Três diplomas legais entrelaçam-se para dispor sobre a questão da guarda de filhos menores nos casos de feminicídio praticado pelo cônjuge-genitor, quais sejam, o Código Civil, o Estatuto da Criança e do Adolescente e o Código Penal.
Mas, adianto ao leitor que todos esses diplomas legais são claudicantes na tentativa de normatizar expressamente a situação dos filhos menores após a prática do feminicídio da genitora pelo próprio genitor. Em verdade, a legislação brasileira nada dispõe sobre essa situação tão dramática e presente na realidade das crianças de nosso país.
É que, para nossa legislação, para efeito da guarda e de sua cessação, apenas leva-se em consideração a conduta do genitor-agressor estritamente em relação a pessoa de seus filhos menores. Ou seja, o assassinato da genitora pelo genitor não encontra previsão legal expressa como causa de perda da guarda, muito menos de destituição do poder familiar. E por incrível que pareça esse genitor ainda conserva o direito de ter seus filhos em sua companhia na prisão durante os momentos de visitação ao presídio.
Pois bem. O Código Civil nos seus Arts. 1.637 e 1.638 prevê, como causa de suspensão ou extinção do poder familiar, o castigo imoderado, o abandono e a prática de atos contrários à moral e aos bons costumes em relação aos filhos menores. O Art. 33, §2º, do Estatuto da Criança, estabelece que a guarda se destinará a suprir a falta eventual dos pais. E o Código Penal apenas reza que será efeito da condenação criminal a incapacidade para o exercício do pátrio poder nos crimes dolosos sujeitos à pena de reclusão cometidos contra filho.
Destarte, em última análise, aliás, em qualquer análise, nossa capenga e adormecida legislação machista premia o autor do feminicídio com a guarda de seus filhos menores ou, na pior das hipóteses, franqueia-lhe o ingresso dessas crianças no presídio para com perplexidade visitarem o carrasco de sua finada mãe.
Ora, preservar a guarda dos filhos menores na pessoa do assassino dessa mãe, ou nada dispor expressamente, como prefere nossa legislação, é pecado imperdoável; regresso a um passado na história da humanidade da qual não se tem registro. Afinal, o genitor destrói, pelas suas próprias mãos, o objeto mais valioso e inestimável na vida de uma criança, a sua sagrada mãe.
Já dizia Drummond:
“Por que Deus permite
Que as mães vão-se embora?
Fosse eu rei do mundo
Baixava uma lei:
Mãe não morre nunca
Mãe ficará sempre
Junto de seu filho”.
Deve, assim, o Congresso Nacional, através de seus senhores Deputados Federais e Senadores, buscar, com urgência e brevidade, o enquadramento da legislação brasileira à tutela das mulheres na condição de mães, buscando-se, assim, se evitar uma Pátria órfã, onde nossas crianças são espectadoras de diários feminicídios dentro do próprio lar.
O feminicídio deve, sim, ser causa legal expressa da perda da guarda dos filhos menores ou, quem sabe, causa da própria destituição do poder familiar do genitor-assassino, que não sabe lidar, sequer, com seus próprios sentimentos.