Principais aspectos da audiência de custódia no processo penal brasileiro

15/10/2016 às 21:33
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Aspectos relevantes da audiência de custódia no sistema penal brasileiro, ressaltando seus benefícios e suas devidas ressalvas perante a sociedade.

Introdução

A audiência de custódia consiste num instrumento jurídico utilizado para assegurar ao indiciado que todos os seus direitos constitucionais sejam respeitados.

O CNJ, juntamente com o Ministério da Justiça e o TJ/SP lançou tal projeto em 2015, com objetivo de respeitar e acatar a pactos e tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, como o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e a Convenção Interamericana de Direitos Humanos.

Primeiramente, cabe dispor em quais circunstâncias se vale a possibilidade do averiguado ser conduzido à audiência.

Somente em casos em que houver prisão em flagrante delito deve o infrator, num prazo máximo de 24 horas, ser levado até um juiz de Direito, que avaliará qual ação cabível ao caso concreto.

Pode o Juiz decretar relaxamento da prisão quando esta se mostrar ilegal. Havendo, entretanto, legalidade na prisão do averiguado, pode o magistrado decidir por efetuar a prisão provisória, por entender que existem elementos suficientes para ensejar à pena privativa de liberdade. Deve obedecer, contudo, ao disposto no artigo 312 do CPP:

Art. 312.  A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.

Parágrafo único.  A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (art. 282, § 4o). 

Deve haver, portanto, equidade e bom-senso ao magistrado ao solucionar o caso, sob pena de arcar com tamanha injustiça e ferir o princípio da proporcionalidade penal e da presunção de inocência. Não deve o magistrado expor o indiciado a uma situação mais gravosa do que a conduta dele de fato representa para a sociedade. Deve, pois, reprimir tal ação delituosa com medidas que se apropriem ao caso em si, sem excesso ou frugalidade. Da mesma forma, não havendo sequer indícios de autoria e/ou prova da materialidade do delito, não deve o juiz cercear o réu de sua liberdade, já que tal bem jurídico representa valor imensurável e é irreparável.  

Normalmente em casos de furto simples, por exemplo, não há por que o magistrado decretar a prisão preventiva do réu, ainda mais se este for primário. Seria mais prudente o juiz determinar uma medida cautelar diversa da prisão, como o comparecimento periódico em juízo, retenção do passaporte para que o réu não fuja do País, ou proibição de ausentar-se da comarca, por exemplo. 

Importante salientar aqui que, na audiência de custódia, não há julgamento do mérito, devendo o juiz apenas decretar se o réu responderá ao processo em liberdade ou não, além de verificar demais irregularidades em sua prisão em flagrante. Para isso, o magistrado, baseando-se no inquérito lavrado pela autoridade policial, demonstrará sua convicção, concluindo se há necessidade de maior reprimenda a partir do que foi exposto, a partir de termos de declarações e demais provas juntadas aos autos.

Funcionamento da Audiência

A princípio, o preso é levado até a autoridade competente que se encontra numa sala juntamente com o representante do Ministério Público e seu defensor. É acompanhado até tal local por um policial, que comparece ao seu lado até o término do ato.

O magistrado, então, faz algumas perguntas que tenham relevância ao procedimento, como qualificação, se e onde trabalha, se é usuário de drogas, etc. A seguir, é aberta a palavra ao promotor de justiça, que fará questionamentos ou não, dependendo da necessidade. O mesmo é feito depois ao seu defensor.

Há, então, novamente abertura à palavra pelo representante ministerial que vai analisar juridicamente a conduta do averiguado, pleiteando ou não pela prisão preventiva do réu. Posteriormente, o defensor irá requerer pelo relaxamento da prisão, pela sua liberdade provisória e/ou por medida cautelar diversa da privação de liberdade do réu.

Destaca-se aqui o papel do promotor, pois possui o papel de fiscalizador da lei. Portanto, agindo de acordo com a estrita legalidade, pode inclusive pleitear pela improcedência da prisão preventiva do réu, se não houver necessidade para tal reprimenda.

O advogado sempre deverá agir de acordo com os interesses de seu cliente, e com a defensoria pública não é diferente com relação à população hipossuficiente. Pleiteará, pois, por uma medida mais benéfica ao indiciado, ou a menos gravosa possível.

Conclusão

De fato, a audiência de custódia representa um instituto de notável proteção aos interesses do indiciado, garantindo-lhe seus direitos constitucionais. É uma prática inovadora do sistema penal que possui influências inclusive de penalistas consagrados como Cesare Beccaria, autor do livro “Dos Delitos e das Penas”, questionando a falta de proporcionalidade entre os crimes e as penas, da necessidade de prisão para determinadas condutas, da falta de clareza das leis, dentre inúmeras outras sanções cruéis praticadas na Idade Moderna. 

Dado o devido valor que tal instrumento jurídico merece dispor, há que se expor alguns entraves da audiência de custódia.

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Ocorre, porém, que há grande volume de presos ao comparecimento em juízo, gerando um trabalho extenso aos juízes de direito. Mas não é só. Com a imensa circulação de presos percorrendo os corredores do fórum criminal todos os dias úteis da semana, é evidente que há certa periculosidade numa eventual fuga ou reação destes.

O contingente policial muitas vezes pode ser insuficiente, resultando em maior temor para a população. Justifica-se tal afirmação pelos diversos crimes que empregam violência, sendo frequentes no dia-a-dia no Brasil. Roubos, lesões corporais, extorsões mediante sequestros, estupros, ameaças, dentre outros crimes, são uma das maiores preocupações dos brasileiros, devendo ser evitados ao máximo com a mínima tolerância.

A princípio, a audiência de custódia surge como uma garantia do preso, adequando o Processo Penal brasileiro a uma maior aproximação aos direitos humanos. Não podemos esquecer, porém, que a prioridade sempre deve ser a coletividade, e esta não deve jamais estar imune à violência e crueldade de parte dos infratores. Deve haver, portanto, uma estrutura adequada em nosso sistema jurídico que possa permitir a proteção da sociedade acima de tudo em consonância com o respeito às garantias constitucionais do preso. 

Referências:

Introdução ao Direito Penal – Criminologia, Princípios e Cidadania – 2ª edição – Humberto Barrionuevo Fabretti e Gianpaolo Poggio Smanio – Ed. Atlas.

CNJ/JUS.BR

Código de Processo Penal

Dos Delitos e das Penas – Cesare Beccaria - 1764

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