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Provérbios 29.15 e a Lei da Palmada

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4 LIBERDADE RELIGIOSA

Sobre liberdade religiosa, o art. 10 da “Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789”, aduz que “ Ninguém pode ser molestado por suas opiniões, incluindo opiniões religiosas, desde que sua manifestação não perturbe a ordem pública estabelecida pela lei” (UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO, 2017, p. 1).

Na mesma linha, o art. 18 da “Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948” determina que:

Todo ser humano tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião; este direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e a liberdade de manifestar essa religião ou crença, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pela observância, isolada ou coletivamente, em público ou em particular (UNESCO, 1948, p. 4)

O direito à liberdade religiosa é uma condição inata ao homem e, nas palavras de Ferreira, apud OLIVEIRA, liberdade religiosa é “o direito que tem o homem de adorar a seu Deus, de acordo com sua crença e seu culto" (2011, p. 01). Silva (2015) acrescenta que na liberdade de crença entra a liberdade de escolha da religião, a liberdade de aderir a qualquer seita religiosa, a liberdade (ou o direito) de mudar de religião, mas também compreende a liberdade de não aderir a religião alguma.

Desta forma, pode-se dizer que liberdade de religiosa é o direito que todo indivíduo possui de adorar o seu Deus, conforme sua crença e culto a fim de garantir a salvação. O indivíduo pode permanecer em uma religião, ou mudar, não podendo ter algum tipo de óbice para exercer tal escolha.

Neste ponto é importante destacar, que o Estado Brasileiro é laico, sendo-lhe vedado favorecer ou desfavorecer qualquer religião e sua prática, conforme art. 19 da CF:

Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público;

II - recusar fé aos documentos públicos;

III - criar distinções entre brasileiros ou preferências entre si.

Isso não significa, por outro lado, que o Estado Brasileiro deve se manter alheio quanto a proteção do direito de liberdade religiosa, pelo contrário, como principal provedor das tutelas constitucionais, deve garantir a todos o direito de confessar, ou não, alguma religião, como MENDES e BRANCO, afirmam “O Estado brasileiro não é confessional, mas tampouco é ateu, como se deduz do preâmbulo da Constituição, que invoca a proteção de Deus” (2015, p. 317).

A liberdade religiosa é de vital importância, que abrange, inclusive, o âmbito tributário. Desta forma, o art. 150, VI, b da CF determina que:

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...)

VI - instituir impostos sobre:

b) templos de qualquer culto; (...)

Ao comentar esse texto constitucional, Sabbag (2010), adverte que o fato de sermos um Estado laico não significa que deixamos de ser “teístas”. Como se sabe, o Brasil é laico e teísta. É que o próprio “preâmbulo” do texto constitucional faz menção à “proteção de Deus” sobre os representantes do povo brasileiro, nossos legisladores constituintes, indicando que estes partiram da premissa de que um Ser Supremo existe, sem que isso significasse uma reaproximação do Estado com a Igreja, nem mesmo com uma específica religião, porquanto no decorrer de todo o texto fundamental o constituinte se mantém absolutamente equidistante, seguindo o princípio de neutralidade e garantindo o pluralismo religioso. Isto porque, o elemento teleológico que justifica a norma em comenta atrela-se à liberdade religiosa (art. 5º, VI ao VIII, CF) e à postura de neutralidade ou não identificação do Estado com qualquer religião (art. 19, I, CF), (2010, p. 318), posto que a liberdade religiosa significa que o cidadão poderá professar a fé, no culto e templo que lhe aprouverem, ou, ainda, não devotar preces a nenhuma religião, em livre escolha.

Desta forma, a Carta Constitucional Brasileira, seguindo o entendimento internacional de tutela dos direitos humanos (Declarações de 1789 e 1948), protege o direito fundamental de liberdade religiosa. No ordenamento jurídico pátrio, este direito refere-se ao poder de escolha de cada indivíduo de permanecer em uma religião ou não. O Estado Brasileiro, apesar de ser laico, deve tutelar esta liberdade fundamental, um dos exemplos na Constituição Federal é a “imunidade religiosa”, no âmbito tributário.


5 TUTELA CONSTITUCIONAL DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

O art. 227 da Constituição Federal é a base constitucional e, consequentemente, de todo ordenamento jurídico pátrio, para a proteção dos direitos da criança e do adolescente. Eis o texto do caput deste artigo:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Comentando o art. 227 da Constituição Federal, SILVA esclarece que ele é “por si só, uma carta de direitos fundamentais da criança e do adolescente” (2009, p. 856). De fato, a Constituição Federal, houver por bem e melhor técnica legislativa, destacar à proteção da criança e adolescente.

O art. 226 da Constituição Federal trata da atuação do Estado na proteção da família, ao determinar que “A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado”. A partir desta determinação, a Carta Magna aduz, no § 1º do art. 227 da Constituição Federal que “§ 1º O Estado promoverá programas de assistência integral à saúde da criança, do adolescente e do jovem, admitida a participação de entidades não governamentais, mediante políticas específicas”, importante destacar que Cury (2006) obtempera que são igualmente responsáveis pela criança a família, a sociedade, e o Estado, não cabendo a qualquer dessas entidades assumir com exclusividade as tarefas, nem ficando alguma delas isenta de responsabilidade.

O próprio art. 6º da Constituição Federal, que fala da proteção aos direitos sociais, chancela a ideia de proteção à criança e adolescente, quando prescreve que “Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”.

Ao analisar detidamente o art. 6º da Constituição Federal, constata-se a presença de direitos atinentes à proteção da criança e do adolescente: educação, saúde, alimentação, moradia, transporte, lazer, segurança, proteção à maternidade e à infância e é por este motivo, ou seja, a proteção à criança e adolescente, que os direitos dos infantes não se limitam ao texto do art. 227 Constituição Federal, como adverte Silva (2009) ao afirmar que esses direitos especificados no art. 227 da Constituição Federal não significam que as demais previsões constitucionais dos direitos fundamentais não se lhes apliquem.

Sobre o tema, o Recurso Extraordinário 482.611, que teve como relator o Ministro Celso de Mello, explicitou o entendimento da Corte Constitucional, no tocante à proteção dada pela Constituição Federal à criança e adolescente:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 482.611 SANTA CATARINA. RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO

EMENTA: Crianças e Adolescentes vítimas de abuso e/ou exploração sexual. Dever de proteção integral à infância e à juventude. Obrigação constitucional que se impõe ao Poder Público. Programa Sentinela–Projeto acorde. Inexecução, pelo Município de Florianópolis/SC, de referido programa de ação social cujo adimplemento traduz exigência de ordem constitucional. Configuração, no caso, de típica hipótese de omissão inconstitucional imputável ao município. Desrespeito à constituição provocado por inércia estatal (RTJ 183/818-819). Comportamento que transgride a autoridade da lei fundamental (RTJ 185/794-796). Impossibilidade de invocação, pelo Poder Público, da cláusula da reserva do possível sempre que puder resultar, de sua aplicação, comprometimento do núcleo básico que qualifica o mínimo existencial (RTJ 200/191- -197). Caráter cogente e vinculante das normas constitucionais, inclusive daquelas de conteúdo programático, que veiculam diretrizes de políticas públicas. plena legitimidade jurídica do controle das omissões estatais pelo Poder Judiciário. A colmatação de omissões inconstitucionais como necessidade institucional fundada em comportamento afirmativo dos juízes e tribunais e de que resulta uma positiva criação jurisprudencial do direito. Precedentes do Supremo Tribunal Federal em tema de implementação de políticas públicas delineadas na Constituição da República (RTJ 174/687 – RTJ 175/1212-1213 – RTJ 199/1219- -1220). Recurso extraordinário do ministério público estadual conhecido e provido (STF- RE 482.611, Rel. Min. Celso de Mello, decisão monocrática, julgamento em 23.03.2010, DJE de 7-4-2010), (CONSULTA PROCESSUAL, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, 2010, p. 1, grifo nosso).

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O Ministro Celso de Melo, neste julgado, erige os direitos de proteção à criança e ao adolescente como “um dos direitos sociais mais expressivos, subsumindo-se à noção dos direitos de segunda geração” e se caso tais direitos não forem tutelados “restarão comprometidas a integridade e a eficácia da própria Constituição, por efeito de violação negativa do estatuto constitucional motivada por inaceitável inércia governamental no adimplemento de prestações positivas impostas ao Poder Público”.

Constata-se, portanto, que o sistema constitucional de proteção à criança e adolescente, determina que cabe tanto à família, sociedade e Estado, promover a proteção da criança e adolescente e que tal proteção é trata-se de um dogma constitucional de primeira grandeza.     


6 O ESTATUTO DA CRIANÇA E ADOLESCENTE (LEI 8.069/1990) E A PROTEÇÃO INTEGRAL

O Estatuto da Criança e Adolescente reafirma os direitos consagrados na Constituição Federal, no entanto, vai além, pois cria outros mecanismos de proteção a eles. Neste sentido Saab (2017) destaca que o Estatuto da Criança e do Adolescente, filiou-se ao sistema político-jurídico manifestamente tutelar consagrado pelo legislador da CF. Além de reproduzir os direitos fundamentais instituídos na Carta Maga à criança e ao adolescente e adotar a proteção integral como princípio norteador de suas disposições, o Estatuto legislou sobre os instrumentos necessários para o alcance desses direitos, assegurando-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades para seu desenvolvimento completo como pessoa humana (físico, mental, moral, espiritual e social), bem como enumerando alguns procedimentos indispensáveis para conferir efeito prático à garantia de prioridade formalizada pela CF.

O art. 1º do Estatuto da Criança e do Adolescente, como um arauto, deixou claro que o objetivo do referido estatuto é o de promover a proteção integral da criança e adolescente, ao aduzir que “dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente”.

Tal proteção veio como forma de mitigar a fragilidade e vulnerabilidade da criança e adolescente. Sobre proteção integral, Silva afirma que “entende-se por proteção integral a defesa, intransigente e prioritária, de todos os direitos da criança e do adolescente” (2000, p. 1).

Ainda sobre proteção integral, Ellen (2014) acrescenta que se refere a um conjunto de valores e princípios, em que se enxerga os direitos da criança e do adolescente, de maneira ampla, protetora e principalmente prioritária, visando sempre proteger a infância e a ingenuidade desses indivíduos em peculiar processo de desenvolvimento. A Doutrina da Proteção Integral, diferentemente da Doutrina da Situação Irregular, é abrangente, universal e exige pela primeira vez que crianças e adolescentes passem a ser considerados indivíduos titulares de direitos fundamentais, e o ordenamento jurídico pátrio passou a ter o Direito da Criança e do Adolescente, dirigido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, em substituição ao Direito do Menor, lei 6.697/79.

Seguindo a sistema do Estatuto da Criança e do Adolescente, no que concerne a proteção da criança e adolescente, seu art. 3º determina que:

Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.

Este artigo reafirma a busca do Estatuto da Criança e do Adolescente em tutelar os direitos da criança e adolescente e confirma a vontade do legislador em consagrar o princípio da proteção integral. Vale destacar que o Brasil é pactuante da Convenção sobre os direitos da criança – que tornou-se vigente no ordenamento jurídico pátrio, através do Decreto 99.710/1990 – e, em seu art. 3º, 1 e 2, prescreve que:

Artigo 3

1. Todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de bem estar social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente, o interesse maior da criança.

2. Os Estados Partes se comprometem a assegurar à criança a proteção e o cuidado que sejam necessários para seu bem-estar, levando em consideração os direitos e deveres de seus pais, tutores ou outras pessoas responsáveis por ela perante a lei e, com essa finalidade, tomarão todas as medidas legislativas e administrativas adequadas.

Importante destacar a preocupação dos entes internacionais em promover o “interesse maior da criança” nos atos dos órgãos públicos e privados, em suas diversas atuações e que o “bem-estar” da criança deva ser assegurado.

O Estatuto da Criança e do Adolescente, portanto, deixa claro que o objetivo do Estado é o de garantir total proteção, à criança e adolescente, seja no aspecto físico ou psicológico, ou seja, na busca de proteção integral. Pode-se perceber, que pelo menos no âmbito legislativo, o esforço do Estado em promover a proteção da criança e do adolescente é latente.

Cabe ainda neste tópico enfatizar que o Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu art. 2º, considera “criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade”.

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Sobre os autores
Adriano Brito Feitosa

Advogado, professor, palestrante, consultor jurídico e empresarial. Mestrando em Filosofia (UFBA); MBA (em andamento) em Marketing, Branding e Growth (PUC/RS); Especialização (em andamento) em Direito 4.0: Direito Digital, Proteção de dados e Cibersegurança (PUC/PR); Especialização (em andamento) em Gestão de Risco, Compliance e Auditoria (PUC/PR); Graduação (em andamento) em Ciências Contábeis; Especialista em Direito Constitucional. Especialista em Advocacia Trabalhista. Especialista em Relações Pessoais e Gestão de Conflitos. Especialista em Métodos de ensino e aprendizagem numa perspectiva andragógica. Bacharel em Direito. Bacharel em Teologia. Bacharel em Filosofia. Fui técnico judiciário no Tribunal de Justiça do estado de Rondônia, onde exerci a função gratificada de conciliador judicial. Fui estagiário de Direito nos seguintes órgãos: Tribunal de Justiça, Justiça Federal, Procuradoria Geral Estadual, Ministério Público Estadual e Ministério Público Federal. Fui estagiário de direito nos escritórios Enry Gouvea Advocacia e Carlos Alberto Trancoso Justo Advocacia. Fui estagiário administrativo no Ministério da Fazenda. Foi membro/colaborador do grupo de estudos "Fenomenologia e Hermenêutica", na Universidade Estadual de Feira de Santana, departamento de Filosofia, sob a orientação da Doutora Tatiane Boechat Abraham Zunino; Foi membro/colaborador do grupo de estudos "Nomisma, Riqueza e Valor: um estudo sobre o pensamento econômico de Aristóteles", na Universidade Estadual de Feira de Santana/BA, departamento de Filosofia, sob a orientação da Doutora Adriana Tabosa. Foi membro/colaborador do grupo de estudos "Pós-modernidade", no Seminário Latino Americano de Teologia da Bahia, sob a orientação do Doutor Daniel Lins; - Foi aluno especial do Mestrado em Ciências Sociais da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia.

Renato de Oliveira Macêdo

Bacharel em Teologia pelo Seminário Adventista Latino Americano de Teologia (SALT-IEANE). Licenciando em Pedagogia e Pós Graduando em Relações Pessoais e Gestão de Conflitos, pela Faculdade Adventista da Bahia (FADBA), Bahia.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FEITOSA, Adriano Brito ; MACÊDO, Renato Oliveira. Provérbios 29.15 e a Lei da Palmada. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5107, 25 jun. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/58567. Acesso em: 26 abr. 2024.

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