Um mau exemplo
No Brasil atual não é necessário vidência para antever o futuro. O corporativismo parlamentar e o fato de a maioria de nossos edis estar dentro do mesmo balaio acabam por usurpar o outrora encantador papel dos videntes. Com aquiescência de Michel Temer, presidente da República, que é chefe da Nação e do Estado, que se diz constitucionalista, a sua defesa apresentou na ação em que é denunciado por obstrução da justiça, além de outros crimes, pelo ex-Procurador da República Rodrigo Janot, atribuindo a este a pecha de “pistoleiro” e outras expressões depreciativas, impróprias a qualquer pessoa que se prima pela boa educação, sobretudo pelo respeito. Ao iniciarmos o curso de Direito Processual, aprendemos desde logo, que a defesa deve-se basear unicamente contra os fatos alegados e não contra as pessoas e que as expressões injuriosas o juiz mandará risca-las, e se forem proferidas, cassará a palavra. Esse procedimento é adotado nos juízos estaduais de primeira estância. Ai do acusado ao ser interrogado sobre fatos relatados na denúncia, responder ao juiz: “ o senhor deve perguntar a ele”... Se o réu chamar o Promotor de Justiça de pistoleiro, qual será a atitude a ser tomada pelo juiz? A denúncia oferecida contra o presidente será examinada pelo Conselho de Ética da Câmara, cujo o relator é o deputado Bonifácio Andrada que acumula dezenas de mandatos eletivos, o que não deixa de ser uma realidade brasileira, pois os nossos representantes no Congresso Nacional, salvo honrosas exceções, são filhos, netos e todo tipo de parentesco, descendentes de antigos governadores, senadores, deputados e vereadores, que sempre tiveram influência nos destinos do Brasil, e principalmente, nos seus estados de origem, que alguns eram e são considerados dono deles. A meu ver, ao contrário do que consta na mídia, o relatório vai ser favorável ao recebimento da denúncia, pois este é o momento e talvez único, em que o deputado relator, terá oportunidade de se manifestar sobre os seus conhecimentos jurídicos, visto que muitos o julgam um jurista. Caso contrário, ele terá uma melancólica passagem pela Câmara dos Deputados. Mas, de qualquer forma, com o parecer contrário ou a favor, a denúncia vai ser rejeitada no plenário da Câmara dos Deputados, cujos componentes, muitos deles, estão implicados em inquéritos, em delações premiadas e estão preocupados em se elegerem nas próximas eleições, para se beneficiarem do fórum privilegiado. E assim haverá impunidade, mais impunidade... A outra situação mais preocupante é a expectativa do julgamento da Adin que discute se é constitucional a competência do STF para afastar parlamentares de suas funções, aplicando-lhes medidas cautelares. O interessado, neste caso, é o senador Aécio Neves. Se os ministros do STF decidirem que a competência cabe ao Congresso Federal, no caso o Senado, não haverá crise entre os dois poderes e Aécio será, ao final, absolvido pelos seus pares, permanecendo a impunidade até que não tenha nenhum mandato. Entretanto, se o STF decidir que é de sua competência, os senadores vão à represália, pois como diz o ditado “não se fala de forca em casa de enforcado”, isto porque, como já disse, muitos de seus colegas estão no mesmo barco e este salvará Aécio que andará livre e solto. Como se vê, nenhuma dessas situações, a meu ver, não resolve a barafunda criada. Não se pode defender uma democracia onde impera a impunidade, a desfaçatez, o desrespeito de seus representantes. Com essas reflexões, procurei a entender a fala do general Mourão que manifestou sua opinião política, sendo malhado pela a imprensa em geral, como se ele fosse “um judas”, atacando-o de golpista. Ora, interpretei assim a suas palavras: o doente precisa de medicamentos (estes estão nas instituições da República), agora, se os remédios não debelarem a moléstia, o médico então lançará o último recurso que é uma intervenção cirúrgica. O Brasil não merece um presidente que ao se defender de uma denúncia, admite que seus defensores escrevem palavras desairosas contra o seu acusador. Isto é um mau exemplo.
José Edson de Andrade Neves
Belo Horizonte, 8 de outubro de 2017