Manutenção do desacato como crime

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Fim da controvérsia, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que a conduta tipificada como desacato a funcionário público é objeto de tutela penal e coloca uma pedra, por ora, sobre a discussão acerca da sua descriminalização.

Sumário: Introdução. Desenvolvimento. Conclusão.

INTRODUÇÃO

Em sessão recente, o pretório julgou o HC 379269/MS que contestava a criminalização do desacato, sustentando que a rubrica do tipo restringe o direito fundamental à liberdade de expressão e pensamento, abarcadas em nossa carta constitucional e tratados ratificados. A 3ª Turma do referido tribunal, por maioria dos votos, reconheceu o caráter criminoso do comportamento de proferir ofensas aos servidores, tendo deste modo, o colegiado confirmado a tutela penal já prevista no diploma criminal.  

Ao longo do julgado, os desembargadores que compunham a seção sustentaram suas teses, em sentido favorável a criminalização da atitude, como forma de garantir maior proteção ao servidor do Estado. Embora decidido por maioria dos votos, alguns votos ganham atenção por suas fundamentações.

O relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca e o Ministro Ribeiro Dantas, ambos votos vencidos, sustentaram suas teses em favor da descriminalização. Reynaldo socorrendo-se no princípio da Liberdade de expressão presente no artigo 5º, IV e IX da Constituição Federal, sustentando resumidamente, o Brasil ao ser signatário do Pacto de San José da Costa Rica, mantendo a tipificação do crime de desacato, violaria fortemente a liberdade de expressão, como direito fundamental, devendo os excessos praticados pelos particulares frente aos que servem o Estado, serem tratados e punidos dentro de outros tipos penais, entre eles os crimes de injuria e difamação. Dantas, seguindo o voto do relator, sustentou que a tutela penal da ação de desacatar serve como blindagem aqueles cometedores de abusos em suas funções, considerando desta forma, qualquer crítica ou ideia negativa como ofensa a sua honra. 

DESENVOLVIMENTO

O voto vencedor proferido pelo ministro Antonio Saldanha Palheiro assente ao tutelar o desacato como infração é uma salvaguarda complementar aos trabalhadores estatais. Salientou ainda, não haver qualquer vedação ao direito à liberdade de expressão assegurado em pactos internacionais, uma vez que o tipo penal prevendo o delito de desacato não proíbe qualquer manifestação por parte dos cidadãos, apenas determina a responsabilidade penal que estes venham a suportar na ocorrência de manifestações e firam os limites éticos de sociabilidade e boa educação para com seus pares, por ora servidores do Estado.

Ao nosso sentir, parece acertado o posicionamento, em razão da liberdade de expressão e pensamento avocada na questão, não podem ser confundidas com destemperança e falta de respeito. Aliás, o próprio mandamento pátrio, fonte formal imediata do direito penal, protege a intimidade, a vida privada, a honra e imagem das pessoas, e a lei punirá qualquer discriminação atentória aos direitos e liberdades fundamentais.  E o servidor no exercício da função ou em razão dela não merece respeito, assim como já garantido para o cidadão quem tem a honra ofendida? Isso sim, é tutelar a desigualdade e ir na contramão do razoável, em detrimento da função pública e secundariamente o funcionário público.

Em apertada síntese, o desacato consiste em proceder de forma grosseira, ofender, xingar, desprestigiar o funcionário público, no exercício da função ou em razão dela. É de ação penal pública incondicionada e tida como de menor potencial ofensivo, tramitando pelo rito do juizado especial criminal. O bem tutelado aqui primariamente é a deferência pela da função pública e secundariamente a honra do funcionário, enquanto representante do estado. Partindo dessas pontuações, foi reformado um latente equívoco, com todas as vênias aos defensores de tese em contrário, pois o desacato extrapola a defesa da honra e engloba o respeito a gestão do estado, tanto que figura entre os crimes cometidos por particular contra a administração pública.

Nenhum cidadão é impedido de fazer questionamentos quanto ato ou conduta, seja verbal ou por escrito, sendo de igual forma garantido a todos o direito de petição ao poder público em defesa de direitos, contra ilegalidade ou abuso de poder. Mas o que levam as pessoas a acharem que podem desrespeitá-los?

Dentre os ramos da atividade estatal, o grupo mais vitimizado com o contrassenso do desacato são os da área policial. A ignóbil ideia de por serem contribuintes dos impostos e estes ajudarem a custearem os seus salários, podem exercer uma falsa tutela e puni-lo por desídia, excesso de rigor ou pelo simples inconformismo com seus atos e decisões, ferindo seu decoro e prestígio com insultos, humilhações e chegando por vezes em vias de fato, extrapolando o exercício do questionamento ou crítica.  

CONCLUSÃO

 Observa-se, não raramente, o funcionário ser hostilizado das mais variadas formas que se possa imaginar, desde críticas maldosas ao seu trabalho a ofensas utilizando palavras de baixo calão. Muito desse comportamento reflete ao mau exemplo que alguns dos agentes públicos dão, diga-se de passagem, a minoria, ao figurem em escândalos de corrupção, improbidade administrativa ou abuso de poder. 

A título exemplificativo, muito se vê pelas ruas policiais sendo hostilizados e às vezes até agredidos por civis durante seu expediente de trabalho. A população brasileira confunde de forma exacerbada a expressão de críticas negativas às de cunho construtivo, com a errônea idealização de que são capazes de melhorar o desenvolvimento da atividade estatal, com a utilização de xingamentos e expressões pejorativas de forma a ferir aquele que se dedica a causa pública, zela pela ordem e proteção da sociedade. 

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm Acesso em 31 de maio de 2017.

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Processo HC nº 379269 / MS (2016/0303542-3) autuado em 16/11/2016. Disponível em: http://www.stj.jus.br/sites/STJ/default/pt_BR/Comunica%C3%A7%C3%A3o/noticias/Not%C3%ADcias/Terceira-Se%C3%A7%C3%A3o-define-que-desacato-continua-a-ser-crime Acesso em 31 de maio de 2017.

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Sobre o autor
Rafaelle Jhonathas de Sousa Guimarães

Pós-Graduado em Direito Penal. Bacharel em Direito pela Universidade Paulista com aprovação no XIX Exame de Ordem Unificado. Servidor Público desde 2005, atualmente é Policial Civil do Estado de São Paulo desenvolvendo suas atividades junto ao Centro de Operações Integradas. Realizou diversos cursos de especialização pela Academia de Polícia Civil de São Paulo- ACADEPOL, Ministério da Aeronáutica, Ministério da Justiça-SENASP, Escola Paulista da Magistratura de São Paulo e outras instituições coirmãs. Postulante ao cargo de Delegado de Polícia.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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