A Instrução Normativa nº 5, de 2017, do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, vem traçar novas regras regulamentadoras dos procedimentos pertinentes às licitações e contratações de serviços, contínuos ou não, pela administração federal.
Extrai-se do normativo que o único critério de aceitabilidade de proposta de menor valor admitido na contratação de serviços terceirizados baseia-se no preço máximo fixado pela administração. Confiram-se os itens a respeito:
2. São diretrizes específicas a cada elemento do Termo de Referência ou Projeto Básico: [...]
2.8. Critérios de seleção do fornecedor: [...]
d) Definir os critérios de aceitabilidade de preços, com fixação de preços máximos aceitáveis, tanto globais quanto unitários;
[...]
2.9. Estimativa de preços e preços referenciais: [...]
b) No caso de serviços com regime de dedicação exclusiva de mão de obra, o custo estimado da contratação deve contemplar o valor máximo global e mensal estabelecido em decorrência da identificação dos elementos que compõem o preço dos serviços, definidos da seguinte forma:
[...]
9. Da desclassificação das propostas:
[...] 9.1. Serão desclassificadas as propostas que: [...]
c) apresentarem preços finais superiores ao valor máximo estabelecido pelo órgão ou entidade contratante no ato convocatório;
O art. 40, X, da Lei nº 8.666/1993 admite a fixação de preço máximo como critério de aceitabilidade das propostas. Significa que, dispondo a administração de meios para conhecer os preços praticados no mercado e dependendo do objeto da licitação, poderá optar pela limitação de preço, desclassificando propostas que sejam superiores ao máximo fixado no edital. Referido dispositivo faculta à administração pública a fixação de preço máximo nas licitações, o qual propicia a todos os interessados o conhecimento antecipado do limite máximo que a administração pretende pagar pelo objeto.
Já o art. 43, IV, da Lei nº 8.666/1993 permite que a licitação seja processada e julgada mediante a verificação da exata correspondência de cada proposta aos requisitos do edital e, conforme o caso, com os preços correntes no mercado ou fixados por órgão oficial competente, ou, ainda, com os constantes do sistema de registro de preços, os quais deverão ser devidamente lançados na ata de julgamento, promovendo-se a desclassificação das propostas desconformes ou incompatíveis.
O critério de aceitabilidade das propostas, com base no exame da compatibilidade dos valores ofertados com aqueles estimados pela administração na fase interna do procedimento licitatório, admite aquelas (propostas) superiores ao valor estimado, exigindo-se, neste caso, por parte da comissão de licitação ou do pregoeiro, a explicitação dos motivos da aceitação do preço.
O Tribunal de Contas da União anotou que o valor orçado pela administração pública, ou seja, aquele resultante de pesquisa de preços praticados no mercado, pode ser definido como o preço máximo a ser praticado em determinada licitação, mas não necessariamente. Assim:
4.1 Com as vênias de praxe, entendo que se possa, também, excluir, como fundamento de eventual multa, o fato indicado na alínea “a” supra, pois verifico que o valor aceito foi apenas 2% acima do estimado, o que me leva a considerá-lo irrelevante para subsidiar uma apenação ao pregoeiro (valor de referência: R$680.000,00/mês e valor contrato: R$694.138,27/mês – peça 35/fl. 33 e peça 36/fl. 24).
4.2 Vale lembrar que este Tribunal, por meio da Súmula nº 259/2010 deixou assente que a fixação de preços máximos, unitários e globais, é obrigação do gestor apenas quando se trata de obras e serviços de engenharia. Não se tratando desses objetos, essa fixação é meramente facultativa. Como já registrei em outros processos por mim relatados, “valor de referência” ou simplesmente “valor estimado” não se confunde com “preço máximo”. O valor orçado, a depender de previsão editalícia, pode eventualmente ser definido como o preço máximo a ser praticado em determinada licitação, mas não necessariamente. São conceitos distintos, que não se confundem. (grifamos)
4.3 Portanto, para contratações como a que aqui se examina (prestação de serviço médico hospitalar), a fixação de preços máximos não é obrigatória. Nessas condições e considerando a pouca representatividade da diferença entre os valores de referência e o contratado (2%), penso que se possa excluir o fato das razões para apenação do recorrente. (Acórdão nº 6.452/2014 – Segunda Câmara, Rel. Min. José Jorge, Processo nº 015.108/2009-4);
[...] 3. "Orçamento" ou "valor orçado" ou "valor de referência" ou simplesmente "valor estimado" não se confunde com "preço máximo". O "valor orçado", a depender de previsão editalícia, pode eventualmente ser definido como o "preço máximo" a ser praticado em determinada licitação, mas não necessariamente. (Acórdão nº 392/2011 - Plenário, Rel. Min. José Jorge, Processo nº 033.876/2010-0).
Em outro julgado, a Corte de Contas federal assentou que nas licitações regidas pela Lei nº 8.666/1993, o valor orçado não se confunde com o preço máximo, a menos que o instrumento convocatório estabeleça tal condição. Não sendo ela estabelecida, a contratação por preço superior ao orçado deve ser justificada.
Confira-se:
Representação formulada ao TCU apontou possível irregularidade em convite promovido pela Petróleo Brasileiro S.A. (Petrobras), cujo objeto era a locação de embarcações. De acordo com o representante, o preço final contratado teria sido 6,32% superior ao valor orçado pela Petrobras, à evidência de sobrepreço. Após apreciar as razões de justificativa dos responsáveis ouvidos em audiência, a unidade técnica propôs que lhes fosse aplicada multa, bem como expedida determinação à entidade para que repactuasse o contrato firmado com a vencedora do certame. Ao discordar da unidade instrutiva, o relator pontuou que “a Lei de Licitações e Contratos estabelece que o preço da proposta vencedora deve estar compatível com os preços de mercado, sem embargo de prever a possibilidade de a entidade licitante estabelecer, no edital, que o valor global não poderá exceder determinado limite, tal como disposto no art. 48, inciso II”. A corroborar sua assertiva, o relator invocou o Acórdão 392/2011 Plenário, no qual restou assente que “o valor orçado não se confunde com preço máximo, a menos que o edital estabeleça tal condição”, e que a fixação do preço máximo só é obrigatória na contratação de obras e serviços de engenharia, conforme a Súmula TCU 259. Nesse contexto, cumpriria então averiguar se o instrumento convocatório da licitação em exame estabelecera o preço constante do orçamento como limite máximo para aceitabilidade das propostas. Após transcrever o item do convite relativo ao julgamento das propostas, o relator concluiu que o orçamento não fora fixado como preço máximo aceitável pela Petrobras, inexistindo, dessa forma, afronta ao instrumento convocatório. Ponderou, contudo, restar como impropriedade “uma aparente insuficiência na justificativa da contratação por preço superior ao orçado”, sendo bastante, a seu ver, dar ciência à entidade. (Acórdão nº 1.549/2017 – Plenário, Rel. Min. José Múcio Monteiro, Processo nº 010.612/2016-5).
Ainda segundo a Corte de Contas federal, a fixação de preço máximo como critério de aceitabilidade das propostas, na modalidade pregão, traduz juízo discricionário da administração. Veja-se:
Representação relativa a pregão eletrônico para registro de preços, promovido pelo [...], objetivando a contratação de serviços de criação de leiaute da Carteira de Identidade Profissional, produção, personalização de cartões em policarbonato e outros, apontara, dentre outras irregularidades, a ausência de valor estimado da contratação. Ao examinar o caso, o relator destacou que a jurisprudência do Tribunal é firme no sentido de que “na licitação na modalidade pregão, o orçamento estimado em planilhas de quantitativos e preços unitários não constitui um dos elementos obrigatórios do edital, mas deve estar inserido obrigatoriamente no bojo do processo relativo ao certame. Todavia, sempre que o preço de referência ou o preço máximo fixado pela Administração for utilizado como critério de aceitabilidade de preços, a sua divulgação em edital torna-se obrigatória”. Sobre o assunto, relembrou o relator o voto condutor do Acórdão 392/2011 - Plenário, segundo o qual, no pregão, “caberá aos gestores/pregoeiros (...) a avaliação da oportunidade e conveniência de incluir tais orçamentos – e os próprios preços máximos, se a opção foi a sua fixação – no edital, informando nesse caso, no próprio ato convocatório, a sua disponibilidade aos interessados e os meios para obtê-los”. Ressalvara, contudo, a deliberação que “na hipótese de o preço de referência ser utilizado como critério de aceitabilidade de preços, a divulgação no edital é obrigatória”, tendo em vista que “qualquer regra, critério ou hipótese de desclassificação de licitante deve estar, por óbvio, explicitada no edital, nos termos do art. 40, X, da Lei nº 8.666/1993”. Considerando que o certame encontrava-se suspenso por iniciativa do CRBM-3ª Região para a correção das impropriedades apontadas, o Tribunal acolheu o voto do relator, julgando parcialmente procedente a Representação, cientificando o órgão de que “na hipótese de o preço de referência ser utilizado como critério de aceitabilidade, a sua divulgação no edital é obrigatória, nos termos do art. 40, X, da Lei nº 8.666/1993” (Acórdão nº 2.166/2014 - Plenário, Rel. Min. Augusto Sherman Cavalcanti, Processo nº 011.468/2014-9. Informativo de licitações e contratos nº 211, de 2014).
Para o TCU, quando adotado o critério de julgamento de propostas baseado na compatibilidade com o preço estimado pela administração, inexiste percentual aceitável de sobrepreço em relação ao valor global de serviços. A jurisprudência predominante da Corte assinala que não há margem de tolerância de sobrepreço e que situações excepcionais devem ser analisadas à luz de suas particularidades (Acórdãos de nº 1894/2011, 1155/2012, 3095/2014, 2132/2015 e 3021/2015, todos do Plenário, dentre outros). O fato de a Corte ter excepcionalmente admitido, ao analisar casos concretos, que valores pouco acima dos preços referenciais podem ser considerados variações normais de mercado, não significa dizer que exista alguma faixa de tolerância que possa ser entendida como normal ou aplicável generalizadamente (Acórdão nº 1.894/2016 – Plenário, Rel. Min. Raimundo Carreiro, Processo nº 021.409/2003-4).
Significa, pois, à luz do ordenamento normativo e da jurisprudência do Tribunal de Contas da União, que o critério de aceitabilidade baseado no preço máximo não é o único parâmetro disponível para a administração pública para a escolha da melhor proposta, seja na contratação de serviços, seja na aquisição de bens, excepcionando-se a contratação de obras e serviços de engenharia por aplicação do disposto no verbete 259, da Súmula do Tribunal de Contas da União (Nas contratações de obras e serviços de engenharia, a definição do critério de aceitabilidade dos preços unitários e global, com fixação de preços máximos para ambos, é obrigação e não faculdade do gestor), as contratações realizadas com supedâneo no regime diferenciado de contratações públicas, por aplicação do disposto no art. 24, III, da Lei nº 12.462/2011 [Art. 24. Serão desclassificadas as propostas que: (...) III - apresentem preços manifestamente inexequíveis ou permaneçam acima do orçamento estimado para a contratação, inclusive nas hipóteses previstas no art. 6º desta Lei] e as contratações das empresas públicas e sociedades de economia mista, por aplicação do disposto no art. 56, IV, da Lei nº 13.303/2016 [Art. 56. Efetuado o julgamento dos lances ou propostas, será promovida a verificação de sua efetividade, promovendo-se a desclassificação daqueles que: (...) IV - se encontrem acima do orçamento estimado para a contratação de que trata o § 1º do art. 57, ressalvada a hipótese prevista no caput do art. 34 desta Lei;].
A IN nº 5/2017, contudo, não conferiu alternativas para o administrador público no tocante à escolha do melhor critério de julgamento de propostas aplicável ao caso concreto. O único critério admitido, segunda a IN, é o do preço máximo. Veja-se que o art. 40, X, da Lei nº 8.666/1993, aplicável subsidiariamente à modalidade pregão (art. 9º da Lei nº 10.520/2002), faculta a fixação de preço máximo como critério de aceitabilidade de propostas, ou seja, a administração pública, segundo o dispositivo citado, pode optar pela limitação de preço, mas não necessariamente, como orienta o Tribunal de Contas da União (Acórdão nº 392/2011 - Plenário, Rel. Min. José Jorge, Processo nº 033.876/2010-0).
Veja-se, ainda, que de acordo com o art. 25, caput, do Decreto federal nº 5.450/2005 (regulamenta o pregão eletrônico no âmbito da administração pública federal), uma vez encerrada a etapa de lances, o pregoeiro examinará a proposta classificada em primeiro lugar quanto à compatibilidade do preço em relação ao estimado para contratação e verificará a habilitação do licitante conforme disposições do edital. Ou seja, segundo o Decreto nº 5.450/2005, o critério de aceitação de proposta a ser fixado no edital de pregão, no formato eletrônico, independentemente do objeto (compra ou serviço), deve ser o do exame da compatibilidade da proposta ofertada pelo licitante em relação ao preço estimado pela administração para a contratação e não o de preço máximo, conforme fixado na IN nº 5/2017.
Este normativo (IN nº 5/2017) contraria o Decreto nº 5.450/2005 e a Lei nº 8.666/1993 ao estabelecer o preço máximo como único critério de aceitação de proposta possível na contratação de serviços. O Decreto nº 5.450/2005, por sua vez, contraria a Lei nº 8.666/1993 a qual permite, em caráter facultativo, a fixação de preço máximo (art. 40, X) ou, ainda, o exame da compatibilidade do preço ofertado em relação ao estimado para a contratação (art. 43, IV) como critérios possíveis para a aceitação de propostas.
A natureza do objeto da contratação, as condições para a sua execução, os indicadores do mercado fornecedor, contratações anteriores de mesmo objeto e outras peculiaridades envolventes da contratação podem, eficazmente, guiar o administrador público na definição do adequado critério de julgamento de proposta, em conformidade com as soluções (critérios) apresentadas pelo ordenamento normativo e admitidos pelo Tribunal de Contas da União, a serem fixadas no respectivo edital.