A recente prisão preventiva dos irmãos Batista, no caso da J&F, nos traz uma importante preocupação com relação aos ilícitos que podem ser cometidos contra o mercado de capitais.
Na matéria, há a abordagem de Rodrigo de Grandis (Duas palavras sobre o crime de “insider trading”: a competência da Justiça Federal para o processo e o julgamento e a sua consideração como antecedente do delito de “lavagem” de dinheiro):
“ Em síntese, os crimes contra o mercado de capitais, em especial o delito de insider trading (artigo 27 – D da Lei nº 6.385/1976), violam direta e frontalmente os serviços de fiscalização e de regulamentação, bem como o notório interesse da autarquia federal Comissão de Valores Mobiliários (CVM) em estabelecer um mercado de valores mobiliários hígido, saudável, íntegro eeficiente, de modo a ensejar a incidência da competência da Justiça Federal prevista no artigo 109, IV, da Constituição Federal.”.
O artigo 27 – D da Lei 10.303/01 prevê o crime de uso de informação privilegiada.
Art. 27-D. Utilizar informação relevante ainda não divulgada ao mercado, de que tenha conhecimento e da qual deva manter sigilo, capaz de propiciar, para si ou para outrem, vantagem indevida, mediante negociação, em nome próprio ou de terceiro, com valores mobiliários:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos
O delito de insider trading (artigo 27 – D da Lei nº 6.385/1976) viola direta e frontalmente os serviços de fiscalização e de regulamentação, bem como o notório interesse da autarquia federal Comissão de Valores Mobiliários (CVM) em estabelecer um mercado de valores mobiliários hígido, saudável, íntegro e eficiente.
O insider trading é uma das práticas mais perniciosas do mercado e consiste na negociação de valores mobiliários baseada no conhecimento de informações relevantes que ainda não são de conhecimento público, com o objetivo de auferir lucro ou vantagem de mercado. Desde 2001, tal prática é considerada crime, diante da redação que se dá à Lei 10.303/01, que alterou a Lei 6.385/76.
Se o mercado de valores mobiliários é um instrumento essencial para o crescimento econômico brasileiro e sua eficiência depende muito além de normas adequadas e do bom funcionamento de instituições: as práticas chamadas de não equitativas devem ser censuradas, pois, além de causar danos a investidores, causam impacto suficientemente hábil a afetar a credibilidade e a harmonia do próprio mercado e a economia do país, que sofre inegáveis prejuízos.
O agente atua antes da divulgação da informação privilegiada, que é toda aquela que, não tornada pública, sendo precisa e dizendo respeito a qualquer emitente ou a valores mobiliários ou outros instrumentos financeiros, seriam idôneas, se lhe fossem dadas publicidade para influenciar de maneira sensível o preço no mercado. A informação privilegiada sobre determinada companhia para negociar com valores mobiliários por ela emitidos é uma situação de manifesta vantagem em relação aos demais investidores não detentores da informação (insider trading).
Trata-se do aproveitamento de informações reservadas sobre a sociedade emissora de títulos, em detrimento dos demais acionistas, que as ignoram, como disse Luiz Gastão Paes de Barros Leães (Mercado de capitais e insider trading, São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, 1982, pág. 139). O comportamento desleal dos insiders ofende não só os direitos dos demais investidores, que ficam desprotegidos perante os grandes acionistas e demais detentores de informações privilegiadas, como ainda ao mercado, de forma a destruir a confiança e a lisura das relações, que constituem a base do sistema.
O objetivo fundamental da repressão ao insider trading é possibilitar o desenvolvimento equilibrado do país e o atendimento do interesse da coletividade, fundamentais para o sistema financeiro nacional e ao atendimento aos princípios da ordem econômica, a teor do artigo 170 da Constituição Federal.
O sujeito ativo do crime é operador no mercado de valores mobiliários, hipótese em que se considera um crime próprio.
Veja-se o caso Sadia-Perdigão, de 2006, cuja punição foi confirmada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em maio deste ano. Já a manipulação de mercado, da qual os executivos da JBS também são suspeitos, não gerou condenação definitiva.
Em 2009, o MPF fez a primeira denúncia de insider no Brasil, o da Sadia. Em 2006, quando a empresa estava prestes a comprar a Perdigão, o diretor de Relações com Investidores da companhia, um membro do conselho da Sadia e um funcionário do ABNAmro, que assessorava a operação, negociaram recibos de ações da Perdigão na Bolsa de Nova York por meio de uma empresa offshore.
Embora a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) tenha condenado, no âmbito administrativo, 73 pessoas por insider trading desde 2002 — segundo dados da autarquia e de pesquisa da FGV Direito-SP —, apenas quatro casos geraram processos da Justiça: Sadia, Randon, Mundial e OGX, de Eike Batista. Os três ainda estão em tramitação. A CVM não tem números consolidados sobre inquéritos de manipulação de mercado mas só quatro foram parar na Justiça, entre eles o da Mundial e da Rimet, cuja condenação foi confirmada em segunda instância este mês, mas ainda cabe recurso.
Podem cometê-lo uma autoridade, que não pode divulgar fatos sigilosos (dever de sigilo), como é o caso de ter informações sobre futuras medidas que serão tomadas na intervenção no domínio econômico.
Ainda será o caso do particular que se beneficia de sua posição privilegiada na empresa, com seu poder de voto, para utilizar informações sobre fatos relevantes antes que estes sejam divulgados no mercado.
Pode acontecer nas negociações a chamada manipulação do mercado.
Tem-se o tipo penal disposto no artigo 27 – C da Lei 10.303/2001, que trata da manipulação de mercado:
Art. 27-C. Realizar operações simuladas ou executar outras manobras fraudulentas, com a finalidade de alterar artificialmente o regular funcionamento dos mercados de valores mobiliários em bolsa de valores, de mercadorias e de futuros, no mercado de balcão ou no mercado de balcão organizado, com o fim de obter vantagem indevida ou lucro, para si ou para outrem, ou causar dano a terceiros:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 8 (oito) anos, e multa de até 3 (três) vezes o montante da vantagem ilícita obtida em decorrência do crime.
O crime envolve a conduta de criar condições artificiais de demanda e ou oferta desses títulos, objetivando tornar os preços irreais. Assim estaria minada a confiança dos investidores no mercado, pois são criados novos riscos além daqueles normais do mercado a gerar ineficiência. Desta forma o agente, através de manipulações do mercado, simula um risco elevado para determinada ação, acarretando a desvalorização desta, de forma a inibir investidores que seriam atraídos para comprar uma ação de alto risco, sendo que poderiam comprar uma outra com menor risco, reduzindo, de forma artificial, a demanda, pois, quanto menor esta, menor será o preço. O agente, assim, com a manipulação, poderia comprar estes papéis a preços muito baixos e revendê-los, logo após, a preços mais altos após estar normalizado o mercado. Essa conduta traria prejuízos ao mercado. Ainda, tal crime ocorre quando algumas pessoas realizam uma série de operações seguidas de compra e venda que vão crescendo de modo a criar uma ilusão de que o valor das ações seria muito maior do que realmente valeriam, trazendo prejuízos a investidores de boa-fé, que comprarem essas ações supervalorizadas. Cria-se uma situação artificiosa, em estado de fraude, na qual se busca valorizar ações que detêm para vê-las negociadas a altos preços, quando, na verdade, não ostentam tal valor. Buscam desvalorizar ações que pretendem, para adquiri-las, por ninharias, para, logo em seguida, revendê-las pelo valor que efetivamente possuem, obtendo assim o lucro fácil, em prejuízo e até quebra de empresas envolvidas.
Trata-se de crime formal, de perigo concreto, permanente, em que é possível a tentativa se a informação estiver sendo passada por escrito e se extravie.