Recuperação judicial rural: Equiparação do produtor rural como empresário

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4 APLICAÇÃO ANALÓGICA DA LEI DE FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO JUDICIAL

4.1 Conceito de analogia

A analogia é uma espécie de lógica, ou seja, é usada para aplicar normas jurídicas à casos semelhantes a casos que já foram julgados, mas que não estão previstos em lei.

O artigo 4º, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, prevê o uso da analogia para solução de casos não previstos em lei: “Art. 4º. Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais do direito”.

Assim, é licito aplicar uma norma jurídica a casos que não estão previstos em lei, mas já tiveram outros conflitos semelhantes julgados, tendo em vista o princípio da igualdade jurídica, aonde dita que havendo razão da lei, deve se ter a mesma solução.

De acordo com o doutrinador Nader (2013, p. 194) explica o conceito de analogia: “A analogia é um recurso técnico que consiste em se aplicar, a uma hipótese não prevista pelo legislador, a solução por ele apresentada para um outro caso fundamentalmente semelhante e não prevista”.

Assim, quando houver julgamento de casos que não tenha na lei, porém, já estiver outros casos semelhantes solucionados, é de suma importância a analogia de normas.

4.2 Requisitos para analogia

Para que seja aplicada a analogia aos casos que não estão previstos em lei, mas já existem casos semelhantes solucionados, há de se observar alguns requisitos, quais sejam: inexistência de previsão legal para tal caso; semelhante entre o caso julgado e o que não existe previsão legal; identidade jurídica.

Desse modo, quando for aplicar a analogia ao caso concreto, observar-se-á a nossa lei, ou seja, existindo prévia disposição legal para solucionar tal caso, não poderá se valer do acima exposto, porém, no caso de omissão ou lacuna em nossa lei, poderá ser aplicado tal instituto.

Também, é indispensável verificar a semelhança entre o caso que já foi julgado e há previsão legal e o caso que não foi regulado por nossas leis, uma vez que eles devem ser semelhantes, ou seja, não idênticos, mas em sua essência terão que ser parecidos.

Por fim, é primordial que aja identidade jurídica entre os fatos no ponto comum as duas situações. A norma aplicada a um, terá que ser a mesma norma aplicada ao outro.

4.3 O empresário e a lei de recuperação judicial

Uma vez que o produtor rural estiver inscrito no órgão competente, ou seja, tenha sua atividade registrada na junta comercial, ele é reconhecido como empresário de fato, assim, faz jus a todos os benefícios descritos na Lei 11.101/2005 (Lei da Falência e da Recuperação Judicial) como qualquer outro empresário.

Gonçalves Neto (2007, p. 72) assim se posicionou em sua obra:

Mas, pode ter interesse na obtenção de registro para gozar das prerrogativas do empresário, possuir um nome para identificação do seu negócio, obter proteção em relação a ele, sujeitar-se-á a falência e à recuperação de empresas que lhe conferem tratamento especial etc. (GONÇALVES NETO, 2007, p. 72).

Após inscrito na junta comercial competente, o produtor rural será equiparado ao empresário e, consequentemente, fará jus aos benefícios da Recuperação Judicial por analogia.


5 A RECUPERAÇÃO JUDICIAL, EXTRAJUDICIAL E A FALÊNCIA

5.1 Conceitos

Antes de mais nada, é plausível relembrar que a Recuperação Judicial e a Falências, ambos são regidos pela Lei 11.101/2005 e, subsidiariamente, pelo Código Civil Brasileiro.

Outrossim, a Recuperação Judicial e Extrajudicial vem sendo utilizada em vasta escala, uma vez que o nosso país está passando com dificuldades econômico-financeiras gritantes e, uma das saídas, é a utilização desse instituto para que não venha ser decretada a Falência da empresa.

Art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estimulo à atividade econômica. (BRASIL, 2005)

A Recuperação Judicial e Extrajudicial é, basicamente, um benefício que o empresário de fato, ou seja, aquele inscrito no órgão competente, tem, para conseguir gerencias seus ativos e passivos sem que tenha que fechar a sua empresa, porém, exige-se alguns requisitos para que faça uso desse instituto, tais como: demonstrar a viabilidade da empresa e apresentar um plano de Recuperação Judicial plausível, como é descrito pelos artigos 47 e seguintes, da Lei de Recuperação Judicial e de Falência.

Bertoldi e Ribeiro dizem em sua obra:

Portanto, o empresário (ai incluída a sociedade empresária) em crise e outros interessados poderão optar pelo estabelecimento de um regime de recuperação judicial ou extrajudicial para desencadear uma tentativa de retomada do equilíbrio econômico e financeiro da empresa [...]. (BERTOLDI, RIBEIRO, 2013, p. 490)

Ademais, uma vez pleiteado o benefício da Recuperação Judicial, será analisado pelo juiz toda a empresa, quer dizer, o caso concreto, para só após ser concedido tal benefício. Não é um processo fácil, exige trabalho árduo do profissional jurídico e, também, esforço do empresário em demonstrar que a empresa é viável e pode continuar no mercado.

O doutrinador Coelho (2010, p. 382) aduz em sua obra: “Nem toda empresa merece ou deve ser recuperada. A recuperação de atividades econômicas é custosa”.

Quando por ventura for concedido o benefício acima descrito a empresa, terá que cumprir fielmente o plano de Recuperação Judicial, pois, uma vez descumprido, é decretada a Falência da empresa.

Também, é cabível a Recuperação Extrajudicial, que, em síntese, é um acordo formal entre credor e devedor, quando há inadimplemento apenas com algumas empresas, desse modo, relativamente é mais fácil e ágil. Bertoldi e Ribeiro (2013, p. 560) explica: “É basicamente um acordo formal entre o devedor e alguns credores, sujeitando, em princípio, apenas aqueles credores signatários. É bastante útil para os casos em que haja problemas pontuais na empresa [...]”.

Em suma, a Recuperação Judicial e Extrajudicial nada mais é do que um benefício ao empresário de fato para que ele se reestabeleça quando estiver em um momento difícil em sua empresa para não vir a Falência.  É visível a ligação entre a Recuperação Judicial e Extrajudicial e a Falência, todavia, são institutos completamente diferentes.

A Recuperação Judicial trata-se de um processo judicial com o fim de reestabelecer a empresa quando estiver passando por um mal momento, como já dito, por outro lado, a Falência é um instituto que visa a arrecadação de todos os bens da empresa, ou seja, transformar todos os bens da empresa em dinheiro para a liquidação de seus credores.

5.2 Requisitos

Embora a Recuperação Judicial seja um benefício ao empresário de fato para que ele se restabeleça econômico financeiramente em seus momentos de crise, não são todos empresários podem fazer uso, é necessário que se cumpra alguns requisitos para fazer jus a tal instituto.

Os requisitos para a concessão do benefício da Recuperação Judicial estão elencados no artigo 48, da Lei 11.101/2005, tais como: o empresário tem que exercer atividade empresário no mínimo por 2 anos; não ser falido; não ter obtido em menos de 5 anos a concessão do mesmo benefício; não ser condenado por crimes falimentares.

Não basta somente preencher os requisitos legais, como explica Bertoldi e Ribeiro (2013, p. 541): “Além de se enquadrar nas hipóteses prevista em lei como legitimadores do pedido de recuperação judicial, o devedor empresário deverá fundamentar a petição explicando minuciosamente o seu estado econômico e as razões que estão a justificar o pedido”.

Contudo, mesmo que provado todos os requisitos acima citados, é necessário que faça um plano de Recuperação Judicial, descrito pelo artigo 53, da mesma lei, aonde será demonstrado à viabilidade da empresa e uma planilha de pagamento dos credores, respeitando o prazo descrito em lei para quitação dos débitos.

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Semelhante são os requisitos para a homologação para a Recuperação Extrajudicial, como exposto pelo artigo 163, § 6º, da Lei 11.101/2005, deverá o empresário demonstrar sua situação patrimonial, relação dos credores, documentos que comprovem os poderes dos subscritores para novar ou transigir, entre outros.

5.3.Procedimento

A recuperação de empresas é um trabalho árduo, que deve ser desempenhado por um profissional com extrema capacidade, tendo em vista, a sua complexidade.

Previamente, deverá ser demonstrado ao juízo, na Comarca aonde a empresa que requer a recuperação tenha a sua matriz, toda a situação da empresa, seus ativos e passivos, bens etc, ou seja, a sua viabilidade de continuar operando.

Vale ressaltar que, por se tratar a recuperação de uma ação de reconhecimento, ela deve ter preenchida todos os requisitos do artigo 51, da Lei 11.101/2005, quais sejam, os já citados acima.

Ainda, após protocolada a ação de recuperação judicial de empresas, o autor não poderá mais decidir, então, é uma escolha que deve ser feita por um olhar clinico.

Pois bem, após protocolizada a ação e preenchidos todos os requisitos, o juiz irá deferir o processamento dessa ação, suspenderá todas as execuções e, abrirá o prazo de 60 dias para a apresentação do plano de recuperação com todos os créditos e dividas e com uma proposta de pagamento, aonde, posteriormente, será levado a edital, podendo qualquer credor se insurgir sobre este plano.

O referido plano de recuperação judicial deve ter o prazo máximo de 2 anos para o seu cumprimento, exceto para as dívidas trabalhistas, que terá o prazo de 1 ano para o pagamento, tendo em vista que elas são de caráter alimentício.

Após todos os credores concordarem com o plano de recuperação judicial e o devedor tenha cumprido todos os requisitos da Lei de Recuperação Judicial, o juiz autorizará a recuperação.

É de suma importante dizer que, uma vez descumprido qualquer obrigação do plano de recuperação nos 2 anos, decretar-se-á falência da empresa.

Por outro lado, quando existindo créditos trabalhista ou tributários, o empresário pode se valer da recuperação extrajudicial, que terá a mesma finalidade da recuperação judicial, porém, com processo mais maleável, pois não há necessidade de justificativa.

O doutrinador Coelho (2008, p. 378) faz, em sua obra, uma síntese do processo de recuperação judicial:

O processo de recuperação judicial divide-se em três fases bem distintas. Na primeira, que se pode chamar de fase postulatória, a sociedade empresária em crise apresente seu requerimento judicial e se encerra com o despacho inicial mandando processar o pedido. Na segunda fase, a que se pode referir como deliberativa, após a verificação de credito, discute-se e aprova-se um plano de reorganização. Tem início com o despacho que manda processar a recuperação judicial e se conclui com a decisão concessiva do benefício. A derradeira etapa do processo, chamada de fase de execução, compreende a fiscalização do cumprimento do plano aprovado. Começa com a decisão concessiva da recuperação judicial e termina com a sentença de encerramento do processo. (COELHO, 2008, p. 378)

Na recuperação extrajudicial, no curso do processo, há possibilidade de novos acordos entre credor e devedor, o que não é possível na judicial, portanto, é uma forma de se reestabelecer com procedimento menos árduo.

Coelho (2010, p. 433), em sua obra, descreve a funcionalidade da recuperação extrajudicial: “Para simplesmente procurar seus credores (ou parte deles) e tentar encontrar, em conjunto com eles, uma saída negociada para a crise, o empresário ou sociedade empresária não precisa atender a nenhum dos requisitos da lei para a recuperação extrajudicial”.

Uma vez homologada a recuperação extrajudicial pelo juiz, fará título executivo a sentença.

Bertoldi e Ribeiro (2013, p. 562), explana a respeito da formação de título executivo na recuperação extrajudicial:

Apresentado, o plano para homologação torna-se vinculante para os credores que a ele aderiram, ou até mesmo para todos demais credores, na hipótese do Art 163 da LRE. A sentença de homologação tem natureza de título executivo judicial. (BERTOLDI, RIBEIRO, 2013. p. 562)

Consequentemente, a recuperação judicial exige mais do profissional, pois ele terá que reunir todo o passivo e ativo da empresa, demonstrar a sua viabilidade de continuar trabalhando e, ainda, estabelecer um plano de pagamento que deverá ser cumprido, já, a recuperação extrajudicial, não existindo créditos trabalhista e tributários, sem justificativa, poderá ser proposta e terá possibilidade de novas conciliações entre devedor e credor dentro do processo.

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Sobre os autores
Luiz Roberto Prandi

Doutor em Ciências da Educação-UFPE Mestre em Ciências da Educação-UNG Especialista em: Metodologia do Ensino Superior Metodologia do Ensino de Filosofia e Sociologia Gestão Educacional Gestão e Educação Ambiental Educação Especial: Atendimento às Necessidades Especiais Educação Especial: Com Ênfase na Deficiência Múltipla Educação do Campo Gênero e Diversidade Escolar Professor Titular/Universidade Paranaense - UNIPAR

Matheus Salomão Martins

Acadêmico do curso de Direito da Universidade Paranaense - UNIPAR - Câmpus - Umuarama

Claudio Cezar Orsi

Possui graduação em Direito pela Universidade Paranaense (1996). Mestre em Direito Processual e Cidadania. Especialização em Direito Processual e Civil. Especialização em Docência do Ensino Superior. Professor da Unipar desde 1997. Professor da disciplina de Processo Civil na Faculdade Integradas da Cidade de Campo Mourão no período de agosto de 2002 a agosto de 2005. Ministrou aulas nas disciplinas de Introdução ao Estudo do Direito, Teoria Geral do Processo, Procedimento Especial, Cautelares e aula de Estágio. Coordenação pedagógica do SAJUG - Serviço de Atendimento Judiciário Gratuíto no período de 2007 a 2009. Atualmente é professor na Cadeira de Processo Civil - II. Coordenador Geral de Estágio na área de Direito. Membro do Colegiado da Unipar do Curso de Direito. Professor no Curso de Biomedicina lecionando a disciplina de Bioética, leciona Ética e Responsabilidade Civil para no Curso de Engenharia Civil e Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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