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Direito ao esquecimento: mecanismo de proteção dos direitos da personalidade

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12/01/2017 às 13:00
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6 ANÁLISE CRÍTICA DOS JULGADOS PROFERIDOS PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Após uma breve exposição dos casos que possibilitaram a aplicação do direito ao esquecimento no sistema jurídico brasileiro e dos critérios utilizados para se chegar a solução dos casos, questiona-se se a decisão exarada pelo Superior Tribunal de Justiça em ambos os processos se deu de forma coerente.

Assim como já afirmou o Tribunal Europeu de Direitos Humanos, a transmissão de notícias atuais é a função principal da imprensa em uma democracia.

Evidente que os eventos delitivos são noticiáveis por sua própria natureza, independentemente da condição dos envolvidos pela notícia. Em regra, há interesse público na informação sobre os resultados das investigações policiais, o desenvolvimento do processo e o conteúdo da sentença. No entanto, tais informações vão perdendo sua justificação a medida que o tempo passa se os envolvidos carecem de relevância pública ou os fatos vinculados a essas pessoas carecem de interesse histórico.

Os julgamentos realizados pelo Tribunal da Cidadania apresentaram uma linha de raciocínio lógica, embora os casos tenham tido decisões diametralmente opostas.

Fazendo menção expressa ao caso Lebach, o STJ registrou que, se já não há interesse público na divulgação de um fato criminoso, por força do transcurso temporal, o autor do crime e a vítima tem direito ao esquecimento. Caso a divulgação dos acontecimentos pretéritos envolva um interesse público, como nos crimes históricos, a exemplo dos casos relatados, ofendido e agressor podem ter os nomes expostos, se forem indissociáveis da infração penal. Em contrapartida, na hipótese de não haver a necessidade de que o nome da vítima ou do autor do crime seja apresentado, o fato histórico pode ser contado, sendo preservados, o nome e imagem dos envolvidos.

Portanto, embora os casos tenham tido desfechos diversos, percebe-se coerência nas decisões exaradas pelo Superior Tribunal de Justiça.


7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A transmissão do conhecimento ou de informações tanto de uma pessoa a outra como de uma geração à seguinte, sempre foi um dos maiores desafios e também uma das maiores pretensões do ser humano desde sua origem. A posse de conhecimento e informação sempre significou poder e bem estar. A imprensa, a revolução tecnológica do século XX com a rádio, a televisão e a telefonia, e sobretudo a internet, colocou a disposição dos indivíduos a possibilidade de acessar em tempo real a informação e conhecimento a nível mundial.

Apesar da contribuição positiva de todas essas inovações tecnológicas, ficou cada vez mais frequente a transgressão de direitos fundamentais, especialmente os direitos da personalidade, através daquelas ferramentas.

O presente trabalho tratou de analisar o surgimento do direito ao esquecimento, demonstrando que o confronto entre liberdade de informação e os direitos da personalidade, a par de transitar pelos domínios do direito constitucional, pode ser solucionado a partir de dispositivos do Código Civil.

Demonstrou-se também que os direitos da personalidade são aqueles caracteres mais fundamentais e intrínsecos à condição humana, demandando, por isso, uma maior proteção pelo ordenamento.

O exercício do direito ao esquecimento deve ser visto como uma forma de proteger as pessoas e não como uma forma de cercear a liberdade de expressão, muito menos ocultar dados históricos relevantes. Daí a ponderação caso a caso dos interesses em xeque, isto é, a análise do conflito entre a liberdade de imprensa e o direito à intimidade, pois embora a primeira seja incensurável e goze de total liberdade, encontra barreiras em princípios como a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas.

Ainda não há critérios específicos na jurisprudência nem na doutrina quanto à aplicação do direito ao esquecimento. Nesse passo, o presente artigo buscou demonstrar as balizas já existentes e trouxe, ainda, como forma de aumentar o debate acerca do tema, os critérios propostos por Pablo Dominguez Martinez.

Com base nos critérios do referido autor (domínio público; preservação do contexto original da informação pretérita; preservação dos direitos da personalidade na rememoração; utilidade na informação e atualidade da informação), foi possível constatar o acerto das decisões do Superior Tribunal de Justiça nos recursos especiais de n. 1.334.097-RJ e n. 1.335.153-RJ.

Diante de tais constatações, conclui-se que o direito ao esquecimento encontra guarida no ordenamento jurídico pátrio e que para sua fiel aplicação deve ser analisado o caso concreto, ponderando-se os direitos em jogo.


8 REFERÊNCIAS

[1] NOVELINO, Marcelo. Curso de direito constitucional. 11. ed. Salvador: Ed. JusPoddivm, 2016. p. 337.

[2] AMARAL, Francisco. Direito civil. Introdução. 5. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 249.

[3] TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2012. p. 87-88.

[4] Ibid., p. 90.

[5] CLAVERÍA GOSÁLBEZ, Luis Humberto. Notas para La construcción jurídica de los llamados derechos de La personalidad en Libro homenaje AL Profesor José Beltrán de Heredia y Castaño. Ediciones Universidad de Salamanca, 1984, p. 104-105.

[6] STANZIONE, P. Capacità e minore età..., cit., p. 90 e ss, DE CUPIS, A.; I diritti della personalità, Vol. I en CICU, Antonio-MESSINO, Francesco; Trattado di diritto civile e commerciale, Tomo IV-1, Milano, 1973, p. 28-33, LÓPEZ JACOISTE, José Javier. Una aproximación tópica a los derechos de La personalidad, en Anuario deDerecho Civil, 1986, p. 1067-1075 y BELTRÁN DE HEREDIA Y CASTAÑO, José. Construción jurídica de los derechos de La personalidad. Discursos leidos ante la Real Academia de Jurisprudencia y Legislación , Madrid, 1976, p. 29.

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[7] CLAVERÍA GOSÁLBEZ, Luis Humberto. Op. cit. p. 105.

[8] LARENZ, Karl. El derecho general de La personalidad en La jurisprudencia alemana, en Revista de Derecho Privado, 1963, p. 639-641. Explica como na Alemanha a existência de uma regulação escassa e incompleta de direitos da personalidade e a reação contra a barbárie causada pelo menosprezo dos valores humanos na 2.ª Guerra Mundial, fez surgir vozes que pleitearam um direito geral da personalidade.

[9] LARENZ, Karl. Tratado de Derecho Civil. Parte General (Traducción y notas de Miguel Izquierdo y Macías-Picarea), Jaén, 1978, p. 97-98 y 160-165.

[10] TARTUCE, Flávio. Op. cit. p. 85.

[11] TEPEDINO, Gustavo. A tutela da personalidade no ordenamento civil-constitucional brasileiro. Temas de direito civil. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. t. I, p. 50.

[12] MARTINEZ, Pablo Dominguez. Direito ao esquecimento: a proteção da memória individual na sociedade da informação. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2014, p.36.

[13] MARTINEZ, Pablo Dominguez. Op. cit., p. 80.

[14] O caso ocorreu no interior da Alemanha, no ano de 1969. Na ocasião, três homens assassinaram brutalmente quatro soldados que guardavam um depósito de munição, ferindo ainda gravemente um quinto militar e roubando as armas e munições do referido depósito. Em relação aos três autores do crime, dois foram condenados à prisão perpétua e um deles, cuja conduta foi menos gravosa, foi condenado à seis anos de reclusão.

Quando o terceiro autor estava próximo de ser solto, um canal de televisão decidiu publicar um documentário retratando todo o ocorrido. O réu buscou o Poder Judiciário para impedir a exibição, sob o argumento de que o documentário dificultaria seu processo de ressocialização. O Tribunal Constitucional Federal acolheu o pleito do agente e impediu a transmissão do documentário.

[15] MORAES, Maria Celina Bodin de; KONDER, Carlos Nelson. Dilemas de Direito Civil-Constitucional:casos e decisões. Rio de Janeiro, 2012, p. 292.

[16] NOLETO, Mauro. O caso Lebach: o sopesamento. Disponível em: http://constitucional1.blogspot.com.br/2008/11/o-caso-lebach-o-sopesamento.html. Acesso em 15 de fevereiro de 2016.

[17] DIZER O DIREITO. O direito ao esquecimento. Disponível em:HTTP://dizerodireito.com.br/2013/11/direito-ao-esquecimento.html. Acesso em: 02 de maio de 2016.

[18] PEREIRA, Nayara Toscano de Brito. Direito ao esquecimento: o exercício de (re)pensar o direito na sociedade da informação contemporânea e as peculiaridades do debate entre o direito civil e a constituição.

[19] BRASIL, STJ, Resp. n. 1.334.097-RJ, Rel. Min. Luís Felipe Salomão, 4.ª T., j. 28/05/2013.

[20] A versão na íntegra pode ser encontrada no site do Poder Judicial da Espanha. Disponível em: http://www.poderjudicial.es/search/doAction?action=contentpdf&databasematch=TS&reference=7494889&links=%222772%2F2013%22&optimize=20151019&publicinterface=true. Acesso em: 18/02/2016.

[21] BRASIL, STJ, Resp. n. 1.335.153-RJ, Rel. Min. Luís Felipe Salomão, 4.ª T., j. 28/05/2013.

[22] MARTINEZ, Pablo Dominguez. Op. cit., p. 161.

[23] Ibid., p. 161.

[24] GALVÃO, Helder. Direito de imagem e fotojornalismo. In: SCHREIBER, Anderson (Coord.). Direito e mídia. São Paulo: Atlas, 2013, p. 32.

[25] GODOY, Cláudio Luiz Bueno de. A liberdade de imprensa e os direitos da personalidade. São Paulo: Atlas, 2001, p. 88.

[26] MARTINEZ, Pablo Dominguez. Op. cit., p. 167.

[27] O tópico do presente artigo é baseado no capítulo 4 da obra “Direito ao esquecimento: a proteção da memória individual na sociedade da informação”.

[28] MARTINEZ, Pablo Dominguez. Op. cit., p. 173.

[29] ALMEIDA JÚNIOR, Vitor de Azevedo. A imagem fora de contexto: o uso de imagens de arquivo. In: SCHREIBER, Anderson (Coord.). Direito e mídia, cit., p. 166.

[30] BRASIL, STJ, REsp 984.803-ES, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3.ª T., julg. 19/08/2009, p. 07.

[31] A versão na íntegra pode ser encontrada no site do Poder Judicial da Espanha. Disponível em: http://www.poderjudicial.es/search/doAction?action=contentpdf&databasematch=TS&reference=7494889&links=%222772%2F2013%22&optimize=20151019&publicinterface=true. Acesso em: 18/02/2016.

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Sobre o autor
Bruno Batista da Silva

Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Pós-graduado em Direito Civil e Direito Processual Civil pela Universidade Católica Dom Bosco. Campo Grande – MS.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Bruno Batista. Direito ao esquecimento: mecanismo de proteção dos direitos da personalidade . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 4943, 12 jan. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/55014. Acesso em: 19 dez. 2024.

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