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Iniciativa popular e democracia participativa: entraves à construção de uma cidadania ativa

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07/12/2017 às 14:40
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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na democracia representativa tradicional, o povo, real detentor da soberania, delega seu poder aos representantes legitimamente eleitos, não havendo que se falar em participação direta dos cidadãos na tomada das decisões. No modelo democrático participativo, misto ou semidireto, por sua vez, o cidadão, diretamente, por meio de mecanismos específicos, sem a interferência de terceiros, exerce o poder em sua plenitude.

O incentivo e fortalecimento à democracia direta, em especial, à iniciativa popular, tem o condão de trazer o cidadão, o homem do povo, para o centro das discussões que envolvem os mais variados temas de interesse público.

Diversamente do que ocorre com o plebiscito e o referendo, que condicionam a participação popular à prévia provocação do Poder Legislativo, a iniciativa popular é uma modalidade de participação direta que permite ao povo agir “ex officio”, independentemente da vontade de terceiros. Nesse contexto, a democracia precisa ser enxergada como algo bem maior do que o mero ato de votar. Não se pode conceber uma democracia plena sem o efetivo exercício da cidadania.

Ser cidadão significa estar presente e fazer parte dos processos de tomada de decisões que englobem os anseios da coletividade. Significa fazer nascer dentro de cada homem e mulher a vontade de integrar o processo de tomada de decisões que passarão a interferir na vida de todos. Em suma, ser cidadão ativo representa participar da formação da vontade governativa.

Participação popular e democracia são conceitos indissolúveis e simbióticos, não sendo crível conceber um sem o outro. Torna-se necessário que haja o fortalecimento de uma cultura democrática mais participativa e, para tanto, a formatação de uma política educacional multilateral, focada não apenas no ensinamento das mesmas e repetitivas disciplinas meramente dogmáticas, tem o papel fundamental nesse processo de mudanças e conquistas rumo à construção de um cidadão ativo.

O vetor dessa transformação não pode ser unicamente hegemônico, estatal. É preciso que, gradativamente, floresça em cada um o desejo de tomar partido das decisões gerais, na busca pela consolidação de uma cidadania plena. Faz-se urgente que as discussões sobre democracia não estejam unicamente afetas à esfera política, mas, principalmente, na seara das relações sociais como um todo.

Democracia não é assunto para discussão apenas em ambientes restritos a plenários, assembleias ou academias, pelo contrário, tratando-se de tema que deva ser trazido para o cotidiano social, de modo a tornar-se acessível a todo cidadão.

Por fim, relevante registrar que a implementação dos institutos de democracia direta, em especial, da iniciativa popular, não representará, de per si, a solução para todos os males que afligem a sociedade contemporânea, contudo, é certo que uma maior participação do cidadão na formação da vontade governativa importará na redução da crescente crise de legitimidade que atualmente se observa no modelo representativo vigente.


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Notas

[2] Trata-se de publicação eletrônica (site) realizada pela BETA VEJA.com, abordando o seguinte tema: “O plebiscito e a arte de iludir”, no ano de 2014.

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Sobre o autor
Rodrigo Monteiro da Silva

Mestre em Direitos e Garantias Fundamentais, pela Faculdade de Direito de Vitória – FDV; Especialista em Direito Público pela Universidade Gama Filho (RJ); Promotor de Justiça (MP-ES).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Rodrigo Monteiro. Iniciativa popular e democracia participativa: entraves à construção de uma cidadania ativa. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5272, 7 dez. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/58743. Acesso em: 18 abr. 2024.

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