Artigo Destaque dos editores

A constitucionalidade da multa pela não homologação de declaração de compensação de tributos federais

Exibindo página 1 de 4
16/09/2020 às 13:40
Leia nesta página:

A declaração de compensação de tributos extingue sob condição resolutória os débitos nela informados. O artigo analisa a imposição de multa pela transmissão de declaração na qual não há o reconhecimento do direito creditório pleiteado pelo contribuinte.

INTRODUÇÃO

A compensação tributária, meio de extinção do crédito tributário, é prática corriqueira na atividade tributária, principalmente por parte das pessoas jurídicas.

Apresentada a declaração de compensação, considera-se extinto o crédito tributário, sob condição resolutória, já que o fisco deverá realizar a homologação da compensação declarada, nos termos da legislação correspondente, ou simplesmente permitir que ocorra a homologação tácita ao fim do prazo de cinco anos.

A norma prevê situações nas quais o contribuinte não poderá utilizar determinados tipos de créditos em uma compensação declarada.

No caso da tentativa de utilização de alguns destes ou na apresentação de declaração com indicação de crédito inexistente, o fisco não homologará a compensação, cobrará os débitos confessados e ainda lançará multa isolada no montante de 50% (cinquenta por cento) ou 150% (cento e cinquenta por cento) do valor dos débitos que o contribuinte pretendia compensar.

Tal previsão, constante da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, visa a punir a ação do contribuinte que, a despeito das expressas vedações legais, utiliza crédito não permitido para extinguir débitos tributários de competência do fisco federal.

Esta exigência tem sido objeto de inúmeras contestações judiciais que classificam a aplicação das penalidades como obstáculo ao exercício do direito constitucional de petição.

O presente estudo, apoiado basicamente em pesquisa bibliográfica, normativa e jurisprudencial, tem o condão de analisar os institutos da compensação tributária e da penalidade decorrente da sua não homologação, debatendo a validade da alegação de que a aplicação da referida penalidade importaria em afronta ao direito constitucional de petição, bem como à garantia da ampla defesa e ao contraditório.

Avaliamos ao longo do estudo a natureza e a aplicabilidade da sanção discutida e apresentamos os principais argumentos levados ao judiciário pelos contribuintes com o fito de impedir a sua exigibilidade, trazendo considerações acerca da sustentabilidade de cada um deles.

Para tal, o trabalho foi desenvolvido de forma a trazer uma abordagem inicial sobre o Direito Tributário Penal, suas características e implicações.

Em seguida, tratamos especificamente da compensação como mecanismo de extinção do débito tributário para, ao fim, trazermos as teses advogadas pelos contribuintes contrários à possibilidade de aplicação de sanções advindas do procedimento de compensação, demonstrando finalmente a constitucionalidade da exigência.


1 O DIREITO TRIBUTÁRIO PENAL

Para evoluirmos ao tratamento do tema central deste estudo é salutar a realização de uma apresentação do conceito de Direito Tributário Penal, tarefa que se inicia com o paralelo a ser desenhado entre este e o Direito Penal Tributário, o que passamos a fazer.

1.1 Direito Penal Tributário e Direito Tributário Penal

Para o Direito Penal Tributário, inserido no âmbito do Direito Penal, a conduta tipificada deverá ser definida como crime, conforme critérios legais, compreendendo os crimes contra a ordem e administração tributárias, atualmente definidos pela Lei nº 8.137 de 27 de dezembro de 1990.

As sanções nesta seara exigem a intervenção do Poder Judiciário, único competente para a fixação e imposição de penas desta natureza.

Para o Direito Tributário Penal, classificado como um ramo do Direito Tributário, importa a ocorrência de uma infração administrativa tributária, caracterizada pelo descumprimento de uma norma tributária, seja principal ou acessória (MACHADO, 2008).

Neste caso não se está a falar de crime, mas de infração ao mandamento atinente ao conteúdo normativo tributário, sendo a pessoa jurídica de direito público competente para instituir tributos e também responsável por prever sanções para o caso de descumprimento das obrigações acessórias que criar, ao passo que em matéria penal tributária somente caberá à União legislar, por força do art. 22, I da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB).

É de se anotar que a infração no Direito Tributário Penal pode ou não envolver a exigibilidade de recolhimento de tributo, haja vista que neste campo insere-se o descumprimento de deveres instrumentais, as obrigações acessórias, conforme indicado no art. 113 do Código Tributário Nacional (CTN):

Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória.

§ 1º A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente.

§ 2º A obrigação acessória decorre da legislação tributária e tem por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos.

§ 3º A obrigação acessória, pelo simples fato da sua inobservância, converte-se em obrigação principal relativamente à penalidade pecuniária.

Tanto os ilícitos penais quanto as infrações administrativas constituem condutas não admitidas pelo ordenamento jurídico e sujeitos à aplicação de sanções.

A distinção entre as duas categorias, portanto, se dá a partir do critério de política criminal no qual se pauta o poder legislativo na concepção do ordenamento penal, com base no desvalor das condutas constantes dos tipos incriminadores.

Do mesmo modo, podem prosseguir tanto no curso de processo tributário penal quanto no de um processo penal tributário a apuração de consequências ligadas a um mesmo fato, caso este venha a ser tipificado em ambas as esferas, não havendo o que se falar em bis in idem, dada a independência de instâncias administrativa e penal, conforme explica Schoueri (2012, p. 1043):

Não há que falar, no caso de incidência de penalidades previstas em ambas as esferas, em bis in idem, como tampouco seria o caso de se cogitar de semelhante ocorrência quando se sujeitasse o ladrão a uma pena privativa de liberdade, além de obriga-lo a devolver a coisa roubada. Se o administrador da companhia falsifica um documento e subtrai recursos daquela, estará sujeito a penalidade societária (destituição do cargo), além da possível pena pelo crime cometido.

É o caso, por exemplo, da autuação lavrada contra o contribuinte que, nos termos do art. 44, § 1o da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, contempla multa de ofício qualificada1 nos casos em que constatado dolo, fraude ou conluio para a prática de sonegação, independentemente de “outras penalidades administrativas ou criminais cabíveis”, ensejando a elaboração de uma representação fiscal para fins penais, nos termos do art. 83 da mesma norma.

A representação fiscal para fins penais será destinada ao Ministério Público, mas somente depois de proferida decisão administrativa definitiva confirmando a higidez do crédito tributário lançado, ao qual caberá tomar as providências acerca de uma possível ação penal.

As distinções que ora são apontadas, contudo, não impedem a observância de princípios comuns aos dois ramos estudados.

O princípio do in dubio pro reo, inserido no art. 112 do CTN, determina que o Direito Tributário Penal deve favorecer o acusado, exigindo-se, exclusivamente no que se refere às penalidades, a interpretação mais benéfica, desde que verificada alguma das circunstâncias ali previstas2.

A retroatividade benigna está presente no art. 106 do CTN que, assim como previsto no art. 107, III do Código Penal (CP), permite a aplicação retroativa da lei que deixe de tratar o fato então punível como ilícito, desde que, na seara tributária, o ato não esteja definitivamente julgado.

Uma vez constituído o crédito tributário, com o lançamento definitivamente julgado3, a penalidade passa a compor o débito, não existindo mais possibilidade de reaver o seu montante com base na retroação benigna, residindo aqui um ponto de distinção na aplicação do princípio em relação ao Direito Penal, posto que a lei posterior favorável ao agente deve extinguir os efeitos da pena ainda que decidida por sentença condenatória transitada em julgado, nos termos do art. 2o parágrafo único do CP.

A garantia do devido processo legal, corolário do Estado Democrático de Direito, esculpido no art. 5o, LV da CRFB, compreende a sua aplicação tanto aos litigantes em processo judicial quanto em processo administrativo, abrangendo os acusados em geral, sendo certa a sua aplicabilidade ao Direito Tributário Penal.

Além disso, merece menção o instituto do arrependimento posterior, definido no art. 16 do CP cujo equivalente na esfera tributária é a denúncia espontânea nos termos do art. 138 do CTN, que mitiga os efeitos da mora resolvida pelo contribuinte antes do início de procedimento administrativo.

Por fim, mas sem esgotar as possibilidades de indicação de semelhanças principiológicas, apontamos o princípio da insignificância (ou bagatela), nascido na teoria da política criminal, conforme traduz NUCCI (2014 p. 307):

Com relação à insignificância (crime de bagatela), sustenta-se que o direito penal, diante de seu caráter subsidiário, funcionando como ultima ratio, no sistema punitivo, não se deve ocupar de bagatelas. Há várias decisões de tribunais pátrios, absolvendo réus por considerar que ínfimos prejuízos a bens jurídicos não devem ser objeto de tutela penal. (...) Há três regras, que devem ser seguidas, para a aplicação do princípio da insignificância: 1) consideração do valor do bem jurídico em termos concretos. 2) consideração da lesão ao bem jurídico em visão global. 3) consideração particular aos bens jurídicos imateriais de expressivo valor social.

A atividade de administração tributária é caracterizada pelo caráter vinculado da atuação do agente público, nos termos do art. 142 do CTN. Ainda assim, da leitura do seu art. 108, § 2o, a contrario sensu, há quem entenda a aplicabilidade do princípio da insignificância para o caso de exigência de penalidades, já que a vedação à dispensa de cobrança por equidade apenas se refere a tributo, não explicitando a impossibilidade da sua incidência quanto a multas, interpretação defendida por Schoueri (2012, p. 1048).

1.2 A sanção tributária

Na definição de Machado (2008, p. 481) sanção é o meio de que se vale a ordem jurídica para desestimular o comportamento ilícito, tido este conceito, de forma geral, como mais abrangente do que o do comportamento ilegal, posto que não adstrito à reserva de veiculação em lei, em que pese, particularmente em matéria tributária, prevaleça o mandamento da reserva legal.

A sanção pode dirigir-se no sentido de compelir o responsável pela inobservância da norma ao cumprimento do seu dever ou pode consistir em uma punição a este cominada.

Já foi mencionado que as infrações definidas nas esferas tributária penal e penal tributária não possuem distinções estruturais, senão o fato de resultarem de escolhas do legislador. O mesmo pode ser dito em relação às sanções: não há diferença ontológica entre uma sanção administrativa, civil ou penal.

A distinção a ser considerada existe eminentemente no campo valorativo, uma vez que a sanção penal conduz ao entendimento de que o fato punível traz carga de gravidade superior, tendo em vista a importância do bem jurídico tutelado e a ofensa à segurança e aos interesses sociais.

Tal percepção faz com que se adotem punições mais severas na área penal do que na área cível e administrativa, o que justificaria, por sua vez, a exclusividade do Poder Judiciário para a sua imposição.

O Código Tributário Nacional no seu art. 136 define como regra a natureza objetiva da responsabilidade pela infração tributária.

É dizer que para a apuração e cominação de penalidades não importa, à luz do fato gerador enquadrado, que seja comprovada a existência de culpa ou dolo por parte do agente em questão.

A regra, porém, encontra exceção quanto à aplicação de sanções pessoais descritas na forma do art. 137 do CTN, ao listar situações em que a responsabilidade é pessoal do agente e o qual ora transcreve-se para melhor esclarecimento do seu teor:

Art. 137. A responsabilidade é pessoal ao agente:

I - quanto às infrações conceituadas por lei como crimes ou contravenções, salvo quando praticadas no exercício regular de administração, mandato, função, cargo ou emprego, ou no cumprimento de ordem expressa emitida por quem de direito;

II - quanto às infrações em cuja definição o dolo específico do agente seja elementar;

III - quanto às infrações que decorram direta e exclusivamente de dolo específico:

a) das pessoas referidas no artigo 134, contra aquelas por quem respondem;

b) dos mandatários, prepostos ou empregados, contra seus mandantes, preponentes ou empregadores;

c) dos diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado, contra estas.

Ao exigir dolo para a caracterização da responsabilidade o dispositivo não produz outra coisa senão a criação de hipóteses em que a responsabilidade pelas infrações tributárias será subjetiva, ou seja, dependente da vontade manifesta do agente que as cometer.

O ilícito administrativo tributário é reconhecido como de conteúdo patrimonial quando implica o não pagamento, seja total ou parcial, do tributo devido.

Pode haver hipótese, porém, em que o ilícito consiste simplesmente na inobservância do cumprimento de uma simples obrigação acessória, como a de apresentar declarações, por exemplo, conforme previsto no parágrafo 3o do art. 113 do CTN: “a obrigação acessória, pelo simples fato da sua inobservância, converte-se em obrigação principal relativamente à penalidade pecuniária”.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Neste ramo, as sanções são eminentemente pecuniárias4 podendo assumir a forma de um valor fixo, também denominada de multa isolada ou pelo descumprimento de um dever formal, ou proporcional ao valor do tributo não pago, ocorrendo, nesses casos, a cobrança concomitante do tributo e da multa correspondente.

O Supremo Tribunal Federal (STF) não admite a aplicação das chamadas sanções políticas5, consistentes em diversas formas de restrições a direitos do contribuinte como forma indireta de compeli-lo a realizar o pagamento de débitos tributários, verdadeiras violações ao princípio da livre iniciativa e do livre exercício profissional.

Conforme exemplifica Machado (2008, p. 493), as sanções políticas podem ser materializadas na forma de apreensão de mercadorias em face de pequenas irregularidades formais, a recusa de emissão de certidão negativa de débito quando não existe lançamento consumado contra o contribuinte ou ainda a suspensão de atividades em razão exclusivamente da existência de dívidas tributárias.

O mesmo pode ser dito em relação às penalidades com efeito confiscatório, em relação as quais o Supremo Tribunal Federal também se pronunciou com entendimento originariamente orientado à instituição de tributos, no sentido de impedir a aplicação de penalidades que firam o princípio da capacidade contributiva, bem como viole a vedação ao confisco contido no art. 150, IV da CRFB.

Este é o teor da decisão exarada na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.075, que versou acerca de multa à ordem de 300% (trezentos por cento) sobre o valor do bem ou serviço, no caso em comento em razão da não comprovação (ou não emissão) da nota fiscal, cuja ementa transcrevemos na parte relativa ao tema:

A TRIBUTAÇÃO CONFISCATÓRIA É VEDADA PELA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA.

É cabível, em sede de controle normativo abstrato, a possibilidade de o Supremo Tribunal Federal examinar se determinado tributo ofende, ou não, o princípio constitucional da não-confiscatoriedade consagrado no art. 150, IV, da Constituição da República. Hipótese que versa o exame de diploma legislativo (Lei 8.846/94, art. 3º e seu parágrafo único) que instituiu multa fiscal de 300% (trezentos por cento) . - A proibição constitucional do confisco em matéria tributária - ainda que se trate de multa fiscal resultante do inadimplemento, pelo contribuinte, de suas obrigações tributárias - nada mais representa senão a interdição, pela Carta Política, de qualquer pretensão governamental que possa conduzir, no campo da fiscalidade, à injusta apropriação estatal, no todo ou em parte, do patrimônio ou dos rendimentos dos contribuintes, comprometendo-lhes, pela insuportabilidade da carga tributária, o exercício do direito a uma existência digna, ou a prática de atividade profissional lícita ou, ainda, a regular satisfação de suas necessidades vitais básicas. - O Poder Público, especialmente em sede de tributação (mesmo tratando-se da definição do "quantum" pertinente ao valor das multas fiscais), não pode agir imoderadamente, pois a atividade governamental acha-se essencialmente condicionada pelo princípio da razoabilidade que se qualifica como verdadeiro parâmetro de aferição da constitucionalidade material dos atos estatais. (...) (STF - ADI-MC: 1075 DF , Relator: CELSO DE MELLO, Data de Julgamento: 17/06/1998, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJ 24-11-2006 PP-00059 EMENT VOL-02257-01 PP-00156 RDDT n. 139, 2007, p. 199-211 RDDT n. 137, 2007, p. 236-237)

Restringindo ainda mais o entendimento acerca dos limites a partir dos quais estará caracterizado o efeito confiscatório da aplicação da penalidade, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 833.106, concluiu que a aplicação de penalidade à ordem de 120% (cento e vinte por cento) fere a proteção constitucional contra o efeito confiscatório dando provimento ao recurso apresentado para assentar a inconstitucionalidade da cobrança de multa tributária em percentual superior a 100% (cem por cento), qual seja, impedindo que o valor da multa seja superior ao valor principal do tributo ao qual se refere.

1.3 A defesa administrativa no âmbito federal

O Processo Administrativo Fiscal federal é regulado pelo Decreto nº 70.235/72, estatuído a partir do Decreto-Lei nº 822/69, que delegou competência ao Poder Executivo para legislar sobre processo fiscal. Subsidiariamente ao que está determinado pela norma geral do Processo Administrativo aplica-se também a Lei nº 9.784/99.

O Decreto nº 70.235/72 surge assim, com a finalidade de regular o processo administrativo relativo à determinação e à exigência de créditos tributários federais, de empréstimos compulsórios e de consulta, incluindo, genericamente, matérias relativas à aplicação de sanções administrativas pela Receita Federal do Brasil.

Em decorrência da mencionada delegação de competência, atualmente a jurisprudência brasileira tem conferido a este decreto o status de lei.

Um dos seus grandes méritos foi o de unificar a legislação processual tributária, uma vez que cada tributo trazia regras processuais específicas para sua cobrança, o que dificultava o sistema de administração tributária, com variedade de formas, prazos e procedimentos específicos, gerando uma série de legislações processuais específicas de complicada assimilação.

Ainda assim, deixou vários procedimentos típicos da atividade tributária à margem da regulação, como os procedimentos relativos especificamente à penalidade, repetição de indébito, perdimento de mercadoria, entre outros, restando, para muitos, insuficiente para atingir o fim a que se propunha.

Não obstante as carências destacadas, o diploma reservou atenção a respeito do contraditório e da ampla defesa, ao estabelecer os caminhos postos à disposição do contribuinte para o exercício das citadas garantias constitucionais.

Constituído o crédito tributário ou aperfeiçoado o ato administrativo que produz efeitos jurídicos, pode o contribuinte comportar-se de uma entre as três formas possíveis: não concordar com a autuação e impugnar o ato - ou apresentar manifestação de inconformidade, de acordo com a decisão reclamada, conformar-se e efetuar a extinção da exigência através de uma das formas previstas no Código Tributário Nacional (CTN) ou se omitir, o que caracteriza a revelia, quando não há nem a extinção e nem a realização de qualquer ato que importe na suspensão da exigibilidade do crédito.

No caso da lavratura de sanções tributárias o contribuinte exerce o seu direito ao contraditório e a ampla defesa com a apresentação de impugnação.

A propósito, é entendimento pacífico que, tais garantias só podem ser invocadas neste momento, ou seja, no momento em que se configura a instauração do contencioso, com a apresentação da impugnação tempestiva.

Antes de aperfeiçoado o lançamento, verifica-se a ocorrência da etapa inquisitiva, na qual o fisco levanta as informações necessárias para a imputação de uma obrigação tributária inadimplida, ou a constituição de uma multa diante da constatação da prática de uma infração tributária.

Ao contribuinte não é garantido o direito de, neste momento, efetivar qualquer medida no intuito de impedir a ação fiscalizatória ou seu resultado, haja vista o disposto pelo art. 14 do Decreto nº 70.235/72, determinando que a “impugnação da exigência instaura a fase litigiosa do procedimento”.

Em relação ao tema, traz-se ementa produzida a partir de decisão administrativa exarada pela Delegacia da Receita Federal de Julgamento (DRJ) de Campo Grande/MS, com grifo nosso, onde se discutia a necessidade de intimação ao contribuinte para prestação de esclarecimentos, no decurso do procedimento de fiscalização e antes do seu desfecho.

A tese vencedora, convencida pelo citado art. 14 do Decreto nº 70.235/72, foi a de que não é garantido ao contribuinte o exercício do contraditório e da ampla defesa antes de instaurado o litígio e que tais garantias foram respeitadas a partir da oportunidade de apresentação e apreciação da impugnação interposta, junto a qual o contribuinte pôde ofertar as provas que considerasse necessárias:

Imposto sobre a Renda de Pessoa Física - IRPF OMISSÃO DE RENDIMENTOS. DEPENDENTES. Os rendimentos tributáveis recebidos pelos dependentes devem ser somados aos rendimentos do contribuinte para efeitos de tributação na declaração. PROCEDIMENTO FISCAL. PARTICIPAÇÃO DO AUTUADO. O procedimento fiscal possui natureza inquisitiva, sendo prescindível a participação do autuado nessa fase, mormente quando a autoridade fiscal já dispõe de informações necessárias para a caracterização da infração tributária. DIRPF. RETIFICAÇÃO. ESPONTANEIDADE. PROCEDIMENTO FISCAL. IMPOSSIBILIDADE. Após o início do procedimento fiscal, o autuado perde a espontaneidade para retificar a declaração de ajuste anual.

As Delegacias da Receita Federal de Julgamento, a propósito, constituem-se na primeira instância do contencioso administrativo federal, atualmente regidas pela Portaria MF 341, de 12 de julho de 2011, formadas por Turmas Ordinárias e Especiais de julgamento, cada uma delas integrada por 5 (cinco) julgadores, podendo funcionar com até 7 (sete) julgadores, titulares ou pro tempore. 

Todos necessariamente ocupantes do cargo de Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil e designados para mandatos com duração de até 36 (trinta e seis) meses, admitidas reconduções.

As unidades das Delegacias da Receita Federal de Julgamento são compostas por turmas e a cada uma confere-se competências especificas de julgamento, conforme ato do Ministro da Fazenda.

Apresentada a impugnação ou a manifestação de inconformidade pelo contribuinte interessado em discutir um direito, cabe a estas o julgamento em primeira instância da peça de contestação.

Esta impugnação não poderá resultar em um agravamento da exigência original, ou seja, há vedação ao reformatio in pejus, ressalvada a possibilidade de o fisco efetuar um lançamento suplementar, dentro do prazo decadencial, se constatado ao longo do julgamento administrativo a insuficiência do lançamento original, resguardado ao contribuinte o direito de impugnar a exigência, como se inicial fosse.

O julgador, tanto o de primeira quanto o de segunda instância, em respeito ao princípio da oficialidade, tem o poder de comando do processo, podendo determinar de ofício a realização de diligências ou perícias, quando as entender necessárias (art. 18 do Decreto nº 70.235/1972) à formação de sua convicção.

A determinação para realização de diligência ou perícia deve estar devidamente motivada (inciso VII, do parágrafo único do art. 2º da Lei nº 9.784/99), descrevendo a razão do pedido para que o resultado seja eficaz.

O art. 16 do Decreto 70.235/72 apresenta os itens que não podem deixar de constar na peça contestatória, para que o contribuinte exerça o seu direito de defesa, como as provas que possua e comprovem o que afirma, bem como prevê a requisição de diligências e perícias com a finalidade de produzi-las.

Há previsão, inclusive, que tais provas sejam apresentadas em momento posterior à apresentação da impugnação, desde que tenham caráter superveniente.

Findo o julgamento em primeira instância, o órgão dá ciência ao interessado do acórdão proferido. Caso o lançamento tenha sido mantido total ou parcialmente, o contribuinte poderá apresentar, no prazo de trinta dias da ciência,  recurso voluntário total ou parcial, que será submetido à segunda instância administrativa (artigo 33 do Decreto n.º 70.235/72).

O julgamento em segunda instância é feito pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF),  órgão colegiado e paritário, composto por conselheiros representantes da Fazenda Nacional e dos contribuintes.

Recentemente modificado e aprovado pela Portaria MF nº 343, de 9 de junho de 2015, o Regimento Interno do CARF (RICARF) estabelece a sua estrutura compreendendo três Seções, cada uma comportando quatro câmaras de julgamento, além da Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF), composta por três turmas.

As Seções são especializadas por matéria e constituídas por quatro Câmaras; e tais Câmaras poderão ser divididas em Turmas, nas quais são realizados os julgamentos em segunda instância.

Mesmo se o recurso voluntário for apresentado após o prazo legal, compete ao CARF o seu exame. Portanto este recurso, mesmo protocolado intempestivamente, será encaminhado ao órgão de segunda instância, que julgará a perempção (artigo 35 do Decreto nº 70.235/72).

Compete aos presidentes de câmara negar, de oficio ou por proposta do relator, seguimento ao recurso apresentado intempestivamente, quando não houver prequestionamento em relação à regularidade de sua interposição.

O recurso voluntário tem efeito suspensivo e, em conseqüência, a eficácia do acórdão de primeira instância fica sobrestada até que se decida a causa, ou seja, durante o transcurso destas etapas permanece suspensa a exigibilidade do crédito tributário discutido, nos termos do art. 151, III do Código Tributário Nacional.

Contra os acórdãos proferidos pelos colegiados do CARF é cabível o recurso especial contra decisão divergente, cujas normas estão reguladas no Regimento Interno do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Anexo II da Portaria MF no 343/2015, arts. 67 a 71), contra as decisões que tenham empregado à lei tributária interpretação divergente da que lhe tenha dado outra Câmara, turma de Câmara, turma especial ou a própria Câmara Superior de Recursos Fiscais. Terá legitimidade para sua interposição tanto o sujeito passivo contra o Procurador da Fazenda Nacional com atuação junto ao órgão.

Admitido o recurso, o processo será encaminhado à outra parte, que terá prazo de quinze dias para apresentação de suas contrarrazões.

O despacho que rejeitar, total ou parcialmente, a admissibilidade do recurso especial será submetido à apreciação do Presidente da CSRF, que poderá designar conselheiro da CSRF para se pronunciar sobre a admissibilidade do recurso especial interposto.

Na hipótese de o Presidente da CSRF entender presentes os pressupostos de admissibilidade, o recurso especial irá retomar seu curso, sendo então encaminhado à outra parte, que terá prazo de quinze dias para apresentação de suas contrarrazões. Será definitivo o despacho do Presidente da CSRF que negar ou der seguimento ao recurso especial.

Em resumo: o contribuinte inconformado com ato da administração poderá interpor impugnação ao colegiado de primeira instância (DRJ), recorrer voluntariamente das decisões desta em segunda instância (CARF) e, atendidos os requisitos de admissibilidade, contra as decisões deste, interpor recurso especial à Câmara Superior de Recursos Fiscais.

O ingresso na via administrativa é gratuito, dispensa a intervenção de advogado e suspende de imediato a exigibilidade do crédito tributário, conforme o CTN, art. 151, III, ao passo que a reclamação no âmbito judicial somente tem este condão nos casos em que haja decisão liminar (CTN, art. 151, IV).

Matéria que recorrentemente é tema de debates e questionamentos acerca de possíveis limitações ao exercício do contraditório e da ampla defesa refere-se à possibilidade da discussão administrativa da inconstitucionalidade de normas aplicadas ao direito tributário.

Contudo é vedado aos membros das turmas de julgamento tanto do CARF quanto da DRJ afastar a aplicação ou deixar de observar tratado, acordo internacional, lei ou decreto, sob fundamento de inconstitucionalidade.

Existem exceções, conforme se apreende da leitura do art. 26-A do Decreto 70.235/72, transcrito a seguir:

Decreto 70.235/72, Art. 26-A.  No âmbito do processo administrativo fiscal, fica vedado aos órgãos de julgamento afastar a aplicação ou deixar de observar tratado, acordo internacional, lei ou decreto, sob fundamento de inconstitucionalidade.

§ 6o  O disposto no caput deste artigo não se aplica aos casos de tratado, acordo internacional, lei ou ato normativo: (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009)

I – que já tenha sido declarado inconstitucional por decisão definitiva plenária do Supremo Tribunal Federal; (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009)

II – que fundamente crédito tributário objeto de:

a) dispensa legal de constituição ou de ato declaratório do Procurador-Geral da Fazenda Nacional, na forma dos arts. 18 e 19 da Lei no 10.522, de 19 de julho de 2002; (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009)

b) súmula da Advocacia-Geral da União, na forma do art. 43 da Lei Complementar no 73, de 10 de fevereiro de 1993; ou (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009)

c) pareceres do Advogado-Geral da União aprovados pelo Presidente da República, na forma do art. 40 da Lei Complementar no 73, de 10 de fevereiro de 1993. (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009).

Ainda assim, pode-se observar que tais exceções pressupõem uma determinação anterior emanada por outros órgãos concernentes ao tema.

Sobre o assunto, manifestam-se Marcos Vinicius Neder e Maria Tereza Martinez Lopez (2010, p. 417):

Observamos ser a questão que envolve interpretações sobre a ilegalidade ou inconstitucionalidade de determinado ato, pelos órgãos administrativos, um dos temas centrais das discussões doutrinárias e jurisprudenciais, sendo disputa travada tanto nas instâncias administrativas quanto nas judiciárias. O acúmulo de processos que versam sobre matéria tributária no Supremo Tribunal Federal tem gerado reflexões, pois se relacionam a questão de massa. Na verdade, as questões tributárias, somadas às previdenciárias, representam a maioria dos casos a serem resolvidos pela Corte Constitucional. O Ministro Gilmar Ferreira Mendes defendeu em diversas oportunidades a importância da criação de mecanismos de prevenção que antecipem a solução dos litígios de massa e evitem a chegada dessas questões a Suprema Corte. Isso tornaria a prestação da tutela do Estado mais célere e eficaz.

Apesar das discussões, o momento atual ainda é de limitação à possibilidade de afastamento da incidência de normas sob argumento de inconstitucionalidade, conforme sumulado pelo CARF:

Súmula CARF nº 2: O CARF não é competente para se pronunciar sobre a inconstitucionalidade de lei tributária.

A titulo de ilustração, menciona-se decisão proferida no julgamento do processo administrativo fiscal federal de número 18192.000193/2007-39, no qual o contribuinte protestou contra o valor, a seu ver, exacerbado da multa moratória imposta no lançamento discutido, a qual contrariava os princípios constitucionais da razoabilidade e proporcionalidade, questionamento que teve como resposta a compreensão de que não caberia ao CARF manifestar-se sobre o tema, conforme informa a ementa transcrita:

Assunto: Processo Administrativo Fiscal Período de apuração: 01/07/2005 a 31/12/2005 INCLUSÃO DOS DÉBITOS EM PARCELAMENTO - DISCUSSÃO JUDICIAL. - JUROS E MULTA - RENÚNCIA A INSTÂNCIA ADMINISTRATIVA - NÃO CONHECIMENTO. Importa renúncia às instâncias administrativas a propositura pelo sujeito passivo de ação judicial por qualquer modalidade processual, antes ou depois do lançamento de ofício, com o mesmo objeto do processo administrativo. O recorrente na ação declaratória questiona a possibilidade de parcelar, inclusive juros e multa. INCONSTITUCIONALIDADE - ILEGALIDADE DE LEI E CONTRIBUIÇÃO - IMPOSSIBILIDADE DE APRECIAÇÃO NA ESFERA ADMINISTRATIVA A verificação de inconstitucionalidade de ato normativo é inerente ao Poder Judiciário, não podendo ser apreciada pelo órgão do Poder Executivo. O CARF não é competente para se pronunciar sobre a inconstitucionalidade de lei tributária. Recurso Voluntário Negado.

É dizer que ao contribuinte punido pela acusação de prática de infração tributária é ofertada a possibilidade da discussão administrativa, nos termos ora explicados.

Importa observar que o contribuinte pode buscar a satisfação da sua pretensão defensiva junto ao judiciário desde logo ou concluída a discussão administrativa que lhe for desfavorável.

1.4 A defesa judicial em âmbito federal

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, no seu art. 5o, XXXV, consagra o princípio da inafastabilidade da jurisdição que, em síntese, eleva o direito de ação ao patamar de um direito subjetivo do cidadão ao passo que estabelece o modelo de jurisdição unificada, que entrega ao judiciário a decisão final sobre as causas submetidas ao seu crivo.

O processo judicial tributário é regido pelo Código de Processo Civil6, salvo no tocante à execução fiscal e à medida cautelar fiscal7.

A iniciativa do processo de conhecimento, em geral, é do contribuinte, uma vez que as decisões relativas aos temas que se convertem em objeto de discussão judicial quase sempre são do próprio fisco.

Não há razão, diante disto, para que ocorra a provocação de controle judicial, dada a presunção de legitimidade e veracidade que caracteriza os atos administrativos, bem como de certeza e liquidez dos créditos tributários inscritos em dívida ativa (CTN, art. 204) que poderão submeter-se a uma ação de execução, mas não de conhecimento. Conforme ensina Machado (2008, p. 458):

Se o fisco decide, administrativamente, pela existência de um crédito tributário, a cobrança deste se faz mediante a propositura da execução fiscal, posto que o fisco constitui, unilateralmente, o título executivo a seu favor. Por isto é que o fisco não tem necessidade de ir a Juízo para pleitear uma decisão sobre o seu direito de crédito.

Em se tratando de tributos federais, a competência para julgamento das demandas será da Justiça Federal, conforme previsto no art. 109, I da CRFB, tendo em vista a condição de ré colocada à União.

As ações de iniciativa do contribuinte para defender-se contra a imputação de uma infração tributária, e a conseqüente cobrança da multa correspondente, basicamente incidirá na proposição de algum dos seguintes tipos de ação, em lista apontada por Machado (2008, p. 469):

  • Ação anulatória de lançamento tributário;

  • Ação declaratória;

  • Ação de repetição do indébito;

  • Mandado de Segurança;

  • Ação rescisória;

A ação anulatória é a que visa ao cancelamento do procedimento administrativo de lançamento que culminou com a formulação da exigência fiscal relativa à infração apurada. Por seguir o rito ordinário, este tipo de ação também recebe o nome de ação ordinária.

Na ação declaratória, também conhecida como uma ação ordinária em razão do rito ao qual se submete, o contribuinte pretende obter a declaração de existência ou inexistência de uma relação jurídica, no caso uma relação tributária que o define como sujeito passivo da obrigação referente à penalidade.

A ação de repetição de indébito demanda que o fisco seja condenado a devolver quantia já paga, indevidamente ou a maior, nos termos do art. 165 do Código Tributário Nacional.

Será manuseada quando o contribuinte já tiver recolhido a penalidade exigida e pretender, judicialmente, que seja devolvida a quantia paga a partir de fundamentos levados à apreciação judicial que eliminem a higidez da cobrança efetuada.

O mandado de segurança é garantido constitucionalmente para proteção de direito líquido e certo lesado ou ameaçado por ato de autoridade estatal, conforme previsão do art. 5o, LXIX, da CRFB.

É medida cabível, por exemplo, quando da adoção de uma sanção política, modalidade de sanção rejeitada pelos tribunais superiores, como já mencionado.

Em matéria tributária, a Lei nº 12.016, de 7 de agosto de 2009, que disciplina o instituto do mandado de segurança, prevê que não será concedida medida liminar que tenha por objeto a compensação de créditos tributários ou a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior (art. 7o, § 2o), ao passo que, conforme sumulado8 pelo Supremo Tribunal Federal, o “mandado de segurança constitui ação adequada para a declaração do direito à compensação tributária”.

Por fim, na hipótese de trânsito em julgado de sentença favorável à Fazenda Nacional em qualquer outra ação em que discutida a aplicação da infração tributária, poderá o contribuinte promover ação rescisória diante de uma das hipóteses de cabimento contidas no art. 485 do Código de Processo Civil de 19739.

É o caso, por exemplo, em que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal se tenha posicionado a favor da tese do contribuinte que não conseguiu que a sua ação chegasse até aquelas instâncias de julgamento.

Pode ser o caso de uma ação em que determinada penalidade foi aplicada ao contribuinte que apresentou demanda judicial na qual restou vencido, mas que posteriormente foi definida como inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal.

Dentro do prazo processual de dois anos após o trânsito em julgado da ação em que ficou vencido, pode o contribuinte ajuizar ação rescisória para rediscutir o assunto a luz do posicionamento demonstrado pelo Supremo Tribunal Federal.

1.5 A vedação à discussão concomitante nas instâncias administrativa e judicial

A prevalência das decisões judiciais, dado o caráter uno da jurisdição brasileira, determina que o ingresso em contencioso judicial importe, necessariamente em renúncia às instâncias administrativas.  

Tal entendimento está expresso no Decreto nº 7.574, de 29 de setembro de 2011, que determina em seu art. 87 que:

Art.87. A existência ou propositura, pelo sujeito passivo, de ação judicial com o mesmo objeto do lançamento importa em renúncia ou em desistência ao litígio nas instâncias administrativas (Lei no 6.830, de 1980, art. 38, parágrafo único).

Antes da edição da norma citada, no entanto, já existia a súmula nº 1 publicada pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) no tocante ao tema:

Importa renúncia às instâncias administrativas a propositura pelo sujeito passivo de ação judicial por qualquer modalidade processual, antes ou depois do lançamento de ofício, com o mesmo objeto do processo administrativo, sendo cabível apenas a apreciação, pelo órgão de julgamento administrativo, de matéria distinta da constante do processo judicial.

A vedação não pode ser considerada cerceamento de defesa, posto que renúncia somente refere-se aos objetos e argumentos absolutamente idênticos quando em ambas as esferas. Havendo disparidade de objeto ou de argumento, a renúncia poderá ser parcial ou, inclusive, não se configurar.

Esta compreensão decorre, como dito, do fato de prevalecer em definitivo o entendimento exarado pelo judiciário, não fazendo sentido permitir que progrida uma discussão administrativa que poderá ser contrariada eventualmente por decisão que a ela prevalecerá.

Importando observar que o esgotamento da lide administrativa não impede o contribuinte de pleitear seu direito na esfera judicial.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Igor Rosado do Amaral

Graduado em Comunicação Social pela ESPM/SP e em Direito pela UNIFOR/CE. Especialista em Direito Público pela Universidade de Caxias do Sul/RS. Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

AMARAL, Igor Rosado. A constitucionalidade da multa pela não homologação de declaração de compensação de tributos federais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6286, 16 set. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/62496. Acesso em: 24 nov. 2024.

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos