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Proteção da marca no ambiente virtual.

O sistema de links patrocinados

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16/05/2018 às 13:10
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4 Jurisprudência do Tribunal de Justiça de São Paulo

Iniciou-se esta etapa do estudo com a pesquisa na base de dados jurisprudencial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (Disponível em: <https://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/consultaCompleta.do?f=1>. Acesso em 16 Fev 2017), na oportunidade foram utilizados os seguintes parâmetros: No campo "Pesquisa Livre" foi informada a expressão – marca e "links patrocinados" - foram selecionadas no parâmetro "Origem" as opções "2º grau" e "Colégios Recursais"; assinalou-se também a opção "Acórdãos" referente ao "Tipo de decisão"; os demais campos em branco. A pesquisa, realizada em 16 de fevereiro de 2017 teve como resultado bruto 74 (setenta e quatro) acórdãos, sendo a data de julgamento mais antiga 28/02/2008 e a mais recente 08/02/2017.

Após tratamento e análise do inteiro teor de cada acórdão do resultado bruto da pesquisa, constatou-se que 30 acórdãos não tratavam do tema de violação da marca em sistema de links patrocinados, mas sim de outros casos de concorrência desleal não relacionados com o objeto do presente estudo, como: titularidade de domínios de sites da internet, violação do direito sobre patentes, falsificação de produtos, uso indevido de marca registrada em estabelecimento comercial, entre outros.

Da amostra inicial restaram 44 acórdãos, dos quais dezessete tratavam-se de Agravos de Instrumento, Agravos Regimentais e Embargos de Declaração. A análise recaiu apenas sobre as apelações que, depois de excluídos os agravos e embargos, totalizaram vinte e sete casos nos quais o tribunal julgou, em grau de recurso, conflitos resultantes da violação do direito de marca em sistema de link patrocinado.

Das vinte e sete apelações selecionadas, oito, aproximadamente 30%, foram consideradas improcedentes em primeira instância, ou seja, o magistrado entendeu não haver violação do direito sobre a marca pela sua vinculação como palavra-chave em link patrocinado de terceiro não autorizado. Apenas uma dessas oito decisões contrárias ao requente foi mantida pelo Tribunal. Apesar de parte considerável das ações serem consideradas inicialmente improcedentes, em nível recursal, 87,5% delas foram revertidas. A única decisão de improcedência mantida foi o da Apelação nº 0211917-14.2009.8.26.0100 em que ERGOMAT INDÚSTRIA E COMERCIO LTDA, autora da ação, buscou que a ré INDÚSTRIA E COMERCIO ATLASMAQ LTDA, deixasse de utilizar o termo "Ergomat", da qual a autora possui o registro, como palavra-chave no serviço de AdWords do Google. Ao manter a decisão de 1ª instância o magistrado salientou o fato de a ré ser revendedora de produtos usados da autora, não podendo esta se opor a sua livre circulação.

Ocorre que a requerida, consoante restou demonstrado nos autos, é revendedora dos produtos da autora, conforme notas acostadas a fls. 83/90,, não havendo ilicitude alguma em sua conduta. Consoante constou na r. sentença: “Sendo os produtos em questão usados, ou seja, revendidos após o uso do comprador inicial, sua circulação é livre, independendo de autorização da empresa que o fabrica por não se tratar de revenda comercial de produto novo. Do mesmo modo, não se pode impedir que aquele que vende tais marcas informe ao consumidor a marca dos produtos vendidos, pois negar-lhe tal direito, além de impedir exercício de atividade econômica livre, acarretaria justamente a violação da propriedade intelectual sobre exame”... (TJ-SP; Relator (a): Pedro de Alcântara da Silva Leme Filho; Comarca: São Paulo; Órgão julgador: 8ª Câmara de Direito Privado; Data do julgamento: 04/09/2014; Data de registro: 04/09/2014) (grifo no original).

A utilização da marca no presente caso tem guarida no art. 132, III da Lei de Propriedade Industrial, que restringe o direito do titular da marca ao proibi-lo de "impedir a livre circulação de produto colocado no mercado interno, por si ou por outrem com seu consentimento".

Este é um dos dois casos, considerando nossa amostra de vinte e sete apelações, em que o tribunal considerou que a utilização de marca registrada em AdWords tinha amparo legal. A outra ação considerada procedente em 1ª instância e revertida pelo tribunal na apelação nº 0133924-84.2012.8.26.0100 julgada em 25 de novembro de 2014. Trata-se de ação vencida em 1ª instância pelas autoras LORÉAL e LORÉAL BRASIL COMERCIAL DE COSMÉTICOS LTDA em face de BELEZA.COM COMÉRCIO DE PRODUTOS DE BELEZA E SERVIÇOS DE CABELEIREIRO LTDA, que não se manteve em nível recursal, pois a ré comercializa os produtos da autora, ocorrendo a incidência do inciso I do art. 132 da Lei 9279/96.

Marca. Uso das marcas das autoras como palavras-chave de link patrocinado contratado pela ré. Ausência de ilicitude. Ré que comercializa os produtos das marcas das autoras vinculadas ao site. Notoriedade do site através das marcas que tem por finalidade alavancar a venda dos produtos. Incidência da norma do art. 132, I, Lei nº 9279/96. Ausência de comprovação de que a distribuição dos produtos pelas autoras é realizada de forma seletiva. Autoras que não se desincumbiram do ônus que lhes é imposto pelo artigo 333, I, do CPC. Autoras que deverão arcar com a integralidade dos ônus da sucumbência. Honorários advocatícios fixados em R$5.000,00. Recurso da ré provido, improvido o das autoras. (Relator (a): Maia da Cunha; Comarca: São Paulo; Órgão julgador: 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial; Data do julgamento: 25/11/2014; Data de registro: 28/11/2014).

Excetuadas as apelações supramencionadas, nos demais 25 casos, o Tribunal de Justiça de São Paulo considerou como sendo prática ilegal a utilização de marca registrada como palavra-chave em sistema de link patrocinado por concorrente da titular do registro.

5.1 Danos Materiais e Danos Morais

Os pedidos, dos vinte e sete casos analisados envolvem: (1) que o réu se abstenha de utilizar a marca registrada, em especial nos serviços de links patrocinados e (2) reparação contemplando danos materiais e danos morais. Como visto anteriormente, o Tribunal de Justiça de São Paulo julgou favoravelmente ao titular do registro da marca em 93% dos casos, gerando ao réu obrigação de indenizar seja por dano moral, dano material ou ambos.

5.1.1 Dano Material

Referente aos danos materiais ensina João da Gama Cerqueira (CERQUEIRA, 2012) que as provas dos prejuízos em ações de perdas e danos são particularmente espinhosas de se levantar nos casos de violação dos direitos provenientes do registro de marca, não podendo os juízes exigi-las com severidade, não é incomum de que se ocorra a violação sem que os resultados financeiros da titular do registro sejam visivelmente afetados, porém isto não quer dizer que o prejuízo, de fato não ocorreu.

Ademais, a Lei de Propriedade Industrial traz regulamentação própria sobre a reparação dos danos nos seus artigos 208 a 210.

Art. 208. A indenização será determinada pelos benefícios que o prejudicado teria auferido se a violação não tivesse ocorrido.

Art. 209. Fica ressalvado ao prejudicado o direito de haver perdas e danos em ressarcimento de prejuízos causados por atos de violação de direitos de propriedade industrial e atos de concorrência desleal não previstos nesta Lei, tendentes a prejudicar a reputação ou os negócios alheios, a criar confusão entre estabelecimentos comerciais, industriais ou prestadores de serviço, ou entre os produtos e serviços postos no comércio.

§ 1º Poderá o juiz, nos autos da própria ação, para evitar dano irreparável ou de difícil reparação, determinar liminarmente a sustação da violação ou de ato que a enseje, antes da citação do réu, mediante, caso julgue necessário, caução em dinheiro ou garantia fidejussória.

§ 2º Nos casos de reprodução ou de imitação flagrante de marca registrada, o juiz poderá determinar a apreensão de todas as mercadorias, produtos, objetos, embalagens, etiquetas e outros que contenham a marca falsificada ou imitada.

Art. 210. Os lucros cessantes serão determinados pelo critério mais favorável ao prejudicado, dentre os seguintes:

I - os benefícios que o prejudicado teria auferido se a violação não tivesse ocorrido; ou

II - os benefícios que foram auferidos pelo autor da violação do direito; ou

III - a remuneração que o autor da violação teria pago ao titular do direito violado pela concessão de uma licença que lhe permitisse legalmente explorar o bem.

Especial atenção ao artigo 210 e seus incisos, que se referem aos lucros cessantes. A lei aponta três maneiras de se determinar o quantum dos lucros cessantes nos casos de violação dos direitos de propriedade industrial, que inclui o direito marcário. Deverá ser utilizado o critério mais favorável ao prejudicado. Ao passo que as hipóteses previstas nos incisos I e II do artigo 210 podem ser de difícil comprovação, pois nem sempre é factível de se aferir quanto o prejudicado teria ganhado se a violação não ocorresse ou, talvez mais laborioso ainda, medir os benefícios alcançados pelo autor da infração, já a hipótese prevista no inciso III pode ser facilmente estimada e já habilita o prejudicado a receber a reparação dos lucros cessantes. Esta tem sido a posição majoritária do TJ-SP – A presunção do dano material – nas infrações aos direitos de propriedade industrial. Seguem para exemplificar algumas decisões nesse sentido:

Marca. Concorrência desleal. Dano moral que, tanto quanto o material pelo uso parasitário da marca, é presumido. Lesão à honra, reputação e imagem da autora que, ao lado do uso parasitário do nome da sociedade empresária, deve ser indenizado para prestígio da marca e do nome e em benefício do consumidor. Teoria do "ilícito lucrativo" mencionada em embargos infringentes em que prevaleceu a tese sustentada. Arbitramento em R$ 50.000,00 que se ajusta aos parâmetros da jurisprudência. Recurso das autoras provido para tanto. (Apelação 0015841-75.2012.8.26.0564 Relator(a): Maia da Cunha; Comarca: São Bernardo do Campo; Órgão julgador: 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial; Data do julgamento: 16/03/2016; Data de registro: 18/03/2016)

Propriedade industrial. Comercialização de produtos contrafeitos. Utilização indevida da marca da autora, devidamente registrada perante o INPI. Laudo pericial nesse sentido. Inadmissibilidade. Procedência da ação mantida.

Danos materiais e morais. Prejuizos in re ipsa. Desnecessidade de prova além da prática da contrafação. Apuração dos danos materiais que se dá em liquidação de sentença, nos termos dos arts. 208 e 210 da Lei nº 9.279/96. Danos morais, de seu turno, que, considerando as circunstâncias do caso, merecem mantidos e no valor arbitrado, de R$20.000,00, que se mostrou equilibrado e adequado ao binômio reparação/sanção.

Honorários de advogado. Percentual intermediário compatível com o trabalho desenvolvido. Recurso desprovido. (Apelação 0126225-13.2010.8.26.0100 Relator (a): Araldo Telles; Comarca: São Paulo; Órgão julgador: 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial; Data do julgamento: 21/10/2015; Data de registro: 23/10/2015).

MARCA. Contrafação de mercadorias. Apelante que é responsável pela fabricação das mercadorias que levam, indevidamente, a marca de titularidade das apeladas (Oakley). Danos morais e materiais que, pelos recentes precedentes jurisprudenciais, são presumidos. O tão só uso indevido de uma marca de propriedade de outrem, é suficiente a configurar concorrência desleal, em virtude da deterioração da marca, desvio de clientela e lesividade aos consumidores. Apreensão das mercadorias antes de que fossem colocadas em circulação, que não altera essa conclusão, posto que decorrente de atividade alheia à vontade da apelante. Danos materiais que serão apurados em liquidação de sentença, o que se amolda ao disposto nos arts. 208 a 210 da Lei nº 9.279/93, bem como à jurisprudência deste Tribunal. Indenização moral fixada em R$ 40.000,00 que é razoável e bem atende às peculiaridades do caso. Sentença mantida. Honorários advocatícios majorados para R$ 7.000,00 (art. 85, §§ 11, 2º e 3º do CPC/15). Recurso desprovido. (Apelação. 1042319-69.2014.8.26.0100 Relator (a): Teixeira Leite; Comarca: São Paulo; Órgão julgador: 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial; Data do julgamento: 01/09/2016; Data de registro: 01/09/2016).

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O entendimento que o dano material é presumido nos casos de violação de marca registrada é reforçado pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

CIVIL E COMERCIAL. RECURSO ESPECIAL. PROPRIEDADE INDUSTRIAL. MARCA. USO INDEVIDO. DANOS MATERIAIS. PRESUNÇÃO. DANOS MORAIS. COMPROVAÇÃO.

1. Os embargos declaratórios têm como objetivo sanar eventual obscuridade, contradição ou omissão existente na decisão recorrida. Inexiste ofensa ao art. 535 do CPC, quando o Tribunal de origem pronuncia-se de forma clara e precisa sobre a questão posta nos

autos, assentando-se em fundamentos suficientes para embasar a decisão, como ocorrido na espécie.

2. Na hipótese de uso indevido de marca, capaz de provocar confusão entre os estabelecimentos e consequente desvio de clientela, desnecessária a prova concreta do prejuízo, que se presume.

3. Há que ser demonstrado o efetivo prejuízo de ordem moral sofrido pelo titular do direito de propriedade industrial, decorrente da sua violação. Na hipótese, configurado pelo protesto efetuado.

4. Recurso especial provido. (Resp n. 1.164.687 - RS (2009/0203347-9), Relator : MINISTRO ANTONIO CARLOS FERREIRA; grifo nosso).

5.1.2 Dano Moral

Quanto aos danos morais resta pacificado na doutrina a possibilidade da pessoa jurídica poder ser sujeito passivo de dano moral. Tal entendimento encontra-se consolidado na Súmula 227 do Superior Tribunal de Justiça - "A pessoa jurídica pode sofrer dano moral.". O que se discute é a necessidade de comprovação dos danos morais nos casos específicos de violação do direito de marca registrada ou se estes podem ser presumidos. Das vinte e sete apelações analisadas, apenas cinco delas tiveram, em segunda instância, negados os pedidos de reparação por danos morais. Digno de nota é o caso da empresa ALSARAIVA COMÉRCIO EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS E PARTICIPAÇÕES LTDA, titular das marcas "HABIB'S" e "RAGAZZO", que ajuizou duas ações em face de PEDIDOS JÁ DIVULGAÇÃO E TECNOLOGIA LTDA, ambas versando sobre a utilização indevida de marca registra em serviço de link patrocinado. As ações tiveram seus pedidos de reparação de danos morais e materiais negados em primeira instância. A requerente e apelou em ambas as ações que foram submetidas ao TJ-SP e julgadas com pouco menos de dois meses entre si, com decisões divergentes no tocante aos danos morais (quanto aos danos materiais foi entendido, em ambos os casos, que são devidos e presumidos).

A apelação 1111763-58.2015.8.26.0100, julgada em 24 de agosto de 2016, considerou que a utilização da marca "RAGAZZO", pela ré em sistema de AdWords, constituiu infração à proteção do registro da marca pertencente à autora, porém em decisão não unanime foi negada a reparação por danos morais conforme termos do relator, que entendeu haver necessidade de efetiva demonstração do dano extrapatrimonial:

De resto, o recurso não merece provimento em relação aos danos morais, visto que não está configurada hipótese em que se possa meramente presumir a ocorrência de dano moral, para que a partir daí, por inferência, ser imposta a condenação à respectiva reparação. O dano extrapatrimonial ocorre quando há abalo do enome social da empresa. É certo que pessoa jurídica não tem honra subjetiva. Não sofre abalos emocionais ou psíquicos, já que estes só podem ser sofridos por indivíduos, por entes vivos, não por ficções jurídicas. Mas a pessoa jurídica tem sim direito à proteção de seu renome. Tem direito ao respeito, à consideração e ao apreço social. Nessa medida, pode padecer de ataque que atinja sua honra objetiva, justamente por gozar de determinada reputação.

Porém, o Desembargador Carlos Alberto Garbi, em seu voto vencido, entendeu que a autora faria jus à reparação extrapatrimonial e que o dano moral seria presumido.

Já na apelação nº 1111766-13.2015.8.26.0100, julgada em 19 de outubro de 2016 em demanda muito parecida, onde agora a marca utilizada indevidamente era "HABIB'S", além da reparação por danos materiais a ré foi condenada também a pagar indenização no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) a título de dano moral. O relator justificou a concessão da reparação extrapatrimonial com base na teoria dos ilícitos lucrativos.

No caso em tela, embora a marca da autora não tenha sido exatamente depreciada ou denegrida, o ilícito praticado pela ré violou sua esfera extrapatrimonial, e não pode ficar impune, pena de reiteração da conduta lesiva. Sobreleva-se, aqui, o caráter punitivo da indenização por danos morais. A mais moderna doutrina fala hoje em “ilícitos lucrativos”, aqueles que valem a pena ser praticados. Sobre o assunto, observa Rodolphe Mesa que “no contexto dos comportamentos antijurídicos, a teoria do ilícito lucrativo leva o agente a estimar as perdas inerentes à sua condenação, confrontando-as com os benefícios previsíveis que a concretização da atividade ilícita pode gerar; e somente se a receita ilícita for maior do que o montante da sanção que o sujeito agirá, decidindo, em total conhecimento de causa e no âmbito de uma preocupação de racionalidade econômica, transgredir a regra de direito”

(cf. Les feutes lucratives em droit privé, citado por Daniel de Andrade Levy, Responsabilidade Civil de um direito de danos a um direito de condutas lesivas, Atlas, p. 108).

Poder-se-ia questionar se o princípio da reparação integral do dano (art. 944 do Código Civil) não constituiria limite e teto à indenização. Nada impede, porém, de se falar em princípio da reparação integral dos atos ilícitos, abrangendo não somente os prejuízos efetivos sofridos pela vítima, como também os benefícios indevidamente auferidos pelo ofensor.

Das vinte e sete apelações analisadas, três delas não fazem menção a dano moral, duas tratam de casos em que foi reconhecida como lícita a utilização da marca registrada como palavra-chave, nos termos do artigo 132, incisos I e III da Lei n. 9279/96, das vinte e duas restantes, o dano moral foi considerado indevido em cinco delas, ou seja, em 77% dos casos a decisão do tribunal foi favorável aos pedidos de reparação de dano moral pelo uso indevido da marca em sistemas de link patrocinado.

4.2 A Responsabilidade do Google

Do total de demandas analisadas em apenas seis delas o Google figurou como réu, sendo que em quatro formou litisconsórcio passivo com a empresa contratante do seu serviço de AdWords que vinculava seu anúncio às marcas registradas de terceiros.

Para a apuração da responsabilidade do Google faz-se necessária a análise da Lei 12.965/2014, conhecida como Marco Civil da Internet que regulou a responsabilidade civil dos provedores de aplicação.

4.2.1 Responsabilidade dos provedores de aplicação após a Lei 12.965/2014

O marco civil da internet – Lei nº 12.965 publicada em 24 de abril de 2014 – encontra-se vigente desde 23 de junho 2014 e não trouxe regulamentação quanto à violação da propriedade industrial no âmbito da internet, pois, sobre propriedade intelectual há apenas um único parágrafo, que versa apenas sobre direito do autor e conexos (§ 2º do artigo 19, abaixo transcrito), e que dependente de regulamentação, ainda inexistente, contudo, regulou em seus artigos 18 a 21 a responsabilidade dos provedores de conexão e dos provedores de aplicação quanto ao conteúdo gerado por terceiros.

Primeiramente deve-se analisar se o Google pode ser considerado, para efeitos legais, um provedor de conexão ou provedor de aplicação. O art. 5º do marco civil da internet traz diversas definições entre elas, em seu inciso VII, o que é, para efeitos legais, uma aplicação de internet - "o conjunto de funcionalidades que podem ser acessadas por meio de um terminal conectado à internet" - assim, os buscadores de conteúdo, como o Google, são aplicações de internet. Torna-se então muito relevante, para determinar sua responsabilidade, a leitura do art. 19 do marco civil:

Art. 19.  Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário.

§ 1o A ordem judicial de que trata o caput deverá conter, sob pena de nulidade, identificação clara e específica do conteúdo apontado como infringente, que permita a localização inequívoca do material.

§ 2o A aplicação do disposto neste artigo para infrações a direitos de autor ou a direitos conexos depende de previsão legal específica, que deverá respeitar a liberdade de expressão e demais garantias previstas no art. 5o da Constituição Federal.

§ 3o As causas que versem sobre ressarcimento por danos decorrentes de conteúdos disponibilizados na internet relacionados à honra, à reputação ou a direitos de personalidade, bem como sobre a indisponibilização desses conteúdos por provedores de aplicações de internet, poderão ser apresentadas perante os juizados especiais.

§ 4o O juiz, inclusive no procedimento previsto no § 3o, poderá antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, existindo prova inequívoca do fato e considerado o interesse da coletividade na disponibilização do conteúdo na internet, desde que presentes os requisitos de verossimilhança da alegação do autor e de fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. (grifo nosso).

Com o advento da nova lei os provedores de aplicações de internet só poderão responder por danos causados pelo conteúdo gerado por terceiros após ordem judicial específica, portanto, não basta que, aquele que tenha a sua marca indevidamente vinculada a anúncio de empresa rival em sistema de link patrocinado, faça comunicação ou solicitação extrajudicial ao provedor de aplicação e este não a cumpra para que se obtenha do provedor de aplicação reparação do dano causado. Faz-se necessária a ordem oriunda do Poder Judiciário e, somente caso haja negativa do provedor posterior a ela, é que este poderá ser responsabilizado.

A lei ainda atribui ao provedor de aplicações o dever de comunicar ao responsável pelo conteúdo que venha a ser tornado indisponível por ordem judicial, sempre que tiver informações de contato do usuário, informações que lhe permitam a ampla defesa e o contraditório em juízo, salvo previsão legal ou decisão judicial fundamentada em contrário.

A partir da vigência do Marco Civil da Internet são estabelecidos parâmetros claros e objetivos para a apuração da responsabilidade dos provedores de aplicação de internet no caso de danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros.

4.2.2 Responsabilidade do provedor de aplicação em casos concretos

Nas vinte e sete apelações analisadas em apenas seis delas o Google figurou no polo passivo da ação sendo que em apenas duas delas houve responsabilização do provedor de aplicação gerando a obrigação de reparar o dano. Nas duas condenações (Apelações nº 0130935-08.2012.8.26.0100 e 0218907-50.2011.8.26.0100) a responsabilidade se baseou na teoria do risco.

Importante salientar que não socorre o Google a alegação de que a inviabilidade de juízo prévio de valor acerca da palavra-chave utilizada pelo contratante do serviço do Google AdWords, por se tratar esse de um programa on line, dinâmico e automático, afasta sua responsabilidade. A eleição, pelo requerido, de sistema impediente de controle prévio, acarreta sua responsabilidade acerca de eventuais prejuízos causados a terceiros, sobretudo porque a contratação do aludido programa confere-lhe retorno pecuniário (artigo 884, do Código Civil). É a aplicação da teoria do risco, plenamente cabível no caso concreto. (Apelação nº 0218907-50.2011.8.26.0100.)

Se o requerido Google se dispõe a vender anúncios em seu site de pesquisas sem analisar previamente o potencial lesivo do conteúdo inserido por aquele com quem contrata, deve arcar com as consequências de sua omissão. Aplica-se, então, a teoria do risco-proveito.

Se site de buscas delibera contratar com milhares de usuários sem qualquer prévio controle de violação de direitos imateriais alheios, e com isso aufere receitas, mas potencializa o risco de danos, deve responder se o risco se converte em prejuízo real.

Em outras palavras, se o contrato firmado entre o Google e seu anunciante gera danos a terceiros, ambos os contratantes devem ser responsabilizados.

(Apelação nº 0130935-08.2012.8.26.0100)

Tal entendimento foi possível, pois, em ambos os casos, a violação do direito marcário, reconhecida pelo judiciário, ocorreu antes da entrada em vigor da Lei 12.965/2014.

Verificou-se também decisão referente à ocorrência de violação de marca posterior à vigência do Marco Civil da Internet, onde o provedor não foi responsabilizado pela incidência do art. 19 da Lei 12.965/2014. Trata-se de ação impetrada por INSULFILM DO BRASIL LTDA em face de GOOGLE BRASIL INTERNET LTDA, onde se requer a retirada da marca registrada "Insulfilm", de propriedade da autora, da vinculação como palavra-chave em anúncios pertencentes a empresas concorrentes no sistema de AdWords do Google, além da reparação por danos materiais e morais. A ação foi julgada improcedente em primeira instância e na apelação nº 1054774-03.2013.8.26.0100, julgada em 17 de janeiro de 2017 o tribunal a considerou parcialmente procedente, decidindo que o provedor de aplicações de internet eliminasse dos resultados de busca contendo a marca registrada da autora os anúncios patrocinados de terceiros, porém negou provimento ao pedido de reparação de danos com base no art. 19 da Lei 12.965/14:

A eventual violação da marca em si, por sua vez, não pode ser diretamente atribuída à apelada, mas aos anunciantes.

Nos moldes do artigo 19 da Lei 12.965/14 (Marco Civil da Internet), o provedor de internet não pode ser responsabilizado por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiro, antes de eventual determinação judicial nesse sentido.

Inviável, assim, o acolhimento da pretensão reparatória, já que apenas nessa oportunidade determina-se a eliminação dos resultados de busca e o impedimento de novos anúncios, quando relacionados à palavra-chave em questão e se tratar de links patrocinados. (Relator (a): Carlos Alberto de Salles; Comarca: São Paulo; Órgão julgador: 3ª Câmara de Direito Privado; Data do julgamento: 17/01/2017; Data de registro: 17/01/2017).

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Sobre o autor
Guilherme Sorg Cabral

Auditor-Fiscal do Trabalho. Bacharel em Ciência da Computação; Acadêmico de Direito na Universidade Paulista - Unip em Bauru/SP e Especialista em Direito Digital.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CABRAL, Guilherme Sorg. Proteção da marca no ambiente virtual.: O sistema de links patrocinados. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5432, 16 mai. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/64684. Acesso em: 24 nov. 2024.

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