4 Comissão Especial da Reforma Política e seu relatório final
Após as jornadas de luta de 2013, diversas propostas de PEC e reformas eleitorais foram feitas tanto no Senado, quanto na Câmara. As propostas tratavam de diversos temas como o fim da reeleição, mudança no sistema de indicação de suplentes, coincidência das eleições e mais diversos temas que se relacionam com a reforma política. Para sintetizar todas estas propostas, foi criada uma Comissão Especial na Câmara dos Deputados, para que esta realizasse a produção de uma proposta substitutiva, que aglutinasse e sintetizasse todas as propostas em uma única reforma.
A comissão, em seu relatório final[13], relatado pelo Deputado Marcelo Castro (PMDB-PI), prevê que será posto fim à possibilidade de reeleição para os cargos executivos, alterando o tempo dos mandatos para 5 (cinco) anos. O texto apresentado ainda muda a fórmula da eleição dos senadores, que não mais teriam suplentes inscritos na mesma chapa, ficando eleito o candidato com mais votos, tendo como suplentes em ordem de votação os candidatos que foram derrotados no pleito.
Mas um dos pontos mais importantes do texto apresentado é a coincidência das eleições. Neste ponto é dito que a partir das eleições de 2018, as eleições municipais, estaduais, distritais e a eleição federal serão realizadas ao mesmo tempo. Ora, o principal argumento para esta possibilidade esdrúxula é que este modelo iria baratear as eleições, já que o TSE não mais realizaria eleições a cada dois anos.
Esta é uma mudança inconcebível. Uma mudança deste porte afastaria definitivamente o eleitorado dos partidos políticos, sem as eleições a cada dois anos, criaríamos direções ainda mais fortes, que se afastariam das suas bases eleitorais e somente se aproximariam dos eleitores a cada cinco anos para pedir votos aos candidatos, haja visto que o texto altera os mandatos para 5 (cinco) anos.
Se é preciso aproximar o partido do povo, dos seus eleitores, não é admissível uma mudança como esta. É preciso sim baratear as eleições e o processo eleitoral, mas é inviável e impensável que a participação do eleitor, a proximidade das bases eleitorais seja quebrada de tal forma a simplesmente inexistir contato com a vivência partidária.
Mesmo que tenha sido aprovado o relatório da Comissão Especial de Reforma do Sistema Eleitoral em 2015, fora criada neste ano[14] uma nova comissão especial, com o mesmo tema, para que esta realize nova proposta e envie para a câmara para aprovação urgente. O presidente da Câmara, o Deputado Rodrigo Maia (DEM/RJ) é defensor de mudanças mais radicais e acredita que, com o fim do financiamento privado de campanha, é preciso enxugar as campanhas e adotar no país um sistema de eleição por lista fechada, onde o partido indicaria os candidatos em uma lista pré-ordenada, e o eleitor, que durante anos foi induzido a acreditar que todos os partidos são iguais, não mais votaria nos candidatos, votaria apenas nas legendas.
De acordo com o Presidente da Câmara, “Você faz eleição por estado. Ao invés de fazer 70 campanhas para deputado federal no estado do Rio de Janeiro, vai fazer uma”. Acreditamos que o tema já nasce vencido em um congresso extremamente personalista, que durante anos tentou se desanexar da imagem dos partidos, valorizando apenas a imagem pessoal dos candidatos. O sistema proposto não seria de todo ruim, acreditamos que o sistema seria positivo em uma democracia mais plena, num país onde a educação seja mais valorizada e que os jovens desde cedo sejam incentivados a participar da vida política do país, mas no nosso atual cenário é possível que este modelo crie ainda maiores distorções, e fortaleça apenas meia dúzia de partidos e não permita a pluralidade de ideias nos espaços legislativos.
Assim, teremos em breve um novo relatório aprovado, debatendo na Câmara a reforma do sistema político-eleitoral brasileiro, mas que não modificará as bases do sistema como sugerimos neste trabalho. Até o momento, são mudanças sugeridas para que não se ‘mexa no time que está ganhando’ e não efetivamente buscando alterar o sistema.
5 Conclusão
Ao fim deste trabalho de pesquisa chegamos à conclusão de que urge uma reforma política e uma ampla reforma do sistema eleitoral brasileiro, mas, como salienta Amorim Neto (2011):
“é preciso prosseguir neste processo de revisão permanente do nosso sistema eleitorial-partidário, não com uma grande reforma que reconstrua todo o ‘edifiício a partir da estaca zero’, mas, sim, por meio de medidas pontuais, cirúrgicas e refletidas.”
Apresentamos uma proposta clara de reformulação do nosso sistema de eleição para os cargos legislativos em âmbito federal e estadual, com o fim do voto proporcional em todas as instâncias, aderindo à tese máxima de que os mais votados são mais merecedores do que os que são ‘carregados’ como nos casos do ‘efeito Tiririca’, apresentado na página 12. Em nosso modelo proposto, as unidades federativas deixariam de ser os colégios eleitorais para as eleições de deputados e passaríamos a adotar o sistema de eleição por distritos, estes respeitariam os limites estaduais para não interferir nas eleições para as respectivas Assembleias Legislativas. Como modelo da divisão dos distritos, adotaríamos a divisão criada pelo IBGE, as mesorregiões, o que pouparia significativamente tempo e recursos para pesquisas e divisão das regiões.
Neste sistema proposto, cada distrito elegeria um determinado número de deputados, sendo 2 (dois) o menor número de deputados por distrito e 21 (vinte e um) o número limite. Estes deputados, eleitos por voto direto e em lista aberta, ocupariam os seus cargos nas respectivas casas legislativas, mas, ao invés de responderem pelo eleitorado de todo o estado, responderiam aos do seu distrito de origem, aproximando o deputado do eleitor.
Essa adoção reduziria o número de deputados em uma série de estados e aumentaria o número em outros, mas, como levaria em consideração o número de habitantes no distrito para realizar a sua divisão, se mostraria válido e muito próximo do modelo atual.
Como dito anteriormente, realizar uma análise de uma reforma política a ser implementada no Brasil, sem levar em consideração um novo pacto para os partidos políticos, é não avançar em mudanças substanciais de nosso sistema de representação. Os partidos são a estrutura base da formação política do estado e sem eles nenhum cidadão poderá concorrer a cargo eletivo, como prevê a Constituição Federal de 1988. Sendo assim, algumas mudanças são fundamentais.
A redução do número de partidos e a criação de barreiras para que partidos existentes venham a se dividir, ampliando assim o número de legendas, é necessária para que o país possa se fortalecer enquanto democracia plena. Nenhum governante atinge maioria das casas legislativas sem realizar acordos com partidos pequenos e com ideologias muito pouco definidas, o que acaba por criar um cenário frágil e de difícil controle, possibilitando ainda o surgimento de acordos espúrios e duvidosos.
Um outro fator importante da reforma proposta, que já está em curso no Senado Federal, é a criação das Federações Partidárias e o fim das Coligações. Estes dois mecanismos tendem a fortalecer a construção democrática das gestões, uma vez que alianças deixariam de ser formadas de forma pragmática, visando apenas se estabelecer no poder, dando em troca tempo de TV e participação nos fundos de campanha, e passariam a ser construídas pensando a longo prazo, tendo como base para a construção os programas partidários e as ideologias dos partidos. Estas mudanças também fomentariam a criação de cláusula de barreiras, já discutidas no Brasil em outros momentos, mas declarada inconstitucional em 2004. Esta cláusula de desempenho, mesmo que chamada de antidemocrática pelos partidos tidos como progressistas, os beneficiaria, já que impediria o surgimento de partidos de aluguel e legendas fantasmas.
Ainda no sentido de ampliar a democracia interna dos partidos é preciso que sejam construídas as prévias eleitorais, realizadas aqui em convenções convocadas pelos partidos e federações, que, convocados todos os seus filiados dentro da circunscrição, votariam nominalmente nos membros entre os seus, para que os mais votados sejam os candidatos nos próximos pleitos. Esta fórmula de prévias realizadas obrigatoriamente beneficiaria os partidos e seus membros, impedindo que pequenos grupos decidam o destino dos partidos sem consulta de sua base partidária e impediria o nascimento ou continuidade de ‘oligarquias’ dentro de legendas, principalmente em regiões mais descentralizadas e municípios menores.
O trabalho apresentado, por fim, realiza uma análise do atual estado da comissão de reforma política, que foi recriada na Câmara dos Deputados, mesmo após a aprovação de seu relatório. Novos pontos foram inseridos no atual projeto e, agora, passa por relatoria do Deputado Lúcio Viera Lima (PMDB/BA).
Diante de tais fatos apresentados, a conclusão que chegamos é de que é preciso avançar na reforma política de nosso sistema, mas, acima de tudo, essa reforma precisa atender a alguns pontos fundamentais: ampliar a democracia representativa; impedir o surgimento de novas legendas de aluguel e coibir a prática já enraizada em nossa cultura política; ampliar a democracia interna dos partidos e realizar prévias para todos os cargos; e rever o sistema de eleição proporcional, impedindo que o coeficiente eleitoral continue a ser um empecilho para a representação plena e qualificada do eleitorado.
Por fim, acreditamos que, acima de tudo, é preciso preservar o Estado de Direito e impedir que a democracia seja colocada em risco. Para isso, precisamos construir mecanismos mais elaborados de combate à corrupção, de controle social, além de controles eleitorais mais ricos e plenos e que garantam a preservação do resultado das eleições e que este reflita sempre a vontade da maioria do povo brasileiro.
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Notas
[1] http://politica.estadao.com.br/blogs/legis-ativo/sobre-a-crise-da-representacao-politica/
[2] Fonte: http://www.tse.jus.br/partidos/partidos-politicos em 11/07/2016
[3] Fonte: http://www.tse.jus.br/partidos/partidos-politicos/partido-em-formacao em 10/10/2016
[4] https://pt.wikipedia.org/wiki/Protestos_no_Brasil_em_2013
[5] A cláusula de barreira também pode ser denominada de cláusula de desempenho e cláusula de exclusão, dependo da linha política do interlocutor.
[6] In RAMAYANA, 2011, p. 143
[7] Mesorregiões http://www.ibge.gov.br/home/geociencias/geografia/default_div_int.shtm?c=1
[8] Número de habitantes de acordo com o CENSO 2010 / IBGE
[9] http://brasil.elpais.com/brasil/2016/05/19/politica/1463611184_292207.html em 10/10/16
[10] Como visto anteriormente em citação de Dallari e Amorim Neto.
[11] http://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2016/05/16/partidos-ainda-negociam-presidencia-da-comissao-de-orcamento
[12] http://politica.estadao.com.br/blogs/legis-ativo/uma-federacao-para7-os-partidos/
[13] http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/POLITICA/487803-RELATORIO-FINAL-DA-REFORMA-POLITICA-INCLUI-DISTRITAO-E-SISTEMA-MISTO-DE-FINANCIAMENTO-DE-CAMPANHAS.html
[14] http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/POLITICA/518129-COMISSAO-ESPECIAL-DA-REFORMA-POLITICA-SERA-INSTALADA-NA-TERCA-FEIRA.html