texto legal. Sendo assim, conforme os artigos 479 e 480 da Consolidação das Leis de Trabalho, as partes do contrato de trabalho a termo que, sem justa causa, dispensar à outra, ou desligar-se do contrato, deverá pagar indenização.

            Entretanto, segundo o artigo 481 do mencionado texto normativo, caso presente, no contrato de trabalho por prazo determinado, a cláusula assecuratória do direito recíproco de antecipação do término contratual, aplicam-se as regras referentes à rescisão antecipada do contrato por prazo indeterminado, quando tal cláusula for acionada{C}[131].

            Nesse sentindo, a Súmula nº. 163 do Tribunal Superior do Trabalho entende que, em concordância com o dispositivo supra mencionado, nas rescisões antecipadas dos contratos de experiência, espécie de contrato por prazo determinado, cabe o instituto do aviso prévio.

            O aviso prévio, ainda, é cabível no caso de extinção da empresa, com pagamento de indenização, simples ou em dobro, consoante prevê a Súmula nº. 44 do mesmo Tribunal, uma vez que a cessação das atividades da empresa pode ser considerada uma rescisão do contrato empregatício sem justa causa.

            Ademais, em relação à falência da empresa, ainda assim é devido aviso prévio ao obreiro, uma vez que esse não pode encontrar-se prejudicado devido ao risco pelo qual o empregador estaria submetido. Logo, os riscos da atividade econômica pertencem exclusivamente ao empregador, que, independentemente de lucro ou prejuízo, deve pagar as parcelas salariais de direito do trabalhador.

            Em relação à dispensa indireta, que é aquela caracterizada pela extinção do contrato de trabalho por culpa do empregador, a Súmula nº. 31 do Tribunal Superior do Trabalho entendia não ser devido aviso prévio nesse caso. Contudo, a Lei nº. 7.108 de 5 de julho de 1983 acrescentou o parágrafo 4º ao artigo 487 da consolidação trabalhista, que passou a prevê o direito do obreiro ao pré-aviso em decorrência de dispensa indireta, acarretando o cancelamento da referida Súmula.

            No caso de culpa recíproca, como ambas as partes do contrato empregatício deram causa a extinção contratual, o Tribunal Superior do Trabalho entendeu, de acordo com a Súmula nº. 14, que o empregado tem direito a cinquenta por cento do aviso prévio[132].

            Ressalta-se que o tempo relativo ao aviso prévio, seja ele trabalhado ou indenizado, integrará o contrato empregatício para todos os fins. Em sendo assim, o pacto de labor somente será considerado extinto quando do término do prazo do pré-aviso. Desta maneira, o entendimento sumulado do enunciado 82 da Sessão de Dissídios Individuais I do Tribunal Superior do Trabalho é de que a data de saída do trabalhador do emprego a ser registrada em sua Carteira de Trabalho e Previdência Social será a do término do prazo do referido aviso prévio, mesmo que indenizado.

            Quando ofertado pelo empregador, a legislação trabalhista prevê o direito do obreiro à redução de jornada no decorrer do período do pré-aviso, objetivando a busca do trabalhador por um novo emprego. Logo, deverá haver redução de duas horas diárias da jornada laboral, independentemente do tipo de jornada a qual o empregado encontra-se sujeito, ou, caso não haja essa redução, deverá haver folga de sete dias consecutivos para determinado fim{C}[133]. Contudo, se não fornecido esse direito, considera-se a não oferta de aviso prévio, pelo que acarretará na concessão ou pagamento de maneira indenizada de outro pré-aviso. Ainda sobre o tema, confirmando o direito do obreiro à redução de jornada, a Súmula nº. 230 do mesmo Tribunal veda a substituição do período reduzido da jornada pelo pagamento de horas extras correspondentes, sob pena de pagar valor correspondente ao pré-aviso de caráter meramente indenizatório[134].

            A Consolidação das Leis do Trabalho prevê dois tipos de aviso prévio, quais sejam: o trabalhado, que como o nome já menciona, é aquele que o trabalhador presta seus serviços, sendo respeitado seu direito de redução de jornada; e o indenizado, consistente naquele não laborado pelo obreiro, em função da faculdade do empregador de suprimir de maneira imediata os serviços do trabalhador, pagando uma respectiva indenização referente ao período do pré-aviso{C}[135].

            Diante de todo exposto, observa-se que o aviso prévio é um instituto de caráter de reciprocidade, integrador do contrato empregatício, de natureza tridimensional, cabível nos contratos por prazo indeterminado, nos casos de dispensa do obreiro sem justa causa ou de dispensa do empregado em face de extinção das atividades da empresa, bem como no caso do pedido de demissão do trabalhador, da dispensa indireta, e, por fim, nos contratos por prazo determinado, apenas no caso de existência de cláusula assecuratória do direito recíproco de rescisão antecipada do pacto laboral.

3.2       ESTABILIDADE DA EMPREGADA QUE ENGRAVIDA NO CURSO DO AVISO PRÉVIO

            Durante toda a trajetória dos direitos assegurados à trabalhadora mulher, percebe-se uma incontestável proteção especial àquela que se encontra em período gestacional. Diante de toda evolução jurídica ora analisada, evidencia-se, assim, um tratamento singular no que diz respeito aos direitos da trabalhadora gestante.

            À empregada grávida foram garantidos os direitos à licença maternidade, assim como à estabilidade provisória, com o objetivo de não apenas assegurar à trabalhadora sua recuperação e bem estar, mas, acima de tudo, proteger a vida que foi gerada por ela.

            Logo, foi esse entendimento que levou o Tribunal Superior do Trabalho a modificar a Súmula nº. 244, no sentido de reconhecer a responsabilidade objetiva do empregador, assim como o direito à estabilidade da gestante no contrato de prazo determinado.

            Ocorre que, apesar dessa evolução, a matéria estabilidade provisória da trabalhadora grávida, ainda permaneceu discutida nas diversas instâncias da Justiça Trabalhista, uma vez que, apesar desse caminho de progresso, a gravidez no curso do pré-aviso não era questão pacificada.

            Cumpre ressaltar que, como analisado, o aviso prévio, conforme prevê o artigo 487, §1º da consolidação trabalhista, integra o tempo de serviço do empregado para todos os fins. No mesmo sentido, a Orientação Jurisprudencial 82 da Seção de Dissídios Individuais I do Tribunal Superior do Trabalho, entende que a data de saída a ser anotada na carteira de trabalho do trabalhador deve ser aquela correspondente à do término do prazo do pré-aviso, ainda que seja ele indenizado.

            Apesar de não haver controvérsias a respeito da integração do tempo do aviso prévio no contrato de trabalho, ao examinar a questão da estabilidade da gestante no curso desse mesmo pré-aviso integrado ao tempo de serviço, percebe-se uma grande divergência a respeito do tema.

            Parte da doutrina entendia que, sendo comprovada pela empregada sua gestação durante o contrato de trabalhado ou aviso prévio, trabalhado ou indenizado, teria ela direito à estabilidade provisória. Ainda, sendo a ocorrência da gestação no período de pré-aviso, sem a comprovação da trabalhadora perante o empregador, não haveria o direito daquela à estabilidade, visto o desconhecimento do empregador acerca do estado gravídico da trabalhadora quando de sua dispensa[136].

            Já outra parte da doutrina entendia que, mesmo que confirmada a gravidez no curso do aviso prévio, negado seria o direito à estabilidade, uma vez que o pré-aviso teria a função de estabelecer o termo certo ao contrato ora indeterminado.

            Contudo, esses entendimentos doutrinários já foram superados, na medida em que a responsabilidade do empregador é objetiva, sem a necessidade comprovação do estado gravídico da trabalhadora para que tenha o direito à garantia de emprego, e, assim como no contrato por prazo indeterminado, a trabalhadora gestante também tem direito à estabilidade na hipótese de contrato por tempo determinado.

            Entretanto, apesar de a Súmula nº. 244 ter superado os entendimentos passados, o tema ainda merece importante atenção, tendo em vista o uso tanto da Súmula nº. 371 do Tribunal Superior do Trabalho quanto do artigo 10º, II, “b”,do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias como fundamentos para as decisões dos tribunais trabalhistas.

            Diante disso, percebe-se que essa matéria sempre foi motivo de divergências jurisprudenciais nas instâncias trabalhistas, uma vez que de um lado estaria o entendimento da não garantia da estabilidade provisória quando a trabalhadora engravida no curso do aviso prévio, caso, por exemplo, da aplicação análoga da Súmula nº. 371 do mencionado Tribunal, e, de outro, o entendimento do direito a essa estabilidade, haja vista a aplicação do artigo 10º, II, “b”,do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

            Logo, a problemática acerca da gestação da empregada no curso do aviso prévio passa a ser matéria de grande relevância para o Direito do Trabalho, na medida em que, como já discutido, a vida da empregada e do recém-nascido tem proteção especial no âmbito trabalhista, uma vez que o direito à vida é o bem mais protegido e relevante de todo o ordenamento jurídico.

           

3.2.1    Posicionamento contrário à estabilidade provisória da gestante: ofensa à Constituição Federal

            Apesar de incontroverso o fato de o aviso prévio integrar o contrato de trabalho por prazo indeterminado, e do direito da trabalhadora gestante à estabilidade provisória ser irrenunciável, o Tribunal Superior do Trabalho vinha entendendo pelo não reconhecimento desse direito da gestante quando o início de sua gestação ocorresse no curso do pré-aviso.

            Como fundamento para essas decisões, vinha-se utilizando, de maneira análoga, sua Súmula nº. 371, no sentido de que as garantias de emprego não poderiam ser adquiridas no curso do aviso prévio indenizado:

SÚMULA 371. AVISO PRÉVIO INDENIZADO. EFEITOS. SUPERVENIÊNCIA DE AUXÍLIO-DOENÇA NO CURSO DESTE (conversão das Orientações Jurisprudenciais nºs 40 e 135 da SBDI-1) - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005

A projeção do contrato de trabalho para o futuro, pela concessão do aviso prévio indenizado, tem efeitos limitados às vantagens econômicas obtidas no período de pré-aviso, ou seja, salários, reflexos e verbas rescisórias. No caso de concessão de auxílio-doença no curso do aviso prévio, todavia, só se concretizam os efeitos da dispensa depois de expirado o benefício previdenciário. (ex-OJsnºs 40 e 135 da SBDI-1 – inseridas, respectivamente, em 28.11.1995 e 27.11.1998)[137].

            Percebe-se que o dispositivo ora analisado prevê a limitação às vantagens econômicas quando da concessão do aviso prévio indenizado, afastando, assim, o direito à garantia de emprego no curso do pré-aviso.

            Desta forma, o mencionado Tribunal possuía o entendimento de que a trabalhadora gestante não tinha direito à estabilidade quando no curso do aviso prévio indenizado, uma vez que, além da aplicação da Súmula supracitada, no que diz respeito à limitação da projeção do pré-aviso às vantagens econômicas obtidas nesse período, a concessão dessa estabilidade acarretaria numa frustração ao direito potestativo do empregador, que já dispensara a empregada quando não encontrava-se gestante, conforme o entendimento exposto do julgado abaixo:

GESTANTE GRAVIDEZ NO CURSO DO AVISO-PRÉVIO NÃO GERAÇÃO DE ESTABILIDADE SÚMULA 371 DO TST. A questão da aquisição de estabilidade no curso do prazo correspondente ao aviso prévio já se encontra pacificada nesta Corte, através da Súmula 371, segundo a qual a projeção do contrato de trabalho para o futuro, pela concessão do aviso prévio indenizado, tem efeitos limitados às vantagens econômicas obtidas no período de pré-aviso, ou seja, salários, reflexos e verbas rescisórias. Assim, o fato da Reclamante ter engravidado no curso do aviso prévio não faz nascer a estabilidade própria da gestante, pois do contrário a concepção poderia se converter em meio de frustrar o exercício do direito potestativo do empregador, de resilição do contrato de trabalho, vindo a pagar por período sequer trabalhado, em caso de constatação tardia da gravidez. Recurso de revista provido[138].

            Compartilhando do mesmo sentido, manifestou-se novamente[139], em outra oportunidade, o mesmo Tribunal acerca do tema:

ESTABILIDADE PROVISÓRIA DA GESTANTE - AQUISIÇÃO NO AVISO PRÉVIO. Não usufrui a empregada da estabilidade provisória de gestante, prevista na Carta Magna, se a concepção da gravidez se deu no período correspondente ao aviso prévio indenizado. Por analogia, aplica-se à Súmula nº 371 do c. TST que dispõe no sentido de que a projeção do contrato de trabalho para o futuro, pela concessão do aviso prévio indenizado, tem efeitos limitados às vantagens econômicas obtidas no período de pré-aviso, ou seja, salários, reflexos e verbas rescisórias. (...) (ex-Orientação Jurisprudencial nº 40 da C. SDI do TST). In casu, restou incontroverso que a concepção ocorreu no período correspondente ao aviso prévio indenizado. Recurso de revista não conhecido[140].

            O Tribunal Superior do Trabalho, ao analisar, por sua vez, o aviso prévio trabalhado, passara a obter como entendimento o direito à estabilidade da gestante, afastando a aplicação da Súmula nº. 371, por essa apenas abarcar o pré-aviso indenizado, conforme o aresto a seguir:

ESTABILIDADE GESTANTE CONCEPÇÃO NO CURSO DO AVISO PRÉVIO TRABALHADO. Não tem aplicação ao caso concreto a Súmula nº 371/TST (conversão da OJ nº 40 da SDI-I, DJ-20/04/2005), pois se refere aos efeitos do aviso prévio indenizado. O item(Dir.) Cada parte ou subdivisão de um Contrato, ou de uma norma legal / parte ou divisão de um texto / (Ingl.) Item  I da nova redação da Súmula nº 244/TST (DJ-20.05.2005), ao consagrar a responsabilidade objetiva do empregador, considerando irrelevante seu desconhecimento a respeito do estado de gravidez, parte(Dir. Processual) Aquele que, em Juízo, demanda alguma obrigação de dar, não dar, fazer ou não fazer - ou que é demandado, ou é chamado a participar do Processo, por Outrem com algum desses objetivos / porção de um todo / (tomar parte) participar / (Gram.) da parte de, por parte de = por iniciativa de, a mando de, recomendado por  da premissa de que o importante é que a concepção, fato gerador do direito à estabilidade, haja ocorrido na vigência do contratoAcordo de vontades, ajuste entre duas ou mais pessoas, sobre objeto lícito e possível, pelo qual se adquirem, se criam, se modificam, se conservam ou se extinguem direitos. O Contrato tem elementos essenciais: aqueles sem os quais não terá validade (como a capacidade do Contratante, a coisa contratada, o preço, o consentimento); elementos naturais: os que estão implícitos no ato; e elementos acidentais: as cláusulas acessórias expressamente mencionadas.  de trabalho. O aviso prévio trabalhado integra o contratoAcordo de vontades, ajuste entre duas ou mais pessoas, sobre objeto lícito e possível, pelo qual se adquirem, se criam, se modificam, se conservam ou se extinguem direitos. O Contrato tem elementos essenciais: aqueles sem os quais não terá validade (como a capacidade do Contratante, a coisa contratada, o preço, o consentimento); elementos naturais: os que estão implícitos no ato; e elementos acidentais: as cláusulas acessórias expressamente mencionadas.  e, ao contrário da hipótese de aviso prévio indenizado, não tem efeitos apenas financeiros. Logo, deve ser reconhecido o direito à estabilidade gestante quando a concepção haja ocorrido no curso do aviso prévio trabalhado. Precedente da Terceira Turma RR- 449600/1998, DJ-10/08/2001. Recurso Instrumento pelo qual uma das Partes, vencida numa decisão judicial, procura obter da instância superior um outro pronunciamento, para anulá-la ou reformá-la, total ou parcialmente / Recurso Especial: Recurso ao Superior Tribunal de Justiça contra Decisão judicial que, no entender dos Interessados, contenha afronta à legislação infra-constitucional / Recurso Extraordinário: Recurso ao Supremo Tribunal Federal contra Decisão judicial que, no entender dos Interessados, contenha afronta à Constituição  de Revista conhecido e não provido{C}[141].

            Ocorre que o instituto do aviso prévio indenizado não é particular, nem gera efeitos distintos ao pré-aviso trabalhado, recebendo essa nomenclatura somente pelo fato de o empregador dispensar os serviços da obreira durante esse período. Sendo assim, não faz sentido e é, portanto, inaceitável, que haja consequências distintas para o pré-aviso trabalhado e o indenizado.

            Além do entendimento equivocado em relação à distinção das consequências jurídicas do aviso prévio trabalhado e do indenizado, evidencia-se um entendimento errôneo ao colocar o direito potestativo do empregador de dispensar a empregada numa posição acima do direito à proteção da mulher e do ser sob gestação, confrontando, assim, normas constitucionais que estabelecem, além do direito à proteção à mulher e ao nascituro referente à estabilidade provisória, exposto do artigo 10º, II, “b”do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias,os direitos de proteção à maternidade e à infância, previstos no artigo 6ºda Constituição Federal de 1988 e, sobretudo, a dignidade da pessoa humana.

3.2.2    Posicionamento favorável à estabilidade provisória: a aplicação da norma constitucional

            Os posicionamentos jurisprudenciais dos Tribunais do Trabalho, principalmente do Tribunal Superior do Trabalho, são de incontestável importância para a evolução das normas trabalhistas. Não obstante a justiça trabalhista, por muito tempo, ter entendido pelo não direito da trabalhadora que engravida no curso do pré-aviso à estabilidade provisória, esse entendimento passou a ser modificado com o passar dos anos.

            Um dos pontos cruciais para essa mudança foi a alteração da Súmula nº. 244 do Tribunal Superior do Trabalho, que passou a estar em conformidade com a Constituição Federal, na medida em que a responsabilidade do empregador passou a ser objetiva, sem a necessidade de comprovação da gravidez pela empregada perante o empregador para obtivesse o direito a estabilidade provisória, e esta estabilidade passou a ser concedida no caso de gravidez durante contrato de trabalho por prazo determinado.

            Além disso, o posicionamento da Constituição Federal acima de todas as outras leis foi, também, fator crucial para o afastamento da Súmula nº. 371 do mencionado Tribunal e para a aplicação apropriada do artigo 10º, II, “b”,do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, uma vez que, além da Constituição Federal garantir os direitos de proteção à mulher, à infância e à maternidade, garante, de maneira expressa, mediante este dispositivo, a estabilidade provisória da gestante.

            Cumpre ressaltar que essa norma constitucional, ao garantir a estabilidade provisória da empregada gestante, não especifica em que situações essa estabilidade é garantida. Logo, entende-se que, qualquer que seja a modalidade de contrato de trabalhado, é garantida a estabilidade provisória, uma vez que o direito à proteção da mulher e à vida do nascituro encontra-se acima do direito do empregador de dispensar a obreira, afirmando, desta forma, o bem mais relevante e importante do ordenamento jurídico, qual seja, a vida.

            Nesse sentido, os Tribunais Regionais do Trabalho passaram a julgar a favor do direito à estabilidade da trabalhadora gestante no curso do aviso prévio, com justificava de ser direito constitucionalmente previsto, através da aplicação do artigo 10º, II, “b”,do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, juntamente com aplicação do artigo 487, § 1º da Consolidação das Leis do Trabalho e da Orientação Jurisprudencial 82 da Seção de Dissídios Individuais I do Tribunal Superior do Trabalho, que prevê a integração do pré-aviso no contrato de trabalho.

            Nesse sentido, decidiu o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região:

GESTANTE – AVISO PRÉVIO – ESTABILIDADE - O direito a estabilidade decorre do fato objetivo - a gravidez - independentemente do fato subjetivo do conhecimento do empregador ou da trabalhadora ao tempo da despedida. É que a expressão"desde a confirmação da gravidez", contida no art. 10,II, b, do ADCT da CF-88, quer significar que a estabilidade inicia-se com a concepção, porquanto o objetivo constitucional é a proteção do feto que não poderia ser relegada ao fato da comunicação do estado gravídico, muitas vezes desconhecido pela própria empregada por inúmeros motivos.E, nos termos do parágrafo 1º, do artigo 487 da CLT,o aviso prévio ainda que indenizado, integra o tempo de serviço para todos os efeitos legais o que, portanto, não serve de obstáculo à aquisição do direito à estabilidade provisória em discussão. Nesse sentido, a exegese do referido preceito legal, a jurisprudência do TST firmou entendimento no sentido - O.J. 82 da SBDI-1 - de que "A data de saída a ser anotada na CTPS deve corresponder à do término do prazo do aviso prévio, ainda que indenizado". A guisa do exposto, como a pretensão do legislador foi à proteção do feto (fato social maior) que em última análise serve de freio ao poder potestativo do empregador de dispensar a empregada e, considerando-se, ainda, que a reclamante ficou grávida no curso do aviso prévio trabalhado que faz parte do contrato de trabalho, tem ela direito à pretendida estabilidade. Finda a estabilidade, converte-se o direito à reintegração em indenização com fundamento na Súmula 244, II, TST, sendo devidos os salários e demais verbas pleiteadas, desde a dispensa até o 5º mês após o parto[142].

            Como se pode ver, o mencionado Tribunal entendeu que, em conformidade com o exposto até o presente momento, a estabilidade da obreira decorre de fato objetivo, independentemente do conhecimento do empregador da situação da gravidez no tempo da demissão, conforme a dicção do artigo 10º, II, “b” do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias e do artigo 487 da consolidação trabalhista.

            O mesmo entendimento foi manifestado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região, conforme o julgado a seguir:

GESTANTE. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. A estabilidade provisória garante o emprego por período pré- determinado. No caso da gestante, a previsão constitucional inserta no art. 10, II, b, do ADCT, prevê a garantia do emprego para a gestante desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto. O objetivo do legislador, de forma direta, foi proteger o nascituro, garantindo a estabilidade emocional e financeira da mãe. A tal modo, ainda que a gravidez ocorra dentro do período do aviso prévio (mesmo indenizado), deve ser reconhecida a estabilidade da empregada[143].

            Percebe-se, do exposto, uma mudança nos julgados de alguns Tribunais Regionais do Trabalho no que diz respeito à concessão do direito à estabilidade provisória no emprego à empregada que engravida no curso do aviso prévio.

            Ressalta-se que a problemática maior em relação ao tema não era referente ao pré-aviso trabalhado, como já demonstrado no julgado do Tribunal Superior do Trabalho referente ao Recurso de Revista nº. 00679/2001-131-17-00.0, mas em relação ao pré-aviso indenizado.

            Contudo, como exposto nas jurisprudências citadas, não há que diferenciar o aviso prévio trabalhado do indenizado, já que a única distinção é a não prestação do serviço do obreiro durante o período do pré-aviso por faculdade do empregador.

            Apesar dos entendimentos favoráveis a essa estabilidade na segunda instância da justiça trabalhista, a 3ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho se manifestou positivamente a respeito da estabilidade no aviso prévio indenizado em fevereiro do ano de 2013, ao julgar o Recurso de Revista nº. 490-77.2010.5.02.0038, decisão essa que repercutiu em todo ordenamento jurídico brasileiro.

3.2.2.1 Atual entendimento do Tribunal Superior do Trabalho: comentários ao Recurso de Revista nº.490-77.2010.5.02.0038

            No dia 6 de fevereiro de 2013, a 3ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho analisou e decidiu o mérito Recurso de Revista nº. 490-77.2010.5.02.0038, com sua publicação no dia 15 de fevereiro de 2013. Entendeu a terceira instância trabalhista que uma empregada que engravida no curso do aviso prévio indenizado tem direito à estabilidade provisória até cinco meses após o parto:

RECURSO DE REVISTA. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. GESTANTE. CONCEPÇÃO NO CURSO DO AVISO PRÉVIO INDENIZADO. DIREITO À ESTABILIDADE. ART. 10º, II, “b”, DO ADCT. A empregada gestante possui direito à estabilidade provisória, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto (art. 10º, II, “b”, do ADCT). O dispositivo constitucional tem por finalidade tanto a proteção da gestante contra a dispensa arbitrária quanto relativamente aos direitos do nascituro. Portanto, a rescisão do contrato de trabalho da obreira gestante, durante o período de gestação, ainda que desconhecida a gravidez pelo empregador ou até mesmo pela empregada, quando do ato da dispensa, não afasta o direito ao pagamento da indenização decorrente da estabilidade não usufruída, conforme entendimento das Súmulas 244, I e 396, I, do TST. Recurso de revista conhecido e provido[144]{C}.

            A empregada com função de enfermeira em hospital recorreu à Justiça do Trabalho com pedido de reintegração após dispensa do emprego. O que não foi deferido pelo Juízo de origem, nem pela segunda instância, pelo fundamento de que a concepção da gravidez ocorreu após rescisão contratual, no curso do pré-aviso indenizado, com invocação da Súmula nº. 371 do Tribunal Superior do Trabalho.

            Inconformada, a reclamante recorreu à última instância sustentando que não significava o fim da relação de emprego, mas uma “manifestação formal de uma vontade que se pretendo concretizar adiante, razão por que o contrato de trabalho continua a emanar seus efeitos legais”. Argumentou, ainda, a contrariedade da decisão à Súmula nº. 244, I, do Tribunal Superior do Trabalho; ao artigo 10º, II, “b”,do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias; e, ao artigo 7º, I e XVIII, da Constituição Federal.

            O relator Ministro Maurício Godinho Delgado, entendeu pela devida aplicação do artigo 10º, II, “b”do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, tendo em vista sua finalidade de proteção à gestante e aos direitos do recém-nascido. Invocou, também, a Orientação Jurisprudencial 82, na medida em que a gravidez foi gerada no curso do aviso prévio indenizado, entendendo pela projeção do pré-aviso, mesmo indenizado.

            Ainda, mencionou a Súmula nº. 244, I, supramencionada, ao entender que mesmo desconhecida a gravidez quando da rescisão contratual, garantida é a estabilidade, visto a responsabilidade objetiva do empregador.

            Nesse sentido, o Ministro relator, ainda, colacionou precedentes das 1ª e 6ª Turmas do Tribunal Superior do Trabalho:

GARANTIA DE EMPREGO À GESTANTE. PROJEÇÃO DO AVISO-PRÉVIO INDENIZADO. SÚMULA Nº 371, PRIMEIRA PARTE, DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. 1. O direito de a empregada gestante manter-se no emprego, sem prejuízo dos salários, com consequente restrição ao direito de resilição unilateral do contrato sem justa causa pelo empregador, sob pena de sujeitar-se às reparações legais, nasce com a concepção e projeta-se até cinco meses após o parto. Trata-se de garantia constitucional, prevista no artigo 10, II, b, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, cujo escopo é não somente proteger a gestante, mas assegurar o bem-estar do nascituro, erigindo-se em genuíno direito fundamental. O interesse em assegurar a vida desde seu estágio inicial é da sociedade, cumprindo ao Estado outorgar ao nascituro proteção ampla e eficaz. A condição para a empregada auferir a garantia erigida no texto constitucional é que a concepção ocorra no curso do contrato de trabalho. 2. Consoante entendimento consagrado na Orientação Jurisprudencial nº 82 da SBDI-I desta Corte superior, ‘a data de saída a ser anotada na CTPS deve corresponder à do término do prazo do aviso-prévio, ainda que indenizado’. Tal entendimento decorre da melhor exegese do disposto no artigo 487 da Consolidação das Leis do Trabalho, extraindo-se do referido texto legal que, durante o período do aviso-prévio, ainda que indenizado, o contrato de emprego encontra-se vigente. 3. Uma vez confirmado que a concepção ocorreu na vigência do contrato de trabalho, e considerando a projeção do aviso-prévio indenizado, como no presente caso, tem jus a empregada à garantia provisória de emprego prevista no texto constitucional. 4. Afigura-se inviável, de outro lado, a aplicação, no presente caso, do entendimento consagrado na Súmula n.º 371 do Tribunal Superior do Trabalho, uma vez que, como já destacado pela Ex.ma Ministra Maria de Assis Calsing, no julgamento do processo nº TST-E-RR-3656600-96.2002.5.06.0900, ‘os precedentes que originaram o referido verbete apenas analisaram a projeção do aviso-prévio sob o enfoque da garantia de emprego do dirigente sindical, do alcance dos benefícios instituídos por negociação coletiva ou da aplicação retroativa de normas coletivas e não da estabilidade gestante’. Precedentes da SBDI-I. 5. Recurso de revista conhecido e provido{C}[145].

            Como mencionado pelo aresto supracitado, o direito de a empregada em gestação permanecer no emprego, impossibilitada sua dispensa arbitrária, surge da concepção da criança até cinco meses após o parto, devendo a data de saída a ser anotada na carteira de trabalho corresponder à do término do prazo do aviso-prévio, ainda que este seja indenizado. Entendimento semelhante foi respaldado, igualmente, na decisão que se segue:

RECURSO DE REVISTA. ESTABILIDADE GESTANTE. CONCEPÇÃO NO CURSO DO AVISO-PRÉVIO INDENIZADO. Nos termos do art. 10, II, ‘b’, do ADCT, para a garantia de estabilidade provisória da empregada é exigido somente que ela esteja grávida e que a dispensa não tenha ocorrido por justo motivo. O atual posicionamento desta Corte é no sentido de se conferir a garantia de estabilidade provisória à trabalhadora a partir do momento da concepção, ocorrida no curso do contrato de trabalho, ainda que durante o aviso-prévio trabalhado ou indenizado. Essa garantia não visa apenas à proteção objetiva da gestante, mas, sobretudo, à tutela do nascituro. Ademais, consoante preconiza a Orientação Jurisprudencial 82 da SBDI-1 do TST, não há dúvida de que o período relativo ao aviso-prévio integra o contrato de trabalho. A diretriz da Súmula 371 do TST não constitui fundamento pertinente para obstar essa garantia. Há precedentes. Recurso de revista conhecido e provido”[146].

                        Por fim, apesar de o julgado entender pelo direito da trabalhadora à estabilidade provisória, negou sua reintegração ao emprego, uma vez que o período dessa garantia, de cinco meses após o parto, havia terminado. Sendo assim, foi aplicada a Súmula nº. 396, I do Tribunal Superior do Trabalho, a fim de garantir à empregada o pagamento dos salários do período compreendido da data da dispensa da obreira e o término do período de estabilidade.

            Sendo assim, essa mudança no âmbito da jurisprudência trabalhista marcou mais uma etapa evolutiva no que diz respeito à proteção ao trabalhador, parte mais frágil da relação de emprego, especialmente à mulher, que, por ser capaz de carregar em seu ventre uma nova vida, necessita de uma segurança maior e, por isso, um tratamento específico, sem esquecer, ainda, do nascituro, sujeito de direito, também protegido pelo direito do trabalho.

3.2.3    Lei nº. 12.812 de 16 de maio de 2013: alteração na Consolidação das Leis do Trabalho

            Em 15 de abril de 2010 foi apresentado à Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 7158/2010 do Senado Federal, de autoria pertencente ao Senador Marcelo Crivella, do Rio de Janeiro.

            O conteúdo desse projeto consistira em um acréscimo do artigo 391-A da Consolidação das Leis do Trabalho, dispondo acerca da garantia à estabilidade provisória da gestante prevista no artigo 10º, II, “b”,do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, no curso do aviso prévio.

            Esse projeto de lei foi passado para três comissões da Câmara dos Deputados para ser visto e analisado, quais sejam: a Comissão de Trabalho, de Administração e de Serviço Público; a Comissão de Seguridade Social e Família; e a Comissão de Constituição de Constituição e Justiça e de Cidadania.

            No dia 17 de agosto de 2011, o Projeto de Lei nº 7158/2010 foi aprovado, de maneira unânime pela Comissão de Seguridade Social e Família, tendo como relatora a Deputada Sueli Vidigal.

            Em 7 de dezembro do ano de 2011, por unanimidade, o projeto de lei teve a aprovação da Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público, de relatoria do Deputado Leonardo Quintão.

            Por fim, apenas em 27 de março do ano de 2013, foi aprovado esse projeto, contra o voto do Deputado Onofre Souto Agostini, pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, que teve como relator o Deputado Ronaldo Fonseca[147].

            Desta maneira, após a aprovação da Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei nº 7158/2010, foi encaminhado à sanção da Presidente da República.

            Sendo assim, a Presidente da República Dilma Rousseff sancionou a Lei nº 12.812 de 16 de maio de 2013, que prevê a estabilidade provisória da trabalhadora que engravida no curso do contrato de trabalho, ainda que no período do aviso prévio, até cinco meses após o parto:

A PRESIDENTA DA REPÚBLICA.Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1o A Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943, passa a vigorar acrescida do seguinte art. 391-A:

Art. 391-A.  A confirmação do estado de gravidez advindo no curso do contrato de trabalho, ainda que durante o prazo do aviso prévio trabalhado ou indenizado, garante à empregada gestante a estabilidade provisória prevista na alínea b do inciso II do art. 10 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

Art. 2o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 16 de maio de 2013; 192o da Independência e 125o da República.

DILMA ROUSSEFF{C}[148].

            A Lei nº 12.812 foi publicada no dia 17 de maio de 2013, quando entrou em vigor, acabando com as divergências a respeito do direito da empregada gestante à estabilidade provisória, garantindo e afirmando o direito que já estava previsto na Constituição da República Federativa do Brasil.

            Portanto, diante de todo caminho percorrido pelo ordenamento jurídico brasileiro, especialmente pelo Direito do Trabalho em busca da maior proteção à mulher, visto o seu dom singular de dar a vida, evidencia-se certamente uma grande evolução normativa e uma confirmação dos direitos constitucionalmente já garantidos, uma vez que “sem a mulher não existe a maternidade; sem a maternidade não existe a vida; sem a vida, não existe a raça humana”[149].

CONCLUSÃO

            A título de encerramento, cumpre demonstrar os principais pontos discorridos ao longo do trabalho de maneira objetiva a visar uma sistematização das partes em que fora desenrolado o estudo.

            A mulher, no decorrer de todo caminho traçado pela vida humana em sociedade, por conta da cultura patriarcalista, fora objeto de discriminação e abuso pelo sexo masculino e, na esfera trabalhista, excluída do mercado de trabalho. Foi com o advento da Revolução Industrial, não obstante a exploração da mão de obra feminina, que a mulher adentrou ao mercado de trabalho.

            As primeiras normas de proteção à mulher no âmbito do Direito do Trabalho foram criadas com o surgimento da Organização Internacional do Trabalho. No Brasil, a primeira norma a ser instituída foi o Decreto nº 21.417-A, de 17 de maio de 1932, que proibia o trabalho noturno e em locais insalubres e perigosos à mulher. Na esfera constitucional, foi a Constituição de 1934 que primeiramente discorreu acerca da proteção à atividade laboral feminina, proibindo a discriminação do trabalho da mulher quanto aos salários e garantindo a proteção à maternidade. Contudo, apesar de toda evolução normativa constitucional referente às normas protestativas à mulher, foi apenas com a Constituição Federal de 1988 que houve a eliminação de qualquer prática discriminatória ao trabalho da mulher.

            A dignidade da pessoa humana surge no ordenamento jurídico brasileiro como um princípio axial de todo sistema normativo. Por serem os valores sociais do trabalho fundamento da República Federativa do Brasil, e o trabalho, direito social garantido a todos, o indivíduo alvo de discriminação que tiver seu direito ao trabalho infringido encontrará, também, sua dignidade violada.

            Não obstante a Carta Magna consagrar o princípio da igualdade como alicerce das relações humanas, no sentido de que todos são iguais perante a lei, perfaz-se necessário, a fim de obter essa igualdade, tratamento desigual aos desiguais na dimensão dessa desigualdade. Desta forma, vê-se fundamental a instituição de normas destinadas à proteção ao trabalho da mulher, principalmente à maternidade, uma vez que é a mulher o único ser humano capaz de gerar uma nova vida, razão pela qual a Consolidação das Leis do Trabalho destina, em seu texto legal, um capítulo específico à proteção da atividade laboral feminina.

            Com o advento da Constituição Federal de 1988, através do artigo 10º, II, “b”, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, foi instituído o direito a estabilidade provisória da trabalhadora gestante desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, a fim de evitar a dispensa da empregada pelo fato de encontrar-se em estado gravídico e consequente desemprego numa fase crucial da vida, não só da mãe, mas, principalmente do recém-nascido.

            Assim, observa-se que a gestação da trabalhadora determina duas situações jurídicas, quais sejam: (1) a licença maternidade, que consiste em cento e vinte dias destinados ao cuidado da criança que acabara de nascer, sem prejuízo do emprego ou salário, facultando-se a mulher o gozo precoce dessa licença a partir do vigésimo oitavo dia antes do parto; e (2) a estabilidade provisória da gestante, consistente na garantia de emprego no período da confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.

            O direito à estabilidade provisória garantida à empregada independe do conhecimento de seu estado gestacional pelo empregador, na medida em que esse é detentor de responsabilidade objetiva, sendo a base de início dessa estabilidade a confirmação da gravidez e não sua comprovação perante o empregador.

            A garantia de emprego assegura à trabalhadora gestante o direito de reintegração se a dispensa se der durante o período de estabilidade, contudo, se a dispensa arbitrária se der após o período de estabilidade, a garantia restringe-se aos salários e demais direitos referentes àquele período.

            Por muito tempo, entendia-se pela não garantia à estabilidade provisória da trabalhadora gestante quando do contrato de trabalho por prazo determinado, visto a natureza precária desse tipo de relação empregatícia. Entretanto, esse entendimento consistia numa afronta à Constituição Federal, uma vez que a Carta Magna não limitou esse direito a casos específicos. Diante disso, a fim de buscar a harmonia normativa, o Tribunal Superior do Trabalho alterou a Súmula nº 244, afastando a distinção da aplicação da garantia à estabilidade provisória aos contratos por prazo determinado e por prazo indeterminado, passando, assim, a incidir esse direito em qualquer tipo de contrato empregatício.

            Apesar de superada a questão da estabilidade provisória no contrato de trabalho por prazo determinado, entendimentos em relação à concessão dessa estabilidade no curso do aviso prévio ainda eram objetos de divergências jurisprudenciais nos tribunais trabalhistas brasileiros, uma vez que, de um lado encontravam-se decisões desfavoráveis à concessão da estabilidade, com aplicação da Súmula nº 371 do Tribunal Superior do Trabalho, e justificativa na violação do direito potestativo de dispensa do empregador, e, do outro, decisões favoráveis à concessão dessa estabilidade, com aplicação do artigo 10º, II, “b”,do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, e do artigo 487, § 6º, da Consolidação das Leis do Trabalho, que prevê a integração do período do pré-aviso no contrato de trabalho.

            Em 15 de fevereiro de 2013, o Tribunal Superior do Trabalho publicou a decisão do Recurso de Revista nº. 490-77.2010.5.02.0038, que entendeu pelo direito à estabilidade provisória da empregada gestante que teve a confirmação de sua gravidez no curso do aviso prévio, ao aplicar o artigo 10º, II, “b”do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, a Orientação Jurisprudencialnº. 82 da Seção de Dissídios Individuais I e a Súmula 244, I, ambos do Tribunal Superior do Trabalho, acabando com as discussões a respeito do tema.

            Em 16 de maio de 2013, foi sancionada pela Presidente da República, Dilma Rousseff, a Lei nº 12.812, que introduziu o artigo 391-A na Consolidação das Leis do Trabalho e que prevê o direito da trabalhadora que engravida no curso do contrato de trabalho, ainda que no período do aviso prévio trabalhado ou indenizado, à estabilidade provisória desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, em conformidade com o texto constitucional.

            Sendo assim, o recente entendimento do Tribunal Superior do Trabalho e o surgimento da Lei nº 12.812 de 16 de maio de 2013 confirmam o direito à estabilidade provisória da empregada gestante, que fora garantido desde o advento da Constituição Federal de 1988.

            A concessão da estabilidade provisória justifica-se pelo direito de proteção à maternidade, garantindo não somente o emprego e a recuperação da trabalhadora, mas, acima de tudo, a saúde, o bem estar e a vida do recém-nascido.

            Portanto, o direito à estabilidade provisória da empregada gestante no curso do aviso prévio, especificamente, confirma não apenas a integração do pré-aviso no contrato de trabalho, mas, e mais importante, o valor supremo da dignidade da pessoa humana e o bem de maior relevância do ordenamento jurídico brasileiro, qual seja, a vida.


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Sobre o autor
Mariana Braga Sobral

Advogada<br>Graduada em Direito pela Universidade Federal de Alagoas<br>Pós-graduanda em Direito do Trabalho e Previdenciário pela PUC Minas

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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