Capa da publicação Falsificação de medicamentos: pena desproporcional?
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A (in)constitucionalidade do artigo 273 e parágrafos do Código Penal.

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24/01/2018 às 14:15
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3 CONCLUSÃO

Tendo em vista o contexto histórico bem como o processo legislativo para criação da Lei nº 9.677/98, buscou-se compreender através do presente trabalho que, em razão da pressão por parte da mídia para propiciar respostas rápidas perante a sociedade, acarretou na carência legislativa no que tange as alterações do artigo 273 do Código Penal.

Inicialmente, realizou-se análise do artigo 273 do Código Penal, acerca das hipóteses de incidência bem como a pena prevista para o crime ora em comento.

Em continuidade, verificou-se a presença de conflitos de entendimentos perante os operadores do direito acerca da inconstitucionalidade da pena prevista para o delito, tendo em vista ferir o princípio da proporcionalidade, tamanho o descompasso entre a gravidade das condutas tipificadas como criminosas e a quantidade de pena prevista.

Assim, constatou-se que alguns Tribunais optam por declarar a desproporcionalidade da pena prevista no artigo 273 do Código Penal, e em contrapartida aplicam através da analogia a pena prevista no delito de tráfico de drogas, contudo, referido entendimento, conforme elucidado por esta pesquisa, não é correta, tendo em vista que acarreta na combinação de normas, o que é vedado no ordenamento jurídico, por ferir os princípios da legalidade, reserva legal bem como segurança jurídica.

Noutro viés, notou-se que há possibilidade de aplicação da pena prevista para o crime de tráfico de drogas ou contrabando somente se mostra adequada se houver a desclassificação integral da conduta. Dessa forma, a depender da natureza dos produtos apreendidos, é que determinará o enquadramento do tipo penal.

Portanto, se os medicamentos internalizados possuem na sua composição, princípios ativos inseridos na Portaria MS/VS nº 344/1998, trata-se de tráfico de drogas, assim, para que a substância seja considerada droga, basta que esteja descrita nas listas da Portaria referida, não se exigindo a demonstração de capacidade de causar dependência física ou psíquica.

De todo modo, reitera-se a tese afirmada de que o que determinará a desclassificação integral do tipo penal, é a natureza dos produtos apreendidos.

Quanto à aplicação do princípio da insignificância, não há qualquer objeção, tendo em vista que, o Direito Penal é de última ratio, portanto, algumas condutas não serão tuteladas com repreensões de maior gravidade.

De todo modo, é consabido que na aplicação do postulado da bagatela, devem-se levar em conta quatro aspectos de natureza objetiva, quais sejam: a) a mínima ofensividade da conduta do agente; b) a ausência de periculosidade social da ação; c) o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; e por fim, d) a inexpressividade da lesão jurídica causada.

Portanto, totalmente cabível a absolvição do agente nos casos de baixas quantidades de medicamentos, pois o bem jurídico tutelado (saúde pública) não restou atingido pela conduta descrita no tipo penal.

Por sua vez, quanto à possibilidade de aplicação dos efeitos repristinatórios da Lei, nota-se que apenas há possibilidade se houver a completa restauração da norma anteriormente revogada, e não apenas a aplicação parcial da pena originária do art. 273, pois constitui-se combinação de normas.

Assim sendo, conclui-se que, em face da desproporcionalidade da pena prevista para o artigo 273 §§1º e 1º-B do Código Penal, as soluções adequadas seriam: a) Levando-se em conta a natureza das mercadorias apreendidas, desclassificar integralmente a conduta para o crime de tráfico de drogas, ou descaminho. b) Considerando a aplicação dos efeitos repristinatórios, cabível se houve a desclassificação igualmente integral da conduta, pois caso contrário estaria criando um novo tipo penal; e por fim c) O reconhecimento do princípio da insignificância, quando a ofensa ao bem jurídico é ínfima, por exemplo, baixíssimas quantidades de produtos, situação na qual, o bem jurídico tutelado não restou atingido.


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Notas

[1] Comparado com o homicídio, a pena mínima do art. 273, § 1º-B é maior que três vezes a pena máxima do homicídio culposo e corresponde a quase o dobro da pena mínima do homicídio doloso simples. Ainda, a pena do art. 273, § 1º-B é cinco vezes maior que a pena mínima da lesão corporal bem como é maior que a reprimenda do estupro, do estupro de vulnerável, da extorsão mediante sequestro. ​

[2] Comparado com o homicídio, a pena mínima do art. 273, § 1º-B é maior que três vezes a pena máxima do homicídio culposo e corresponde a quase o dobro da pena mínima do homicídio doloso simples. Ainda, a pena do art. 273, § 1º-B é cinco vezes maior que a pena mínima da lesão corporal bem como é maior que a reprimenda do estupro, do estupro de vulnerável, da extorsão mediante sequestro. 

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SANDRI, Suellen. A (in)constitucionalidade do artigo 273 e parágrafos do Código Penal.. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5320, 24 jan. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/63095. Acesso em: 18 abr. 2024.

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