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Ações perniciosas contra o mercado de capitais

12/10/2017 às 19:05
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No contexto da recente prisão preventiva dos irmãos Batista, no caso da J&F, o artigo discute espécies de crime contra o mercado de capitais.

A recente prisão preventiva dos irmãos Batista, no caso da J&F, nos traz uma importante preocupação com relação aos ilícitos que podem ser cometidos contra o mercado de capitais

Na matéria, há a abordagem de Rodrigo de Grandis (Duas palavras sobre o crime de “insider trading”: a competência da Justiça Federal para o processo e o julgamento e a sua consideração como antecedente do delito de “lavagem” de dinheiro):

“ Em síntese, os crimes contra o mercado de capitais, em especial o delito de insider trading (artigo 27 – D da Lei nº 6.385/1976), violam direta e frontalmente os serviços de fiscalização e de regulamentação, bem como o notório interesse da autarquia federal Comissão de Valores Mobiliários (CVM) em estabelecer um mercado de valores mobiliários hígido, saudável, íntegro eeficiente, de modo a ensejar a incidência da competência da Justiça Federal prevista no artigo 109, IV, da Constituição Federal.”.

O artigo 27 – D da Lei 10.303/01 prevê o crime de uso de informação privilegiada.

Art. 27-D. Utilizar informação relevante ainda não divulgada ao mercado, de que tenha conhecimento e da qual deva manter sigilo, capaz de propiciar, para si ou para outrem, vantagem indevida, mediante negociação, em nome próprio ou de terceiro, com valores mobiliários:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos

O delito de insider trading (artigo 27 – D da Lei nº 6.385/1976) viola direta e frontalmente os serviços de fiscalização e de regulamentação, bem como o notório interesse da autarquia federal Comissão de Valores Mobiliários (CVM) em estabelecer um mercado de valores mobiliários hígido, saudável, íntegro e eficiente. 

O insider trading é uma das práticas mais perniciosas do mercado e consiste na negociação de valores mobiliários baseada no conhecimento de informações relevantes que ainda não são de conhecimento público, com o objetivo de auferir lucro ou vantagem de mercado. Desde 2001, tal prática é considerada crime, diante da redação que se dá à Lei 10.303/01, que alterou a Lei 6.385/76.

Se o mercado de valores mobiliários é um instrumento essencial para o crescimento econômico brasileiro e sua eficiência depende muito além de normas adequadas e do bom funcionamento de instituições: as práticas chamadas de não equitativas devem ser censuradas, pois, além de causar danos a investidores, causam impacto suficientemente hábil a afetar a credibilidade e a harmonia do próprio mercado e a economia do país, que sofre inegáveis prejuízos.

O agente atua antes da divulgação da informação privilegiada, que é toda aquela que, não tornada pública, sendo precisa e dizendo respeito a qualquer emitente ou a valores mobiliários ou outros instrumentos financeiros, seriam idôneas, se lhe fossem dadas publicidade para influenciar de maneira sensível o preço no mercado. A informação privilegiada sobre determinada companhia para negociar com valores mobiliários por ela emitidos é uma situação de manifesta vantagem em relação aos demais investidores não detentores da informação (insider trading).

Trata-se do aproveitamento de informações reservadas sobre a sociedade emissora de títulos, em detrimento dos demais acionistas, que as ignoram, como disse Luiz Gastão Paes de Barros Leães (Mercado de capitais e insider trading, São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, 1982, pág. 139). O comportamento desleal dos insiders ofende não só os direitos dos demais investidores, que ficam desprotegidos perante os grandes acionistas e demais detentores de informações privilegiadas, como ainda ao mercado, de forma a destruir a confiança e a lisura das relações, que constituem a base do sistema.

O objetivo fundamental da repressão ao insider trading é possibilitar o desenvolvimento equilibrado do país e o atendimento do interesse da coletividade, fundamentais para o sistema financeiro nacional e ao atendimento aos princípios da ordem econômica, a teor do artigo 170 da Constituição Federal.

O sujeito ativo do crime é operador no mercado de valores mobiliários, hipótese em que se considera um crime próprio.

Veja-se o caso Sadia-Perdigão, de 2006, cuja punição foi confirmada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em maio deste ano. Já a manipulação de mercado, da qual os executivos da JBS também são suspeitos, não gerou condenação definitiva. 

Em 2009, o MPF fez a primeira denúncia de insider no Brasil, o da Sadia. Em 2006, quando a empresa estava prestes a comprar a Perdigão, o diretor de Relações com Investidores da companhia, um membro do conselho da Sadia e um funcionário do ABNAmro, que assessorava a operação, negociaram recibos de ações da Perdigão na Bolsa de Nova York por meio de uma empresa offshore.

Embora a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) tenha condenado, no âmbito administrativo, 73 pessoas por insider trading desde 2002 — segundo dados da autarquia e de pesquisa da FGV Direito-SP —, apenas quatro casos geraram processos da Justiça: Sadia, Randon, Mundial e OGX, de Eike Batista. Os três ainda estão em tramitação. A CVM não tem números consolidados sobre inquéritos de manipulação de mercado mas só quatro foram parar na Justiça, entre eles o da Mundial e da Rimet, cuja condenação foi confirmada em segunda instância este mês, mas ainda cabe recurso. 

Podem cometê-lo uma autoridade, que não pode divulgar fatos sigilosos (dever de sigilo), como é o caso de ter informações sobre futuras medidas que serão tomadas na intervenção no domínio econômico.

Ainda será o caso do particular que se beneficia de sua posição privilegiada na empresa, com seu poder de voto, para utilizar informações sobre fatos relevantes antes que estes sejam divulgados no mercado.

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Pode acontecer nas negociações a chamada manipulação do mercado.

Tem-se o tipo penal disposto no artigo 27 – C da Lei 10.303/2001, que trata da manipulação de mercado: 

Art. 27-C. Realizar operações simuladas ou executar outras manobras fraudulentas, com a finalidade de alterar artificialmente o regular funcionamento dos mercados de valores mobiliários em bolsa de valores, de mercadorias e de futuros, no mercado de balcão ou no mercado de balcão organizado, com o fim de obter vantagem indevida ou lucro, para si ou para outrem, ou causar dano a terceiros:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 8 (oito) anos, e multa de até 3 (três) vezes o montante da vantagem ilícita obtida em decorrência do crime.

O crime envolve a conduta de criar condições artificiais de demanda e ou oferta desses títulos, objetivando tornar os preços irreais. Assim estaria minada a confiança dos investidores no mercado, pois são criados novos riscos além daqueles normais do mercado a gerar ineficiência. Desta forma  o agente, através de manipulações do mercado, simula um risco elevado para determinada ação, acarretando a desvalorização desta, de forma a inibir investidores que seriam  atraídos para comprar uma ação de alto risco, sendo que poderiam comprar  uma outra com menor risco, reduzindo, de forma artificial, a demanda, pois, quanto menor esta, menor será o preço. O agente, assim, com a manipulação, poderia comprar estes papéis a preços muito baixos e revendê-los, logo após, a preços mais altos após estar normalizado o mercado. Essa conduta traria prejuízos ao mercado. Ainda, tal crime ocorre quando algumas pessoas realizam uma série de operações seguidas de compra e venda que vão crescendo de modo a criar uma ilusão de que o valor  das ações seria muito maior do que realmente valeriam, trazendo prejuízos a investidores de boa-fé, que comprarem essas ações supervalorizadas. Cria-se uma situação artificiosa, em estado de fraude, na qual se busca valorizar ações que detêm para vê-las negociadas a altos preços, quando, na verdade, não ostentam tal valor. Buscam desvalorizar ações que pretendem, para adquiri-las, por ninharias, para, logo em seguida, revendê-las pelo valor que efetivamente possuem, obtendo assim o lucro fácil, em prejuízo e até quebra de empresas envolvidas.

Trata-se de crime formal, de perigo concreto, permanente, em que é possível a tentativa se a informação estiver sendo passada por escrito e se extravie.

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Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROMANO, Rogério Tadeu. Ações perniciosas contra o mercado de capitais . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5216, 12 out. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/60644. Acesso em: 21 nov. 2024.

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