A arbitragem e sua aplicação no poder público

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O presente trabalho se propõe a analisar os benefícios da arbitragem, bem como a eficiência de se utilizar a arbitragem para a resolução e negociação entre as partes conflituosas, nas relações que possuem como uma das partes o Poder Público.

RESUMO:A arbitragem possibilita, através de um terceiro, o árbitro, a soluções para conflitos existentes entre as partes. O novo Código de Processo Civil dá maior visibilidade a arbitragem como forma de solução de conflitos e a Lei n. 9.307/96 com as modificações da Lei n. 13.129/2015 amplia a possibilidade de sua aplicação à Administração Pública. O presente trabalho se propõe a analisar os benefícios, bem como a eficiência de se utilizar a arbitragem para a resolução e negociação entre as partes conflituosas nas relações que possuem como uma das partes o Poder Público. Trata-se de uma pesquisa dedutiva, em que se analisou a aplicabilidade da arbitragem no decorrer dos anos, bem como a sua eficiência, além de uma análise das perspectivas da arbitragem na Lei n. 9.307/96 e as possíveis melhorias no relacionamento das partes e no desafogamento do Judiciário. Pelas leituras, estudos, pesquisas e análise do que atualmente ocorre na Justiça, percebeu-se que a arbitragem propiciará resolução mais célere dos conflitos da Administração Pública, sem a necessidade de se demandar judicialmente. Conclui-se que a arbitragem, embora pouco utilizada nesse âmbito, é apta a resolver conflitos e desafogar o Judiciário.

Palavra-Chave: Composição de Litígios. Arbitragem. Constitucionalidade. Administração Pública. Ajustes da Administração.

ABSTRACT:Arbitration allows, through a third party, the arbitrator, solutions to conflicts between the parties. The new Code of Civil Procedure gives greater visibility to arbitration as a form of conflict resolution and Law n. 9,307 / 96 with the modifications of Law no. 13.129 / 2015 extends the possibility of its application to Public Administration. The present work proposes to analyze the benefits, as well as the efficiency of using the arbitration for the resolution and negotiation between the conflicting parties in the relations that have as one of the parties the Public Power. It is a deductive research, in which the applicability of the arbitration over the years, as well as its efficiency, besides an analysis of the perspectives of the arbitration in the Law n. 9,307 / 96 and the possible improvements in the relationship of the parties and in the liberalization of the Judiciary. Through the readings, studies, researches and analysis of what currently takes place in Justice, it was realized that the arbitration will allow faster resolution of conflicts of the Public Administration, without the need to sue in court. It is concluded that the arbitration, although little used in this scope, is able to resolve conflicts and to unburden the Judiciary.

Keyword: Composition of Litigation. Arbitration. Constitutionality. Public administration. Administration Settings.


INTRODUÇÃO

Em face da chamada crise do judiciário, marcada pela morosidade, o Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015) apresenta a arbitragem como uma modalidade adequada para o tratamento do conflito. (BRASIL, 2015)

A arbitragem no Brasil não é um instrumento alternativo recente, teve a sua primeira regulamentação na Constituição Imperial de 1824, que previu em seu art. 160 que suas sentenças seriam executadas sem recursos, se as partes assim acordassem. Além de prever que as nomeações dos juízes árbitros nas causas cíveis e penais seriam feitas pelas partes. (BACELLAR, 2016)

Em 1850, através do Código Comercial brasileiro torna-se o juízo arbitral obrigatório para determinadas ações e aquelas não abarcadas por esse foram tratadas pelo regulamento n.737, de 25 de novembro de 1850. Após esse período as Constituições posteriores passam a dar maior relevância à judicialização. A Constituição de 1988, nos seus parágrafos 1° e 2° do art. 114, voltam a dar relevância à sua aplicação nos casos de tribunais e juízes do Trabalho quando frustadas as negociações coletivas.  (BACELLAR, 2016).

Atualmente a arbitragem está prevista na Lei n. 9.307/96, Lei de Arbitragem (LA), conhecida como Lei Marco Maciel. A Lei 13.129/15 inclui um parágrafo 2º no artigo 1º da Lei 9.307/96 estabelecendo que a “autoridade ou órgão competente da administração pública direta para a celebração de convenção de arbitragem é a mesma para a realização de acordos ou transações”.

  A arbitragem é uma técnica para solução de controvérsias por meio da intervenção de uma ou mais pessoas que recebem seus poderes de uma convenção privada, decidindo com base nesta convenção, sem intervenção do Estado, sendo a decisão destinada a assumir eficácia de sentença judicial (CARMONA, 1993).

Não obstante a concretude da arbitragem é incomum sua utilização, no direito público, o qual possui algumas peculiaridades não observadas no direito privado, sobretudo em face dos princípios da legalidade e da indisponibilidade do interesse público. Assim, o presente artigo tem por escopo examinar a aplicabilidade da arbitragem na Administração Pública, seus requisitos, benefícios e desvantagens.


MATERIAL E MÉTODOS

A pesquisa utilizou o método dedutivo de abordagem, pois partindo do estudo do desenvolvimento histórico da arbitragem, ressaltando seus procedimentos e organização; já quanto à técnica de pesquisa, utilizou-se a pesquisa bibliográfica e documental por meio da análise da legislação reitoria da matéria.


BREVE HISTÓRICO SOBRE A ARBITRAGEM NO BRASIL

Os conflitos tiveram surgimento desde o inicio da existência dos homens, o termo é originado do latim conflitus que é um antagonismo, oposição em que se tem uma divergência entre opiniões. (DINIZ, 1998).

A arbitragem é uma das modalidades de resolução de conflitos visto que tem a intervenção de um terceiro para decidir a lide. Sendo assim é uma forma de heterocomposição, na qual há uma decisão formal de um terceiro imparcial que as partes buscam solucionar a lide sem a intervenção do poder judiciário. (GRINOVER, 1999).

A primeira previsão legal que tratava da arbitragem no Brasil foi a Constituição do Império de 1824 em que consistia na criação do conselho do estado, estabelecia-se os quatro poderes (executivo, legislativo, judiciário e modificador) segurando o regime monárquico transmitindo o poder de forma hereditária. (SANTOS, 2001).

O Código Comercial de 1850, Lei n. 556 de junho e o decreto n.737 de 25 de novembro de 1850, ressaltam a importância da arbitragem com o juiz arbitral competente sendo obrigatória as normas imperativas para os comerciantes. (SANTOS, 2001).

Em 1891 a Constituição da República estabeleceu a arbitragem como canal de resolver conflitos entre particulares e fronteiras. (SANTOS, 2001).

O Código Civil de 1916 retrocedeu a arbitragem no Brasil, pela sua hermenêutica em que a decisão do árbitro não teria eficácia se não fosse homologada pelo judiciário, em que o legislador preocupava com o procedimento e formação do árbitro. (SANTOS, 2001).

O Brasil exerceu um grande papel internacionalmente em 1923 por um ato internacional, enaltecendo o protocolo de Genebra com cláusulas aplicando a arbitragem entre particulares.

Entretanto, foram muitas previsões legais que contribuíram para a celeridade, efetividade e autonomia da arbitragem, entre ele as Constituições de 1946, 1967 e 1969 conseguinte o Código de Processo Civil de 1973 em que pela jurisprudência e doutrina, não trouxeram a carga das mudanças decorrentes do árbitro. (SANTOS, 2001).

A Lei n. 9.307/1996 trouxe inovações como método alternativo sobre direitos, decisão de interesses entre as partes, vinculado de uma convenção de arbitragem em que as partes não buscam o poder judiciário. Portanto o árbitro pode ser qualquer pessoa capaz, imparcial para decidir o conflito com decisão formal do terceiro que tenha confiança das partes. Sendo assim a arbitragem é um método de resolução de conflito que pode ser usado por entes públicos e particulares, em regra sem vínculo anterior entre as partes. (SANTOS, 2001).

A Lei n. 9.307/1996 em seu artigo primeiro ressalta que “as pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais”, ou seja, podem ser transacionais. O parágrafo primeiro do mesmo dispositivo fala sobre a administração pública direta e indireta em que em caso de litígios pode solucionar o caso com a arbitragem.

A Lei n. 13.129/15 complementar e altera a lei da arbitragem em que destacam pontos significativos como a possibilidade ou utilização da arbitragem para solução de disputas envolvendo a administração pública no qual a arbitragem deverá ser de direito e respeitar o princípio da publicidade.

O Código de Processo Civil (CPC) de 2015 tem previsão legal da arbitragem, permitindo a solução de conflitos. Ele formalizou a arbitragem como jurisdição e fez sua previsão no §1º do artigo 3º do Código de Processo Civil. A arbitragem já é regulamentada por lei própria, a Lei n. 9.307/96 com as atualizações trazidas pela Lei n. 13.129/15, mas subsidiariamente se submete as Normas do Código de Processo Civil. O Poder Judiciário e a arbitragem são jurisdições paralelas, ambas reconhecidas constitucionalmente: a jurisdição estatal, que é regulada pelas normas processuais civis, e a jurisdição arbitral, que é regulada por lei extravagante. (BRASIL, 2015)

A harmonização entre as jurisdições ocorre através da carta arbitral, instrumento jurídico que possibilita pedidos de cooperação entre os juízes e árbitros. A carta arbitral esta prevista no artigo 237 do Código de Processo Civil. Este instrumento jurídico não autoriza a juízes a revisão do mérito das decisões proferidas no âmbito arbitral.


VANTAGENS DA APLICAÇÃO DA ARBITRAGEM PERANTE A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

A arbitragem é a intervenção de um terceiro, estranho ao conflito, para decidir o conflito. A decisão formal do conflito pertence ao terceiro. A decisão do arbitro é absoluta não é recorrível é chamada de sentença arbitral a titulo executivo, podendo essa decisão apenas pode ser nula de acordo com o art. 18 da Lei n. 9.307/96.

Segundo o art. 1° da Lei de Arbitragem, Lei n.9.307/96, quaisquer pessoas capazes de contratar podem se submeter à arbitragem, mas não será possível a sua utilização em todas as causas sendo somente passíveis de arbitragem os litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis.

A arbitrariedade teria aplicação nos casos do interesse público secundário, por os casos primários necessitarem de procedimentos mais complexos e que necessitarem de maior segurança jurídica. Segundo Hely Lopes Meirelles o interesse público primário é o objetivo a ser atingido pela Administração no atendimento das necessidades sociais, já o interesse público secundário é um instrumento utilizado para permitir a consecução do interesse público primário (MIRELLES, 2011).

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Com relação as vantagens da utilização da arbitragem na Administração Pública, Bacellar destaca:

Com o amparo no principio da continuidade do serviço público, afirma-se que qualquer contenda que envolva interesses públicos secundários, direitos disponíveis ou, ainda, direitos indisponíveis, mas transigíveis, na execução do contrato administrativo poderá ter uma maior celeridade pela decisão arbitral (BACELLAR, 2016, p.151).

A evolução do pensamento gerado pela a adoção do favor arbitrum, que liberaliza o domínio da arbitrabilidade, proporcionou a aprovação de dispositivos que possibilitaram a utilização da arbitragem como forma de resolução de conflitos no âmbito da administração pública. Como, por exemplo, cita-se o caso da Lei das Parcerias Público- Privadas e a Lei n. 11.196/2005, que modificou a Lei Geral da Concessão e Permissão de Serviços Públicos com isso houve a possibilidade de os contratos preverem o emprego dos mecanismos privados como a arbitragem para a resolução de seus conflitos. (BACELLAR, 2016)

Nota-se que há uma sucessão contínua de alterações legislativas em favor da busca de meios alternativos para solução de controvérsias existentes nas relações jurídicas entre particulares e entre esses e a Administração Pública. À Lei de Arbitragem, adicionaram-se outras alterações legislativos, as quais possibilitaram o uso da arbitragem pela Administração Pública, alguns desses diplomas legislativos são: a Lei n° 9.472/97 e a Lei n° 10.233/2001.

A Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997, que dispõe sobre a organização dos serviços de telecomunicações e cria a ANATEL (Agência Nacional de Telecomunicações), traz a previsão de utilização de métodos extrajudiciais de solução de conflito:

Art. 93. O contrato de concessão indicará:

XV – o foro e o modo para solução extrajudicial das divergências contratuais. (BRASIL, 1997)

Por sua vez, a Lei nº 10.233, de 5 de junho de 2001 que dispõe sobre a reestruturação dos transportes aquaviário e terrestre, cria o Conselho Nacional de Integração de Políticas Públicas de Transporte, a Agência Nacional de Transportes Terrestres, Terrestres, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários e o Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes também prevê a possibilidade de utilização de métodos extrajudiciais:

Art. 35. O contrato de concessão deverá refletir fielmente as condições do edital e da proposta vencedora e terá como cláusulas essenciais as relativas a:

XVI – regras sobre solução de controvérsias relacionadas com o contrato e sua execução, inclusive conciliação e arbitragem. (BRASIL, 2001)

Analisando a evolução legislativa, é visível a aceitação crescente da adoção da arbitragem e outros meios de solução de litígios pela Administração Pública.

Pereira e Talamini destacam haver reconhecimento doutrinário e também maior aceitação jurisprudencial da possibilidade que a administração, adote a arbitragem para a resolução de conflitos com particulares (PEREIRA; TALAMINI, 2010, p.137).

A arbitragem possibilita a aqueles que a utilizam maior segurança de que o contrato será respeitado, bem como que os seus conflitos serão resolvidos, tendo em vista que é mais célere em comparação as vias judiciais que estão em morosidade. A arbitragem tem o dever de proteger os interesses públicos, observando os princípios da legalidade, da moralidade, da impessoalidade e da publicidade. (BACELLAR, 2016)

Segundo Bacellar,

Defendem alguns arbitralistas a necessidade de flexibilizar alguns princípios a fim de viabilizar o uso da arbitragem pela Administração Pública, harmonizando-se as prerrogativas desta e a autonomia da vontade das partes, conciliando os interesses da Administração com os interesses privados nas hipóteses em que sua utilização é cabível (BACELLAR, 2016, p.147).

A arbitragem possui algumas peculiariedades que fazem a sua aplicação ser uma vantagem como o conhecimento técnico especializado dos árbitros em atendimento a Administração Pública. De acordo com a Lei n. 9.307/96 art. 13 poderá ser árbitro qualquer pessoa capaz e que tenha a confiança das partes. Os árbitros são escolhidos para solucionar uma demanda específica e por esse motivo possuem maior agilidade em resolver os conflitos.

Há muitos benefícios na utilização da arbitragem na Administração como: a prevalência da autonomia da vontade das partes, a segurança no procedimento, a efetividade e a celeridade. (BACELLAR, 2016)

Cavacalti (2000) posiciona-se de maneira favorável a administração utilizar do método de arbitragem para resolver suas controvérsias fazendo isso perante uma Câmara arbitral, ao invés de denegar o direito das partes, remetendo-as ao juízo ordinário ou gerando a perpetuação do processo administrativo sem que haja um órgão diretamente responsável pela instrução do processo.

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Sobre os autores
Vitória Dreide Xavier Araújo Silva

Graduada em Direito pela Universidade Estadual de Montes Claros- UNIMONTES.

Cynara Silde Mesquita Veloso

Professora da Unimontes. Mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e Doutora pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas)

Marcelo Brito

Mestre em desenvolvimento social pela UNIMONTES. Professor da Unimontes e das Faculdades Santo Agostinho.

Catiele Ferreira Santos

Graduanda em Direito da Universidade Estadual de Montes Claros- UNIMONTES, cursando o quinto período.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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