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A municipalização dos serviços de iluminação pública

16/05/2019 às 16:45
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O texto analisa a questão da transferência, pelas concessionárias de energia elétrica, aos Municípios, do sistema de iluminação pública.

Encerrou-se em 31 de dezembro de 2014 o prazo previsto no art. 218, §§ 3º e 4º, inc. VI, da Resolução nº 414/2010, concedido pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), para que todas as concessionárias de energia elétrica concluam, sem ônus, a transferência aos Municípios do sistema de iluminação pública de forma a permitir que a prestação dos serviços de iluminação pública sejam realizados, doravante, pela Comuna.

De acordo com a disciplina assentada no referido dispositivo regulamentar, os Municípios receberão o parque de iluminação pública, fato que implicará que a gestão, manutenção e administração dos serviços de iluminação pública sejam realizadas pelo ente municipal, sem interferência da concessionária local, cuja função será apenas e tão somente fornecer a energia elétrica necessária para o funcionamento dos equipamentos trespassados. Em relação ao patrimônio a ser transferido ao Município, verificam-se o relé fotoelétrico (necessário para propiciar o acendimento automático da lâmpada); braço; reator; cúpula ou luminária; soquete e lâmpada. Grife-se que o poste não é objeto de transferência, salvo se ele for específico para iluminação (poste ornado, por exemplo).

Acerca das novas funções a serem desempenhadas pela Administração Pública Municipal, destaca o advogado Alfredo Gioielli: “gestão, manutenção de todo sistema de distribuição, atendimento, operação e reposição de lâmpadas, suportes, chaves, troca de luminárias, reatores, relés, cabos condutores, braços e materiais de fixação e conexões elétricas” (Municipalização de iluminação pública pela Aneel é ilegal. Disponível em: <http://http://www.conjur.com.br/2013-mar-21/alfredo-gioielli-municipalizacao-iluminacao-publica-aneel-ilegal>. Acesso em: 22 out. 2014).

Sem adentrar na polêmica relacionada à forma como ocorreu a transferência do parque de iluminação pública à Comuna, verifica-se que a determinação da Aneel repousa no fato de que os Municípios, conforme estabelece o art. 30, inc. V, da CF/1988, detêm a atribuição de organizar e prestar serviços públicos de interesse local, inserindo-se aí a iluminação pública.

Em relação às benesses vislumbradas com tal transferência, destaca-se que a municipalização dos serviços de iluminação pública poderá gerar a prestação de serviços mais eficientes e planejados, haja vista o maior controle da Administração na operação. Nesse sentido, grife-se que tal rapidez na prestação de manutenção corretiva e preventiva do parque de iluminação pública garantirá segurança à população, vez que os locais pouco iluminados ou sem iluminação são os mais propensos para cometimento de crimes de toda sorte. Demais disso, com a prestação de serviços públicos realizada pelo Município, poderão ser implementadas medidas que garantam a redução de consumo da energia, gerando economia ao Erário, a exemplo da substituição das lâmpadas incandescentes, que consomem mais energia elétrica, por lâmpadas do tipo LED ou fluorescente, cujo consumo é reduzido. Outrossim, poderá, ainda, ser substituída a matriz energética, dada a possibilidade do uso de energia solar e eólica, em detrimento da elétrica, para a iluminação.

Preliminarmente à transferência do parque de iluminação pública pela concessionária de energia, deverá a Administração Pública planejar-se em relação a tal recebimento, realizando, dentre outras providências, o levantamento dos equipamentos já instalados e em operação, apontando-se as suas condições físicas; o planejamento futuro de atuação na manutenção preventiva e corretiva; a eleição da forma como serão prestados tais serviços: (1) se diretamente, ou seja, pelo próprio Poder Público, fato que demandará a necessidade de aparelhamento da Administração; criação de órgão para gerir a execução dos serviços, receber as ligações etc.; realização de concurso público para contratação dos profissionais; aquisição de equipamentos e insumos por meio de licitação; ou (2) indiretamente, por empresa contratada mediante licitação, adoção de Parceria Público-Privada ou, ainda, por meio da participação de um consórcio intermunicipal, cuja constituição é disciplinada pela Lei Federal nº 11.107/2005.

Nas tratativas a serem realizadas entre o Poder Público e a concessionária, nessa oportunidade, devem os entes municipais questionar o estado em que se encontram os bens a serem futuramente trespassados, não devendo aceitá-los se eles estiverem sucateados ou sem que estejam recebendo a correta manutenção ou sejam produzidos em desconformidade com as regras da ABNT. Grife-se que receber os bens nessas condições demandará a substituição deles futuramente, fato que gerará prejuízo para os cofres públicos. O que se tem recomendado é que “O município deve condicionar a transferência de ativos a que a concessionária de distribuição promova as adequações necessárias no parque de iluminação pública, deixando-as em condições normais de funcionamento” (GIOIELLI, Alfredo; KIRCHNER, Carlos Augusto Ramos. Informações necessárias para a realização do plano de transição de domínio da gestão da iluminação pública. Em: <http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/cao_cidadania/iluminacao_publica/Manual de Boas Práticas na Transferência de Ativos de IP.pdf>. Acesso em: 22 out. 2014).

Em relação à celebração do termo de transferência do parque de iluminação pública, tendo em vista que o competente ajuste não detém cláusulas-padrão, deve a Administração questionar os termos propostos pela concessionária de energia elétrica, devendo ser rechaçadas as cláusulas que o Poder Público entender serem abusivas, uma vez ser necessário garantir um ajuste equânime entre as partes, bem como afastar qualquer tipo de prejuízo para o interesse público.

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Atuando de forma planejada, sempre com apoio da concessionária de energia elétrica, que deverá prestar, quando necessário, as informações pertinentes nesta fase de transição, evita-se a judicialização da transferência do parque de iluminação pública, de modo a afastar qualquer tipo de prejuízo à prestação desse serviço público.

No que tange às obrigações da concessionária de energia elétrica, vislumbra-se, dentre outras, a necessidade de encaminhamento de relatório analítico dos bens a serem transferidos, apontando-se, ainda, a situação física destes, bem como qualquer outro dado solicitado pela Administração, ex vi do teor contido no art. 218, § 7º, da resolução em destaque; a exigência de transferência de equipamentos que observem as normas técnicas existentes; o apoio no início da prestação de serviços pela Administração ou terceiro contratado; a assistência técnica futura, haja vista a dependência na energia elétrica da concessionária etc.

Em relação à Administração Pública, deverá ser elaborado pelo setor competente um estudo de impacto orçamentário dos serviços a serem realizados por pessoal próprio (execução direta) ou terceirizado (execução indireta). No que tange à atuação do setor jurídico, este deverá, dentre outros aspectos, analisar os termos da transferência do parque de iluminação pública, com o consequente afastamento de cláusulas abusivas impostas pela concessionária, assim como elaborar o termo de responsabilidade civil e criminal das informações prestadas pela concessionária. Já o setor de engenharia deverá elaborar laudo que descreverá o estado dos equipamentos, que será cotejado, futuramente, com o relatório elaborado pela concessionária. O exame deste relatório deve ser rigoroso, de forma a revestir a Administração da segurança necessária quanto à sua verossimilhança, isto é, sua fidelidade em relação à realidade dos equipamentos. Demais disso, deverá ser elaborado pelo setor de engenharia um plano de execução dos serviços, termo de referência ou projeto básico, em caso de execução indireta, haja vista que tais documentos deverão constar do edital de licitação posteriormente. Por fim, deverá o setor de meio ambiente elaborar um plano de descarte das lâmpadas.

Grife-se que o recebimento do parque de iluminação pública deverá ser realizado formalmente, mediante vistoria em todos os equipamentos, devendo as impropriedades serem consignadas no documento, a fim de serem objeto de reparação, em prazo a ser fixado pelo Poder Público, bem como afastar futura responsabilização da Administração.

Diante da complexidade envolvida e volume de trabalho, verifica-se que algumas Municipalidades processaram competente licitação com o escopo de contratar um particular para realizar tais providências preliminares, a fim de observar o prazo imposto pela Aneel. Ante todo o exposto, portanto, para aqueles Municípios que ainda não se organizaram para receber tal encargo, tomadas tais cautelas, dentre outras, garante-se o regular trespasse do parque de iluminação pública, sem que ocorra solução de continuidade dos serviços públicos e, por conseguinte, prejuízo ao interesse público.

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Sobre o autor
Aniello dos Reis Parziale

Graduado em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Advogado, consultor em Direito Público e gerente jurídico da Editora NDJ. Mestre em Direito Econômico e Político pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Autor de dezenas de artigos sobre Direito Administrativo, com ênfase em contratações públicas, servidores e direito municipal. Visite o site do autor: www.anielloparziale.com.br

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PARZIALE, Aniello Reis. A municipalização dos serviços de iluminação pública. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5797, 16 mai. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/61806. Acesso em: 21 nov. 2024.

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