O ministro do Supremo Tribunal Federal-STF, Luís Roberto Barroso, suspendeu todos os processos que tratavam do ensino domiciliar no RE 888815. Esse recurso teve repercussão geral reconhecida pelo Plenário Virtual do STF em junho de 2016.
Segundo o sítio de notícias do STF:
O Recurso Extraordinário (RE) 888815 teve origem em mandado de segurança impetrado pelos pais de uma menina, então com 11 anos, contra ato da secretária de Educação do Município de Canela (RS) que negou pedido para que a criança fosse educada em casa e orientou-os a fazer matrícula na rede regular de ensino, onde até então havia estudado. Tanto o juízo da Comarca de Canela quanto o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (TJ-RS) indeferiram a segurança, com o fundamento de que, não havendo previsão legal de ensino nessa modalidade, não há direito líquido e certo a ser amparado.
No recurso ao STF, os pais sustentam que “restringir o significado da palavra educar simplesmente à instrução formal numa instituição convencional de ensino é não apenas ignorar as variadas formas de ensino agora acrescidas de mais recursos com a tecnologia como afrontar um considerável número de garantias constitucionais”, como os princípios da liberdade de ensino e do pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas (artigo 206, incisos II e III), tendo-se presente a autonomia familiar assegurada pela Constituição.
O ensino domiciliar ou doméstico é aquele lecionado no ambiente familiar do aluno, por um professor particular ou por um membro da família. A educação formal é ministrada na casa do discente.
Em alguns países, Áustria, Bélgica, Canadá, Portugal, Itália, o ensino domiciliar é permitido pelo Estado e em outros não é permitido, como Alemanha e Suécia.
Quem defende a legalidade do ensino domiciliar no Brasil cita os seguintes benefícios para os alunos: flexibilidade de horário, maior possibilidade de fazer passeios orientados. Esses desejam implantar esse método de ensino pelos seguintes motivos: insatisfação com a escola, Bullying, comprometimento da integridade física e psicológica, péssima qualidade do ensino no Brasil, péssimo ambiente escolar, sala de aula cheia, Drogas e sexualização precoce. O grande problema é que os pais querem colocar seus filhos em uma grande bolha de vidro protegendo os pupilos ao máximo do ambiente externo. E como esses pais irão fazer para oferecer um curso diferenciado para seus filhos? Será que terão conhecimento em todas as áreas do saber? Como será uma aula de natação ou arte marcial para o filho dessa família?
Por outro lado os que são contra citam: a família terá que ter uma condição financeira elevada para contratar professores particulares ou para levar o aluno para uma instituição privada que ministre aulas particulares, baixa escolaridade das famílias brasileiras, defasagem educacional dos pais, falta de capacidade para gerenciar conflitos, falta de socialização, dificuldade de trabalhar em grupo, dificuldade de reconhecer outro membro como líder (a figura do pai e professor podem confundir o discente). A educação formal em escolas é interativa e dinâmica. O estudante passa a lidar com problemas e desentendimentos que devem ser solucionados para conviver em um ambiente harmonioso.
Os pais que defedem a educação domiciliar se embasam na nos artigos 205 e 227 da Constituição Federal-CF e no artigo 22 do Estatuto da Criança e do Adolescente-ECA:
Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada em colaboração com a sociedade, visando o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional-LDB estabelece:
Art. 1º A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais.
Só que a própria LDB diz:
Art. 6o É dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula das crianças na educação básica a partir dos 4 (quatro) anos de idade.
Como no Brasil não há Lei que autorize a educação familiar os pais podem responder pelo artigo 246 do Código Penal:
Abandono intelectual
Art. 246 - Deixar, sem justa causa, de prover à instrução primária de filho em idade escolar:
Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa.
No ECA vem expresso que os pais têm obrigação de matricular seus filhos no ensino regular:
Art. 55. Os pais ou responsável têm a obrigação de matricular seus filhos ou pupilos na rede regular de ensino.
Com o reconhecimento do MEC, em 2012, da utilização do Exame Nacional do Ensino Médio-ENEM para conclusão do Ensino Médio o número de famílias que implantaram a educação domiciliar aumentou. Existem várias instituições que orientam as famílias para a implantação da educação familiar. Resta saber, no fundo, qual o objeto dessas empresas, pois a orientação será gratuita ou paga?
Um professor para transmitir o conhecimento adquirido necessita de vários anos de estudos em uma disciplina específica precisando se capacitar periodicamente, fazendo cursos na área, pós graduação, mestrado, e mesmo com essa capacitação deve estar atendo as mudanças educacionais. Será que uma família terá condições de ensinar seu filho, com maestria, nas diversas disciplinas que necessitam de um profissional qualificado na área educacional?
Quanto mais um professor se qualifica, maior será a facilidade que o discente terá para apreender. Uma família terá disposição e tempo hábil para em um ano letivo ensinar seu filho nas diversas áreas do conhecimento?
Outro ponto que deve ser levado em consideração é a atual crise financeira a qual o Brasil enfrenta. Caso o STF autorize, a educação domiciliar, muitas famílias irão se aventurar nesse tipo de educação para diminuir os gastos. Os países que autorizaram esse tipo de educação são em sua maioria de primeiro mundo, ou seja, os pais têm uma educação de melhor qualidade. A família que se aventurar nesse sistema educacional deve pensar que está colocando o futuro educacional e profissional de seus filhos em jogo.
Se a educação domiciliar for adotada no Brasil, quem vai fiscalizar a execução do serviço prestado e verificar o nível de aprendizado oferecido? E quando esses adolescentes chegarem a faculdade que tem os mesmos problemas que não foram vivenciados durante a infância/adolescente, como esses jovens irão resolver esses problemas?
Lançadas essas ponderações resta saber como o STF julgará esse RE que atingirá a educação de milhões de brasileiros.