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Impedimento e suspeição no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE)

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09/01/2017 às 14:03
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3) Consequências de Ato Parcial em Processo Administrativo

Do art. 7º da Lei n. 12.529/11 extrai-se uma das possíveis consequências da atuação parcial por Conselheiro do CADE: a perda de seu mandato. Trata-se de penalidade disciplinar máxima, mas que se relaciona apenas com o sujeito ativo da parcialidade no julgamento.

Eventual atuação parcial viola dispositivos legais e contraria princípios constitucionais (juiz natural e impessoalidade) e também resulta em prática de conduta vedada expressamente pela lei de defesa da concorrência, sendo ilegal e, como tal, deve ser afastada do mundo jurídico.

A decisão em processo administrativo nada mais é senão um ato administrativo com conteúdo decisório. Sendo esse ato administrativo ilegal, caracteriza-se como inválido, porque não foi expedido em absoluta conformidade com as exigências legais, ainda que tenha a possibilidade de produzir efeitos.

O sujeito é pressuposto de validade do ato administrativo; se irregular a sua atuação, inválido será o ato e, nesse sentido, é possível pleitear a sua nulidade.

A invalidação do ato é a sua supressão ou da relação jurídica dele nascida, porque foram produzidos em desconformidade com a lei. Uma decisão eivada de parcialidade deve ser declarada nula, retroativamente, porque o vício de que padece o sujeito não é passível de convalidação e, se novamente produzido, pelo mesmo sujeito, permaneceria maculado de ilegalidade.

Conforme dispõe Celso Antônio Bandeira de Mello , “Na conformidade desta perspectiva, parece-nos que efetivamente os atos unilaterais restritivos da esfera jurídica dos administrados, se eram inválidos, todas as razões concorrem para que a sua fulminação produza efeitos ex tunc, exonerando por inteiro quem fora indevidamente agravado pelo Poder Público das conseqüências onerosas.”

A corroborar, a imparcialidade é pressuposto intrínseco de validade da relação processual. Se o Juiz for parcial, o processo poderá ser extinto, sem resolução do mérito, porque verificada “a ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo” (art. 485, IV, CPC). 


4) Medidas Cabíveis

  No Regimento Interno do CADE, a regra é a de que tanto a suspeição quanto o impedimento, devem ser alegados de ofício ou por meio de petição fundamentada, na primeira oportunidade me que couber à parte falar nos autos (art. 5º, par. 1º).

  Se a parcialidade for constatada apenas na decisão, é possível pretender o reconhecimento de sua nulidade já que proferida por juiz parcial, em ofensa aos princípios constitucionais do juiz natural (art. 5º, XXXVII e LIII), da impessoalidade (art. 37, caput) e do Estado Democrático de Direito (art. 1º). Assim, competirá à parte “alegar e provar – ou requerer ao Tribunal a produção de provas – os motivos de parcialidade, para que obtenha êxito em sua pretensão recursal de anulação da sentença”.

  O impedimento é insuscetível de preclusão, tamanha a sua gravidade. Por isso, pode ser alegado a qualquer momento. Mas, se já proferido o julgamento, deve ser postulada a sua nulidade por intermédio de recurso (após o trânsito em julgado da sentença no processo civil, pode haver a impugnação por meio de ação rescisória). Nesse sentido, reproduzimos, a seguir, a lição de Nelson Nery Júnior:

“Não há prazo para a alegação do impedimento, porque insuscetível de preclusão. No entanto, para que se consiga afastar o juiz impedido da causa, a fim de que não julgue a demanda, é preciso que se oponha a exceção até o momento imediatamente anterior ao do julgamento. Proferido este, não se pode mais afastar o juiz da causa, objetivo da exceção de impedimento. Depois de proferido o julgamento pelo juiz impedido, a parte ou o interessado poderá pleitear a nulidade do julgado, por intermédio de recurso, sob o fundamento de que a decisão é nula por ter sido proferida por juiz parcial (impedido). (...) Caso tenha transitado em julgado a sentença ou acórdão, de mérito, proferido por juiz impedido, ainda assim é possível sua impugnação por meio da ação rescisória.”

 A Lei n. 9.784/99 prevê que a anulação de atos ilegais é um dever da Administração Pública (art. 53). Se já houver julgamento no processo administrativo, e considerando-se que as decisões do CADE não comportam revisão no âmbito do Poder Executivo (art. 9º, par.2º, da Lei n. 12.529/11), restam apenas duas opções na esfera administrativa: Embargos de Declaração e Reapreciação, ambos instrumentos previstos no Regimento Interno da autarquia (arts 218 a 226).

  Os Embargos de Declaração são cabíveis no prazo de 5 (cinco) dias da publicação da ata de julgamento, em petição dirigida ao Conselheiro-Relator, indicando o ponto obscuro, contraditório ou omisso, cuja declaração se imponha. Tem, portanto, a finalidade de clarificar o julgado e, como regra, não tem o condão de substituir/modificá-lo. Não obstante, no processo civil, aplicável ao caso , os embargos declaratórios podem ter, excepcionalmente, caráter infringente quando utilizados para a) correção de erro material manifesto; b) suprimento de omissão; c) extirpação de contradição , situação na qual poderá o recurso ter caráter modificativo. Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça já admitiu o uso dos embargos para declarar nulo o julgamento do qual participou juiz suspeito:

“SUSPEIÇÃO – JULGAMENTO – COLEGIADO INTEGRADO POR JUIZ SUSPEITO. Acolhem-se os EDcl para declarar nulo o julgamento do qual participou, por equívoco, julgador que se dera anteriormente por suspeito.” (STJ, 4ª Turma, EDclREsp 225322-DF, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, v.u., j. 24.10.2000, DJU 18.12.2000, p. 201)

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  Se o impedimento é considerado uma questão de ordem pública e configura um erro manifesto no processo, podemos concluir pela possibilidade de interposição de Embargos Declaratórios no caso, objetivando efeitos infringentes.

  Ainda que não fosse possível tal providência, pelo fato de tratar-se de um ato ilegal, que a Administração Pública tem o dever de corrigir, uma mera petição dirigida à Presidência do CADE poderia questionar a lisura do julgamento, sugerindo a realização de um novo, redistribuindo-se a Relatoria.

  A Reapreciação, por sua vez, tem cabimento para a reconsideração do julgamento plenário que negar aprovação do ato ou contrato, quando houver fundamento em fato ou documento novo, capazes, por si só, de lhes assegurar pronunciamento mais favorável, desde que as partes venham a ter conhecimento depois da data do julgamento, ou de que antes dela estavam impedidas de fazer uso comprovadamente.  Pela simples leitura dos requisitos, grifados, entendemos que esse instrumento não seria o mais adequado para arguir a parcialidade no julgamento, pois não seria um fato ou documento novo que, por si só, já melhoraria a situação da parte.

  A nossa opinião seria pela utilização dos Embargos de Declaração, até mesmo por força de seu efeito suspensivo (art. 221 do Regimento Interno), enquanto que a Reapreciação, muito embora possa ser solicitada no prazo de 15 (quinze) dias da publicação da ata de julgamento, ela não suspende a execução da decisão atacada (art. 225 do Regimento Interno).

  Dessa maneira, na esfera administrativa, é possível tentar a nulidade da decisão, por vício de ilegalidade e por força do impedimento, por meio de simples petição nos autos do processo ou por meio de Embargos de Declaração.

  Há, ainda, a possibilidade de se ingressar com ação judicial que vise a declaração de nulidade do ato administrativo decisório, com discussão ou não de mérito, solicitando-se, ainda, um provimento que suspenda liminarmente os efeitos da decisão da autarquia.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CARDINALI, Adriana Laporta. Impedimento e suspeição no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 4940, 9 jan. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/54918. Acesso em: 25 abr. 2024.

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