As audiências públicas surgiram no Brasil influenciadas pela possibilidade da análise de fatos no controle abstrato de constitucionalidade.
Apesar de o STF entender que no controle concentrado de constitucionalidade não se admite dilação probatória e o exame dos fatos controversos, acaba por analisar (inclusive revisando) fatos considerados pelo legislador na elaboração das normas.
A Lei nº 9.868/99 (que regulamenta o processo da ação direta de inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade no STF) admite expressamente a análise de fatos, por meio do auxílio de pessoas que não são partes no processo. Assim, dispõe em seus arts. 9º e 20, de semelhante teor:
"Art. 9º. Vencidos os prazos do artigo anterior, o relator lançará o relatório, com cópia a todos os Ministros, e pedirá dia para julgamento.
§ 1o Em caso de necessidade de esclarecimento de matéria ou circunstância de fato ou de notória insuficiência das informações existentes nos autos, poderá o relator requisitar informações adicionais, designar perito ou comissão de peritos para que emita parecer sobre a questão, ou fixar data para, em audiência pública, ouvir depoimentos de pessoas com experiência e autoridade na matéria.
§ 2o O relator poderá, ainda, solicitar informações aos Tribunais Superiores, aos Tribunais federais e aos Tribunais estaduais acerca da aplicação da norma impugnada no âmbito de sua jurisdição.
§ 3o As informações, perícias e audiências a que se referem os parágrafos anteriores serão realizadas no prazo de trinta dias, contado da solicitação do relator".
Da mesma forma, no art. 6º, § 1º, da Lei nº 9.882/99 (sobre a arguição de descumprimento de preceito fundamental):
"Art. 6º Apreciado o pedido de liminar, o relator solicitará as informações às autoridades responsáveis pela prática do ato questionado, no prazo de dez dias.
§ 1º Se entender necessário, poderá o relator ouvir as partes nos processos que ensejaram a arguição, requisitar informações adicionais, designar perito ou comissão de peritos para que emita parecer sobre a questão, ou ainda, fixar data para declarações, em audiência pública, de pessoas com experiência e autoridade na matéria".
As audiências públicas constituem o principal (mas não o único) instrumento utilizado para a apuração e a elucidação de fatos no controle concentrado de constitucionalidade pelo STF.
No novo CPC, as audiências públicas são previstas como um instrumento de concretização do contraditório ampliado nos precedentes, a fim de assegurar a participação da sociedade na formação e, também, na sua superação.
O art. 927, § 2º, do CPC/2015, dispõe que “a alteração de tese jurídica adotada em enunciado de súmula ou em julgamento de casos repetitivos poderá ser precedida de audiências públicas e da participação de pessoas, órgãos ou entidades que possam contribuir para a rediscussão da tese”.
Nos termos do art. 983, § 1º, do CPC/2015, que trata do incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR), “para instruir o incidente, o relator poderá designar data para, em audiência pública, ouvir depoimentos de pessoas com experiência e conhecimento na matéria”.
Ainda, no procedimento dos recursos especiais e extraordinários repetitivos, o art. 1.038, II, do novo CPC, confere ao relator o poder-dever de “fixar data para, em audiência pública, ouvir depoimentos de pessoas com experiência e conhecimento na matéria, com a finalidade de instruir o procedimento”.
Em todas as normas, destaca-se que a realização das audiências públicas é uma faculdade do tribunal ou do relator, ou seja, elas são designadas especialmente no interesse da Corte, mas com o objetivo de ampliar a publicidade e o contraditório, além de qualificar a fundamentação da decisão (que será aplicada a todos os outros casos semelhantes).
Com base nessas novas regras, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região realizou sua primeira audiência pública no dia 02 de junho de 2017, para instruir o seu IRDR nº 5. O incidente, afetado pela 3ª Seção em 15/12/2016, trata da possibilidade – ou não – da extensão do adicional de 25%, previsto no art. 45 da Lei nº 8.213/91, apenas para a aposentadoria por invalidez, para as outras espécies de aposentadoria (por idade, por tempo de contribuição e especial), a pensão por morte e ao benefício de prestação continuada da Assistência Social.
Na audiência pública, a Corte ouviu treze entidades, que, por seus representantes, puderam expor sua posição sobre o tema durante 15 minutos cada uma: a Defensoria Pública da União; a Procuradoria Regional da República da 4ª Região; a Ordem dos Advogados do Brasil; o Asilo Padre Cacique; o Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário; a Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia; a Associação Nacional dos Médicos Peritos da Previdência Social; a Associação Médica Brasileira; a Associação Nacional dos Aposentados e Pensionistas da Previdência Social; o Conselho Federal de Serviço Social; a Faculdade de Medicina da UFRGS; o Conselho Federal de Enfermagem e a Associação Médica do Rio Grande do Sul.
As audiências públicas consistem em um importante instrumento de ampliação do contraditório e da publicidade processual, além de qualificar a fundamentação da decisão judicial, ao permitir a participação (e a colaboração) processual direta de pessoas com conhecimento especializado (e não necessariamente jurídico) acerca do tema controvertido.
A adoção de audiências públicas como uma etapa da formação do precedente não só confere maior legitimidade à decisão judicial, mas a qualifica, auxilia o órgão julgador a levar em consideração e a fundamentar o precedente do modo mais amplo, para que compreenda todos (ou a maior quantidade possível conhecida no momento) os argumentos e fundamentos necessários para a resolução da questão de direito controvertida.