Capa da publicação Funrural na cadeia frigorífica: visão inadequada do STF
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Artigo Destaque dos editores

O problema do Funrural na cadeia frigorífica.

A visão inadequada do Supremo sobre o tema e os problemas jurídicos dessa decisão

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2. NECESSIDADE LEI. FATO GERADOR. ATO EMANADO DO EXECUTIVO.

A Lei 8.212/91 com todas as alterações já tratadas, dentre todas as discussões já levantadas, não se pode deixar de analisar, ainda, a necessidade de previsão normativa do fato gerador da obrigação tributária.

O fato gerador é elemento essencial de construção da regra-matriz de incidência do tributo. Na melhor doutrina, é caracterizado pela concretização do arquétipo legal, por meio da subsunção, adaptação do fato ao modelo ou paradigma legal.

Nessa linha, a lei 8.212 não determina o fato gerador da obrigação tributária. Este elemento está descrito em textos normativos emanados do Poder Executivo, como bem salienta o Ministro Eros Grau, em julgamento do RE 363.852, afirmando “que não se pode admitir visto que excede os limites da função regulamentar que lhe fora conferida pela lei”.

Nesse sentido, a INSTRUÇÃO NORMATIVA MPS/SRP Nº 3, revogada pela INSTRUÇÃO NORMATIVA RFB Nº 971, DE 13 DE NOVEMBRO DE 2009 trazem a definição do fato gerador da contribuição social para o fundo de assistência ao trabalhador rural.

Cristalino que em matéria tributária deve prevalecer a legalidade absoluta, não prestando o executivo a legislar em matéria tributária, sob pena de exceder os limites da função regulamentar conferida pelo Código Tributário Nacional e Constituição Federal. Em nenhum preceito da lei 8.212/91 autoriza o Poder executivo a determinar, o exercício da função regulamentar. Nos termos dos arts. 114 e 97, III do Código Tributário, este estabelece que somente a lei pode fixar fato gerador de tributo.


3. DA REVERSÃO DE MEDIDA LIMINAR. RESPONSABILIDADE.

Diante do caso, necessário discutir a responsabilidade do substituto tributário pelo recolhimento da contribuição previdenciária que deixou de ser efetuado por conta de decisão judicial posteriormente cassada.

Cinja-se que, no caso em apreço, muitos frigoríficos estavam em posse de decisões que os permitiam deixar de recolher e repassar o percentual do Funrural ao órgão fazendário, em caráter liminar. Contudo, continuavam obrigados pelas obrigações acessórias, preenchimento da GFIP e escrituração, estando apenas suspensa a exigibilidade de crédito tributário.

Na linha da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, as decisões judiciais liminares deferidas e mais tarde revogadas, não obrigam o substituto tributário, pois não foi este que se beneficiou com a medida judicial. (Precedentes REsp 767.928/RS; Resp 887.585/RS; AgRg REsp 1.156.071/RS).

No sistema jurídico, o risco da reposição do status quo ante, em caso de cumprimento de liminares ou sentenças posteriormente modificadas, revogadas ou anuladas, é da parte que se beneficia da medida.

O tributo é indevido pelo frigorifico no caso, não por ser o responsável por absorver a incidência econômica do tributo é o contribuinte, mas, porquanto em sendo o regime da substituição tributária, técnica de arrecadação, nas hipóteses em que um dos dados que a integram não se realiza na operação promovida pelo substituído, deve o Fisco buscar a diferença junto ao substituído. Com efeito, cobrando o valor que não fora recolhido do substituto, está considerando como sujeito passivo quem não é contribuinte do tributo.

Volto a frisar, responsável pelo tributo é aquele que sofre decréscimo de seu patrimônio pela imposição da norma, atribuindo a este a sujeição passiva.

A norma primaria elegeu o empregador rural como contribuinte do tributo, aquele que sofre a incidência da relação jurídica tributária, com a redução patrimonial. Já a norma derivada, com vistas a facilitar o recolhimento do tributo pelo fisco, por conveniência, estabeleceu a responsabilidade do substituto, frigorifico, para reter e repassar parte do patrimônio daquele, em flagrante obrigação acessória. 

A obrigação principal é aquela que consiste em pagar ou dar tributo, já a acessória em obrigação de fazer ou não fazer. Se interpretarmos que o substituto seria responsável pelo pagamento do tributo, com absorção do decréscimo patrimonial estaríamos subvertendo a norma e criando uma nova hipótese de incidência jurídico tributária. Cinja-se que a substituição tributária atua somente como instrumento para facilitar a fiscalização e arrecadação, não prestando a transferir a sujeição passiva de incidência da norma tributária.

In casu, o substituto (frigorífico) deixou de recolher a contribuição social ao Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural sem nenhuma culpa ou dolo. Houve uma decisão judicial, em algumas vezes requerida pelo substituído (produtor) outras, pelo próprio substituto (frigorífico), que afastou a possibilidade de retenção e recolhimento do tributo na sistemática.

Não se mostra crível exigir o tributo do substituto, conforme salienta o Ministro Herman Benjamin, relator do Recurso Especial nº 887.585/RS, em julgamento de caso análogo ao presente, que não tem mais como repassar o ônus correspondente ao contribuinte (produtor rural). Ou seja, exigir a contribuição do substituto (frigorífico) é subverter o princípio da capacidade contributiva, exonerando o contribuinte do imposto por ele devido e onerando exclusivamente o responsável tributário.

Nessa mesma linha, o Ministro Teori Zavascki já se manifestou no Recurso Especial de nº 767.928/RS, ao assinalar a sistemática da substituição tributária e medida judicial de suspensão de recolhimento por parte do substituto:

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No regime da substituição tributária, que nada mais é do que um peculiar mecanismo de arrecadação do tributo, a substituta atua como intermediária entre a substituída e o fisco, atuação que, todavia, está prevista para ocorrer antecipadamente, em um determinado momento no tempo, quando se viabiliza a retenção e recolhimento do valor com atribuição do ônus financeiro à substituída. No caso, esse cenário foi alterado por decisão judicial, inibindo que a atuação da substituta ocorresse no tempo e no modo estabelecidos pela lei. Sinale-se que não foi ela quem requereu a medida judicial, nem há noticia de que tenha se beneficiado ou agido de má-fé ou em conluio com a parte autora.

Assim, a questão posta contende a existência de responsabilidade ou não do substituto que de cumprimento a decisões judiciais. Portanto, nos termos da jurisprudência pátria, o risco de reposição do status quo ante no caso das medidas liminares é da parte que requer e se beneficia da medida, nos termos dos arts. 297 e 520 do Código de Processo Civil.

Neste sentido inclusive, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça “firmou entendimento de que os provimentos judiciais liminares deferidos e mais tarde revogados em demandas propostas pela substituída tributária não obriga a substituta, pois não foi esta quem se beneficiou da medida judicial”. (REsp nº 1.156.071/RS)

Suprimida a decisão judicial, deve ocorrer o restabelecimento da obrigação exclusivamente para o contribuinte, aquele que tem relação pessoal e direta com o fato gerador, nos termos do art. 121, I do CTN, ou seja, aquele que demonstra capacidade contributiva à luz do tributo exigido.

Dessa forma, com o presente artigo, pretendeu-se contribuir para aqueles que farão as defesas dos Frigoríficos de nosso país, garantindo que haja legalidade no trato da questão, permitindo até mesmo a sobrevivência financeira dos mesmo, pois a atuação fiscal desarrazoada poderá ensejar sérios problemas econômicos para empresas, colaboradores e, enfim, à toda comunidade.


Nota

[1] “ Art. 25. A contribuição da pessoa física e do segurado especial referidos, respectivamente, na alínea a do inciso V e no inciso VII do art. 12 desta lei, destinada à Seguridade Social, é de:

I – dois por cento da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção;

II – um décimo por cento da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção para o financiamento de complementação das prestações por acidente de trabalho.”

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Sobre os autores
Dartagnan Limberger Costa

Advogado militante nas áreas de Direito Empresarial, Tributário e Contratos. Contador. Foi professor de Graduação nas áreas de Direito Empresarial, Direito Civil e Falimentar. Graduação e Mestrado em Direito (UNISC) Graduação em Ciências Contábeis (UNINTER) MBA em Direito da Economia e da Empresa (Fundação Getúlio Vargas) Pós Graduado em Direito Empresarial do Trabalho pela Universidade Cidade de São Paulo Pós Graduado em Direito Tributário pela Universidade Cândido Mendes Pós Graduado em Direito Penal com fulcro em Direito Econômico pela Verbo Jurídico Pós Graduado em Contabilidade, Auditoria e Controladoria (UNINTER)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COSTA, Dartagnan Limberger ; KANITZ, Valter Ernesto. O problema do Funrural na cadeia frigorífica.: A visão inadequada do Supremo sobre o tema e os problemas jurídicos dessa decisão. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5062, 11 mai. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/57695. Acesso em: 22 nov. 2024.

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