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Pedofilia: a ineficácia na punição e no tratamento

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4. A SUBSTITUIÇÃO DOS HCTP

A partir da análise da realidade do HCTP, é necessário pensar em alternativas para o atual modelo falido. É essencial a substituição do método aplicado por essa espécie de medida de segurança por um tratamento realmente efetivo, que ocorra em um ambiente adequado em sintonia com os direitos humanos e o princípio da dignidade.                                                                                          

4.1 O HCTP em sua forma ideal

É de extrema importância a conscientização da sociedade de que o pedófilo é um doente e que, ao invés de ser punido severamente em cárceres comuns, quando exteriorizar sua doença, ele deve receber sua punição acompanhada de um tratamento eficaz que o ajude.

Querer que o índice de casos de abusos de crianças e adolescentes diminua, exige uma enorme responsabilidade por parte do governo, pois este deve, além de punir o pedófilo que exteriorizou a sua doença, garantir o tratamento eficaz desta parafilia, para que o crime não seja cometido novamente.  Sendo assim, já que se trata de indivíduos doentes que precisam de ajuda, faz-se necessário a punição adequada, acompanhada de tratamento médico, excluindo a punição em instituição prisional comum.

Para que a punição e o tratamento dos pedófilos se deem de forma efetiva, faz-se essencial um lugar adequado para isto. O lugar ideal para tal feito seria o HCTP, que teria uma estrutura física competente para tal tratamento, com o espaço necessário para comportar todos os indivíduos que estão sendo tratados; com aparelhos e instrumentos médicos avançados; com tecnologia hospitalar; com a higienização adequada, com profissionais qualificados, com os medicamentos apropriados, e com as instalações necessárias; tudo isso garantiria um tratamento eficaz ao pedófilo e uma punição adequada, pois dá a ele condições de cumprir a sua pena de forma digna, recebendo o tratamento necessário para impedi-lo de cometer tal ato que o colocou em conflito com a lei.

Em um trabalho desenvolvido pela ABP (Associação Brasileira de Psiquiatria) sobre a realidade dos HCTPS, o grupo aponta algumas sugestões de reformas que se fazem necessárias no sistema, com o objetivo de qualificar tais instituições e permitir que realizem o tratamento médico adequado.

Destacamos abaixo sugestões que podem ser implantadas em uma reforma ampla do sistema, com o objetivo de qualificar as instituições e permitir que realizem, de fato, ações médicas. Estrutura arquitetônica: As reformas estruturais necessárias a boa parte dos hospitais visitados devem privilegiar não só a segurança, como também uma diversidade de atividades terapêuticas. Assim, os hospitais devem dispor de espaços para realização de atividades esportivas, culturais e profissionalizantes, além de alojamentos com número de leitos por quarto adequado para monitoramento da equipe técnica, separados por gênero, idade e sintomatologia. Recursos humanos: A contratação de profissionais deve permitir um atendimento de boa qualidade, com acesso a todos os recursos terapêuticos disponíveis para os usuários do Sistema Único de Saúde. A equipe mínima para atendimento, funcionando em regime de plantão, deve ser composta por: diretor clínico, psiquiatra, clínico geral, equipe de enfermagem, terapeuta ocupacional e psicólogo. Deve ser observada também a proporção entre o número de pacientes e profissionais para a viabilidade de um tratamento eficaz. Reinserção social e acompanhamento terapêutico. A criação de ambulatórios ligados aos HCTPs para continuidade do tratamento dos ex-internos é uma medida essencial para a prevenção de recaídas.

Assim, o indivíduo que sair do HCTP continuaria seu tratamento em regime ambulatorial durante a medida de segurança restritiva. Além da abordagem psiquiátrica, seria igualmente acompanhado e avaliado por equipe de técnicos capacitados para tal. “Ademais, é fundamental uma integração entre os sistemas de saúde e o judiciário, uma vez que essa população encontra-se em um terreno de interseção dessas duas esferas.” (MANUAL FORENSE, 2011, p. 6-7)

Entretanto, a realidade é bem diferente, pois como já foi apresentado neste trabalho, a situação dos HCTPs no Brasil é extrema preocupação, visto que estes órgãos governamentais vivem em estado de calamidade pública.

 

 

 

4.2 Alternativas de tratamento para pedófilos

Devido ao fato da pedofilia se tratar de uma doença neurológica, a legislação brasileira garante o caráter semi-imputável do indivíduo pedófilo. Por isto, o Art. 99 do código penal ordena que a pena dos crimes praticados por este sujeito se deem nos HCTPs.

É dever desta instituição governamental garantir ao pedófilo que exteriorizou a sua doença, uma punição que além de ser condizente com seu crime, se adeque ao estado mental deste, por meio de tratamentos adequados. Nesta situação, tais tratamentos seriam psicoterapia, terapia ocupacional, o uso de medicamentos controlados, como antidepressivos e drogas para a redução da libido.

Outras medidas que ajudariam, seriam grupos de apoio, onde os pedófilos compartilhassem suas aflições e motivassem uns aos outros a lutar contra seus desejos sexuais com crianças e adolescentes. Um ótimo exemplo de como esta alternativa é eficaz, é o trabalho realizado no ABSex (Ambulatório de Transtornos da Sexualidade), da FMABC (Faculdade de Medicina do ABC), coordenado pelo psiquiatra Danilo Baltieri, que atualmente lida com 30 pedófilos. Entre estes, existem condenados por agressão sexual contra menores e, também, aqueles que nunca chegaram a exteriorizar a sua doença. Todos eles apresentaram melhoras significativas no controle da parafilia com a participação nos grupos de apoio aliado a outras medidas.

Além das alternativas já citadas, existe também a aplicação da castração química, que está sendo analisada na Câmara sob o Projeto de Lei 5398/13, do Deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ). Esta medida de punição vem sendo muito discutida, por se tratar de uma medida polêmica. A castração química é uma forma temporária de castração para reduzir a libido e os impulsos sexuais, ocasionado por medicamentos hormonais e que não provoca a esterilização. Estes hormônios atuam sobre os neurotransmissores cerebrais que controlam a produção de esperma e testosterona, inibindo assim o desejo sexual. A castração física foi um método muito utilizado ao decorrer da história para aqueles que cometiam crimes sexuais, principalmente na época da Santa Inquisição. Neste período, a castração era realizada de forma cruel e violenta, sendo retirados os testículos e o pênis do acusado, sendo irreversível o processo. Hoje em dia, a castração física é feita apenas em casos de necessidades, ocasionadas por doenças, ou até mesmo por processo estético, como ocorre no processo transexualizador. Ao longo dos tempos, houve mudanças científicas e sociais no método e na aplicabilidade desta medida. O primeiro país a adotar a castração química como forma de punição legal foi os Estados Unidos da América em 1996, no estado da Califórnia.

Desde então, outros países como, por exemplo, França, Grã-Bretanha, Polônia e Argentina também adotaram a medida. No Brasil, quando o assunto é discutido, relacionado à castração química para criminosos sexuais, grande parte da população mostra-se favorável à pena. Em 2007, o Senador Gerson Camata (PMDB-ES) propôs o Projeto de Lei do Senado Federal n. 552/07, no qual visava executar a castração química para aqueles que cometerem os crimes tipificados nos artigos 213, 214 (revogado), 218 (revogado) e 224 (revogado) do Código Penal, porém acabou sendo arquivado em 2011. Recentemente, outro projeto de lei envolvendo o assunto acabou ganhando reconhecimento nacional e sendo muito discutido. Trata-se do Projeto de Lei 5398/13 proposto pelo Deputado Federal Jair Bolsonaro (PP-RJ), em que:

''Aumenta a pena para os crimes de estupro e estupro de vulnerável, exige que o condenado por esses crimes conclua tratamento químico voluntário para inibição do desejo sexual como requisito para obtenção de livramento condicional e progressão de regime''.

O projeto encontra-se em trâmite no plenário e aguarda para seguir adiante.

 


5. CONCLUSÃO

Dado o exposto, sabe-se que a pedofilia divide-se em dois aspectos: o crime e a doença. Porém, o aspecto patológico da pedofilia é negligenciado pela sociedade, que devido ao caráter polêmico do tema e influência dos preceitos morais estabelecidos, não reconhece o transtorno psiquiátrico como causa maior do delito, demonizando a figura do pedófilo. Entretanto, apesar de concepções erradas e sentimentos de ódio provindos do meio social, o ordenamento jurídico abrange e acolhe o indivíduo diagnosticado com a pedofilia – portanto, semi-imputável – por meio da medida de segurança, que garante a substituição da pena privativa de liberdade pelo internamento em Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico.

Há, a partir do estudo dos fatos, a constatação de que existe um contraste entre o HCTP do ordenamento jurídico e o HCTP da realidade. Tendo em vista a conjuntura levantada, o presente artigo analisou a necessidade de substituição do HCTP por um novo órgão governamental que seja realmente eficaz ao tratar e dar assistência adequada de forma a reinserir os pedófilos na sociedade.

Conclui-se que a ineficiência do atual modelo de HCTP deve-se à falta de fiscalização e regulação por parte do ordenamento jurídico, que não concebe sanções suficientemente rígidas para o impedimento de novas práticas contrárias à dignidade humana. É por se tratar de um modelo falido, herança dos manicômios judiciários, que os HCTPs devem ser completamente reformulados.                                                                               

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Em um mundo sintonizado e atento aos direitos essenciais do indivíduo, a humanização do internado faz-se necessária para o estabelecimento de um tratamento digno e adequado, que possa interromper o ciclo de tortura, abusos e agressões que fazem parte da vida daqueles confinados no HCTP, que sofrem dupla penalização: tanto do Estado, quanto de toda a sociedade. Percebe-se a urgência em analisar e debater esse problema tantas vezes ignorado, foco principal desse trabalho, que o realizou com sucesso.

 

 


REFERÊNCIAS

BALTIERI, Danilo. Pedofilia como transtorno comportamental psiquiátrico crônico e transtornos comportamentais assemelhados. Disponível em: <http://ambr.org.br>. Acesso em: 20 outubro 2016.

 

 

BRASIL. Código Penal. In: VadeMecum. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2016.    

________.Estatuto da Criança e do Adolescente. In: VadeMecum. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2016.                                                                                                                                                         

CARRARA, Sérgio Luis. A História Esquecida: os Manicômios Judiciários no Brasil. Rev. bras. crescimento desenvolv. hum., São Paulo, v. 20, n. 1, p. 16-29, abr. 2010. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-12822010000100004&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 09 nov. 2016.

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DINIZ, Debora. A custódia e o tratamento psiquiátrico no Brasil: censo 2011. Brasília: Universidade de Brasília, 2013. Disponível em: <http://repositorio.unb.br>. Acesso em: 9 nov. 2016.

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MAMEDE, Margarida C. Cartas e retratos: uma clínica em direção à ética. São Paulo: Altamira, 2006.

MANUAL FORENSE. Hospitais de Custódia no Brasil: Avaliação e Propostas. Disponível em: <http:// abpbrasil.org.br>. Acesso em: 20 outubro 2016.

MARTINS, Diego. O Holocausto Brasileiro. Disponível em: <http://luadesangue.com>. Acesso em: 10 agosto 2016.

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. Classificação estatística internacional de doenças e problemas relacionados à saúde. 9. ed. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2003.

SANTOS, Ana L. G. dos; FARIAS, Francisco R. de; PINTO, Diana de S. Por uma sociedade sem hospitais de custódia e tratamento psiquiátrico. História, Ciências, Saúde – Manguinhos, Rio de Janeiro, v.22, n.4, out.-dez. 2015, p.1215-1230.

SASSINE, Vinicius. Tortura e abandono em hospitais de custódia pelo Brasil. O Globo. Disponível em: <http://oglobo.globo.com/brasil/tortura-abandono-em-hospitais-de-custodia-pelo-brasil-7604872>. Acesso em: 9 nov. 2016.

VIANA, Itana; SOUZA, Luis Eugenio de. Como são tratados os doentes mentais infratores? Periculosidade, medida de segurança e Reforma Psiquiátrica. Revista de Direito Sanitário, Brasil, v. 12, n. 3, p. 161--176, mar. 2013. ISSN 2316-9044. Disponível em: <http://www.periodicos.usp.br/rdisan/article/view/694/704>. Acesso em: 9 nov. 2016.

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Sobre os autores
Helena Cinque

Acadêmica de Direito da Universidade Paranaense (UNIPAR)

Vitória Carolina Silva

Acadêmica de Direito da Universidade Paranaense (UNIPAR)

Igor Garrido Ferreira

Acadêmico de Direito da Universidade Paranaense (UNIPAR)

Thaís Fernanda Zanardi Vacari

Acadêmica de Direito da Universidade Paranaense (UNIPAR)

Anelise Ruiz Lopes

Acadêmica de Direito da Universidade Paranaense (UNIPAR)

Luís Irajá Nogueira de Sá Júnior

Possui graduação em Direito pela Faculdade de Direito da Alta Paulista(1985), especialização em Didática do Ensino Superior pela Universidade Presbiteriana Mackenzie(1993), especialização em Direito Civil pela Universidade Presbiteriana Mackenzie(1994), especialização em Direito Civil e Processual Civil pela Universidade Paranaense(1995), mestrado em Direito Processual e Cidadania pela Universidade Paranaense(2006) e aperfeicoamento em Curso Preparatório Para Concursos pelo Ministério Público e Magistratura Damásio Evangelista de Jesus(1991). Atualmente é Professor auxiliar "A" (TI) da Universidade Paranaense, Profissional Autônomo da Sá e Sirigu Advogados Associados e Membro de corpo editorial da Revista Autoclasse. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Privado. Atuando principalmente nos seguintes temas:Indenização, Reservas, Responsabilidade, Transporte, Turismo.

Bárbara Cossettin Costa Beber Brunini

Psicóloga Mestre em Psicologia e Sociedade pela UNESP/ SP, docente de graduação e pós graduação, professora convidada da Escola da Magistratura do Paraná e psicóloga concursada da prefeitura de Icaraima do Estado do Paraná e cedida ao Fórum da cidade de Icaraíma onde exerce a função de psicóloga jurídica.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CINQUE, Helena ; SILVA, Vitória Carolina et al. Pedofilia: a ineficácia na punição e no tratamento. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4927, 27 dez. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/54486. Acesso em: 2 nov. 2024.

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