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Terceirização: Leis n. 13.429/17 e 13.467/17 e a desconstrução da relação tradicional de emprego

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19/10/2018 às 15:00
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3 TERCEIRIZAÇÃO SEGUNDO AS LEIS Nº 13.429/2017 E Nº 13.467/2017

3.1 Considerações Preliminares

Superadas as matérias tratadas no primeiro capítulo, verificamos a lacuna legislativa existente acerca do fenômeno da terceirização, no que se refere ao seu real alcance material e às possibilidades de sua aplicação. É fato que, desde 1983 – ano da edição da Lei nº 7.102/83, que tratava sobre a terceirização do trabalho de vigilância –, o tema da triangulação de serviços é tratado prioritariamente por meios jurisprudenciais.

Apesar dessa ausência de positivação, a subcontratação de serviços sempre esteve em pauta, com diversas tentativas de se fazer uma regulamentação através de lei do fenômeno da Terceirização. Como exemplos, temos os projetos 1.292/95, 4330/04, 5.439/05, 1.621/07, 6.832/10 e 4.302/98. Este último culminou em uma das Leis que dão razão ao presente capítulo, a Lei 13.429/17.

O primeiro deles, PL 1.292/95[77], diz respeito especificamente à terceirização de atividades no setor público, ao passo que pretende alterar a Lei de Licitações – Lei 8.666/93. Tal projeto ainda está em tramitação e aguarda parecer da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania.

O projeto de lei nº 4.330/04, por sua vez, prevê a contratação de serviços terceirizados para qualquer tipo de atividade de determinada empresa, sem qualquer espécie de limitação – configuraria, se aprovado, o que muitos entendem por terceirização irrestrita. Por meio deste PL, ainda, propõe-se a total inexistência de vínculo empregatício entre a empresa contratante e os empregados da empresa contratada, determinando, para tanto, que as relações entre tais empresas devem ser regidas puramente pela norma civil.[78]

Tratando da mesma matéria, têm-se os projetos de lei nos 5.439/05, 1.621/07 e 6.832/10. Os três foram apensados ao projeto de lei 4.330/2004 - por tratarem da mesma matéria – e arquivados em 22/4/2015, quando da aprovação da Subemenda Substitutiva Global do PL principal.[79]

O primeiro deles visava à proibição da contratação de mão-de-obra interposta, à exceção dos casos de trabalho temporário, serviços de vigilância, conservação e limpeza. Para tanto, propunha-se adicionar à CLT o seguinte dispositivo:

Art. 442-A Salvo nos casos de trabalho temporário, serviços de vigilância, conservação e limpeza, é vedada a contratação de trabalhador por empresa interposta, formando-se o vínculo empregatício diretamente com o tomador dos serviços.

Parágrafo único. O inadimplemento das obrigações trabalhistas, previdenciárias e tributárias por parte do empregador, implica a responsabilidade solidária do tomador de serviços quanto àquelas obrigações, desde que este tenha participado da relação processual e conste do título executivo judicial. 

As outras duas propostas de lei, PL 1.621/07 e 6.832/10, buscavam, em síntese, a proibição da adoção do modelo de subcontratação de mão de obra por empresa interposta para a execução das atividades-fim da pessoa jurídica. Além disso, se aprovados estabeleceriam a responsabilidade solidária da empresa tomadora dos serviços pelas obrigações trabalhistas da empresa terceirizada para com seus operários. Ambos os projetos tramitaram em conjunto, pois seus textos eram muito semelhantes, e se encontram atualmente arquivados.

O projeto de lei nº 4.302/98, por sua vez, ficou por muitos anos tramitando no Congresso Nacional, até a sua aprovação em março de 2017. Dessa feita, partindo-se da ideia de que o projeto demorou mais de 19 anos para ser aprovado, observa-se a constante ambição dos últimos anos, por parte do Poder Judiciário, em preencher a lacuna legislativa existente, enquanto não era editada uma norma específica que englobasse todos os aspectos das relações terceirizadas de trabalho. Durante este interregno, dessa forma, prevaleceu o entendimento das jurisprudências trabalhistas, consubstanciadas nas Súmulas do Tribunal Superior do Trabalho.

Feita esta consideração inicial, esclarece-se que, ao longo do presente capítulo, procurar-se-á analisar as modificações concretizadas e nascentes na ótica trabalhista em relação às relações terceirizadas de trabalho. Para tanto, verificar-se-ão as alterações sob a ótica da nova Lei do Trabalho Temporário – especificamente no que se refere à terceirização de serviços -, bem como sob a visão da normatividade trazida pela Reforma Trabalhista.

3.2 Características do novo conceito de Terceirização - perspectivas hermenêuticas das Leis 13.429/17 e 13.467/17

3.2.1 Segurança Jurídica

O advento da Lei 13.429/17 trouxe consigo relevantes modificações nos paradigmas das relações de emprego no Brasil. Antes, não se tinha segurança jurídica em torno do fenômeno da terceirização de serviços que, como se observou em tópicos anteriores, era regulada de maneira precária em leis esparsas. Diante disto, dava-se maior importância ao entendimento jurisprudencial dos Tribunais Superiores sobre o assunto.

A partir deste quadro, há o entendimento, por parte da doutrina, de que a edição da Lei 13.429/17 atribuiu maior Segurança Jurídica aos aplicadores do direito, bem como às empresas que se utilizam da subcontratação de mão-de-obra para o desempenho de sua atividade social.

Nesse sentido, afirmou Gilberto Sturmer [80], à época da aprovação do Projeto 4.302/98 pela Câmara dos Deputados: 

(. .) a realidade é que um fato já existente e inexorável, adequado à realidade do século 21 e até hoje sem qualquer regulamentação (a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho não é lei), passa a gerar segurança jurídica. Ainda que se entenda que o excesso de leis não é bom para o país, neste caso especificamente — terceirização de serviços — a lei já se fazia necessária. (STURMER, 2017)

Ainda, continuou o professor sua explanação no sentido de que “. . a terceirização, como referido, é um fato que precisava ser regulamentado. ”

Defendendo a mesma posição, a presidente da Federação das Associações Comerciais e de Serviços do Rio Grande do Sul – FEDERASUL -, Simone Leite, entende que “. . a regulamentação da terceirização cria segurança jurídica e vai ajudar as empresas a alavancar os negócios e gerar mais empregos no País”. [81]

Quanto ao assunto, ainda, afirma José Wahle (2017), advogado do escritório Veirano Advogados, tecendo uma crítica à atividade legislativa indireta do Poder Judiciário acerca do instituto da terceirização, que “agora o Judiciário ficará ocupado preenchendo as lacunas.”[82]

Por outro lado, há quem afirme que o advento da Lei que regulamenta a prestação de serviços terceirizados não resolve a questão da Insegurança Jurídica, justamente por não conceituar quais atividades devem ser consideradas serviços específicos e determinados.

Quanto a isso, dispõem os art. 4º - A  e 5º- A, da Lei 13.429/17:

 Art. 4º - A. Empresa prestadora de serviços a terceiros é a pessoa jurídica de direito privado destinada a prestar à contratante serviços determinados e específicos.

(. .)

Art. 5º - A. Contratante é a pessoa física ou jurídica que celebra contrato com empresa de prestação de serviços determinados e específicos. 

Para Estevão Mallet (2017)[83], a expressão é genérica, e dará margem a novos questionamentos. No mesmo sentido, entende a advogada Daniela Yuassa (2017)[84], do escritório Stocche Forbes, que se vai novamente atribuir ao Judiciário a responsabilidade de determinar o que seria específico ou determinado.

Assim, os que defendem a continuação da Insegurança Jurídica da Terceirização, mesmo com a normatização do tema, fazem-no com base na semântica do texto legal.

Cumpre ressaltar que tal posição contrária cai por terra com a regulamentação feita pela Lei 13.467/17 acerca do alcance da terceirização, o que será tratado posteriormente.

Nota-se, a partir do exposto, crescente divergência interpretativa por parte dos aplicadores do direito acerca da Segurança Jurídica por trás das reformas realizadas acerca do tema.

Entretanto, ainda que se possa interpretar de diferentes maneiras o texto legal, é fato que, com o advento dos referidos institutos normativos, tem-se a positivação - por muitos esperada – de um tema há muito tratado no nosso ordenamento jurídico.

3.2.2 Atividade-fim x Atividade-meio

Conforme ensinamentos do mestre Maurício Godinho Delgado[85], a terceirização por muito tempo pode ser conceituada como: 

(. .) fenômeno pelo qual se dissocia a relação econômica de trabalho da relação justrabalhista que lhe seria correspondente. Por tal fenômeno insere-se o trabalhador no processo produtivo do tomador de serviços sem que se estendam a este os laços justrabalhistas, que se preservam fixados com uma entidade interveniente. A terceirização provoca uma relação trilateral em face da contratação de força de trabalho no mercado capitalista: o obreiro, prestador de serviços, que realiza suas atividades materiais e intelectuais junto à empresa tomadora de serviços; a empresa terceirizante, que contrata este obreiro, firmando com estes os vínculos jurídicos trabalhistas pertinentes; a empresa tomadora de serviços, que recebe a prestação de labor, mas não assume a posição clássica de empregadora desse trabalhador envolvido. 

Antes da edição da Lei nº 13.429/2017, conforme analisado em tópicos anteriores, o tema da Terceirização era dominantemente analisado sob a ótica da Súmula nº 331 do E.TST, que vedava a terceirização de serviços diretamente ligados à atividade-fim da empresa contratante. Permitia, de maneira restrita, apenas a adoção de mão-de-obra terceira em atividades-meio: atividades secundárias, distantes do objeto social da empresa tomadora.[86]

A partir do advento da Lei supracitada, permitiu-se a contratação de mão de obra temporária para a substituição de pessoal da tomadora, tanto para as atividades-meio, quanto para as atividades-fim da empresa contratante, conforme se observa da leitura do seu art. 9º, §3º:

Art. 9º. O contrato celebrado pela empresa de trabalho temporário e a tomadora de serviços será por escrito, ficará à disposição da autoridade fiscalizadora no estabelecimento da tomadora de serviços e conterá: 

(. .)                                                   

§ 3o  O contrato de trabalho temporário pode versar sobre o desenvolvimento de atividades-meio e atividades-fim a serem executadas na empresa tomadora de serviços. (grifo nosso) 

Fundando-se especialmente no instituto legal acima transcrito, intensa pressão popular e midiática surgiu às vésperas da votação do projeto de Lei 4.302/98. Isto, pois se afirmava que, caso o projeto passasse e fosse transformado em Lei Ordinária, ter-se-ia a autorização da terceirização irrestrita, para quaisquer atividades, sejam elas finais ou secundárias.

Nesse sentido, em texto publicado em seu sítio no dia 22/3/2017, a Rede Globo – Portal G1 – deu à matéria o título: “Câmara aprova projeto que permite terceirização irrestrita. ”. Por sua vez, o portal de notícias do jornal Estadão valeu-se da manchete “. .Câmara aprova terceirização para qualquer atividade em empresas públicas e privadas. ” para tratar da aprovação do projeto de Lei nº 4.302/98.

Mesmo que se tenha a sensação de que o texto da Lei 13.429/17 autorize a terceirização irrestrita, podemos observar, a partir da leitura do §3º do seu art. 9º, que a há a permissão da subcontratação de mão-de-obra para o desenvolvimento das atividades-fim da empresa contratante, porém somente para os casos de contrato temporário. Isto é, uma empresa especializada na produção de computadores, por exemplo, poderá contratar empregado de empresa terceira para a realização de sua atividade-fim, construção de computadores, desde que para substituição de pessoal, e através de um contrato de trabalho temporário.[87]

Nestes termos, assim, não era correto afirmar, à época do início da vigência da Lei 13.429/17, que se permitia a terceirização irrestrita do labor, já que sua permissão se relacionava exclusivamente aos contratos temporários de trabalho.

Foi somente com o advento da Reforma Trabalhista – Lei nº 13.467/2017 -, publicada em 14/7/2017, que se admitiu expressamente a terceirização de serviços de forma ampla, relacionada a quaisquer atividades da empresa contratante, inclusive sua atividade-fim. Nestes termos, dispõe o art. 4º-A da Lei 6.019/1974, com redação dada pela Lei 13.467/17[88]:

Art. 4o-A.  Considera-se prestação de serviços a terceiros a transferência feita pela contratante da execução de quaisquer de suas atividades, inclusive sua atividade principal, à pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviços que possua capacidade econômica compatível com a sua execução.  (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017) 

A partir da leitura do acima transcrito artigo, observa-se a autorização dada pelo quanto à prestação de serviços a terceiros, mediante transferência pela empresa contratante à contratada de quaisquer de suas atividades, inclusive as relacionadas ao objeto social da empresa tomadora. Com isso, altera-se consideravelmente o entendimento que se tinha acerca das relações terceirizadas de trabalho, ao passo que agora não se deve fazer mais distinção entre atividade-fim e atividade-meio da empresa.

Tal distinção era, antes, fundamental para que se caracterizasse a terceirização de determinado serviço como lícita ou ilícita.

Por terceirização lícita, entendiam-se as hipóteses previstas na Súmula 331 do TST, quais sejam o trabalho temporário, os serviços de vigilância, os serviços de conservação e limpeza, e os serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador.

 Por outro lado, para que a triangulação de serviços se caracterizasse como ilícita, dever-se-ia analisar a presença dos requisitos da relação tradicional do emprego, entre o empregado terceirizado e a empresa contratante dos serviços. Com efeito, ilícita era a terceirização em que presentes os requisitos da relação de emprego diretamente entre o tomador e o empregado terceirizado. Isto, pois ao se configurar a relação direta referida, a empresa prestadora perdia sua autonomia de controle em relação aos seus empregados. Com a subordinação destes ao poder de direção e controle da tomadora, assim, formava-se o vínculo de emprego direto, e a consequente ilicitude da terceirização. Além deste critério de distinção, entendia-se que todas as terceirizações relacionadas à atividade-fim da empresa contratante eram consideradas ilícitas, conforme entendimento da Súmula 331 do TST.

Agora, não há de se falar na distinção entre atividade-fim e atividade-meio como forma de se caracterizar a ilicitude das relações terceirizadas de trabalho, ao passo que, com as alterações trazidas pela Lei 13.429/17 - bem como com as trazidas pela Reforma Trabalhista -, abriu-se o precedente sobre a autorização da terceirização das atividades-fim.

Urge esclarecer, entretanto, que a contratação de trabalhadores por empresa interposta, mesmo após as reformas feitas, continua ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços. Isso, pois a intermediação de mão-de-obra - que ocorre quando uma empresa mantém o trabalhador sob sua direção e comando, sem registrá-lo ou o remunerar, e transmite tais obrigações a outra empresa – continua representando clara afronta à disposição do item I da Súmula nº 331 do TST[89], que dispõe:

CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE (nova redação do item IV e inseridos os itens V e VI à redação) - Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011 

I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).

A ilicitude, neste caso, se dá pelo fato de a terceirização não se confundir com a intermediação de mão de obra. Gustavo Garcia[90] afirma que esta figura, via de regra, deve ser vedada pelo sistema jurídico, já que o trabalho não pode ser tratado como mercadoria, o que iria de encontro ao seu valor social e à dignidade da pessoa humana.

Assim, em resumo, não mais se deve adotar a dicotomia atividade-fim/atividade-meio como critério para caracterização da ilicitude de uma relação terceirizada de trabalho, em atenção à permissão trazida pela Lei 13.429/2017, concomitante com o que dispõe a Reforma Trabalhista.

3.2.3 Responsabilidade Jurídica dos empregadores

 Na redação original da Lei nº 6.019/74[91], a única previsão que se fazia acerca da responsabilidade dos empregadores era quanto à responsabilidade solidária para os casos de falência da empresa de trabalho temporário, conforme disposição de seu art. 16:

Art. 16 - No caso de falência da empresa de trabalho temporário, a empresa tomadora ou cliente é solidariamente responsável pelo recolhimento das contribuições previdenciárias, no tocante ao tempo em que o trabalhador esteve sob suas ordens, assim como em referência ao mesmo período, pela remuneração e indenização previstas nesta Lei.

Com a inclusão pela Lei 13.467/17 do art. 5 – A ao texto da Lei 6.019/74, estabeleceu-se a responsabilidade subsidiária pelas obrigações trabalhistas decorrentes da triangulação do serviço, consubstanciando o que já entendia a jurisprudência trabalhista através da Súmula 331 do TST. Nesse sentido, dispõe o art. 5-A, em seu § 5º:

Art. 5o-A.  Contratante é a pessoa física ou jurídica que celebra contrato com empresa de prestação de serviços relacionados a quaisquer de suas atividades, inclusive sua atividade principal. (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017)

(. .)

§ 5o  A empresa contratante é subsidiariamente responsável pelas obrigações trabalhistas referentes ao período em que ocorrer a prestação de serviços, e o recolhimento das contribuições previdenciárias observará o disposto no art. 31 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991. (Incluído pela Lei nº 13.429, de 2017) (grifo nosso)

Com efeito, temos agora no nosso ordenamento jurídico a previsão concomitante de responsabilização solidária – quando da falência da empresa de trabalho temporário, conforme art. 16 da Lei de 1974 - e subsidiária do tomador de serviços. Quanto ao lapso temporal da responsabilização da tomadora, este se refere ao período da prestação de serviços do empregado terceirizado à empresa contratante, e abrange os débitos trabalhistas e previdenciários[92] decorrentes deste período.

A adoção legal do entendimento da jurisprudência trabalhista com relação à responsabilidade subsidiária da empresa contratante demonstra a preocupação existente em torno da proteção do empregado. Por proteger o empregado da possibilidade de não receber os direitos decorrentes do término do vínculo com sua empregadora direta – empresa de prestação de serviços -, muito importante é a positivação da responsabilidade subsidiária trazida pela Lei da Reforma Trabalhista.

Neste ponto, urge esclarecer que a responsabilização subsidiária da empresa contratante tem como suporte a culpa in eligendo, isto é, a escolha equivocada da empresa prestadora de serviços. Isto ocorre, pois a referida escolha é feita por pessoa jurídica que descumpriu a legislação trabalhista, tangenciando o princípio da função social do contrato, nos termos do art. 421 do CC, o que justifica a subsidiariedade quanto aos encargos decorrentes do término do contrato.

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Neste sentido, o desembargador Sebastião Geraldo Oliveira[93] destaca a importância da cautela que a empresa contratante deve ter no momento da contratação de empregado terceirizado por meio de um contrato civil com uma empresa de prestação de serviços:

(. .) Quando o empresário transfere a terceiros a execução de parte da sua atividade, deve atuar com bastante diligência, escolhendo criteriosamente empresas que tenham capacidade técnica, econômica e financeira para arcar com os riscos do empreendimento, sob pena de ficar caracterizada a culpa “in contraendo” ou culpa “in eligendo”. Deve também, fiscalizar com rigor o cumprimento do contrato de prestação de serviços e a observância dos direitos trabalhistas dos empregados da contratada, especialmente o cumprimento das normas de segurança, higiene e saúde dos trabalhadores, para não ver caracterizada, por sua omissão, a culpa “in vigilando”. (Oliveira, Sebastião Geraldo. Indenização por Acidente do Trabalho ou Doença Ocupacional. 4ª Ed., Editora LTr, 2008, p.398) (grifo nosso) 

Prosseguindo-se, a inclusão do art. 5-A na Lei 6.019/74 trouxe consigo, ainda, a responsabilidade da empresa tomadora dos serviços quanto à garantia de um ambiente de trabalho seguro, higiênico e salubre, conforme disposição do §3º[94]:

§ 3º É responsabilidade da contratante garantir as condições de segurança, higiene e salubridade dos trabalhadores, quando o trabalho for realizado em suas dependências ou local previamente convencionado em contrato. 

A motivação de tal responsabilidade se traduz em uma tentativa de prevenir o aumento de acidentes de trabalho, frequentemente associados à figura da Terceirização[95].

Esta associação feita entre o trabalho terceirizado e os acidentes laborais é um dos principais argumentos contrários à ampliação das relações terceirizadas de trabalho. Neste sentido, auditor fiscal do trabalho Otávio Kolowski Rodrigues, responsável pela investigação de acidentes de trabalho na região de Porto Alegre, afirmou à época da votação do Projeto de Lei nº 4.302/98, em reportagem publicada no portal Carta Capital[96], que, sem a devida punição, o número de mortes na construção civil aumentaria com a terceirização liberada. Justamente por isto, observa-se a importância do instituto trazido no art. 5-A pela Lei 13.429/17.

Em análise ao §3º do artigo acima referido, em artigo publicado na revista Jus Navigandi, Lucas Ferraz Grasselli[97] afirma:

Outro ponto que merece destaque é a obrigação imposta pela Lei 13.429/2017 no sentido de que caberá à contratante garantir as condições de segurança, higiene e salubridade dos trabalhadores. A omissão da tomadora dos serviços nesse aspecto poderá gerar acidente de trabalho e, por consequência, obrigação de reparar os danos causados ao trabalhador, tanto no aspecto moral como material, com responsabilização solidária, nos termos da legislação civil.

Frisa-se, assim, que o descumprimento das normas de higiene, segurança e salubridade no trabalho, trazidas pelo instituto legal em análise, acarreta responsabilidade objetiva solidária da empresa tomadora quanto a eventuais acidentes de trabalho, por tratar-se de matéria de Responsabilidade Civil.

3.2.4 Quarentena

A partir das reformas realizadas no tocante à terceirização de serviços, tem-se a positivação de dois períodos de quarentena para a contratação de empregados terceirizados pela empresa tomadora de serviços: a quarentena da empresa contratante e a quarentena do empregado.

3.2.4.1 Quarentena da empresa contratante

O art. 5 – C da Lei 6.019/73, incluído pela Lei 13.467/17, estabelece a vedação da contratação de empresa prestadora de serviços cujos titulares ou sócios tenham anteriormente prestado serviços à empresa tomadora na qualidade de empregado direto, trabalhador avulso ou trabalhador autônomo, durante um período de quarentena de 18 meses. Com efeito, dispõe o referido instituto legal[98]:

Art. 5o-C.  Não pode figurar como contratada, nos termos do art. 4o-A desta Lei, a pessoa jurídica cujos titulares ou sócios tenham, nos últimos dezoito meses, prestado serviços à contratante na qualidade de empregado ou trabalhador sem vínculo empregatício, exceto se os referidos titulares ou sócios forem aposentados. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017) 

O que se entende a partir do regramento em questão é uma tentativa por parte do legislador de reduzir a ocorrência do fenômeno da Pejotização. Com relação a tal instituto, a doutrina e a jurisprudência trabalhistas a conceituam como a contratação de pessoa física para prestar serviços de modo subordinado, não eventual e oneroso, por meio de pessoa jurídica constituída especialmente para esse fim, com a tentativa de mascarar o vínculo empregatício existente - o que consequentemente caracteriza fraude na relação contratual.

Nesse sentido, o TRT da 4ª Região assim decidiu:

FRAUDE ATRAVÉS DE "PEJOTIZAÇÃO". RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. 1. A "pejotização" é uma fraude mediante a qual o empregador obriga seus trabalhadores a constituir empresas (pessoas jurídicas) em caráter pro forma, para burla do vínculo empregatício, com vistas a uma ilegal redução dos custos da mão-de-obra, em total desrespeito da legislação trabalhista, especialmente arts. 2º e 3º, 29 e 41 da CLT, atraindo, pois, a aplicação do disposto no art. 9º da CLT: "serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente consolidação." 2. A constituição de pessoa jurídica, nestes casos, funciona como máscara da relação de emprego existente, assim como para frustrar a aplicação dos preceitos consolidados, furtando-se o real empregador a arcar com ônus de seu negócio na medida em que busca, fraudulentamente, fugir à conceituação do art. 2º da CLT, assim como tenta descaracterizar seus empregados do tipo do art. 3º do mesmo diploma. 3. Sob outro norte, o fato da parte autora possuir empresa constituída em seu nome não indica, por si só, que tenha interesse em prestar serviços na condição de representante comercial autônoma, mas sim a modalidade de labor imposta para manter a atividade remunerada pela parte ré, transmudada de vínculo para a "pejotização", que é fórmula de fraude aos direitos sociais, mediante a qual transmudam-se os trabalhadores em "sócios" meramente formais de empresas terceirizadas, implicando na sonegação da paga de FGTS, gratificação natalina, férias, vale-transporte, etc. 4. Reconhecido o vínculo empregatício direto com a empresa BR TRONIC ELETRÔNICA - EIRELI, impõe-se reconhecer, em atenção aos limites do pedido, a responsabilidade subsidiária das empresas GABRIELA CARDOSO PEREIRA - EIRELI e THYSSENKRUPP ELEVADORES. Inteligência dos arts. 932, III, e 942, parágrafo único, do CCB, e 9º da CLT. (TRT/RS Proc. 0021209-20.2014.5.04.0221. RELATOR: MARCELO JOSE FERLIN D'AMBROSO). 

Leone Pereira[99] conceitua a pejotização como “. . a contratação de um trabalhador, na condição de pessoa jurídica, para a prestação de serviço.”

Em entrevista[100] à revista Veja, especialistas da IOB, da Sage Brasil, afirmaram, quanto à constituição por um ex-empregado de uma empresa microindividual – MEI – para a contratação de seus serviços por uma empresa tomadora: 

A reforma menciona que não poderá figurar como empresa contratada a pessoa jurídica cujos titulares ou sócios tenham, nos últimos dezoito meses, prestado serviços à contratante na qualidade de empregado ou trabalhador sem vínculo empregatício, exceto se os referidos titulares ou sócios forem aposentados. Caso o MEI venha a ter subordinação à empresa que preste serviço (por exemplo, estando sujeito a jornada de trabalho ou cumprimento de ordens de superior hierárquico), poderá ingressar com eventual reclamatória trabalhista buscando a caracterização do vínculo empregatício, onde caberá ao Poder Judiciário a decisão final a respeito da questão. (VEJA, 2017) 

No mesmo sentido, o jornal Zero Hora, em entrevista[101] aos advogados trabalhistas Odilon Garcia Júnior e Carolina Mayer Spina Zimmer em seu portal de notícias online, expõe que a partir de agora há a possibilidade de uma empresa demitir seus funcionários e os recontratar como terceirizados, reduzindo salários e outras obrigações, porém “. . para bloquear essa possibilidade, a reforma criou uma quarentena de 18 meses que impede que a empresa demita o efetivo para recontratá-lo dessa forma imediatamente. ”

A partir disso, entende-se por relevante a introdução do art. 5 – C à Lei 6.019/74, ao passo que impede a contratação pela empresa contratante de empresa prestadora de serviços que detenha em seu quadro social ex-empregado daquela, que tenha sido dispensado nos 18 meses anteriores ao contrato de prestação laboral.

Entretanto, pode-se tecer uma crítica quanto ao alcance da proibição em análise: servirá para coibir a pejotização de ex-empregados da empresa contratante, porém não impedirá a ocorrência da transformação em pessoa jurídica de trabalhadores que nunca mantiveram relações laborais com a tomadora.

3.2.4.2 Quarentena dos Empregados 

Semelhante ao Art. 5 – C, o Art. 5 – D da Lei 6.019/74, incluído pela Lei 14.467/17, estabelece que o empregado demitido não pode ser recontratado por empresa tomadora na qualidade de empregado terceirizado nos 18 meses que sucederem à sua dispensa.

Com efeito, dispõe o referido instituto legal:

Art. 5o-D.  O empregado que for demitido não poderá prestar serviços para esta mesma empresa na qualidade de empregado de empresa prestadora de serviços antes do decurso de prazo de dezoito meses, contados a partir da demissão do empregado.  (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017).

Entende-se que a ideia do legislador, ao inserir esse instituto à Lei 6.019/74, era a de evitar que a empresa demitisse seus empregados e logo após isso os recontratasse, como forma de diminuir custos e se desincumbir das obrigações contratuais dos empregados terceirizados em questão.

3.2.5 Quarteirização de Serviços 

A figura da Quarteirização de Serviços pode ser entendida como a subcontratação, por parte da empresa prestadora de serviços, de uma outra empresa, para prestar tais serviços à empresa tomadora. Dessa forma, nessa relação contratual existem quatro diferentes pessoas e dois contratos de cunho civil: a empresa tomadora de serviços, a empresa prestadora de serviços inicial, a prestadora subcontratada e o trabalhador terceirizado. A instituição contratante constitui um contrato de cunho civil com uma determinada empresa especializada na prestação de serviços, a qual, por sua vez, faz novo contrato civil, subcontratando outra empresa para prestar tais serviços em seu lugar.

Tem-se dificuldade a encontrar na doutrina conceituação para o instituto da quarteirização. Justamente por isso ele é, em sua maior parte, conceituado jurisprudencialmente. Entretanto, um dos poucos conceitos disponíveis para análise é o de Reinaldo Dias[102], doutrinador da área de administração, que a conceitua como: 

É a evolução do processo de terceirização, em que o gerenciamento dos terceiros passa para uma quarta empresa. Trata-se do gerenciamento por parte de uma empresa quarteirizadora, de todas as atividades, serviços e fornecimentos de uma empresa e que podem ser terceirizados, empregando para isto, além de sua própria equipe e banco de dados, parceiros especializados que atuam em cada um dos setores.

Há muito, vemos diversos entendimentos na jurisprudência acerca do instituto, e a corrente majoritária sempre tendia considerar a quarteirização como possível, desde que se observassem os preceitos da Súmula 331 do TST[103]. Nesse sentido, temos alguns julgados[104]:

QUARTEIRIZAÇÃO DE SERVIÇOS - O fenômeno da quarteirização ocorre quando o tomador contrata uma empresa de prestação de serviços que, por sua vez, contrata outra entidade para fornecer pessoal necessário à execução do contrato. Na maioria das vezes, o artifício é utilizado para burlar direitos trabalhistas em flagrante prejuízo do trabalhador. Nestas circunstâncias, torna-se imperativa a incidência do art. 9º da CLT e responsabilização subsidiária daquele que se beneficiou diretamente do serviço do trabalhador, nos moldes do entendimento consubstanciado na Súmula 331/TST. (TRT-5 - RECORD: 269006520085050134 BA 0026900- 65.2008.5.05.0134, 1ª. TURMA, Data de Publicação: DJ 18/02/2011) 

QUARTEIRIZAÇÃO" DE SERVIÇOS. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DOS TOMADORES DE SERVIÇOS. O tomador de serviços responde subsidiariamente com o contratado pelas verbas trabalhistas devidas aos empregados que prestaram serviços em seu favor (Súmula 331 do TST). Havendo a "quarteirização" de serviços, ou seja, o contratado transfere a prestação de serviços para outra empresa, a qual é empregadora dos trabalhadores, todos os tomadores de serviços dessa cadeia produtiva respondem subsidiariamente. Recurso do reclamante provido em parte para responsabilizar subsidiariamente os tomadores de serviços (TRT-4 - RO: 00006518420125040451, Data de Julgamento: 06/07/2016, 6a. Turma).

Por outro lado, havia também a corrente jurisprudencial que entendia que a figura da quarteirização de serviços era ilícita e caracterizava fraude aos preceitos do direito do trabalho, o que ensejava responsabilização solidária entre todas as empresas da relação contratual, conforme segue[105]:

QUARTEIRIZAÇÃO. FRAUDE. TERCEIRIZAÇÃO DE SERVIÇOS JÁ TERCEIRIZADOS. O fenômeno da "Quarteirização" ocorre quando uma empresa prestadora de serviços, coloca à disposição da empresa Tomadora de Serviços, empregados de outra empresa, em serviços ligados à sua atividade fim. Nesse caso, a Empresa tenta esquivar-se das suas obrigações trabalhistas, por meio da intermediação de mão de obra, o que é vedado, nos termos da Sumula nº 331, Item I, do C. TST. Recurso da Segunda Reclamada não provido no part (TRT-15 - RO: 4283320125150126 SP 026324/2013-PATR, Relator: HELCIO DANTAS LOBO JUNIOR, Data de Publicação: 12/04/2013)

A partir disto, a Lei 13.429/17 supre a ausência conceitual em torno do tema, estabelecendo a regularidade do fenômeno em comento, ao incluir à Lei 6.019/74[106] seu art. 4º-A, §1º:

Art. 4o-A.  Considera-se prestação de serviços a terceiros a transferência feita pela contratante da execução de quaisquer de suas atividades, inclusive sua atividade principal, à pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviços que possua capacidade econômica compatível com a sua execução. (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017)

§ 1o  A empresa prestadora de serviços contrata, remunera e dirige o trabalho realizado por seus trabalhadores, ou subcontrata outras empresas para realização desses serviços. (Incluído pela Lei nº 13.429, de 2017).(grifo nosso)

Observamos assim, segundo análise do instituto supratranscrito, que empresa prestadora de serviços a terceiros é aquela que contrata, remunera e dirige o trabalho realizado por seus trabalhadores, ou subcontrata outras empresas para a realização desses serviços.

É justamente a partir possibilidade de subcontratação que podemos definir a figura da quarteirização. Nesse sentido, podemos inferir que ocorre quarteirização quando uma empresa terceirizada subcontrata outras empresas para realizar a prestação do serviço propriamente dita. Tem-se, assim, através da positivação da subcontratação de empresas por meio da Lei 13.429/17, a resolução da divergência jurisprudencial referida.

3.3 Incipientes Divergências Doutrinárias

Com o surgimento de toda e qualquer lei que regulamente de forma nova determinado assunto no campo do direito, surgem diversas correntes interpretativas na doutrina e na jurisprudência, em busca da melhor aplicação legal. Com a Lei 13.429/17, junto da Lei 13.467/17, não é diferente.

Na doutrina trabalhista, surgem diferentes posições acerca da implantação das normas trazidas pela Lei da Terceirização e pela Lei da Reforma Trabalhista. Para alguns - que defendem a posição de que as relações terceirizadas de trabalho fomentam o Mercado de Trabalho, ante a flexibilização das regras trabalhistas -, as alterações legislativas feitas representam grande avanço.

Por outro lado, a posição contrária combate a precarização das relações de trabalho e direitos do trabalhador, ocasionada pela referida flexibilização. Nesse sentido, o presidente da Anamatra-RS, Rodrigo Trindade de Souza (2016), sobre as reformas do direito do trabalho, afirma em entrevista[107] ao portal eletrônico ConJur:

A terceirização é bastante ruim para o mundo do trabalho. A Amatra fez um estudo, entregue recentemente à direção do TRT-4, sobre os maiores devedores da Justiça do Trabalho no estado. Descobrimos que, dos seis maiores devedores, quatro são empresas terceirizadas – inclusive a primeira.

(. .)

A perspectiva que se apresenta com a possível aprovação deste projeto de lei é de ampliação do rol de dívidas trabalhistas, prejudicando justamente os trabalhadores. Há mais. A terceirização implica salários 24% inferiores, na média, em relação aos contratos firmados diretamente com o tomador dos serviços. Apresenta o dobro de tempo de rotatividade, ou seja, quem presta serviços fica mais tempo desempregado. O terceirizado trabalha, em média, três horas a mais do que o empregado formalizado. E o pior: 80% dos acidentes de trabalho no Brasil envolvem terceirizados. O incrível é que os terceirizados representam só 17% da força de trabalho do Brasil. E o mais trágico: de cada cinco operários que morrem no trabalho, quatro são terceirizados. Então, esse projeto não pode avançar no Senado para não precarizar ainda mais as relações entre capital e trabalho. 

Um dos pontos apontados como positivos pelos defensores do método da terceirização é a desburocratização do instituto, a qual representa a possibilidade de dinamização de despesas, através da diminuição dos custos fixos e do aumento da possiblidade de custos móveis. A lógica é: repartindo-se os custos, permite-se a dinamização do mercado, e a despesa da empresa tomadora diminui.

Quanto a este ponto, Paula Marcelino[108] possui a mesma visão acerca dos efeitos da terceirização de serviços:

Na nossa compreensão, essa diferença se dá por um motivo fundamental: a terceirização nos parece ter no Brasil outro lugar na estrutura do mercado de trabalho, pois, nos últimos vinte anos da história do país, ela se tornou o mais importante recurso estratégico das empresas para gestão (e redução) dos custos com a força de trabalho.

Nesse sentido, o empresariado industrial defende a aplicação imediata das alterações trazidas pelas reformas no âmbito trabalhista, justamente por se utilizar de serviços terceirizados para fins de redução de custos.

Segundo pesquisa realizada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) em 2016[109], 88,9% das empresas entrevistadas afirmaram contratar serviços terceirizados com a finalidade de reduzir custos. Prosseguindo, o levantamento revela que 63,1% das empresas industriais utilizam a terceirização. Ainda, sustenta o estudo que a redução de custos não está diretamente relacionada com redução de salários e de custos trabalhistas. Pelo contrário, o custo menor seria resultado da “. . otimização do processo produtivo, que implica em ganhos de eficiência, melhor aproveitamento de insumos e ganhos de escala no processo fabril.”[110]

De entendimento diverso, há autores que entendem que a diminuição de custos decorrentes da dinamização do mercado ocorre às expensas do empregado, o que acarreta severas reduções em seus direitos. Para elucidar tal posição, imaginemos a seguinte comparação: um empregado direto de uma empresa produtora de automóveis, por exemplo, recebe R$ 1.000,00 mensais, acrescidos de todos os direitos reservados ao trabalhador, inclusive os advindos de eventual negociação coletiva. Um empregado terceirizado, contratado para exercer as mesmas funções, provavelmente receberia R$ 750,00 mensais, cerca de 25% a menos do que o empregado direto, sem ter direito a algumas vantagens, como plano de saúde, assistência odontológica, etc.

Nesta trilha, observa-se que, de fato, ocorrerá diminuição de custos para a empresa tomadora em sua relação contratual para com a terceirizada, porém se pode sustentar a posição de que esta redução não será compensada pela empresa prestadora quando do pagamento do salário de seus empregados, para não fugir da ótica do capitalismo e sua busca pelo lucro.

Seguindo essa perspectiva, há muito já afirmavam Paulo Vicente e Marcelo Alexandrino (2010)[111], o que demonstra a constante discussão acerca da redução salarial:

São muitos os argumentos contrários à terceirização, quase sempre no sentido de que ela viola o núcleo central do contrato de trabalho regido pela CLT, implicando redução dos direitos do empregado quanto a promoções, salários, fixação na empresa e outras vantagens decorrentes de acordo ou convenção coletiva. Além disso, é muito mais seguro para o trabalhador ser empregado de uma grande empresa do que de pequenas empresas de duvidosa idoneidade econômica. (Vicente & Alexandrino, 2010).

Outro ponto polêmico acerca da eficácia da Lei 13.429/17 se dá quanto à geração de emprego. Alguns entendem[112] - como o Presidente da Federação das Câmaras de Dirigentes Logistas do Rio Grande do Sul (FCDL-RS), Vitor Augusto Koch - que, a partir de agora, haverá maior competitividade na economia e geração de empregos formais com o estímulo à contratação de empresas especializadas. Em contraponto, outros afirmam que os empregos já existem e que, por estarem as empresas livres para terceirizar quaisquer de suas funções, com a premissa de economizar recursos, o número de demissões aumentará. Tal posição é encampada pela Juíza do Trabalho da 1ª Vara do Trabalho de São Leopoldo, Valdete Souto Severo.

Entre outras afirmativas, Valdete entende[113], que a Lei 13.429/2017, especificamente:

De modo ainda mais direto, nega o direito fundamental à relação de emprego (artigo 7º, I), à irredutibilidade de salário (art. 7º, VI), às férias (art. 7º, XVII), à redução dos riscos inerentes ao trabalho (art. 7º, XXII), apenas para citar os exemplos mais óbvios. A intermediação de força de trabalho permite que as prestadoras se sucedam em contratos de um ou dois anos, fazendo com que concretamente os trabalhadores jamais fruam férias e possam ter o salário reduzido, a cada “nova” contratação. Estimula a potencialização dos riscos, bastando citar o exemplo da supressão da exigibilidade de um técnico em segurança do trabalho, em face da redução do número de empregados (contratados na forma prevista na ordem constitucional vigente), promovida pela terceirização em diferentes setores da mesma empresa. (Severo, 2017)

Quanto às relações de trabalho propriamente ditas[114], Paulo Garcia, Coordenador do Conselho de Relações do Trabalho e Previdência Social da FIERGS, entende que a permissão da terceirização irrestrita mudará a imagem que se tem acerca dos terceirizados, fundamentando sua posição com base na possibilidade de utilização pelos empregados terceirizados das mesmas dependências e serviços ambulatoriais do que os empregados diretos da empresa tomadora.

Por outro lado, a juíza Valdete[115] alega que haverá maior distanciamento entre o empregado terceirizado e quem de fato se beneficia da sua força de trabalho, ao passo que o poder de controle dos terceirizados continua sendo da empresa prestadora de serviços. Além disso, declara que a relação pessoal de trabalho pode restar prejudicada, quando da sucessão de contratos das empresas prestadoras para com diferentes tomadoras. Havendo a mudança de empresas para quem são prestados os serviços, muitas vezes o empregado terceirizado acaba tendo dificuldade para tirar férias, já que a cada novo contrato começa a contar novamente o tempo.

Quanto ao alcance da legislação, e no que tange à autorização da terceirização de atividades-fim da empresa tomadora, há quem afirme que também se estendem à Administração Pública, tendo em vista que tanto a Lei 13.429/17, como a Lei 13.467/17, não excluem o poder público quanto ao cumprimento de seu regramento. Nesse sentido, Ângelo Costa[116], presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho, afirmou, à época da aprovação do PL 4.302/98:

O projeto em relação à terceirização é muito abrangente e dá margem para que este tipo de contratação seja feita nas mais variadas áreas do serviço público, o que é bastante preocupante. Este novo processo nas relações de trabalho do país pode abrir precedente perigoso no setor público, que pode sofrer ainda mais com a ineficiência. O Estado pode deixar de fazer concursos públicos e passar a contratar empresas prestadoras de serviço. Assim, funcionários que não terão direito algum à carreira, vão exercer funções dentro da máquina pública. (Costa, 2017)

Defendendo posição contrária, o juiz federal William Douglas[117] afirma que a permissão da terceirização da atividade-fim, se ampliada à Administração Pública, torna o texto legal inconstitucional, “pois a constituição brasileira, no inciso segundo do artigo 37, prevê que o acesso ao funcionalismo deve ser feito através de seleção pública, com regras preestabelecidas.”. Com isso, alega que a permissão ferirá o princípio do procedimento licitatório por concurso público, demonstrando a inconstitucionalidade pontual da Lei 13.467/17.

Maria Sylvia Zanella Di Pietro[118], afirma, acerca da necessidade de procedimento licitatório para contratação da Administração Pública:

No âmbito da Administração Pública, os limites são muito maiores do que na empresa privada, porque, pela Constituição, o pessoal que compõe os quadros administrativos integra a categoria dos servidores públicos, os quais necessariamente ocupam cargo, empregos ou funções. Todos ingressam mediante concurso público de provas ou de provas e títulos (art. 37, II) com apenas duas ressalvas: uma que diz respeito aos cargos em comissão, de livre nomeação e execução; outra que concerne às contratações por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público.

Demonstrando a divergência existente acerca do ponto, Istvan Kasznar[119], professor da Administração Pública e de Empresas da Fundação Getúlio Vargas, explana:

No setor público, temos uma série de funções que são desnecessárias. Temos uma enorme quantidade de empregos que já não condizem que a necessidade da população e que podem ser terceirizados. Porém, acredito, a questão em debate está muito mais focada no setor privado, mas as regras têm de ser claras para os dois lados. (Kasznar, 2017)

Fato é que não se sabe ao certo como se dará a aplicação das alterações legislativas das relações terceirizadas de trabalho no tocante à Administração Pública. Certeza, esta, que se dará apenas com o tempo, a partir da decisão dos tribunais superiores acerca do ponto.[120]

Por fim, quanto aos setores atingidos, as pessoas contrárias à terceirização irrestrita afirmam que todos os trabalhadores serão atingidos e o número de terceirizações aumentará, por não haver limitação setorial na Lei 13.429/17. Isto, pois, na prática, o ordenamento jurídico agora permite às empresas terceirizar 100% do seu quadro funcional.

Por outro lado, Paulo Garcia e Vitor Koch entendem que, a partir da entrada em vigor da legislação de que se trata, não aumentará o número de terceirizações no Mercado de Trabalho, apenas se regulamentará a triangulação já existente em nosso país. Para justificar a posição, Paulo Garcia afirma que “. . não é vantagem para uma empresa terceirizar 100% dos seus funcionários, já que paga seus impostos ao governo e ao contratar os serviços também acaba bancando os impostos da terceirizada.”

Nesse ponto, esclarece-se que, quando da publicação da Lei 13.429/17, não se tinha certeza acerca do alcance da triangulação de serviços, se poderia ou não se estender à totalidade das atividades da empresa contratante, o que era considerado o principal motivo de divergência.

Isto, pois a nova lei de terceirizações[121] é omissa quanto à possibilidade de delegação das atividades-fim da empresa contratante, se limitando a afirmar que a contratação de prestação de serviços terceiros se daria para fins determinados e específicos. Como visto, a Lei da Reforma Trabalhista[122] sanou tal omissão, ao afirmar especificamente que podem ser terceirizadas todas as atividades da empresa contratante.

No próximo tópico, far-se-á um quadro comparativo das diferentes redações da Lei nº 6.019/74 –  tomando-se como base sua redação original e sua redação posterior às Reformas estudadas na presente monografia – no intuito de tentar sistematizar as novidades e alterações legislativas acerca da terceirização de serviços.

3.4. Quadro Comparativo[123].

Assunto

Lei nº 6.019/74

(Redação Original)

Lei nº 6.019/74

(Após as alterações trazidas pela Lei nº 13.429/17 e Lei nº 14.467/17)

Atividades passíveis de serem terceirizadas.

Previsão jurisprudencial na Súmula 331 do TST, segundo a qual se tinha a terceirização como exceção, permitida apenas para atividades consideradas secundárias ao objeto social da empresa tomadora.

Art. 4º- A. c/c Art. 5º – A. (redação dada pela Reforma Trabalhista)

Terceirização caracterizada como prestação de serviços relacionada a quaisquer das atividades da empresa tomadora, inclusive sua atividade principal. Aqui, tem-se o fim da distinção entre atividade-fim x atividade-meio como forma de verificar qual atividade é passível de ser terceirizada.

Vínculo empregatício entre o empregado terceirizado e a tomadora

Não havia previsão legal. O entendimento jurisprudencial era de que não haveria vínculo direto com a tomadora de serviços, se não estivessem presentes os requisitos caracterizadores da relação de emprego, o que acarretava a ilicitude da relação terceirizada de trabalho.

Art. 4º-A, § 2º

Aqui, a Lei 13.467/17 introduz o entendimento jurisprudencial no ordenamento jurídico pátrio. Agora, tem-se a normatização dada pelo artigo em comento no sentido de que não se configura vínculo empregatício entre os trabalhadores, ou sócios das empresas prestadoras de serviços, qualquer que seja o seu ramo, e a empresa contratante.    

Responsabilidade da Tomadora quanto aos débitos trabalhistas decorrentes da prestação do serviço

Não havia previsão. Responsabilidade Subsidiária como entendimento jurisprudencial.

Art. 5-A §5º.

Responsabilidade Subsidiária da tomadora referente ao período da prestação laboral terceira.

Quarentena da Prestadora

Não havia previsão de impossibilidade de contratação da mão de obra terceira de pessoa que já tivesse prestado serviços à Tomadora na qualidade de empregado direto ou trabalhador avulso em determinado lapso temporal.

Art. 5 – C.

Determinação de um período de quarentena de 18 meses de intervalo para contratação, na qualidade de contratante, de ex-empregados sócios da contratada e/ou de pessoa jurídica da qual seja sócio ex-empregado, exceto se aposentados, caso em que não há período de quarentena.

Quarentena de Empregados.

Não havia previsão expressa na legislação e tampouco na jurisprudência.

Art. 5 – D.

O empregado direto da empresa tomadora que for demitido não poderá prestar serviços na qualidade de empregado terceirizado pelo período de 18 meses a contar da data da dispensa.

Quarteirização

Não havia previsão expressa na legislação anterior.

Art. 4-A § 1º

É permitido à empresa prestadora de serviços subcontratar outras empresas para a realização desses serviços.

Setores excluídos

Art. 19-B

Tem-se que a Lei 6.019/74, a partir do artigo em análise – inovação trazida pela Lei 13.467/17 -, exclui de sua aplicação as empresas de vigilância e transporte de valores. Assim, o primeiro entendimento que se tem é o de que, para tais modalidades de emprego, a Súmula 331 no TST continua a valer.

 

3.5. Posicionamento do TST acerca da aplicabilidade da Legislação – norma de direito material - estudo de caso. 

Em recente julgamento de Embargos de Declaração, nos autos do processo RR - 1144-53.2013.5.06.0004, lide inicialmente proposta por Natalia Gomes Da Silva em face de Itau Unibanco S.A. e Contax-Mobitel S/A, a SDI-I, Subseção 1 Especializada em Dissídios Individuais, o Tribunal Superior do Trabalho decidiu, que, para os contratos de trabalho vigentes antes da entrada em vigor da Lei 13.429/2017, continuam a ser aplicados todos os preceitos da Súmula nº 331 da Corte Trabalhista.

Os Embargos foram interpostos pela segunda demandada em decorrência de julgamento de Recurso de Revista pela Terceira Turma do TST, o qual reconheceu a ilicitude da terceirização, por contrariedade à Súmula 331, I, do TST, reestabelecendo a Sentença do juízo de origem. Com isso, reconheceu-se o vínculo de emprego direto com o tomador de serviços, e se atribuiu às empresas reclamadas responsabilidade solidária pelos débitos trabalhistas, em decorrência da ilicitude da contratação terceira.

Na petição inicial, a reclamante Natália afirmou ter trabalhado em proveito do banco demandado, mesmo constando como empregador em sua CTPS a segunda reclamada. Para tanto, alegou a realização de diversas tarefas consideradas essenciais para a atividade bancária, tais como renegociação de dívidas, cobrança, controles, processamento, alteração, cálculo de encargos, parcelamento de faturas, vendas de cartão de crédito, alterações de limites, solicitação de segunda via de cartões, análise de reativação de clientes, desbloqueio de cartões, inclusão de dependentes, abertura de processo de fraude, venda de títulos de capitalização, alteração de beneficiários do título, vendas de seguros.

Nos embargos em análise, a segunda ré requereu manifestação da SDI-I em relação ao acréscimo trazido pelo art.4º- A, §2º, que afasta o vínculo de emprego de terceirizados, “qualquer que seja o seu ramo”, com a contratante dos serviços. Para a empresa, a nova lei “afasta qualquer ilação de ilicitude na terceirização dos serviços prestados” e “deve ser aplicada de imediato”, tendo em vista que a Súmula 331 “vigia no vazio da lei, vazio esse que não mais existe”.[124]

No julgamento dos Embargos, prestaram-se esclarecimentos acerca da matéria, ressaltando-se o entendimento já anteriormente firmado da Subseção, conforme trecho da decisão que segue[125]

(. .) No entanto, a despeito de o v. acórdão embargado não padecer de omissão, contradição, obscuridade ou de erro material, reputo necessário prestar alguns esclarecimentos, a fim de complementar a outorga da prestação jurisdicional.

Com efeito. De um lado, a meu juízo, a modificação legislativa introduzida com a entrada em vigor da Lei nº 13.429/2017, denominada Lei da Terceirização, geradora de profundo impacto perante a jurisprudência consolidada do Tribunal Superior do Trabalho, no que alterou substancialmente a Lei nº 6.019/74, não se aplica às relações de emprego regidas e extintas sob a égide da lei velha, sob pena de afronta ao direito adquirido do empregado a condições de trabalho muito mais vantajosas.

De sorte que, no caso, por se tratar de contrato de trabalho celebrado e findo muito antes da entrada em vigor da Lei nº 13.429/2017, prevalece o entendimento jurisprudencial firmado à luz da Súmula nº 331, I, do TST, amparado, como sabemos, no antigo teor da Lei nº 6.019/74.

De outro lado, não subsiste a pretensão de sobrestamento do feito.

É bem verdade que, nos autos do Recurso Extraordinário com Agravo nº 713211/MG, o Eg. Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal, em 15/5/2014, reconheceu a Repercussão Geral do tema constitucional concernente à fixação de parâmetros para a identificação do que representa “atividade-fim”, para efeito de definir-se a licitude da terceirização.

Não obstante, daí não adveio qualquer determinação de sobrestamento da tramitação de processos que versem acerca da referida questão jurídica.

Em semelhantes circunstâncias, nem a entrada em vigor da Lei nº 13.429/2017, nem o reconhecimento de Repercussão Geral do tema versado no ARE nº 713211, no âmbito do Eg. STF, têm o condão de alterar o entendimento sufragado no v. acórdão ora embargado.

À vista do exposto, dou provimento aos embargos de declaração apenas para prestar os esclarecimentos constantes da fundamentação. (grifo nosso)

Com isso, a Máxima Corte trabalhista firmou entendimento de que as alterações trazidas pela Lei 13.429/17 - podendo-se entender o mesmo quanto à Lei da Reforma Trabalhista – somente se aplicam às relações de emprego regidas e extintas após a entrada em vigor da legislação em comento. Isto, pois as alterações em matéria de terceirização são normas de direito material, e, portanto, não são aplicadas de imediato, a contrário do que determina o Princípio da Aplicação de Imediata das Normas Processuais.[126]

Com efeito, quando a relação jurídica material já se findou e produziu todos os seus resultados sob a vigência da norma anterior, a norma a ser aplicada é a anterior.

Sobre o assunto, Roberto Dala Barba Filho[127] afirma que existem três circunstâncias: facta praeterita, facta pendentia e facta futura. A primeira diz respeito aos fatos pretéritos, que ocorreram ante do advento da nova lei, cujos efeitos foram inteiramente regulados pela lei antiga. A segunda, por sua vez, refere-se aos fatos cujos efeitos se projetam no tempo, regulando-se os efeitos anteriores de determinado fato pelo momento de sua constituição, ou seja, os fatos consumados antes do advento da lei nova pela lei antiga se regulam, e os posteriores pela lei posterior são regulados. Por último, os facta futura dizem respeito a fatos consumados inteiramente após a vigência da nova lei.

Nestes termos, o entendimento que surge é o de que a aplicação das Leis 13.429/17 e 13.467/17 – esta última no que tange às alterações à Terceirização de serviços -, por se tratar de aspectos de Direito Material, deve respeitar os institutos da coisa julgada, do ato jurídico perfeito e do direito adquirido. Devem-se observar, por consequência, os fatos ocorridos antes da entrada em vigor da legislação.

Assim, o entendimento que se tem aplicado nos tribunais do trabalho é o dado pelo TST, isto é, continua-se aplicando o disposto na Súmula 331 para as reclamatórias trabalhistas ajuizadas antes da Lei nº 13.429/17.

O que se pode esperar quanto à efetiva aplicação do novo conceito de terceirização é de que não mais se utilizará a distinção entre atividade-meio e atividade-fim como forma de enquadrar como lícita ou ilícita a contratação dos serviços. Agora, verificar-se-ão com mais afinco as questões relacionadas ao vínculo de emprego e o preenchimento de seus requisitos, tratados no primeiro capítulo do presente trabalho. Isto é, continuarão ocorrendo terceirizações lícitas e ilícitas, porém agora não mais a ilicitude estará relacionada com a prestação de serviços se dar quanto às atividades finais da empresa. De forma contrária, a ilicitude pairará na caracterização do vínculo empregatício de forma direta com a tomadora de serviços, pelo preenchimento dos requisitos da relação de emprego, em especial do requisito da Subordinação Jurídica, posto que, todos os outros – onerosidade, não-eventualidade, pessoalidade e alteridade – já estão presentes na relação entre o empregado terceirizado e a empresa contratante em uma terceirização ordinária.

Em consequência da caracterização da ilicitude pela presença da Subordinação Jurídica do operário terceirizado à tomadora, a Justiça do Trabalho declarará fraude no contrato de terceirização e responsabilidade objetiva das empresas pelos débitos trabalhistas.

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Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CECHET, João Lucas Longhi. Terceirização: Leis n. 13.429/17 e 13.467/17 e a desconstrução da relação tradicional de emprego. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5588, 19 out. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/65226. Acesso em: 27 abr. 2024.

Mais informações

Trabalho de conclusão de curso de graduação a ser apresentado à Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais. Orientador: Professor Dr. Rodrigo Coimbra Santos.

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