A litigância a custo zero das minorias organizadas
É certo que, em seus 15 anos de existência, a Lei 10.948 resultou na aplicação de 100 advertências e apenas 15 multas entre os 359 processos instaurados, segundo levantamento da colunista Mônica Bergamo, da Folha de S. Paulo, em 7 de novembro de 2016. [5] Mas esse número de multas aparentemente pequeno (as advertências são expressivas) comporta outra leitura. Tome-se o caso da Justiça do Trabalho. O fato de a legislação considerar o empregado hipossuficiente facilita a litigância de má-fé contra os patrões, o que resultou em 3 milhões de novos processos trabalhistas só no ano passado, muitos deles estimulados por escritórios de advocacia em busca de clientes, conforme mostra reportagem do jornal O Estado de S. Paulo de 26 de dezembro de 2016. [6]
Na aplicação da Lei 10.948 não deve ser muito diferente. A exemplo de outras minorias que são tratadas como crianças e protegidas como incapazes pela legislação, lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais também dispõem de assistência jurídica gratuita para entrar com ações acusando terceiros de “homofobia” – por sinal, um termo perigosamente impreciso, que jamais deveria ser utilizado no âmbito da legislação penal. Como não precisam constituir advogado e podem dispor, gratuitamente, do trabalho da Defensoria Pública, do Ministério Público e dos órgãos de direitos humanos da OAB, além do apoio de universidades e ONGs, a tendência é que os homossexuais politicamente engajados tentem transformar toda crítica que recebem em injúria. Qualquer outro cidadão que não pertence às minorias, caso queira se sentir judicialmente injuriado por qualquer motivo, tem de pagar por isso, arcando com honorários advocatícios e custas processuais, como fez o cantor e compositor Roberto Carlos no célebre processo que moveu contra a publicação de sua biografia, Roberto Carlos em Detalhes, de autoria do jornalista Paulo Cesar de Araújo.
No caso de Levy Fidelix, acusá-lo de homofobia perante a lei não teve custo nenhum para os acusadores. A denúncia contra ele partiu da Coordenação de Políticas para a Diversidade Sexual, criada pelo Decreto Estadual nº 54.032/2009 no âmbito da Secretaria de Justiça e Defesa da Cidadania, com o objetivo de elaborar políticas públicas para a promoção dos direitos da população de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais. Com base na denúncia, a Comissão Especial de Discriminação Homofóbica – também instituída no âmbito da referida pasta e designada por meio de portaria – instruiu o processo administrativo, que resultou no estabelecimento de multa ao ex-candidato, estipulada no mínimo valor legal previsto, que é de 1.000 Ufesp (Unidade Fiscal do Estado de São Paulo).
Após ser proferida a decisão, o denunciado opôs embargos de declaração, alegando que não havia motivação para fixar a penalidade imposta. Como os embargos foram impugnados a pedido da Defensoria Pública, o denunciado interpôs recurso, requerendo a nulidade da sentença e, caso ela não fosse anulada, pleiteava a reforma da decisão a fim de ser absolvido. Por sua vez, a Defensoria Pública pleiteou a majoração da pena, alegando a magnitude do dano causado pelo denunciado. Por fim, em sede de contrarrazões, a Defensoria Pública argumentou que houve motivação suficiente para fixar o valor da pena e requereu a manutenção da decisão, confirmada pelo secretário de Justiça e Defesa da Cidadania, Márcio Fernando Elias Rosa, e publicada no Diário Oficial do Estado de São Paulo em 21 de fevereiro último. [7]
Baixo índice de conciliação nos processos por “homofobia”
Quando a Lei 10.948 – de autoria do deputado estadual Renato Simões, do PT – foi aprovada pela Assembleia Legislativa paulista e promulgada pelo governador Geraldo Alckmin, do PSDB, em 5 de novembro de 2001, seus defensores alegavam que o objetivo da norma era apenas proteger os homossexuais de discriminação; jamais admitiam que, devido ao seu caráter subjetivo, ela poderia ser usada até para punir a livre expressão de um político em pleno debate eleitoral. Na época (lá se vão 15 anos), líderes católicos e evangélicos já percebiam os riscos que essa lei oferece a garantias constitucionais, como a liberdade de culto e o livre exercício de uma profissão (veja-se o caso dos psicólogos que não comungam com a chamada “ideologia de gênero”), mas não foram ouvidos.
Na mesma edição do Diário Oficial do Estado de São Paulo em que saiu a condenação de Levy Fidelix, também foi publicada a condenação de uma empresa e de um cidadão à pena de advertência com base na acusação de “homofobia”. Os nomes dos dois denunciantes do caso aparecem protegidos por iniciais, em que pese algumas categorias de homossexuais brigarem pelo uso do nome social nas escolas; já a empresa e o cidadão condenados são amplamente identificados na sentença administrativa, com o nome completo da pessoa e da empresa e os números do CNPJ, CPF e Carteira de Identidade. [8]
Nesse caso, a pena foi somente de advertência. Mas, de acordo com o que prevê o artigo 6º da Lei 10.948, a pena pecuniária a cidadãos ou empresas pode chegar a 3.000 Ufesp, o que corresponde a R$ 75.210 para o exercício de 2017. E a empresa também pode ser punida com a suspensão por 30 dias de sua licença estadual de funcionamento ou até mesmo a cassação dessa licença. Trata-se de um conjunto de penalidades graves para uma infração de caráter muito subjetivo. Além disso, que imparcialidade judicativa se pode esperar de órgãos criados pelo Estado justamente para promover a causa dos potencialmente ofendidos? No mínimo, esses órgãos se sentem quase obrigados a abrir um processo administrativo para cada denúncia que surge, pois se não o fizerem serão acusados de negligência pelas minorias vitimistas.
É o que se pode deduzir de outra informação da coluna de Mônica Bergamo, já citada. A Coordenação Estadual de Políticas para a Diversidade Sexual estabeleceu convênio com o Tribunal de Justiça, no âmbito da cidade de São Paulo, para fazer mediação de conflitos nos casos de preconceito contra lésbicas, gays, bissexuais e travestis. Segundo Bergamo, desde fevereiro de 2015, quando começou o projeto, ocorreram 72 sessões, das quais nove foram consideradas bem-sucedidas. A despeito da mediação da própria Justiça, é muito baixo o índice de conciliação, menos de 13%. Ou seja, se 87% dos reclamantes não aceitam a conciliação mediada pelo Judiciário e preferem manter o processo administrativo no Executivo (já que não lhes custa nada), é sinal de que esperam que sua denúncia resulte em multa contra o denunciado, o que, entretanto, só ocorreu em 4,1% dos processos (15 de 359). Talvez seja uma prova de que a maioria das denúncias é frágil e só serve para alimentar o discurso vitimista da militância gay de esquerda – por sinal, criticada por muitos homossexuais, como o vereador paulistano Fernando Holiday (DEM).
Levy Fidelix não combateu pessoas, mas a militância
Levy Fidelix pode ser considerado uma vítima dessa militância. Em nenhum momento, ele fez “discurso de ódio” contra os homossexuais, como se alegou contra ele até na decisão de primeira instância. Está certo o desembargador Natan Zelinschi de Arruda, que não vislumbrou violência contra os homossexuais na fala do candidato e a considerou apenas inadequada, com “aspectos grosseiros, sem maiores consequências”. Fidelix não combateu os homossexuais como indivíduos e, sim, o comportamento ostensivo da militância gay, que ofende o decoro público, como no caso da Marcha das Vadias durante a visita do Papa Francisco e na questão do uso dos banheiros femininos por travestis. Algo que ficou claro no debate quando Fidelix afirmou seu sentimento de tolerância em relação aos homossexuais: “Que façam um bom proveito do que querem fazer e continuar como estão, mas eu, presidente da República, não vou estimular; se está na lei, que fique como está, mas estimular, jamais, a união homoafetiva”.
Se os formadores de opinião e as autoridades constituídas tivessem com Fidelix só um pouquinho da enorme boa vontade que têm com a filósofa Marilena Chauí (a doutora da USP, que, mesmo sendo servidora pública, prega o ódio à classe média que lhe paga o salário), sem dúvida, relevariam o estilo meio tosco de Fidelix, que não estava preparado para debater um tema tão espinhoso como a homossexualidade. Luciana Genro logo percebeu isso e pontuava as respostas desastradas do adversário com um riso sarcástico. Quando ela afirmou que “os homossexuais, travestis e lésbicas sofrem uma violência constante” e que “o Brasil é campeão de morte da comunidade LGBT”, Fidelix poderia ter lembrado que nenhum militante de esquerda tem autoridade ética para falar em nome dos gays, porque o ditador Fidel Castro – grande ídolo do PSOL – foi um feroz perseguidor de gays, entre eles, o escritor Reinaldo Arenas, preso apenas por ser homossexual.
Quando formulou sua pergunta, Luciana Genro devia estar pensando nos 338 homossexuais assassinados em 2012, segundo o Grupo Gay da Bahia, dado que rendeu manchetes sensacionalistas na imprensa do tipo: “A cada 26 horas morre um gay no Brasil”. [9] Fidelix poderia ter desmascarado essa falácia, observando que, só naquele ano de 2012, 56.337 brasileiros foram vítimas de homicídio no país – 154 homicídios por dia ou 6,4 homicídios por hora, segundo o Mapa da Violência. [10] Como muitos homossexuais são mortos por seus próprios parceiros de ocasião, requisitados em aventuras de altíssimo risco nas noites do submundo, pode-se afirmar, sem erro, que a fictícia homofobia está longe de ser a principal causa dos assassinatos de homossexuais. Morre-se muito mais devido à violência urbana, motivada pelo tráfico de drogas, que elevou o número de homicídios anuais no país para 60 mil, quase o número de mortos na guerra da Síria.
O único momento do debate em que Levy Fidelix pareceu repudiar, de fato, os homossexuais como pessoas, indo além de criticar seu comportamento militante, foi quando disse: “Então, gente, vamos ter coragem. Nós somos maioria. Vamos enfrentar essa minoria. Vamos enfrentá-los, não ter medo. E dizer que sou pai, mamãe, vovô; e o mais importante é que esses que têm esses problemas realmente sejam atendidos no plano psicológico e afetivo, mas bem longe da gente, bem longe mesmo, porque aqui não dá”. Mas é preciso entender essas declarações no contexto da guerra anticristã deflagrada pela militância gay. Hoje, a pretexto de qualquer declaração de um clérigo em defesa da família tradicional, igrejas são cercadas e até invadidas por gays seminus, que vão do beijaço ao strip-tease na ofensa aos santos.
Quando da visita do Papa Francisco ao Brasil, em julho de 2013, uma Marcha das Vadias invadiu a Jornada Mundial da Juventude, na Praia de Copacabana. Imagens da manifestação disponíveis na Internet mostram uma mulher seminua se masturbando com a imagem de Nossa Senhora, em meio a várias cruzes despedaçadas; então, ela quebra a imagem, atira-a ao chão, toma o pedaço de uma cruz e, após revesti-lo com uma camisinha, enfia-o no ânus de seu parceiro, diante do olhar abismado da multidão de jovens que recebiam o Papa. É provável que Levy Fidelix tinha essas imagens em mente quando disse que a maioria pacífica não pode “ficar escorada” com medo da militância gay. [11]
Em que pese o casal que conspurcou as imagens na visita do Papa ter sido processado por um promotor público por intolerância religiosa, não houve uma cruzada nacional pedindo sua punição em face da violência concreta praticada em praça pública. [12] Já Levy Fidelix tem contra si a Secretaria de Justiça do Estado de São Paulo, a Defensoria Pública, o Ministério Público, o procurador-geral Rodrigo Janot, a OAB, as universidades, diversas ONGs e a maioria da imprensa – justamente as instituições que deveriam ser as primeiras a defender, com vigor, a liberdade de expressão. Ao perseguirem Levy Fidelix, essas instituições, ainda que involuntariamente, não estão agindo de modo republicano e não percebem que, num debate político, o eleitor só tem a ganhar com a máxima transparência dos debatedores. Por isso, todo candidato deve ter plena liberdade para dizer o que pensa numa campanha eleitoral – afinal, é um risco para a sociedade se ele sair do armário ideológico somente depois de eleito.