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Devem ser arbitrados honorários advocatícios no julgamento de embargos de declaração à luz do CPC/2015?

11/10/2016 às 13:57
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O CPC/2015 diz textualmente, em seu art. 85, que são devidos honorários advocatícios em razão do julgamento dos recursos. Assim, sendo os embargos de declaração recurso, são devidos honorários advocatícios pelo seu julgamento?

I - CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Os honorários advocatícios sucumbenciais integram a remuneração do advogado pelo trabalho desempenhado em favor da parte vencedora. O advogado do vencido, em regra, não receberá remuneração a esse título. O valor dos honorários é fixado com base no valor da causa ou da condenação, em percentual que deve ir, como padrão, de 10 (dez) a 20% (vinte por cento). Esse percentual é arbitrado pelo juiz, adotados os seguintes critérios legais: I - grau de zelo do profissional; II - lugar de prestação do serviço; III - natureza e na importância da causa; IV - trabalho realizado pelo advogado e no tempo exigido para o seu serviço. (CPC, art. 85, §2º)

No modelo dicotômico do processo, a atividade cognitiva era realizada em um processo exclusivo, denominado de processo de conhecimento. Finalizado o processo, diante do inadimplemento, não existindo condição ou termo a impedir a pretensão, deveria o credor ajuizar uma segunda ação, instaurando um outro processo, cuja finalidade era a satisfação da obrigação. Em tal modelo, a remuneração do advogado era por processo. Assim, faria o advogado do vencedor jus aos honorários advocatícios sucumbenciais do processo de conhecimento e do processo de execução.

No modelo dicotômico, pouco importava se o advogado tinha trabalhado apenas no 1º grau, ou se tinha sido necessária uma verdadeira batalha nos tribunais até o STF. Os honorários eram fixados na sentença, pouco importando se depois dali o labor do advogado seria curto ou longo. A sorte estava lançada!

No atual modelo do processo, há apenas um único processo que se inicia com a ação e só termina com a satisfação da obrigação reconhecida (ou pelo menos, com a tentativa do Estado em sua satisfação, nas hipóteses de execuções infrutíferas). O modelo sincrético permite concomitantemente atividades cognitivas e executivas, sem nenhum problema. Como só há um processo, seria injusto remunerar o advogado apenas uma vez, propondo, então, o legislador a remuneração por etapas, o que é melhor para o advogado.

O CPC/2015, em seu art. 85, §1º, preceitua que "São devidos honorários advocatícios na reconvenção, no cumprimento de sentença, provisório ou definitivo, na execução, resistida ou não, e nos recursos interpostos, cumulativamente."


II - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NA FASE RECURSAL

O §11 do art. 85 , CPC, disciplina que:

"O tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§2º a 6º, sendo vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º para a fase de conhecimento. "

Como visto acima, são devidos honorários advocatícios na fase recursal. Na leitura conjunta do §1º com o §11 do art. 85, conclui-se que não há fixação autônoma de honorários advocatícios na fase recursal, mas há uma majoração dos honorários já fixados, sendo vedado ultrapassar o teto de 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação ou sobre o valor da causa.

Se o advogado do recorrido mantém-se vencedor, deverá haver majoração dos honorários, salvo se  o juiz de 1º grau já fixou os honorários advocatícios no teto; por outro lado, se o advogado do recorrente vier a obter êxito em sua peça, a remuneração pelo seu trabalho constará da decisão, seja por inverter a sucumbência (devendo o percentual levar em consideração o trabalho adicional na fase recursal), seja na hipótese de sucumbência recíproca, em que é expressamente vedada a compensação.

O objetivo manifesto do texto legal é remunerar o advogado pelo seu trabalho adicional. Há um outro objetivo que se extrai: o de impedir recursos protelatórios/abusivos. O CPC adota a ideia de efetividade, de boa-fé objetiva, de duração razoável do processo, de cooperação, valores incompatíveis com a conduta do advogado que recorre apenas para prolongar a litispendência da demanda, confiante em um Judiciário moroso, impotente diante de tantos recursos que assolam os tribunais brasileiros. O advogado do que manifestamente não tem razão, sempre se utilizou do expediente recursal por vários motivos: a) o custo da interposição, geralmente, é baixo (e se for beneficiário da gratuidade da justiça, nem se fale); b) não havia majoração dos honorários sucumbenciais na fase recursal; e c) o tempo de julgamento dos recursos comumente leva anos (às vezes, décadas).

Nessa seara, a expectativa é de que a possibilidade de majoração dos honorários venha a desestimular recursos protelatórios/abusivos, contribuindo para um "desinchaço" do Judiciário.


III - SÃO CABÍVEIS HONORÁRIOS NO JULGAMENTO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO?

O art. 85, §1º, CPC, prescreve que são devidos honorários advocatícios nos recursos interpostos. Não há dúvida de que os embargos de declaração possuem natureza jurídica de recurso. Essa a posição da doutrina majoritária, bem como é a opção do legislador, tanto que no art. 994, IV, lista os embargos de declaração como recurso.

Por outro lado, o §11 do mesmo art. 85, afirma que "o tribunal, ao julgar recurso (...)". Isso quer dizer, então, que só haverá majoração dos honorários se os embargos forem interpostos em tribunal? Se forem interpostos no 1º grau não haverá a majoração?

Essa é a problemática que nos propusemos a tratar neste escrito: o cabimento de honorários advocatícios em julgamento de embargos de declaração.

Um dos fundamentos para a majoração é o trabalho adicional do advogado. Se ele trabalhou a mais, em tese, faz jus a uma remuneração maior. Se o trabalho foi pouco, que majore pouco, mas tem que majorar. Se os embargos foram da parte adversa e o advogado da parte vencedora não foi ouvido, não deve haver a condenação por este fundamento.

O outro fundamento é o de desestimular recursos protelatórios/abusivos. É possível a protelação vir através de embargos, ou não? Lógico que sim. Então, quanto a este fundamento, não se vê incompatibilidade dos embargos de declaração com a possibilidade de majoração.

Quanto à ideia de que os honorários advocatícios só devem ser majorados se os embargos forem interpostos no tribunal, é óbvio que tal ideia não se sustenta por i mesma. Qual seria o fundamento jurídico para isso? Não há, a não ser por um apego exagerado ao texto da lei. Digo ao texto, pois o sentido da norma é outro. O que fundamenta a majoração é o trabalho adicional, bem como o desestímulo ao recurso protelatório/abusivo, ambas as coisas existentes tanto nos embargos interpostos em tribunal quanto aos interpostos no 1º grau.

Então é possível a majoração em sede de embargos de declaração?

Penso que não. E o que motiva não são os fundamentos acima demonstrados, pois por eles, a meu sentir, seria possível a majoração. É que os embargos de declaração servem para aperfeiçoar/integrar a decisão judicial, pois está obscura, contraditória, omissa ou com erro material. A norma que rege a técnica da condenação em honorários é da causalidade. Quem deu causa indevidamente à demanda, responde pela despesa com a sucumbência.

Na hipótese dos embargos de declaração, quem dá causa à sua interposição é o juiz, com uma decisão com vícios por, muitas vezes, má técnica redacional. Observe-se que a correção da decisão interessa ao embargante, e pode interessar também ao embargado (ou ser indiferente para ele). Não seria lógica, nem justa, a condenação. Se os embargos forem protelatórios, há norma específica para coibir tal atitude atentatória.

O que pensam os doutrinadores?

Para Daniel Neves, ao tratar do §11 do art. 85, diz que:

"O dispositivo deve ser aplicado somente em recursos que sejam julgados por outro órgão jurisdicional, distinto daquele que proferiu a decisão impugnada. Dessa forma, não será cabível majoração de honorários em julgamento de embargos de declaração (...)". (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. Volume Único. São Paulo: Método, 2016. p. 220)

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Fredie Didier Jr. e Leonardo Carneiro da Cunha, na mesma linha, sustentam que:

"No julgamento de embargos de declaração, não há majoração de honorários advocatícios anteriormente fixados. Isso porque o §11 do art. 85 do CPC refere-se a tribunal, afastando a sucumbência recursal no âmbito da primeira instância. Assim, opostos embargos de declaração contra decisão interlocutória ou contra sentença, não há sucumbência recursal, não havendo, de igual modo e em virtude da simetria, sucumbência recursal em embargos de declaração opostos contra decisão isolada do relator ou contra acórdão." (DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 3, Salvador: Juspodivm, 2016, p. 54)

A Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (ENFAM) editou o Enunciado 16, com a seguinte redação: "Não é possível majorar os honorários na hipótese de interposição de recurso no mesmo grau de jurisdição."

Já há posição dos tribunais superiores sobre o assunto?

Esse é o problema. A 1ª Turma do STF já se posicionou e entendeu que:

"Após 18 de março de 2016, data do início da vigência do Novo Código de Processo Civil, é possível condenar a parte sucumbente em honorários advocatícios na hipótese de o recurso de embargos de declaração, interposto perante Tribunal, não atender os requisitos previstos no art. 1.022 e tampouco se enquadrar em situações excepcionais que autorizem a concessão de efeitos infringentes." (STF. 1ª Turma. RE 929925 AgR-ED/RS, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 7/6/2016, Info 829.)

Analisando o voto do Min. FUX, ele expressamente diz que o simples fato de o recurso de embargos de declaração ter sido interposto na vigência do novo CPC faz incidir a majoração dos honorários, e os fixa no teto. Ou seja, não os aplicou por uma especificidade, mas entendendo que, na vigência do novo CPC, há incidência de honorários no julgamento dos embargos de declaração.


IV - CONCLUSÃO

Como se vê, a questão está em aberto. A doutrina caminha no sentido da impossibilidade de arbitramento dos honorários advocatícios nos embargos de declaração, o que também é a posição defendida por este articulista, conforme acima exposto, mas a 1ª Turma do STF entendeu de forma diferente.

É óbvio que da decisão do STF não se extrai precedente obrigatório, pois além de não ser a posição do Tribunal (que só se revela através do pensamento convergente da maioria do colegiado. No caso, o pensamento é majoritário de uma Turma), não é matéria constitucional, o que afasta o STF de ser quem dá a última palavra sobre o assunto. Quem forma precedente obrigatório sobre matéria de lei federal é o STJ, que ainda não se posicionou sobre a questão.

Todavia, não deixa de ser uma posição importante da mais alta Corte do país. Resta-nos somente aguardar a posição definitiva do STJ.


V - BIBLIOGRAFIA

DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 3, Salvador: Juspodivm, 2016.

MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Código de Processo Civil Comentado. 2ª ed. São Paulo, RT. 2016.

MEDINA, José Miguel Garcia. Novo Código de Processo Civil Comentado. 2ª ed. São Paulo, RT. 2015.

NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. Volume Único. São Paulo: Método, 2016.

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Sobre o autor
Matusalém Dantas

Mestre em Direito pela FADIC/PE. Presidente do Instituto Potiguar de Direito Processual Civil - IPPC. Professor da Graduação e da Pós-graduação lato sensu do Centro Universitário do Rio Grande do Norte (UNI-RN), onde ministra a disciplina de Direito Processual Civil. Membro da Associação Brasileira de Direito Processual - ABDPro e membro da Associação Norte Nordeste de Professores de Processo - ANNEP. Diretor de Secretaria da 4ª Vara da Justiça Federal de Primeiro Grau no Rio Grande do Norte.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DANTAS, Matusalém. Devem ser arbitrados honorários advocatícios no julgamento de embargos de declaração à luz do CPC/2015?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4850, 11 out. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/52677. Acesso em: 18 abr. 2024.

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